¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, fevereiro 20, 2008
 
O ASTRÓLOGO



“Com bandido não se discute. Lugar de criminoso é na cadeia”, diz o Astrólogo a meu respeito. Essa eu ainda não tinha ouvido. Já fui chamado de comunista, reacionário, agente do Dops, agente do SNI e mais tarde, quando comecei a viajar, de agente da CIA. Fui também chamado de Robin Hood às avessas, “o que tira de todo e não dá nada a ninguém”. Como também de Savonarola às avessas, “o que nos condena por não pecarmos”. Ultimamente tenho sido chamado de ateu, no que não vai nenhuma impropriedade, sou ateu mesmo. O curioso é que ajuntaram um adjetivo à definição: ateu militante. É o pejorativo que os católicos fundamentalistas empregam para desqualificar quem é simplesmente ateu. Pois há uma raça neste século XXI que não concebe que alguém seja ateu. Pode ser muçulmano, hinduísta, protestante, evangélico, testemunha de Jeová. Pode até ser terrorista, desde que em nome de Deus. O que não pode é ser ateu.

Agora, sou bandido, criminoso. Esta é ótima. Estou sendo acusado por nosso Nostradamus tupiniquim, que já foi bolchevique convicto. Do comunismo se converteu à astrologia, da astrologia assestou a proa rumo ao islamismo e do islamismo para um cristianismo difuso, que não ousa dizer seu nome. Nem pode, pois aí se afogaria em um mar de contradições. Católico não pode ser, pois é astrólogo. Protestante ou luterano também não, aí afasta seus discípulos católicos. O Astrólogo diz-se filósofo, sem que filosofia alguma tenha elaborado. Neste sentido, em nada difere da “filósofa” Marilene Chauí, velha bolchevique. Pretende-se de direita, mas faz frente única com outra velha bolche, a Marina Silva, quando se trata de defender o creacionismo. Um mesmo passado ideológico implica solidariedade com os velhos camaradas.

Pretende-se defensor da liberdade de imprensa. Mas fecha com o bispo Edir Macedo, quando se trata de ameaçar jornalistas com processos, quando estes jornalistas denunciam suas falcatruas. Edita um jornal que pomposamente se chama Mídia Sem Máscara. Que, ao professar um catolicismo fanático e fundamentalista, deixou cair a máscara que tentava ocultar a seus leitores. O Astrólogo, Marilena Chauí, Marina Silva, Edir Macedo: o mesmo combate.

Que ninguém me chame de ingrato. Fui convidado para escrever no MSM e gostei de escrever ali. O jornal liderava uma caterva de jovens católicos, fanáticos e analfabetos em relação à Bíblia e ao magistério da Igreja, com os quais muito me diverti digladiando. Os meninos sequer tinham noção dos dogmas católicos e pretendiam discutir com quem os conhece. Infelizmente, senti-me obrigado a deixar de escrever no jornal que se pretendia sem máscara, quando censuraram crônica em que eu afirmava que Cristo havia nascido em Nazaré. Foi uma lástima. Eu adorava provocar aquela malta de carolas. Hoje, sinto uma falta enorme dos papa-hóstias.

Tirante os astros, o itinerário do Astrólogo é o mesmo de um intelectual confuso do século passado, Roger Garaudy, autor de um livro que até fez certa fortuna no Brasil, A Perspectiva do Homem. Foi católico, virou comunista, ou era comunista e virou católico, já não lembro. A ordem dos fatores não altera a vigarice. E morreu muçulmano. Estas conversões tresloucadas, eu as assisti de perto. Em Porto Alegre, havia um jornalista que começou católico, tornou-se comunista, o Jefferson Barros. E morreu virando o traseiro pra lua e cumprindo o Ramadã. Pobres diabos cuja cabeça oca gira como cata-vento ao sabor das brisas, que chegam à velhice sem ter uma idéia definida do que seja a vida. Precisam acreditar em algo, por estúpido que esse algo seja.

Eu o conheci como autor de um livro interessante, O Imbecil Coletivo, livro que recomendei a muitos leitores. Era uma crítica contundente às esquerdas. O que não se via, neste livro, era o fanático fundamentalista que mais tarde o Astrólogo revelou ser. Eu jamais imaginaria que era astrólogo. A revelação surgiu a partir de uma crônica, em que comentei projeto de outro velho bolche – tudo fecha! – o senador Artur da Távola, que pretendia regulamentar a profissão de astrólogo. Baixei a lenha na pretensão do senador e – aproveitando a vaza – na astrologia.

Em um fórum de debates, um interlocutor me interpelou: “Como que você critica a astrologia, se escreve num jornal que tem como editor um astrólogo?” Fiquei perplexo. Meu interlocutor foi adiante: “Mais ainda: ele não só é astrólogo, mas mestre-astrólogo. Tem quatro tratados de astrologia publicados e um de seus onze filhos também é astrólogo”. Pus um pé atrás. Neste momento, dei-me conta de que não basta a alguém criticar as esquerdas, o marxismo e o PT, para ser considerado honesto.

O que espanta, em tudo isto, é que um astrólogo, que se pretende entendido em Lógica, lidere um grupo de jovens católicos que, por questões de fé, não podem aceitar a astrologia. Até mesmo o recórter chapa-branca tucanopapista hidrófobo Reinaldo Azevedo é fanzoca do Nostradamus de Pindorama. Mais um pouco e estará fechando – se é que já não fecha – com a bolchevique petista Marina Silva.

Ó tempora, ó lógica!