¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sábado, março 08, 2008
 
AINDA AS MALAS



Pois é! A Espanha barra brasileiros em seus aeroportos todos os dias. Pobre gente brasileira que vai tentar a sorte na Espanha ou tenta entrar na Europa através da Espanha. Não são exatamente os pobres diabos africanos que arriscam a vida no Mediterrâneo em toscas pateras. Têm dinheiro suficiente para pagar passagem aérea. Mas o objetivo, no fundo, é o mesmo: fugir à miséria de seus países e tentar vida melhor.

Bastou que a Espanha barrasse três universitários e a imprensa fez um escândalo. De repente, o Brasil sentiu-se ferido em seu orgulho. Imediatamente, o Supremo Apedeuta autorizou retaliação. A Espanha, que barra imigrantes de todos os quadrantes, sejam africanos ou latino-americanos, parece agora barrar exclusivamente brasileiros. Os argumentos dos universitários barrados são um tanto precários: iam a Lisboa para um congresso. Por que ir a Madri para chegar a Lisboa? Porque seria mais barato ir via Madri. Nenhum jornalista perguntou por qual empresa voaram, quanto pagaram. Nenhum jornalista se preocupou em fazer uma rápida pesquisa, para saber se realmente voar via Madri é a fórmula mais barata para chegar em Portugal.

A Folha de São Paulo deste sábado foi pródiga em besteiras. Entrevistaram uma agente de turismo, Lenice Morettini, que observava a longa fila de passageiros que se formava diante do balcão da Iberia, no aeroporto de Guarulhos. Ela passou a analisar os brasileiros na fila que viajavam para a Espanha e a dar palpites sobre quais seriam ou não barrados. Lenice criou o conceito de passageiro-borracha, aquele que bate e volta.

Entre os critérios para definir o passageiro-borracha, incluiu o tamanho da mala. "Olhe a malinha. Quem vai passear na Europa, com aquele frio, sem levar um monte de roupa, um bom casaco? E quem viaja leva mais de uma mala, nem que seja para trazer presentes", observa Lenice. Ela acha que esse é o perfil do turista que seria automaticamente barrado.

Confesso nunca ter ouvido tanta besteira em apenas três frases. A agente de turismo certamente está acostumada a esse tipo de viajante idiota, que viaja em rebanho e com um monte de malas. Normalmente, viajo à Europa nos invernos. Dificilmente ultrapasso oito quilos de bagagem. Levo uma calça no corpo e outra na mala. Uma camisa no corpo e quatro ou cinco na mala. Mais cuecas e meias. Sapatos, um par só, os que levo nos pés. Casaco, levo na mão. Faz quase quarenta anos que viajo com essa malinha e nunca fui barrado em país algum.

Quanto a levar mais uma mala para trazer presentes, é sandice atroz. Alguém levaria uma mala vazia para trazê-la carregada? Só um tanso. Se o propósito for trazer presentes, viaja-se com uma mala só e lá se compra outra para a volta. Além do mais, porque todo viajante teria de trazer presentes? Mais ainda, por que uma mala toda de presentes?

"Se nós conseguimos ver quem está viajando com segundas intenções, você acha que as autoridades da Europa não conseguem ver?" – pergunta Lenice. É preciso ter uma cabeça de jerico para fazer tal afirmação. A mala do imigrante é sempre enorme. Ele geralmente desconhece o país para onde vai, não tem experiência de viagens e leva tudo em excesso.

Quem viaja com mala pequena é o viajor experiente, que não viaja para ficar e por isso mesmo não precisa levar todas suas posses. É espantoso ouvir de uma agente de turismo tamanha besteira.