¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

Powered by Blogger

 Subscribe in a reader

segunda-feira, maio 05, 2008
 
A AFFAIRE RONALDO



Vivemos em um mundo – em sua parte ocidental, pelo menos – onde homossexualismo, hoje, é visto com naturalidade. Claro, sempre existem aqueles papistas que vêm algo de abominável no fato de um homem ou uma mulher preferirem relacionar-se afetiva e sexualmente com pessoas do mesmo sexo. Mas homossexualismo data de muito antes da era cristã. Em crônica recente, eu falava da poetisa Safo, que viveu no século VII a.C. e nasceu na ilha de Lesbos, Grécia. Daí vem a palavra lesbianismo. Ou amor sáfico, como quisermos. O fato é que os historiadores situam, de um modo geral, nos poemas de Safo de Lesbos a primeira ocorrência na literatura da palavra amor.

Tampouco é desconhecido o costume dos antigos gregos de cultivar o amor de um efebo. Nos Diálogos de Platão – no Banquete, se a memória não me falha – vemos Alcibíades, um dos mais valorosos guerreiros do mundo helênico, flertando com Sócrates. Sexo era então prazer, não importa com quem. Foi o cristianismo, com sua filosofia puritana, que tornou o homossexualismo pecado – e mesmo crime – no Ocidente.

Mas, como dizem os portenhos, más vale un gusto que cien pesos. Apesar da opressão vaticana, o homossexualismo nunca deixou de ser praticado no mundo todo. Clark Gable, por exemplo, que sempre foi tido como um modelo de macho, "jovem, vigoroso e brutalmente masculino". Pois o modelo de macho americano tinha mulheres para manter sua fachada. Mas, pelo que se revela, ele gostava mesmo era de homens. Acaba de sair nos Estados Unidos uma nova biografia do ator, - Clark Gable - Tormented Star – que o revela como homossexual. E não era só ele. Cary Grant, Gary Cooper e até mesmo o insuspeito Humphrey Bogart teriam praticado o mesmo esporte.

O homossexualismo é punido até com morte no mundo muçulmano. Mas no Ocidente há muito deixou de ser estigma. A listagem de homossexuais no mundo do teatro, cinema ou literatura é enciclopédica e ninguém vai deixar de respeitar um Oscar Wilde, um André Gide, um Marcel Jouhandeau, uma Greta Garbo, uma Marlene Dietrich, por suas preferências na hora da cama.

Assim sendo, causa espécie que a imprensa nacional e internacional esteja preocupada com uma affaire de um jogador de futebol com três travestis. Não tenho apreço algum por jogadores de futebol. Se vejo algum deles anunciando algum produto, é certo que aquele produto não comprarei. Nada contra o esporte. Futebol, até acho bonito. Mas terrivelmente monótono. É sempre a mesma coisa, um monte de atletas correndo atrás de uma bola e chutando em gol. Confesso que não consigo entender como esses patas tortas recebam milhões de dólares para repetir todas as semanas a mesma peça.

Dito isto, defendo o direito desse tal de Ronaldo ir para a cama com quem bem entender. Gente de teatro, gente de cinema, artistas e literatos podem. Por que um jogador de futebol não pode? É difícil entender como uma revista que se pretende séria como a Veja, dê sua capa às preferências íntimas de um atleta. Pelo jeito, a imprensa está pretendendo demonizar o travestismo. Homossexual, até que passa. O que não pode, ao que tudo indica, é esse misto de um sexo e outro ao mesmo tempo.

A pressão da imprensa foi tal que o pobre diabo deu entrevista na televisão se penitenciando de algo que lhe terá sido muito prazeroso. A impressão que me fica é a da mesma reação ante o assassinato da menina Isabella. Aquela gente toda se reunindo para xingar os assassinos – houve quem viajasse 800 quilômetros para dar-se a esse prazer – só consigo entender como uma multidão de celerados que têm medo de um dia jogar um filho pela janela. A reação ante o caso de Ronaldo me parece a mesma.