¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sexta-feira, julho 31, 2009
 
FOLHA CONTINUA
DANDO ESPAÇO A
IMORTAL IMORAL



Sexta-feira é o dia em que a Folha de São Paulo dá espaço a três cronistas canalhas: um senador corrupto, um deputado corrupto e um jornalista contemplado com a bolsa-ditadura. Espanta constatar como a Folha envelheceu tão rapidamente. De jornal jovem e corajoso, que denunciou e ainda denuncia os desmandos da ditadura e a corrupção do Congresso, transformou-se em casa que dá abrigo ao que de pior existe no país.

Não há dia em que não se descubra uma maracutaia de José Sarney e sua família. Os setores de artes dos jornais têm de atualizar a cada semana os infográficos dos Sarney com os tentáculos que controlam roubos, evasões fiscais, nepotismo, tráfico de influência e crimes outros. O empresário Fernando Sarney já foi indiciado por formação de quadrilha, gestão de instituição financeira irregular, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica – diz a própria Folha de São Paulo. Pela investigação, o órgão mais beneficiado pelos crimes foi o Ministério de Minas e Energia – controlado politicamente por seu pai.

A folha corrida do filho do presidente do Senado é tamanha que já fez esquecer a folha corrida de Fábio Luís da Silva, o Lulinha, filho mais velho do homônimo. Suas negociatas com a Telemar, maior operadora de telefones do país, lhe renderam apenas R$ 5 milhões, concedidos no amor a uma produtora de programas de TV sobre games da qual Lulinha é um dos sócios, a Gamecorp. Qual a diferença entre as corrupções do filho de Sarney e as do filho de Lula? Uma só: um é filho do presidente do Senado e o outro é filho do presidente da República.

O Estadão de ontem revelava o acúmulo de salários com aposentadoria do qual se beneficia José Sarney, superando o limite constitucional de R$ 24,5 mil. E superando muito além do imaginável. Segundo o jornal, o senador imortal – e bota imortal nisso! – tem aposentadoria como ex-presidente da República, como ex-governador do Maranhão e ainda uma aposentadoria do Tribunal de Justiça do Maranhão, que poderiam somar algo em torno de R$ 45.000, além de receber mensalmente seu salário como senador, de R$ 16.512. O que dá um simpático salariozinho de 61.512 reais. Por mês. Não é de espantar que o senador sequer tenha notado os 3.800 reais que o Senado lhe pagava a título de auxílio-moradia, apesar de Sarney ter residência em Brasília.

Sessenta mil reais só de salários. Aqui não está computado o que o ilustre acadêmico recebe por fora, em decorrência de suas roubalheiras. Interrogado sobre porque político tão corrupto continua assinando coluna na Folha, o secretário de Redação sempre responde cinicamente que o jornal abriga toda gama de opiniões e que Sarney ainda não foi condenado em juízo por crime algum. Precisa?

Em poucas décadas de existência, a Folha adquiriu uma craca que a desmoraliza perante seus leitores. Hoje, olimpicamente, o imoral imortal disserta sobre Aristóteles e a arte da política. Escreve que a ojeriza à política é coisa de tiranos. “Hitler tinha horror à política. Na tentativa de evitar a Guerra Mundial, um seu general disse que era chegada a hora da política e ele respondeu: "abomino a política". O ser autoritário é sempre amargurado com a política: o move a força como solução e, para alcançá-la, veste-se do ressentimento, da inveja, do puritanismo, como uma máscara para esconder a hipocrisia”.

Está passando um recado a seus eventuais leitores. Este asco que hoje todo cidadão honesto nutre pelos políticos seria comportamento de ditadores amargurados com a política e movidos pelo ressentimento, pela inveja, pelo puritanismo, como uma máscara para esconder a própria hipocrisia.

Queixa-se da imprensa, abstratamente, mas jamais da Folha que publica seus tijolos: “Hoje, com a sociedade de comunicação, os princípios da guerra aplicados à política são mais devastadores do que a guilhotina da praça da Concorde. O adversário deve ser morto pela tortura moral disseminada numa máquina de repetição e propagação, qualquer que seja o método do vale-tudo, desde o insulto, a calúnia, até a invenção falsificada de provas”.

Coitadinho do senador, morto pela tortura moral, pelo insulto, pela calúnia, até mesmo pela invenção falsificada de provas! Sarney mente descaradamente para justificar seus desmandos e ainda ousa alegar invenção falsificada de provas. “Como julgar uma democracia em que não se tem lei de responsabilidade da mídia nem direito de resposta, diante desse tsunami avassalador da internet e enquanto a Justiça anda a passos de cágado? Como ficam os direitos individuais, a proteção à privacidade, o respeito pela pessoa humana?”

Como se na legislação brasileira não houvesse lei que responsabilizasse a mídia nem direito de resposta. Curiosamente, nestes dias, o tiranete Hugo Chávez, através de um mandalete, apresentou à Assembléia Nacional da Venezuela um projeto de lei que prevê a prisão de jornalistas e outros profissionais da imprensa que cometam o que chamou de "crimes midiáticos", que poderão ser punidos com até quatro anos de prisão. O projeto prevê que a pessoa que divulgar informação considerada "falsa", "manipulada", que cause "prejuízo aos interesses do Estado" ou atente contra a "moral pública" ou a "saúde mental" estará incorrendo em "crime midiático".

O que o imortal imoral está pedindo é censura à imprensa que denuncia seus crimes e que contesta o que ele chama de direitos individuais, proteção à privacidade e respeito pela pessoa humana. Isto é, o direito de roubar, para si e para os seus, o direito de não responder por tais crimes e o respeito à sagrada instituição da corrupção familiar.

É espantoso ver um jornal que se considera honesto e combativo dando acolhida a tal pústula.