¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, dezembro 14, 2008
 
RUMO AO EX-BRASIL (IV)


Vacinação define território – Em setembro, a CCPY assume a responsabilidade de dirigir a política indígena na área ianomâmi e solicita à Funai a implantação de um programa sistemático de imunização dos ianomâmis. O maior incentivador das vastas reservas é o antropólogo Kenneth Taylor, contratado pela Funai para atuar na área ianomâmi.

Em fevereiro de 1980, a Funai forma um grupo de trabalho para reestudar a área ianomâmi, com a participação de Cláudia Andujar. Este grupo deveria a estudar a proposta oficial (ilhas) e a da CCPY (área contínua). Uma terceira proposta de bloqueio de dez milhões de hectares foi apresentada e aprovada pelo grupo de trabalho. Em setembro, é descoberto o garimpo Santa Rosa. Em dezembro, é feito um levantamento da área ianomâmi e, ao mesmo tempo, uma campanha de vacinação, com a participação de Cláudia Andujar.

Uma expedição, patrocinada pelo Antropolog Resource Center (ARC), da Noruega, e pelo International Workgroup for Indigenous Affairs (IWGLA), da Dinamarca –com permissão da Funai– consegue vacinar e contar 8.402 ianomâmis, entre 20 de dezembro de 1980 e 02 de março de 1981. Da expedição participam Cláudia Andujar e dois médicos brasileiros. Consideradas as dimensões da reserva ianomâmi, correspondente a três Bélgicas, isso sem falar nas dificuldades de locomoção na selva, é no mínimo espantoso que três pessoas tenham conseguido vacinar tanta gente em apenas 71 dias.

Em novembro de 1981, após denúncias na imprensa nacional e internacional de sucessivos massacres de ianomâmis, é interditada a pista do garimpo Santa Rosa, que no entanto continuou funcionando, com acesso pelo rio Uraricoera. Em março de 1982, uma portaria ministerial interdita 7,7 milhões de hectares para estudo e demarcação da área ianomâmi.

Em dezembro de 1982, reúnem-se na Vila Surumu o bispo de Roraima, dois padres venezuelanos, um jornalista estrangeiro e vários índios. Define-se então que a reivindicação de áreas contínuas teria um comando único, o padre Giorgio Dalbem, dada a necessidade de maior pressão, tendo em vista a indefinição da Funai. Em 1983, entre os meses de agosto e outubro, a diocese de Roraima promove reuniões sucessivas com índios do Brasil, Guiana e Venezuela para reivindicar áreas contínuas em cada país, visando uma área única englobando terras desses três países.

Em 1984, a Funai cria outro grupo de trabalho para nova identificação da área Raposa/Serra do Sol. O relatório deste grupo concluí que "pelo levantamento foi identificada uma área indígena de aproximadamente 1.577.850 hectares, ignorando a proposta feita pela própria Funai em outubro de 1977. Em agosto deste mesmo ano, o jornal El Universal, da Venezuela, publica uma matéria sob título "Setores de ultra-esquerda pretendem internacionalizar a Amazônia", baseada em documento confidencial do governo venezuelano. Em dezembro, realiza-se na Vila Surumu, a 9ª Assembléia Geral dos Índios de Roraima, patrocinada pela Diocese de Roraima. Nela foi aprovada uma carta ao presidente recém-eleito, Tancredo Neves, pedindo a demarcação urgente de reservas em áreas contínuas, como única forma de preservar física e culturalmente os índios da região.

Ainda no mesmo mês, realiza-se em Boa Vista a 9ª Assembléia do CIMI Norte 1, com a participação dos bispos de Roraima, Araguaia, tuxauas, sociólogos, antropólogos, funcionários da Funai e de Nelly Arruela Giménez e seu marido, ambos vinculados aos projetos da biosfera ianomâmi, desenvolvidos na Venezuela. Nesta assembléia, além da defesa das áreas contínuas, foi aprovada uma nota de repúdio à política indigenista do governo brasileiro, por ter criado um grupo de trabalho interministerial, com poderes decisórios na demarcação de áreas indígenas. Para os participantes da assembléia, tal grupo "vem barrando sistematicamente a demarcação das terras indígenas".

Em 1985, a Secretaria de Segurança de Roraima registra o primeiro atrito envolvendo índios e não-índios no Uiramutã, tendo a Igreja Católica sido acusada por moradores da região como responsável pelo tumulto. Em vista da acusação, a Diocese de Roraima alega que "a Igreja Católica não tem criado o problema indígena, ele surgiu com a chegada do europeu no Brasil e em Roraima". Em 1987, o oeste do Estado é invadido por 45 mil garimpeiros com a construção de cerca de 100 pistas para pequenas aeronaves. No ano seguinte, através de decretos presidenciais, a reserva ianomâmi é definida com a constituição de dez "ilhas", nos estados de Amazonas e Roraima, em um total de 1.533.452 hectares.

Em 1990, um levantamento feito pelo CPRM detecta um corpo com provável mineralização de fosfato, na bacia do rio Ajarani. A companhia faz o requerimento da área e as pesquisas são iniciadas. A Funai impõe obstáculos à continuidade dos trabalhos, incluindo aquela área em uma nova configuração do Parque Yanomâmi. As pesquisas são paralisadas. Em outubro, o presidente da Funai pede ao ministro da Justiça a demarcação do Parque Yanomami em área contínua, com uma proposta diferente daquelas até então apresentadas, englobando a área da CPRM, embora nela não se verifique a presença de índios.

Em 1991, oito senadores americanos, inclusive o então vice-presidente dos EUA, Albert Gore Jr., encaminham uma carta ao presidente George Bush, pedindo que o governo americano pressione o governo brasileiro para demarcar o Parque Yanomâmi. Em abril deste ano, após chegar dos Estados Unidos, o então presidente Fernando Collor de Mello, através de um decreto sem número, torna sem efeito a demarcação administrativa das "ilhas" e revoga as reservas garimpeiras propostas em 1989 pelo presidente José Sarney. Collor vai a Surucucus e dinamita várias pistas garimpeiras.

Em novembro, o Ministério da Justiça declara como posse permanente dos ianomâmis uma área de 9.419.108 hectares, nos estados de Roraima e Amazonas. Inicia-se a retirada dos garimpeiros, até hoje não concluída. Está armado o cenário para um genocídio que jamais ocorreu, a farsa do massacre dos ianomâmis, em agosto de 1993.