¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, setembro 20, 2009
 
CARPIDEIRA DA GUERRA
FRIA CONDENA EUROPA



Conheci Gilles Lapouge, o correspondente do Estadão na França, no final dos anos 70, em um debate em uma livraria em Paris. Conheci e não gostei. Era jornalista de evidente desonestidade intelectual. Na ocasião, coordenava um debate com Hélio Bicudo, que proferia suas bobagens costumeiras sobre o Brasil. Em dado momento, Lapouge, que por ofício devia conhecer muito bem o país, pergunta, já inserindo na pergunta a resposta que queria ouvir:

- É verdade que os esquadrões da morte existem em todas as capitais do Brasil?

Bicudo, participando da mesma desonestidade intelectual, não hesita em confirmar a pergunta cretina:

- Sim, os esquadrões da morte existem em todas as capitais do Brasil.

Ora, os ditos Homens de Ouro, policiais que compunham o esquadrão da morte, só existiam no Rio de Janeiro, e talvez no Espírito Santo. Não havia esquadrão em São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, muito menos em Salvador, Recife, Manaus ou Belém. Em suma, não existia esquadrão em nenhuma outra capital do Brasil. Mas o objetivo, tanto de Lapouge como de Bicudo, apparatchiks a serviço da União Soviética, era condenar o regime militar. Estenderam então o esquadrão para o país todo.

Há muitos anos leio os artigos de Lapouge. Pior ainda: em meus dias de Estadão, tive de traduzi-lo. Pois o correspondente em Paris se dá ao luxo de enviar seus artigos em francês. Na edição de hoje do jornal, Lapouge acusa de perseguir imigrantes uma Europa que busca se proteger ante a imigração ilegal. Seu artigo é de evidente má-fé. Senão, vejamos:

“A França de Sarkozy exibe um comportamento repugnante. Utiliza vôos charter para levar os imigrantes de volta, sem considerar os perigos (econômicos ou mesmo políticos) que os aguardam no país de origem. O ministro da Integração se vangloriou de ter expulsado 30 mil clandestinos este ano”.

Ora, clandestinos têm mesmo é de serem mandados de volta a seus países. Ao defendê-los, Lapouge advoga a desintegração da Europa. Sem falar que Lapouge não pode ignorar que os ditos “vols de la honte” (vôos da vergonha) datam do governo Giscard d’Estaing. Giscard oferecia dez mil francos na época a todo imigrante que quisesse voltar a seu país. Mas, como me dizia Slimane Zéghidour, jornalista e escritor argelino: “Podem me dar a França inteira, não aceito. Não posso levá-la no bolso”. Os chamados vôos da vergonha prosseguiram durante o governo Mitterrand e, desta vez, sem um vintém sequer para voltar. Mas Lapouge jamais diria uma palavrinha contra o sedizente socialista François Mitterrand. Debita hoje a Sarkozy o que foi prática rotineira em governos passados. É que Sarkozy não é de esquerda.

“Além dessas baixezas, Sarkozy vem se batendo pelo que chama de “imigração selecionada”. A França necessita de cérebros, pessoas inteligentes, instruídas, se possível limpas. Assim, um africano que saiu da Escola Politécnica, um argelino licenciado em Direito, essa Paris apresentada como humanitária adora. É uma tese traiçoeira. De um lado rejeita nas trevas exteriores os mais desesperados; e de outro priva a África do pequeno número de pessoas de alto nível, técnicos, diplomados, que esses países conseguiram formar com muito sacrifício. Um enorme egoísmo!”

Ou seja: Lapouge defende que a França – e por extensão, a Europa – acolha a escória do Terceiro Mundo e rejeite o que de melhor o Terceiro Mundo oferece. Como se a França – ou a Europa – tivesse como obrigação receber os detritos humanos decorrentes das ditaduras do mundo árabe e africano. O que um dia Stalin e Hitler sonharam – destruir a Europa livre e democrática – os muçulmanos já estão perto de conseguir. Lapouge toma o partido da barbárie.

Prossegue o correspondente: “Proliferam ideologias fascistas por toda a Europa, o partido de Jörg Haider na Áustria, os neonazistas flamencos, dinamarqueses, alemães orientais e, na França, o perverso partido da Frente Nacional de Le Pen”. Lapouge omite safadamente apenas um detalhe. Nem Haider nem Le Pen militaram em partidos nazistas. Mitterrand não só foi colaborador nazista, como também foi condecorado com o galardão máximo da República de Vichy, a Francisque, por seus bons serviços prestados ao Reich. Lapouge, que não nasceu ontem, sabe muito bem que Mitterrand virou a casaca e passou a militar nas esquerdas. Está portanto acima do bem e do mal.

É deplorável que essas carpideiras da finada União Soviética ainda tenham espaço, num jornal que se pretende liberal como o Estadão, para caluniar uma Europa que tenta se proteger – tardiamente – da invasão árabe e africana. Que Lapouge tenha sua opinião pessoal sobre a política de imigração da França é uma coisa. Que falseie a realidade omitindo fatos que não desconhece, é outra e bem mais grave.