¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, junho 19, 2007
 
BOA BISCA



Quem dá explicação, já perdeu a discussão - diz a vox populi. Quanto mais o senador se explica, mais se enreda. Mentir não é bom, me dizia o Mário Quintana. Para cobrir uma mentira é preciso inventar outra e a coisa não acaba mais. O que era uma simples affaire conjugal, perfeitamente tolerável pelos costumes - como direi? - republicanos, está se transformando num imbróglio que talvez custe a cabeça do impoluto presidente do Senado.

Se até agora não há algo que prove que o senador Renan Calheiros recebia dinheiro de uma empreiteira, o que já está mais que provado é que sonegava imposto. Pois se não tinha como justificar uma pensão alimentícia de 12 mil reais e no entanto a pagava, é porque dinheiro havia. Para justificar que podia pagar a pensão - o que nem de longe prova que a pagasse do próprio bolso - o senador apresenta recibos fajutos de venda de gado. Para começar, o número de reses de sua fazenda é contestado pelo funcionário por elas responsáveis. Continuando, dos recibos constam preços não praticados no mercado.

Ou seja, o senador está encaminhando sua defesa a rumos cada vez mais perigosos. Se nem o gado explica o dinheiro que diz dispor, resta a pergunta: de onde veio então esse dinheiro? Pergunta mais que pertinente. Afinal, segundo suas declarações de bens, em 24 meses, a partir de maio de 2003, o senador ergueu um patrimônio agropecuário formado por três fazendas e mais de mil cabeças de gado. Não é tarefa para qualquer mortal.

Para situar-se como vítima, o senador insiste na affaire afetiva, alegando estar sendo chantageado. Ora, neste Brasil de hoje, a ninguém interessa as eventuais infidelidades, seja de um senador, seja de um Zé Ninguém. Há uns trinta anos ou quarenta anos, a simples suspeita de uma amante derrubaria até mesmo o presidente da República. Os tempos mudaram. O cerne da questão, que o senador que a todo custo desviar, é de onde vinha o dinheiro recebido por sua teúda e manteúda.

Falar nisso... O primeiro livro assinado por Machado de Assis, publicado em 1861, tinha como título A Queda que as mulheres têm para os tolos. Em verdade, segundo os machadianos, não seria de sua lavra, pois seu nome consta como tradutor. Embora não o tenha lido, o título sempre me fez pensar. Particularmente nestes dias de Mônica Veloso. Que faz uma jornalista bonita, inteligente e independente entregar-se a um pedaço de gente, incapaz até mesmo de ser honesto com a mãe de seus filhos? A fortaleza destes senhores empertigados nos altos cargos do poder no fundo não passa de verniz. Mal são flagrados em uma pulada de cerca, tecem atabalhoadamente um rosário de mentiras tentando provar o que nunca foram.

Quando uma mulher bonita dorme com um canalha, eu, justo, me sinto roubado. Diga-se de passagem, não precisa nem dormir. Quem tem qualquer tipo de apreço por um corrupto, certamente acha normal, senão louvável, digna e justa, a corrupção. Não me refiro apenas às relações entre homem e mulher. Penso que uma pessoa honesta não pode ter intimidade alguma com corruptos. Se tiver, demonstra que aceita o crime com naturalidade.

Claro que as facilidades que só o dinheiro e o poder oferecem sempre constituem uma tentação. O que me pergunto é se vale a pena dormir com pessoa vil em troca de tais facilidades. Ainda mais em um país onde uma mulher bonita, inteligente e independente tem todas as portas abertas para uma ascensão profissional. Longe de mim pretender jogar na jornalista a culpa toda desta história sórdida. Mas mulher que dorme com senadores, boa bisca deve ser.