¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, junho 06, 2012
 
VIVER E DEIXAR VIVER


Jamais usei qualquer droga. Nem mesmo tabaco. A bem da verdade, nos distantes anos 70, dei duas tragadas num baseado. Estava em Estocolmo, em um apartamento de universitários, com 19 brasileiros e três suequinhas. Me passaram o bagulho. Para não bancar o estraga-prazeres, dei uma pitada. Uma das suecas me perguntou:

- Vocês brasileiros só sabem fazer isso?
- Isso o quê?
- Puxar fumo e ficar olhando o próprio umbigo?

Brasileiros, até pode ser, respondi. Mas expliquei que não era muito brasileiro. E convidei as três para meu apartamento, onde tomamos vinho a noite toda até o amanhecer. Noite e amanhecer é modo de dizer. Era verão e as noites eram de uma luz irreal, emanada por um sol paranóico que teimava em não deitar-se.

A maconha era liberada na Suécia e a prefeitura de Estocolmo inclusive financiava bares para a meninada fumar. Tentei entrar em um deles, para ver como é que era. Fui barrado, era maior de idade. O bar era para uso exclusivo de menores. Pelo que sei, a maconha continua liberada. O nível de criminalidade, de lá para cá, aumentou. Mas não pelo consumo de drogas. E sim pela invasão de muçulmanos no país dos Sveas.

Neste sentido, fumei mais maconha que tabaco. Lá pelos meus dez anos, eu participava de uma pecinha de teatro no primário. Representávamos os gaúchos, homens que, na visão das professoras, eram inconcebíveis sem um cigarro na boca. Dei uma tragada e joguei fora. Como não costumo usar o que não me agrada, até hoje não fumo.

Leitores que parecem não entender como alguém pode ser contra algo e ao mesmo tempo defender sua prática, querem saber afinal se sou contra ou a favor das drogas e do tabagismo. Nem tanto ao mar nem tanto à terra. O cigarro é decididamente letal. Algumas drogas, nem tanto. Creio que um uso moderado de drogas como maconha e mesmo a cocaína pode proporcionar prazer sem matar ninguém. Consta que Freud era adepto da coca, e isto não prejudicou seu intelecto. De minha parte, não usaria nenhuma nem outra.

Mas se alguém quiser usá-las, nada contra. Se alguém quiser inclusive destruir-se com cigarros ou drogas, esteja a gosto. Considero que pessoas adultas sabem - ou pelo menos deveriam saber - o que fazem. Ainda há pouco, li entrevista com o ex-marido de Dilma Rousseff, que hoje só respira com o auxílio de bombas de oxigênio. Não se arrepende de seu tabagismo. Pelos prazeres que teve, acha que valeu a pena. É um ponto de vista. Más vale un gusto que cien pesos - dizia-se lá na Fronteira gaúcha.

Em Paris, vi um velhote acoplado a um tubo de oxigênio, carregado em uma maleta de rodinhas. Entrou numa tabacaria e pediu dois Gauloises. Em meu boteco em São Paulo, vi um habitué cadavérico, consumido pela cirrose - morreria dali a uma semana - bebendo tranqüilamente seu uísque. Comentei isto com uma de minhas médicas. Ela foi pragmática: se vai morrer mesmo, que curta seus últimos dias.

Você prefere 90 anos sem álcool ou 70 com cirrose? Se um dia me fizerem esta pergunta, opto serenamente pela segunda hipótese. Já minha médica tem outro enfoque: “eu não bebo e vivo bem”. Tem gente estranha neste mundo.

Da mesma forma, em virtude de minha ojeriza aos ativistas gays, há quem queira saber se sou contra ou a favor do homossexualismo. Ora, ser contra ou a favor do homossexualismo é o mesmo que ser contra ou a favor do amanhecer. O sol nem liga, vai continuar saindo. Homossexualismo é comportamento imemorial, vem do fundo dos tempos. Foi comportamento normal na Grécia e Roma antigas, até que a peste cristã transformasse o prazer em pecado.

Desde jovem convivi com homossexuais, no colégio, na universidade e no trabalho e nada vejo de anormal neles. É apenas um outro modo de ser. Mas essa militância aguerrida, que quer fazer do homossexual uma vítima, mesmo em sociedades onde os homossexuais transitam sem problemas, essa militância é abominável. Assemelham-se aos antigos comunistas, que se sentiam superiores aos demais seres humanos, porque afinal detinham a Verdade.

Jamais julguei uma pessoa por suas práticas sexuais, crenças, posses ou cor da pele. Julgo, isto sim, por sua inteligência ou cultura. Nem sentido, não tenho muita consideração pelas sumidades do mundo das artes ou da política que pontificam por aí.

Viver e deixar viver - este era o lema de Casanova, homem que soube viver. Só não gostam disto os religiosos e seguidores de filosofias fanáticas, que querem impor a todos o próprio comportamento.