¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sábado, maio 07, 2011
 
QUANDO MATAR
É FAZER JUSTIÇA



Ser polícia do mundo não é tarefa fácil. Os Estados Unidos estão sendo acusados, por jornalistas do mundo todo, de assassinar friamente bin Laden. Pelo jeito, na interpelação do terrorista, faltou aquela frase típica dos seriados policiais americanos: “Você está preso. Pode constituir advogado. Na falta de advogado, terá um constituído pelo Estado. Você pode ficar calado. Tudo que disser pode ser alegado contra você”.

Faltou também, ao que tudo indica, visto de entrada nos passaportes da força que atacou a fortaleza do saudita. Isso sem falar no devido mandado de busca e apreensão, para levar os discos rígidos, CDs e pendrives encontrados no refúgio do terrorista.

José Rodrigo Rodrigues, mestre em direito pela USP, doutor em filosofia pela Unicamp, professor e editor da revista "Direito GV", coordenador de publicações da Escola de Direito da FGV-SP e pesquisador do Núcleo Direito e Democracia do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, etc., etc., se pergunta na Folha de São Paulo de hoje se o gesto americano trata-se mesmo de justiça.

“Ou a ação dos EUA deve ser considerada como mera vingança? Justiça e legalidade não se confundem: não vou tratar aqui da legalidade da operação. A execução de Bin Laden não gerou protestos significativos na comunidade internacional. O desrespeito à soberania do Paquistão, a aplicação de uma pena sem processo judicial, o segredo da operação, nada disso parece tão importante diante do objetivo final. Os fins justificariam os meios, portanto? Processo judicial, sentença formal, Estado de Direito: esses conceitos seriam apenas tecnicalidades? A resposta é clássica e antiga: devemos desconfiar do poder e submetê-lo a fiscalização constante. A história ensina que os poderosos abusam de sua posição”.

Deve ser jovem o mestre em Direito, já que julga necessário explicar que justiça e legalidade não se confundem. Ora, nunca se confundiram. Justiça é um ideal a ser alcançado e não coincide necessariamente com lei. Pelo jeito, o causídico pretende que a comunidade internacional deva protestar contra o assassinato de um terrorista frio e sem nenhum senso de humanidade. Que um Estado cúmplice do terrorismo deva ser previamente informado sobre o ataque ao terrorista que abriga. Que a operação não seja sigilosa, mas previamente anunciada aos quatro ventos. Que um homem que jogou dois aviões - repletos de passageiros que nada tinham a ver com o peixe, contra dois prédios repletos de gentes que tampouco nada tinham a ver com peixe algum – seja submetido a processo judicial e sentença formal.

Numa guerra regular, há certas regras e convenções que a delimitam. No terror, não há regras nem convenção alguma. Mata-se, e fim de papo. Mais ainda: matam-se pessoas que nada têm a ver com as questões em litígio. Quando um terrorista se explode ou explode uma bomba em um avião, ele não está preocupado em matar o inimigo. Quer simplesmente manchetes para divulgar sua causa. Não se pode pretender que, no combate a estes animais, sejam levadas em conta as prescrições do Direito.

Continua o doutor José: “Diante do ocorrido, não seria surpresa descobrir que agentes americanos estejam no Brasil investigando a suposta ligação entre membros de organizações terroristas e a comunidade árabe local”.

Suposta ligação? O PhDeus da Unicamp deixou-se contaminar pelo jargão de jornalistas, que costumam usar “suposto” quando a palavra adequada seria “evidente”. Desde há muito se sabe que a Tríplice Fronteira – como é chamada a região de Foz – é um SPA para reciclagem de terroristas. Pelo jeito, o dr. José considera inclusive estranho o fato de os americanos investigarem no Paquistão “a suposta ligação entre membros de organizações terroristas e a comunidade árabe local”.

Continua o dr. José: “Haverá mais mortos em nome dessa justiça? É sabido que, na esfera internacional, o Estado de Direito ainda é uma utopia distante. Nessa esfera, tem prevalecido o realismo do poder, que não se deixa limitar pelos aguilhões do Direito e fala em nome da justiça em toda e qualquer ocasião. Nesse registro, "justiça" passa a ser sinônimo de "opinião dos poderosos".

Ao que tudo indica, esqueceu de sua afirmação inicial, a de que justiça e legalidade não se confundem. Claro que não se confundem. Os Estados Unidos, sem dúvida alguma, feriram os princípios do Direito. Mas fizeram justiça. Ou não será justiça executar um assassino frio que jamais teve consideração alguma por qualquer princípio do Direito?

O julgamento do terrorista saudita seria pretexto para uma série interminável de atentados, até que fosse libertado. Como jamais seria libertado, os atentados se repetiriam até sua execução. Sua morte também vai gerar terrorismo. Mas morte é fato consumado, e atentado algum o trará de volta à vida.

Dr. José quer que tratem segundo as regras do Direito um homem que planejou e executou o assassinato de três mil pessoas, e que mais pessoas mataria se tivesse as mãos livres. Tais assassinos ultrapassaram sua cota a qualquer direito legal. Eliminá-los sumariamente é o mínimo que se pode fazer em nome da justiça.