¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, dezembro 27, 2006
 
SOBRE A HUMANA ESTUPIDEZ



Há muitas coisas no mundo que não entendo. Uma delas é porque as pessoas adoram viajar todas nas mesmas datas. Por trás deste apagão de aeroportos, obviamente estão a greve dos controladores do tráfego aéreo - que ninguém, nem mesmo a imprensa, ousa dizer que é greve -, a inépcia da Anac e da Infraero, o overbooking das empresas. Mas não podemos deixar de lado a estupidez do ser humano. Por que razões todo mundo tem de viajar ao mesmo tempo?

Ora, direis, boa parte das gentes tem só aquele período para visitar os seus. Pode ser. Mas há uma outra boa parte que poderia viajar em outros dias. Alguns objetarão: mas é Natal. Nada disso. Natal pode ser o pico dos deslocamentos ensandecidos. Mas eles acontecem o ano todo. Cada feriadão, o rebanho desce ao litoral. Percursos que normalmente podem ser feitos em uma hora são feitos em cinco. Não tenho visto ninguém reclamar. Ao que tudo indica, o cidadão já aceitou os desconfortos do ano todo. Só chia quando dá atraso em aeroportos.

A estupidez é universal. Não é exclusividade do Brasil. Em toda a Europa, no começo da temporada oficial de verão, a carneirada se lança nas aerovias, ferrovias e estradas, sem preocupar-se com engarrafamentos. É a época ideal para os serviços de transporte entrarem em greve. Se alguém acha que os controladores do tráfego aéreo no Brasil estão sendo originais, em muito se engana. É que só agora descobriram que podem parar o país todo.

Nunca falta quem me pergunte: para onde vais neste feriadão? Não vou para lugar nenhum. Nada mais delicioso que um feriadão em São Paulo. Um milhão e meio de carros sai da cidade. Isto significa, por baixo, três milhões de paulistanos. Sampa se torna silente e provinciana. É o bom momento de passear, curtir bares e restaurantes. Se a cidade se torna palatável quando saem três milhões de pessoas, a conclusão que se impõe é que em São Paulo há pelo menos três milhões de pessoas a mais.

Não entendo. Há pessoas que buscam o verão europeu, quando a Europa está tomada por milhões de americanos, japoneses, brasileiros. Os preços, tanto de passagens como de hotelaria, sobem. Hotéis, praias e trens estão lotados. Viajar se torna desconfortável, quase uma tortura. Mas os turistas vão em bandos. Há uma espécie de compulsão: se todo mundo está partindo, por que estou ficando?

O verão tornou-se uma praga que empesta qualquer país onde ocorra. Enfim, honra a quem merece. Os turistas parecem ainda não ter descoberto o verão frio, isto é, o verão boreal. Não é desagradável viajar pela Escandinávia no verão. Desde que você assuma o conceito de um verão cujas temperaturas podem chegar a 0 grau.

Quando voltei da Suécia, lá pelos anos 70, uma jornalista deslumbrada me perguntou:

- Janer, tu que viajaste, que coisas lindas e maravilhosas descobriste em tua viagem?

Respondi:

- Descobri que a estupidez é universal.

Ela quase se engasgou com o microfone e me pediu para repetir. Repeti:

- Descobri que a estupidez é universal.