¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, dezembro 06, 2009
 
BANDEIRAS ESFARRAPADAS (II)


Na mesma linha e no mesmo jornal, segue o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Depois de velho e afastado de qualquer posição de mando, passou a defender a descriminalização da droga. Como se a droga não estivesse há muito descriminalizada, neste país onde os campi universitários são locais privilegiados para seu consumo. Escreve FHC, em artigo para o Estadão:

Um dos temas mais difíceis do mundo contemporâneo é o que fazer com o uso de drogas. Existem algumas comprovações bem estabelecidas sobre a questão. Se é verdade que sempre houve consumo de diferentes tipos de drogas em culturas muito diversas - embora não em todas -, não menos verdade é que ele no geral se deu em âmbito restrito e socialmente regulamentado, principalmente em cerimônias rituais. Não é esse o caso contemporâneo: o uso de drogas se disseminou em vários níveis da sociedade, com motivações hedonísticas; no mais das vezes, sem aprovação social, embora, dependendo da droga, haja certa leniência quanto aos usuários.

Certa leniência? Há uma complacência total. Não só no Brasil como em qualquer país do Ocidente. Em que mundo vive FHC? Continua, mais adiante, o ex-presidente:

A situação é apavorante. O medo impera nas favelas do Rio. Os chefões do tráfico impõem regras próprias e "sentenciam", mesmo à morte, quem as desrespeita. A polícia, com as exceções, ou se "ajeita" com o tráfico ou, quando entra, é para matar. A "bala perdida" pode ter saído da pistola de um bandido ou de um policial. Para a mãe da vítima, muitas vezes inocente, dá no mesmo. E quanto à Justiça, não chega a tomar conhecimento do assassinato. Quando o usuário é preso, seja ou não um distribuidor, passa um bom tempo na cadeia, pois a alegação policial será sempre a de que portava mais droga do que o permitido para consumo individual. Resultado: o usuário será condenado como "avião" e tanto quanto este, ao sair, estigmatizado e sem oferta de emprego, voltará à rede das drogas.

Pelo que sei, FHC vive em São Paulo, Brasil. Nesta cidade e neste país em que há décadas não se põe na cadeia usuário algum de drogas. Quanto a traficantes, só quando agem demais ostensivamente, e olhe lá! O distribuidor menor, este tampouco vai para a cadeia. Nesta cidade em que vive o ex-presidente, a pouco mais de quilômetro de seu apartamento, zumbis dopados por crack circulam livremente, durante o dia e a céu aberto, na chamada Cracolândia. Quase ao lado de uma delegacia de polícia.

Há poucos minutos de onde moro, houve nos anos 90 uma boate chamada Máfia Nigeriana. A polícia levou uma década para descobrir que a boate era gerida por ... uma máfia nigeriana, que vendia drogas no bairro. A boate foi fechada, mas nunca tive notícias de que alguém tivesse ido em cana. Onde estão agora os nigerianos? Na célebre esquina da Ipiranga com a Avenida São João, em prosa e verso cantada, negociando drogas à luz do dia. Sem que autoridade alguma tome qualquer providência contra o tráfico escancarado.

Que mais não seja, porque FHC não defendeu a descriminalização da droga quando era presidente e tinha maior poder para propor uma lei? É que na época não soava bem defender esta bandeira. Hoje, na confortável situação de ex-presidente, defende o que teria melhor defendido quando presidente.

O mesmo ocorre com esse outro tucano abominável, José Serra. Quando era ministro da Saúde e estava numa posição privilegiada para legislar nacionalmente sobre o tabagismo, nada fez. Pelo contrário, andou fazendo campanha em Cruz Alta, defendendo a indústria do tabaco. Agora, governador, instituiu uma lei fragrantemente inconstitucional, que proíbe o cigarro no Estado de São Paulo. Quando a legislação federal exige a existência de fumódromos nos bares. País onde lei menor revoga lei maior não é país. É bordel.

Desde há muitas décadas venho defendendo a liberação das drogas. Não estou advogando em causa própria. Jamais usei drogas e não saberia diferenciar maconha de alfafa, muito menos cocaína de pó de giz. Tampouco jamais fumei. Mas jamais me ocorreria proibir a todo mundo fumar em bares. Desde que em ambientes separados.

A esta gente, que depois de velhos e decrépitos querem bancar os moderninhos, meu solene asco.