¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, novembro 07, 2011
 
IDADE MÉDIA, VOLVER!


Valayaté-Faghih, Kachfol-Astar e Towzihol-Masael são os três livros-chave de um escritor que, em 1979, recebeu generoso asilo em terras de França, em cidade nas cercanias de Paris. Traduzindo, pela ordem: O Reino do Erudito, A Chave dos Mistérios e A Explicação dos Problemas. Pinço cá e lá algumas reflexões do erudito autor:

No momento de urinar ou defecar, é preciso se agachar de modo a não ficar de frente nem dar as costas para Meca.

Não é necessário limpar o ânus com três pedras ou três pedaços de pano, uma só pedra ou um só pedaço de pano bastam. Mas, se se o limpa com um osso ou com coisas sagradas como, por exemplo, um papel contendo o nome de Deus, não se pode fazer orações nesse estado.

É preferível agachar-se num lugar isolado para urinar ou defecar. É igualmente preferível entrar nesse lugar com o pé esquerdo e dele sair com o pé direito. Recomenda-se cobrir a cabeça durante a evacuação e apoiar o peso do corpo no pé esquerdo.
Durante a evacuação, a pessoa não deve se agachar de cara para o sol ou para a lua, a não ser que cubra o sexo. Para defecar, deve também evitar se agachar exposto ao vento, nos lugares públicos, na porta da casa ou sob uma árvore frutífera. Deve-se igualmente evitar, durante a evacuação, comer, demorar e lavar o ânus com a mão direita. Finalmente, deve-se evitar falar, a menos que se seja forçado, ou se eleve uma prece a Deus.

A carne de cavalo, de mula e de burro não é recomendável. Fica estritamente proibido o seu consumo se o animal tiver sido sodomizado, quando vivo, por um homem. Nesse caso, é preciso levar o animal para fora da cidade e vendê-lo.
Quando se comete um ato de sodomia com um boi, um carneiro ou um camelo, a sua urina e os seus excrementos ficam impuros e nem mesmo o seu leite pode ser consumido. Torna-se, pois, necessário matar o animal o mais depressa possível e queimá-lo, fazendo aquele que o sodomizou pagar o preço do animal a seu proprietário.

Onze coisas são impuras: a urina, os excrementos, o esperma, as ossadas, o sangue, o cão, o porco, o homem e a mulher não-muçulmanos, o vinho, a cerveja, o suor do camelo comedor de porcarias.

O vinho e todas as outras cervejas que embriagam são impuros, mas o ópio e o haxixe não o são.

O homem que ejaculou após ter tido relações com uma mulher que não é sua e que de novo ejaculou ao ter relações com a legítima esposa, não tem o direito de fazer orações se estiver suado; mas, se primeiro tiver tido relações com a sua mulher legítima e depois com uma mulher ilegítima, poderá fazer as suas orações mesmo se estiver suado.

Por ocasião do coito, se o pênis penetrar na vagina da mulher ou no ânus do homem completamente, ou até o anel da circuncisão, as duas pessoas ficarão impuras, mesmo sendo impúberes, e deverão fazer as suas abluções.

No caso de o homem — que Deus o guarde disso! — fornicar com animal e ejacular, a ablução será necessária.

Durante a menstruação da mulher, é preferível o homem evitar o coito, mesmo que não penetre completamente — ou seja, até o anel da circuncisão — e que não ejacule. É igualmente desaconselhável sodomizá-la.

Dividindo o número de dias da menstruação da mulher por três, o marido que mantiver relações durante os dois primeiros dias deverá pagar o equivalente a 18 nokhod (três gramas) de ouro aos pobres; se tiver relações sexuais durante o terceiro e quarto dias, o eqüivalente a 9 nokhod e, nos dois últimos dias, o eqüivalente a 4½ nokhod.

Sodomizar uma mulher menstruada não torna necessários esses pagamentos.

Se o homem tiver relações sexuais com a sua mulher durante três períodos menstruais, deverá pagar o eqüivalente em ouro a 31½ nokhod. Caso o preço se tiver alterado entre o momento do coito e o do pagamento, deverá ser tomado como base o preço vigente no dia do pagamento.

De duas maneiras a mulher poderá pertencer legalmente a um homem: pelo casamento contínuo e pelo casamento temporário. No primeiro, não é necessário precisar a duração do casamento. No segundo, deve-se indicar, por exemplo, se a duração será de uma hora, de um dia, de um mês, de um ano ou mais.

Enquanto o homem e a mulher não estiverem casados, não terão o direito de se olhar.

É proibido casar com a mãe, com a irmã ou com a sogra.

O homem que cometeu adultério com a sua tia não deve casar com as filhas dela, isto é, como suas primas-irmãs.

Se o homem que casou com uma prima-irmã cometer adultério com a mãe dela, o casamento não será anulado.

Se o homem sodomizar o filho, o irmão ou o pai de sua esposa após o casamento, este permanece válido.

O marido dever ter relações com a esposa pelo menos uma vez em cada quatro meses.

Se, por motivos médicos, um homem ou uma mulher forem obrigados a olhar as partes genitais de outrem, deverão fazê-lo indiretamente, através de um espelho, salvo em caso de força maior.

