¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, maio 02, 2006
 
FAVOR PASTAR NO CAMPUS


Quando preciso de um médico, sempre procuro informar-me se ele fez pós-graduação nos Estados Unidos ou na Europa. Por precaução. De longa experiência, sei que o médico formado nos Estados Unidos provavelmente vai querer cortar-me o álcool e fará sérias objeções à carne vermelha. Se se formou na Europa - particularmente na Espanha ou França - terá perfeita consciência de que um bom vinho ou um bom cochinillo fazem parte do bem viver.

Sempre vi algo de místico nestes senhores que abominam carne vermelha. Muitos transitam na área do budismo, superstição que tem como pressuposto a reencarnação. Nada de matar seres vivos, como se o homem pudesse hoje estar vivo se não tivesse se alimentado a vida toda de seres vivos. São pessoas que não gostaria ter a meu lado em uma viagem. Se um almoço já constitui problema, imagine uma viagem. Mas já encontrei solução para conviver com estes místicos, as cantinas italianas: eu como o cordeiro, eles a massa da guarnição.

Místicos também são, a meu ver, estes senhores que empunham a redução da camada de ozônio querendo induzir-nos a uma vida materialmente mais pobre. Basta um glaciar diminuir um quilômetro nos pólos e já sentem o planeta ameaçado. Seus argumentos, que dependem de conhecimentos multidisciplinares, são mais confusos que os dogmas da Igreja Católica. Mas nunca falta um chofer de táxi que, do alto de sua sapiência, explique convictamente que o verão quente em São Paulo se deve ao derretimento das calotas.

Há uma conspiração - e das mais ferozes - contra a carne vermelha no mundo. Não hesito em afirmar que a conspiração tem suas raízes no puritanismo ianque, são sempre de lá que vêm as restrições ao melhor da gastronomia. Quarta-feira passada, dois geofísicos professores da Universidade de Chicago alertaram os adeptos da carne vermelha que o aumento de sua flatulência contribui para os gases estufa.

Era só o que faltava! Os místicos do efeito estufa marchando lado a lado dos zen-budistas. A escola dos Unidos contra o Prazer avança. Ecochatos unidos jamais serão vencidos. Por favor, senhores professores, vão pastar no campus. Pastem e ruminem e não pretendam responsabilizar os carnívoros pelo Armagedon. Ainda há pouco, cientistas australianos estudavam uma vacina para reduzir as flatulências bovinas e ovinas, que seriam em parte responsáveis pelo efeito estufa. Agora, o apocalipse chegará através de nós, cultores de uma boa picanha. O pum primevo, que inaugurou o processo de derretimento das calotas, terá sido emitido por aquele nosso ancestral que, tendo descoberto o fogo e já cansado do steak tartar, resolveu assar uma costeleta de javali.

Em meus dias de Madri, fiz memoráveis almoços no Comidas Naturales, antigo restaurante da calle San Bernardo. Lá, tudo era natural. Tanto o boi como o cordeiro, o javali ou o coelho, todos eram naturais. Nada era de plástico. Foi minha homenagem máxima ao meio ambiente.

Last but not least, cuidado ao escolher um médico.