¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, agosto 29, 2006
 
ARMADILHA PARA HOMOSSEXUAIS



Não é fácil ser entendido quando se foge aos padrões do pensamento vigente. Há leitor que se confunde quando digo que sou, em princípio, contra as drogas, mas a favor da liberação das drogas. Sou contra o aborto, mas sou pela descriminalização do aborto. Não vai nisto nenhum atentado à lógica. Se sou pela liberação das drogas, é porque penso que tal liberação servirá para diminuir o consumo das mesmas. E, principalmente, para exterminar o tráfico e todos os crimes dele decorrentes. Que mais não seja, o cigarro vem matando milhões desde que se tornou símbolo do homem que sabe o que quer e até hoje seu comércio não é proibido. Verdade que, na última década, os antitabagistas conseguiram grandes avanços como vetar o fumo em restaurantes e lugares públicos.

A propósito, hoje é o Dia Nacional de Combate ao Fumo. Mas o cigarro está longe ainda de ser proibido. Tampouco acho que deva sê-lo. Por um lado, tudo que é proibido sempre atrai. Pelo outro, as pessoas são suficientemente adultas para consumir ou não consumir o que as mata. Quem quiser chupar câncer, que o chupe e boa sorte.

Sou contra o aborto. É absurdo abortar quando se tem ao alcance das mãos diversas alternativas anticoncepcionais. Há milhões de pessoas apelando ao aborto como anticoncepcional e isto é uma estupidez. Sou pela descriminalização do aborto porque ninguém deve ter um filho que não quis, concebido em um momento de descuido, embriaguez ou ignorância. Só é crime o que a lei define como crime. Se a lei não define aborto como crime, então não é crime. Há quem condene o aborto em nome de um tal de direito natural, como se direito fosse algo escrito em tábuas eternas pendendo em algum desvão da eternidade. Ora, direito é construção feita por homens e cada país a erige como bem entende. As atuais objeções ao aborto são quizílias de fundamentalistas, que até hoje não aceitaram a idéia de um Estado laico. Confundem preceito moral com preceito legal e querem impor, teocraticamente, sua visão de mundo a todos os cidadãos.

Da mesma forma, sempre defendi o comportamento homossexual. Se uma pessoa se sente melhor mantendo relações com outra do mesmo sexo, ninguém tem nada a ver com isso. "Viver e deixar viver", esta era a divisa de Casanova. Faço-a minha também. A Bíblia condena? Que condene. Homossexualismo então é condenável para aqueles que têm a Bíblia como livro normativo. Judeus e cristãos devem abster-se do homossexualismo. A Igreja de Roma condena? Que condene. Isto significa que os católicos romanos também devem abster-se do homossexualismo. Mas nada lhes dá o direito de condenar o comportamento daqueles que não aceitam nem os princípios da Bíblia nem os preceitos de Roma.

Não faltam crentes hoje em dia que resumem o Ocidente a um legado judaico-cristão. A equação está incompleta. O Ocidente é também greco-romano. Quando se fala em judaico-cristão, estamos falando de dogma e de religião. Quando se fala em greco-romano, estamos falando de direito e filosofia. Se em um universo teológico homossexualismo é pecado, em um universo jurídico ou filosófico não vige a noção de pecado. Homossexualismo fazia parte da alegria do mundo pagão. Não fosse a emergência do cristianismo, ainda hoje constituiria algo perfeitamente permissível nos costumes da urbe. O cristianismo criminalizou o homossexualismo. Se sempre defendi este tipo de comportamento, não consigo defender palhaçadas como paradas gays - especialmente quando organizadas às custas do contribuinte - ou essa nova armadilha chamada casamento homossexual.

Carolyn Conrad e Kathlyn Peterson se divorciaram na semana passada. As duas foram o primeiro casal homossexual a unir-se civilmente nos Estados Unidos, após a promulgação da lei permitindo a união civil de homossexuais, em 01 de julho de 2000, no estado de Vermont. A cerimônia foi celebrada em todo o país como um marco na luta dos homossexuais para obter equiparação legal aos direitos adquiridos pelos casais heterossexuais no casamento. Em seu pedido de divórcio, Conrad afirmou que Peterson havia se tornado violenta, ao ponto de quebrar uma parede com um soco durante uma discussão, e havia ameaçado agredir uma de suas amigas. Peterson foi proibida pela Justiça de se aproximar de Conrad.

As uniões homossexuais sacramentadas pelo Estado não passam de um engodo para aprisionar pessoas que antes eram livres. Se Carolyn e Kathlyn não tivessem se unido perante a lei, ao menor sinal de agressão uma teria se separado da outra e estamos conversados. Com a nova lei, precisam solicitar oficialmente ao Estado permissão para separar-se.

Nesta matéria, a Espanha antecedeu os Estados Unidos. Em junho passado, dois homens iniciaram os trâmites legais de divórcio, quase um ano depois de entrar em vigor a lei que permitiu o casamento entre pessoas de mesmo sexo. Ambos viviam juntos desde 1993 e se casaram em outubro de 2005 na localidade madrilena de Rivas Vaciamadrid. Hoje, um dos parceiros reclama o direito de ficar com a casa, cuidar dos cachorros e uma pensão mensal de 7.000 euro. Alega que, durante anos, "se dedicou como uma dona-de-casa e teve de abandonar suas atividades profissionais".

Bari Shamus, uma das fundadoras do Grupo Liberdade de Casamento em Vermont, disse que a separação do casal americano não deveria surpreender a população, pois "os casais homossexuais têm os mesmos problemas de relacionamento que os casais heterossexuais".

Bingo, Bari! Os problemas são ainda mais agravados quando tais casais assinam um contrato sob chancela do Estado. Se antes uma separação não implicava partilha de bens nem demandas judiciais, hoje passou a implicar. Não estamos longe do dia em que, em função de um curto namorico, um dos parceiros pedirá indenização ao outro por ter gerado falsas expectativas. Tais processos já começam a pipocar em relações heteros. Daí a passarem para o campo das homossexuais é apenas um passo. Quem viver verá.

Em função de idéias estúpidas como feminismo ou politicamente correto, os homossexuais estão renunciando aos poucos à liberdade que sempre usufruíram e caindo na armadilha do casamento sacramentado em cartório. O relacionamento homossexual, que um dia foi regido pelo desejo ou mesmo pelo sentimento de companheirismo, submete-se agora ao Direito de Família. É o que chamo de saudades dos grilhões.