¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sábado, fevereiro 04, 2012
 
DEPUTADO REGULAMENTA FILOSOFIA,
HOLÍSTICA, CHURRASCO E CHIMARRÃO



Comentei há pouco o propósito do deputado Giovani Cherini (PDT-RS), que pretende regulamentar o irregulamentável, no caso o exercício da profissão de filósofo em todo o País. Pois não é que o homem é um regulamentador contumaz? Longe dos pagos, eu desconhecia os feitos do nobre deputado. Leitores me alertam que este senhor, além de pretender regulamentar a filosofia, já instituiu – ou pretendeu instituir, não sei se o projeto foi aprovado – o dia do terapeuta holístico, seja lá o que isso quis dizer. Além disso, regulamentou o churrasco e o chimarrão. O homem é eclético. Da filosofia e holística ao churrasco e chimarrão.

Em 21 de março de 2003, Cherini apresentou projeto de lei 11.999, instituindo o Dia Estadual do Terapeuta Holístico, que seria celebrado no dia 31 de março. Na justificava, o deputado alega:

“Através da Terapia Holística a vida das pessoas pode tornar-se mais saudável, pois utiliza-se uma somatória de técnicas milenares e modernas, sempre suaves e naturais, proporcionando harmonia, autoconhecimento e incrementando a capacidade da pessoa tratada. Dentre estas técnicas podemos citar Yoga, Reiky, Tai Chi Chuan, Acupuntura, Aromaterapia, Homeopatia, Fitoterapia, Cromoterapia, Cristaloterapia, xamamismo, e outras terapias alternativas que ajudam a combater doenças de maneira eficaz e barata.

“As popularmente chamadas de "terapias alternativas" são aplicadas pelo Terapeuta Holístico, que procede ao estudo e à análise do cliente, realizados sempre sob o paradigma holístico, cuja abordagem leva em consideração os aspectos sócio-somato-psíquicos. Cada caso é considerado único e deve-se dispor dos mais variados métodos, para possibilitar a opção por aqueles com os quais o cliente tenha maior afinidade, promovendo a otimização da qualidade de vida, estabelecendo um processo interativo com seu cliente, levando este ao autoconhecimento e a mudanças em várias áreas, sendo as mais comuns: comportamento, elaboração da realidade e/ou preocupações com a mesma, incremento na capacidade de ser bem-sucedido nas situações da vida (aumento máximo das oportunidades e minimização das condições adversas), além de conhecimento e habilidade para tomada de decisão. Avalia os desequilíbrios energéticos, suas predisposições e possíveis conseqüências, além de promover a catalização da tendência natural ao auto-equilíbrio, facilitando-a pela aplicação de uma somatória de terapêuticas de abordagem holística, com o objetivo de transmutar a desarmonia em autoconhecimento”.

Ou seja, não disse nada. Se trocar terapeuta holístico por psicanalista ou pai-de-santo, astrólogo ou curandeiro, tanto faz como tanto fez. O deputado reconhece que a “profissão” não é regulamentada, sendo portanto de livre exercício. Mas ao criar uma data para homenagear os vigaristas, está dando o primeiro passo para uma futura regulamentação.

Não bastasse se preocupar com os destinos da terapia holística, o deputado apresentou o projeto de lei nº 70/2003, no qual institui o churrasco como o prato típico do RS:

Art. 1º – O churrasco a (sic!) gaúcha fica instituído como “a comida típica do Rio Grande do Sul”.

Como se só no Rio Grande se comesse churrasco. Ora, churrasco é universal está disseminado de sul a norte no país. Constitui o plat de résistance de países como Uruguai e Argentina e diria inclusive da Espanha, famosa por seus asados. Onde há carne e fogo há churrasco. A fórmula é imemorial.

Mas o deputado pretende que exista um churrasco que é tipicamente gaúcho:

Parágrafo único – para os efeitos desta lei, entende-se por churrasco a (resic!) gaúcha a carne temperada com sal grosso, levada a assar ao calor produzido por brasas de madeira carbonizada ou in natura, em espetos ou disposta em grelha e sob controle exclusivamente manual.

E se a carne for assada em um forno a 300º, deixa de ser churrasco? Por que há de ser assada em espetos ou disposta em grelha e sob controle manual? Churrasco, eu o faço como bem entendo, ora bolas! A definição proposta pelo deputado é bizantinice de cetegistas. Mas o deputado vai adiante:

Art. 2º – É conferido ao churrasco a gaúcha a distinção de símbolo do Estado do Rio Grande do Sul, de sua gente e de sua cultura.

Eh Brasil! Todos os países do mundo têm seus pratos típicos e nunca algum deles pretendeu instituí-lo como símbolo nacional. Os suecos têm o smörgåsbord, a Hungria o goulasch, a França o cassoulet, a Itália suas massas e pizzas, Portugal seus bacalhaus, a Inglaterra tem o abominável fish and chips, e nunca nenhum desses países pretendeu dar-lhes o status de símbolo. Só o provincianismo atroz dos cetegistas é capaz de inspirar tal ridículo. Optasse eu por um símbolo do Rio Grande, eu pensaria em duas aves cheias de significado, encontradiças na pampa gaúcha, o joão-de-barro ou o quero-quero.

Falar em churrasco, não foi no Rio Grande do Sul que eu comi os mais dignos de lembrança. E sim em São Paulo ou Buenos Aires. E as melhores churrascarias de São Paulo são, a meu ver, as uruguaias e argentinas. Isso sem querer fazer injustiça ao Vento Haragano, tocada por churrasqueiros de Nova Bréscia, que concorre firme com as de nuestros hermanos.

Não bastasse este besteirol todo, o deputado quer instituir o Dia do Churrasco. Agora só falta o do chimarrão, pensei. Faltava. O deputado criou também o Dia do Chimarrão. Ambos comemorados em 24 de abril de cada ano e incorporados ao calendário oficial de eventos do Estado do Rio Grande do Sul.

Falta do que fazer! E ainda há quem eleja tal palhaço. Este povinho bem merece seus representantes.