¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, dezembro 10, 2008
 
ANTROPÓLOGA LUSA INSISTE EM
PRESERVAR BARBÁRIE EM JAULAS
EM TERRITÓRIOS BRASILEIROS




O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma hoje a discussão sobre a demarcação em faixa contínua da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima, tal como pensada pelo governo Fernando Henrique Cardoso e homologada por Luiz Inácio Lula da Silva.

Segundo o Estadão, em reportagem de Ivan Marsiglia, “a demarcação em ilhas, que permitiria a fixação do homem branco no local, interessa a um grupo de seis grandes rizicultores - ou "arrozeiros" - que ocuparam nos últimos anos parte do território pertencente à União. Ao lado deles, está a bancada de Roraima no Congresso, para quem os índios têm terra demais e inviabilizam economicamente o Estado”.

Marsiglia mente. A demarcação em ilhas não interessa apenas a um grupo de seis rizicultores. Interessa também a milhares de indígenas, que não querem renunciar às vantagens da proximidade com o branco, tais como emprego, medicina, farmácias, escolas, comércio. Quem quer isolar os indígenas dos brancos são brancos com interesses inconfessáveis, que dirigem entidades como o Conselho Indígena de Roraima (CIR) - financiado por fundações americanas e européias - e o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), organismo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que trabalha junto aos assim chamados povos da floresta.

Para fundamentar sua mentira, o repórter do Estadão entrevista a antropóloga portuguesa Manuela Carneiro da Cunha que, do alto de sua cátedra na Universidade de Chicago, deita falação sobre questões que deveriam dizer respeito apenas às autoridades brasileiras. Para a antropóloga, "demarcar em ilhas tem duas conseqüências: a destruição de uma etnia ou a perpetuação de um conflito".

A lusa mente. Contato com branco não destrói etnia alguma. Se assim fosse, há muito não existiriam as etnias africanas que hoje vivem no país. E conflito não há. Conflito existirá daqui para a frente, conforme for a decisão do STF. Nenhum homem gosta de ser expulso de suas terras. Se os brancos, que trabalham e produzem, forem expulsos de um território que será entregue a bugres que não trabalham nem produzem, aí sim se estabelecerá o conflito. O que os antropólogos querem, na verdade, é manter os índios em jaulas atemporais, em estado de selvageria, para contemplação dos turistas do futuro. O que querem estes senhores é negar o acesso dos índios às benesses do mundo contemporâneo.

Mas o cerne do problema não é a preservação do índio e suas tradições. Nas últimas discussões sobre a questão no Brasil, geralmente omite-se um item, nada menos que o essencial: os protochanceleres da suposta "nação" ianomâmi, por exemplo - já irremediavelmente demarcada - reivindicaram para seus protegidos um território de subsolo riquíssimo em ouro, diamantes, nióbio e cassiterita. Um naco do país, eqüivalente a três Bélgicas, foi entregue a dez mil índios. Nenhuma ONG se preocuparia tão enfaticamente com as culturas dos miskitos na Nicarágua ou dos ashaninkas no Peru.

Manuela evoca, como exemplos antagônicos, a demarcação contínua do Parque Nacional do Xingu - "uma ilha de floresta dentro de um oceano de soja" - e a descontínua, oferecida aos xavantes, do Alto Rio Negro, e aos guaranis-caiouás, de Mato Grosso do Sul: que resultou em degradação, mortalidade infantil e suicídios entre os índios. Ora, há um alto indíce de suicídios entre policiais militares no Brasil, que só tende a aumentar. As informações constam de uma tese desenvolvida por um psicólogo da Polícia Militar de São Paulo, intitulada Uma cultura suicida, e divulgada pela revista Isto É(19/11/1994). A constatação é de que o número de suicídios naquela corporação havia aumentado 50% em 1994 e que era crescente desde 1979, tendo sido considerado excessivo em 1989, com 19 mortes, e alcançado seu pico em 1992, com 35 mortes. Não nos consta que estes policiais tenham sido expulsos de suas reservas de demarcação contínua. Por outro lado, suicídio de branco não interessa a antropólogo algum.

Para Manuela, “as terras e as sociedades indígenas são preciosas para o mundo por serem modelos de uso, de sociabilidade e de visões de mundo diferentes. São um reservatório de soluções, de outras formas humanas de se viver”.

São formas humanas muito interessantes de se viver. O antropólogo Napoleon Changnon, que estuda o problema há 40 anos e viveu 60 meses em aldeias ianomâmis na Venezuela, nos relata estas formas humanas de se viver em seu livro Yanomamö, a Fierce People. Neste ensaio, onde estuda grupos ianomâmis na Venezuela, Chagnon descreve um povo primitivo que faz a guerra para obter as mulheres do inimigo morto. Seu estudo em nada fecha com as imagens idílicas da fotógrafa Claudia Andujar. Falando de sua experiência junto ao grupo do ianomâmi Kaobawa, diz o antropólogo:

"Entre os mais significativos resultados de minha análise estão os seguintes fatos, que demonstram a natureza e a extensão da violência entre o povo de Kaobawa dentro de uma perspectiva regional:
"1. Aproximadamente 40% dos machos adultos participaram do assassinato de outro ianomâmi. A maioria destes (60%) matou só uma pessoa, mas alguns homens foram muitas vezes guerreiros bem-sucedidos e participaram do assassinato de mais de 16 outras pessoas.
"2. Aproximadamente 25% de todas as mortes entre machos adultos são devidas à violência.
"3. Aproximadamente dois terços das pessoas de 40 ou mais anos perdeu, devido à violência, pelo menos um dos seguintes tipos de parentes biologicamente próximos: pai, irmão ou filho. A maioria deles (57%) perdeu dois ou mais parentes próximos. Isto ajuda a explicar porque um grande número de indivíduos são motivados à vingança.

"A mais insólita e impressionante descoberta, que foi discutida e debatida na imprensa e nos jornais acadêmicos, é a relação entre o sucesso militar e o sucesso reprodutivo entre os ianomâmis. Unokais (homens que mataram) têm mais sucesso em obter esposas e, conseqüentemente, têm maior descendência que os homens de sua própria idade que não são unokais.

"A explicação mais plausível para esta relação parece ser que os unokais são socialmente recompensados e têm mais prestígio que os outros homens e, por estas razões, são geralmente mais aptos a obter esposas-extras através das quais têm número de filhos além da média".

Chagnon nos mostra um agrupamento de indivíduos no qual a violência física, o assassinato e mesmo o infanticídio fazem parte do cotidiano. A criança não desejada é morta após o parto. As mulheres são continuamente espancadas e mesmo cortadas com facões e machados e inclusive recebem flechadas em áreas não vitais, como as nádegas ou pernas. Isso quando não são assassinadas. O autor nos narra o diálogo entre duas mulheres, que discutem suas cicatrizes no couro cabeludo. Uma considera que o marido da outra deve gostar muito dela, já que a espanca tão freqüentemente.

Os ataques a aldeias vizinhas para matar um ou mais habitantes e raptar mulheres constituem práticas normais para os guerreiros. No decorrer do livro de Chagnon, temos um desfile de assassinatos e massacres de índios por índios, narrados ao autor com a naturalidade de quem faz uma crônica social da oca.

Manuela Carneiro da Cunha foi defensora incondicional da demarcação da reserva ianomâmi. Estas são as formas humanas de se viver que a lusa quer preservar. Enquanto a humanidade ruma a níveis superiores de vida, conforto e convivência, que os bugres “sifu”, conforme a fina prosódia de nosso presidente.