¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, junho 20, 2007
 
COVARDIA SE REPETE



Já comentei várias vezes a covardia do Ocidente ante a affaire Rushdie. Vou comentar de novo. Tudo começou em 1989, quando o indiano Salman Rushdie publicou Versículos Satânicos. Neste livro, Rushdie reproduziu os versículos Gharanigh, não aceitos pelos canonistas do Corão. Mutatis mutandis, foi como se no Ocidente fossem publicados os evangelhos apócrifos ou gnósticos, não aceitos pela Igreja Católica, que aliás são publicados em várias línguas do Ocidente. Embora fosse indiano com nacionalidade britânica, Rushdie foi condenado à morte por uma fatwa do aiatolá Khomeini, então todo-poderoso da "revolução" no Irã.

A Europa aceitou tranqüilamente a sentença do aiatolá. Em vez de isolar o Irã, o Reino Unido passou a dar proteção a Rushdie. Os demais países da comunidade se mantiveram em silêncio obsequioso. Sem atinar que não se tratava apenas de proteger um escritor perseguido. Mas de repudiar a pretensão megalômana de um padre persa, que pretendeu legislar inclusive no estrangeiro. A apostasia, ou crime, segundo os muçulmanos, havia ocorrido em Londres, com a publicação do livro. Do alto dos minaretes de Teerã, Khomeiny ordenou não só a condenação à morte - como também a execução da sentença - de Rushdie, assim como todos os implicados na publicação do livro… em território europeu ou onde quer que estes "criminosos" estivessem. Em 1991, o tradutor do livro para o japonês foi assassinado e em 1993 o editor de Rushdie na Noruega foi atacado quando saía de casa.

Na semana passada, a rainha Elizabeth II houve por bem conceder o título de "sir" a Rushdie, ao nomeá-lo cavaleiro da Coroa britânica. Protestos histéricos no Irã e Paquistão. O ministério das Relações Exteriores do Irã considerou a decisão da rainha um ato de provocação. Em Islamabad, manifestantes queimaram fotos do escritor e da rainha e o ministro dos Assuntos Religiosos do Paquistão, Mohammad Ejaz uh-Haq, ressuscitou a já esquecida fatwa, ao declarar que "se alguém comete um atentado suicida para proteger a honra do profeta Maomé, seu ato é justificado".

A covardia se repete. Leio hoje nos jornais que a ministra britânica das Relações Exteriores, Margaret Beckett, declarou que Grã-Bretanha lamenta a ofensa causada pela concessão do título ao escritor Salman Rushdie, o que se deveu a seus méritos literários. No fundo, a Coroa está pedindo desculpas a uma súcia de fanáticos terroristas, por ter reconhecido o valor literário de um de seus súditos.