É aconselhável ter pressa em casar uma filha púbere. Um dos motivos de regozijo do homem está em que sua filha não tenha as primeiras regras na casa paterna, e sim na casa do marido.

A mulher que tiver nove anos completos ou que ainda não tiver chegado à menopausa deverá esperar três períodos de regras após o divórcio para poder voltar a casar.

Qualquer comércio de objetos de prazer, como os instrumentos musicais, por menores que sejam, é estritamente proibido.
É proibido olhar para uma mulher que não a sua, para um animal ou uma estátua de maneira sensual ou lúbrica.

Cansei. Acho que chega. Pois o autor destes eruditos preceitos não é nenhum doente mental — ou pelo menos assim não é oficialmente considerado — nem, pelo que me conste, está sob camisa de força. Ao contrário, é um dos chefes de Estado contemporâneos que mais freqüenta as primeiras páginas da imprensa internacional e, do alto de sua sabedoria e humanismo, ousa reptar as potências. O autor de tão doutas prescrições é nada menos que o aiatolá Ruhollah Khomeiny. Excertos destas suas três obras foram publicadas em vários países, no Brasil inclusive, sob o título genérico de O Livro Verde dos Princípios Políticos, Filosóficos, Sociais e Religiosos do Aiatolá Khomeini.

Mas as esquerdas parisienses continuavam abominando o xá e louvando o potencial revolucionário do islamismo. Só começaram a preocupar-se quando Khomeiny, empunhado uma esquecida surata do Corão, que assimila o consumo de ovas de esturjão a um ato impuro, decidiu proibir a exportação de caviar. A União Soviética passou então a dominar o mercado e aproveitou a prescrição de Alá para aumentar o preço das ovas de beluga (um primo do narval, que habita o Ártico). Caíra um aiatolá no caviar dos intelectuais de esquerda.

Não sei se o leitor sabe, mas no Irã de Khomeiny, como aliás em todo o mundo islâmico, as mulheres têm o clitóris cortado, lá pelos cinco ou seis anos, e a vagina infibulada, isto é, costurada com fibras vegetais. Ao casar, o marido corta as fibras com uma faca e depois a pendura às costas, para exibi-la, pingando sangue, aos vizinhos. Após o parto, a mulher volta a ter a vagina costurada, para ser novamente rasgada. A esta prática estão submetidas cerca de cinqüenta milhões de mulheres, na África e no Oriente Médio, hoje, 1989. A genitália de muitas muçulmanas transformou-se em cloaca, o que esclarece a alta incidência de Aids nos países africanos, pois dadas as lesões internas da mulher, toda relação sexual sempre é de alto risco. Isto é o Islã, século XX.

Pois Khomeiny, cuja primeira providência ao assumir o poder foi provocar uma guerra que produziu um milhão de cadáveres, não contente de legislar sobre a maneira de defecar ou copular com animais, quer agora impor seu obscurantismo ao Ocidente. Ao entrar em Teerã, afirmou: “Criminosos não devem ser julgados, e sim executados”. Começou fechando os bordéis e fuzilando as prostitutas. Mas casar por uma hora, tudo bem.

Continuou fuzilando homossexuais. Mas se o homem sodomizar o filho, o irmão ou o pai de sua esposa após o casamento, este continua válido. Numa França de baixo crescimento demográfico, estes fuzilamentos sumários causaram, diga-se de passagem, muita apreensão. Pois, como me dizia um colega de imprensa, “se a moda pega na França, vamos chegar ao final do século com a população reduzida à metade”.

Com a nonchalance de um deus, Khomeiny condenou à morte o escritor Salman Rushdie, autor de Versos Satânicos, romance onde Maomé, à semelhança do Cristo de Kazantzakis, é visto como um ser humano. Rushdie, a propósito, não é cidadão persa, o que o colocaria sob a “legislação” do atual Estado teocrático iraniano. O escritor condenado à morte é um hindu, goza de cidadania britânica e vive em Londres. Para o assassino, o aiatolá oferece não só o paraíso, como também três milhões de dólares, que já subiram para seis. Mais ainda: a pena de morte é extensiva aos editores do livro. Stalin era mais modesto. Mandou matar Trotsky no México, sem maiores alardes.

Em outras palavras, o terrorismo com a bênção de um chefe de Estado. Terrorismo previamente anunciado, premiado com o paraíso vírgula seis milhões de dólares. A liberdade de expressão, talvez a mais importante conquista da cultura ocidental, é ameaçada pelo fanatismo de um sacerdote à beira das morte. Rushdie, provavelmente, deverás viver escondido pelo resto de seus dias. E editores e livreiros correm risco de vida em função das aiatolices de um padre no poder.

“As linhas da batalha estão se formando” — escreve Rushdie em Versos Satânicos -, “o secular contra o religioso, a luz contra a escuridão. É melhor escolher o lado”. Com sua sentença, o aiatolá decreta não apenas a morte de um homem, mas a volta do Ocidente aos dias cinzentos da Idade Média.

A Europa acaba de chamar seus embaixadores em Teerã. É chegada a hora, para todo homem que pensa, de escolher seu lado, ainda que com risco da própria vida.

Joinville, A Notícia, 26.02.89