¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sexta-feira, junho 13, 2008
 
HURTIGRUTEN


A Hurtigruten – Expresso Costeiro, em norueguês – é uma linha marítima que dispõe de onze navios, que sobem de sul a norte o litoral do país. Você começa a navegação em Bergen, ao sul e, se quiser, vai até Kirkenes, no extremo norte da Noruega, já na fronteira com a Rússia. Há barcos antigos e novos. Desde o MS Nordstjernen, construído em 1956, até o moderníssimo MS Midnatsol, de 2003.

A viagem é flexível. Você pode embarcar onde quiser e descer onde quiser. Seja em Ålesund, Trondheim, Bodø, ou nos demais portos por onde os barcos passam. Você pode descer em uma cidade, ficar lá quantos dias quiser e pegar um outro navio para seguir viagem. Cada navio tem sua personalidade, é uma outra viagem. Abrigam desde 150 a 650 passageiros. Você pode também, mediante um pagamento extra, pegar um ônibus em uma cidade – para ver os fjordes do alto ou as geleiras – e voltar ao navio na cidade seguinte.

Fiz este percurso em 2000, com minha Baixinha. Além de parar em cidades, os navios penetram em fjordes e atracam em pequenas aldeias de 100 ou 200 almas. É curioso ver um navio atracando em uma aldeia perdida, com cinco ou mais vezes seu número de habitantes. Nesta altura, para o leitor neófito, é bom que se explique o que é um fjorde. À primeira vista, parecem rios. São no entanto braços de mar que entram montanha adentro. Podem ser extremamente estreitos, coisa de 200 metros de largura. Quanto à profundidade, pode atingir 1.500 metros. Ou seja, transatlânticos de qualquer porte podem navegá-los. Devido a esta característica, na Segunda Guerra serviram de esconderijo para submarinos alemães.

O percurso do litoral é divino, particularmente no verão. Aquele sol que jamais se esconde não o deixa dormir. Você até pode dormir, nada impede. Mas o fascínio daquelas noites brancas não o incitam a ir para a cama. O fjorde mais deslumbrante pelo qual entrei foi o Trollfjorden, já no Círculo Polar Ártico. É pequeno, não tem mais de dois quilômetros de extensão. Nisto reside sua beleza. Está envolto por montanhas verdes e ao mesmo tempo nevadas, e cascatas caindo do alto. Eu estava lendo em um dos salões, quando chegou minha Baixinha, desesperada: “Sobe, sobe, não imaginas o que está acontecendo lá fora”. Era meia-noite, em pleno verão boreal. Subi. Franceses atrapalhados não sabiam para onde focar suas câmeras. Temperatura em torno de zero grau. Foi-nos servida uma sopa quente de mariscos que aqueceu até as entranhas.

Foi certamente a viagem mais linda de minha vida. Mais linda ainda que a viagem ao Assekrem, no Saara argelino. O que me agrada nestas navegações é que você está em meio à natureza, mas abrigado pelo conforto de um barco. Em meio ao mar, a centos e poucos metros da montanha, do verde e da neve, mas em um salão confortável e aquecido, sem areia por perto e servido por garçons. É minha dobradinha ideal: civilização e natureza, sem os desconfortos desta última.

Divino, não é verdade? Só tem um problema. Se tudo o que Midas tocava virava ouro, tudo o que o Brasil toca vira merda. A Viagens Abreu – certamente a mais antipática agência de turismo de massa que conheço, junto com a CVC – monopolizou a representação da Hurtigruten no Brasil. E só vende um pacote: de Bergen a Kirkenes, sempre no mesmo navio, sem opção alguma de estadas nos portos ou troca de navios. Transformou a linha costeira em cruzeiro. Assim, se você quiser descer ou parar em Ålesund, Trondheim, Bodø ou Tromsø, nada feito. Enfim, até que pode. Mas terá de pagar o percurso até Kirkenes.

Ora, neste julho, eu quero ir até Tromsø. Cidade universitária nos confins do planeta, de uns 60 mil habitantes, é tida como a Paris do Ártico. A tal de Viagens Abreu, que açambarcou as viagens da Hurtigruten, não me oferece esta possibilidade. Mais ainda: vende o pacote com refeições a bordo. O que, além de ser caro, lhe rouba a aventura de degustar a culinária dos restaurantes de cada porto.

Solução? Em Paris, na primeira agência de turismo que entrei, fechei um percurso entre Bergen e Tromsø. Pela metade do preço que me propunha a abominável Abreu. Ou seja, dezenove anos após a queda do Muro, dezessete anos após o desmoronamento da União Soviética, ainda há no Brasil quem aposte nos monopólios do socialismo.

Resumindo: se você quiser fazer uma travessia a seu gosto pela Hurtigruten, melhor ir a Paris. Para conferir:

http://www.hurtigruteninpictures.com/

http://en.wikipedia.org/wiki/Hurtigruten