¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, outubro 10, 2011
 
SAINT STEVE?


Em meus verdes anos, quando fazia Filosofia, eu olhava meio de esguelha para os universitários da área técnica e científica. O saber, o humanismo, pensava eu, reside na Filosofia e nas Letras. Nada como o tempo para mudar as gentes. Hoje vivo afastado deste mundo e meu convívio tem sido maior com amigos da área técnica. Me fascinam as grandes obras da engenharia e os feitos da informática. Em algum lugar escrevi que quem descobre um chip mais rápido faz mais pela comunicação entre os homens do que um literato. Se os escritores estabelecem elos de comunicação, os informatas os tornam mais ágeis e mais ao alcance de todos.

Mas, cá entre nós, a imprensa está exagerando na apologia a Steve Jobs. O homem teve sua importância, isto é inegável. Daí a ser considerado gênio vai uma grande distância. Bill Gates mexeu com a minha vida. Quanto ao Jobs, se não tivesse existido, nada teria mudado em meus dias. Não tenho em casa nenhuma de suas geringonças. Estou pensando vagamente em um iPhone, mas hesito. Sei que pouca utilidade terá para mim, será mais ou menos como um brinquedinho portátil. Os achados de Jobs atendem mais a uma fome de consumo do que a uma real necessidade.

É equívoco da imprensa atribuir a Jobs a invenção do iPhone, iPod, iPad, iMac, como vem sendo feito. Não estamos mais nos tempos de Da Vinci ou Thomas Alva Edson. Na área da informática, todo gadget é fruto de milhares de homens/horas trabalho. Em recente artigo, dizia Farhad Manjoo, comentarista da revista eletrônica Salon:

- Há uma escola hagiográfica de Jobs que sugere ter sido ele o inventor individual das soluções. Embora haja centenas de patentes com o nome dele, Jobs não era o responsável pelas idéias dentro da Apple. O papel dele era separar as boas idéias das más idéias até elas virarem produtos.

Os devotos de Jobs dirão que algo tenho dele aqui em casa, o mouse. Segundo Manjoo, não é bem assim:

- O caso mais famoso desse seu talento foi o mouse, dispositivo que ele conheceu em 1979 numa viagem à unidade de pesquisas da Xerox em Palo Alto. Jobs percebeu na hora que aquilo poderia redefinir a computação e trabalhou febrilmente na tentativa de transformar aquilo em algo útil. Ele copiou outras partes do Mac de Jef Raskin, lendário especialista em interfaces de computador na Apple que bolou vários dos principais conceitos da computação gráfica.

Jonathan Ive, um dos diretores da Apple, tem suas queixas:

- Ele tinha um jeito de examinar minhas idéias e dizer: “Isto é bom, isto não é muito bom, gosto disto”. E depois eu me sentava na platéia e ele falava daquilo como se fosse idéia sua. Presto uma atenção insana para entender de onde vem uma idéia, a ponto de encher cadernos com minhas idéias. Por isso dói quando ele assume a autoria de um de meus designs.

O depoimento de Ive é grave. Estamos diante de um gênio ou de um operoso plagiador? A imprensa está fazendo a hagiologia de Jobs. Parece que a época está precisando de santos.

Mas Saint Steve está mais para ladrão do que para santo.