¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, julho 07, 2010
 
O PODER DOS BLOGS


Ocorreu em Florianópolis um daqueles crimes que mexem com a opinião pública. Uma menina de 13 anos foi estuprada por três adolescentes, oriundos de três influentes e ricas famílias locais. Um deles é filho de Sérgio Sirotsky, diretor da RBS TV. Outro, de um delegado cujo nome ainda não foi divulgado. O terceiro, não se sabe quem seja.

Os jornais da RBS, inicialmente, nada divulgaram sobre o fato. O que é grave omissão, já que o Diário Catarinense é hoje o jornal mais influente do Estado. Coube a um blogueiro local, o Mosquito, botar a boca no trombone. Vários outros blogs, no Rio Grande do Sul e Santa Catarina, o acompanharam. Quando perguntei a alguns interlocutores quando a imprensa em papel iria denunciar o crime, de um amigo recebi curiosa resposta: “Blogs, emails etc. podem escrever o que desejarem. A imprensa é que está impedida de colocar o nome de menores, é a lei. Se te dá prazer arrasar os pais e os garotos, problema teu. Não vejo razão para aumentar o sofrimento das famílias envolvidas”.

Não me dá prazer algum arrasar pais ou filhos. O que me dá prazer é ver criminosos punidos. Criminoso tem de ser denunciado publicamente, o que assegura alguma punição. Alguma, é bom salientar. Quando os crimes ficam encobertos, as coisas se acertam no âmbito do Judiciário. Se a família da vítima sofre, por que seriam poupadas as famílias dos criminosos? Se a estuprada foi arrasada, por que não seriam arrasados os estupradores? Estão sendo poupados porque pertencem às elites locais. Fosse filho de pobre, por mais ECA que haja, teriam de uma forma ou outra seus nomes em domínio público. É óbvio que ninguém irá para a cadeia, muito menos para instituições de menores. O leitor já viu filho de rico ser punido por estupro? Eu nunca vi. Acaba sobrando para a vítima. Mas a divulgação do crime implica uma certa rejeição social e é bom que assim seja.

Hoje, na Zero Hora, o mais medíocre dos cronistas gaúchos escreve:

Nos últimos dias, no entanto, observa-se em um setor da mídia uma carga de crítica insistente contra a família Sirotsky, a RBS e seus profissionais, tentando transformá-los em réus da violência sexual contra a menor, sob a alegação de que a nossa empresa não noticia o episódio de Florianópolis para autoproteger-se. Mas como? O primeiro veículo da mídia tradicional a noticiar o fato foi o Diário Catarinense em 30 de junho. E o Diário Catarinense é da RBS.

Depois disso, diversos jornais da RBS, Jornal de Santa Catarina, de Blumenau, A Notícia, de Joinville, Zero Hora e mais outras vezes o próprio Diário Catarinense, além da RBS TV em Santa Catarina, referiram-se ao fato, sempre com o cuidado imposto pela lei, que diz no artigo 143, parágrafo único, do Estatuto da Criança: “Qualquer notícia a respeito do fato não poderá identificar a criança ou adolescente, vedando-se fotografia, referência a nome, apelido, filiação, parentesco, residência e, inclusive, iniciais do nome e sobrenome”.


Para começar, os jornais da RBS só divulgaram o fato depois que este se tornou público no universo blogueiro. Não adiantava mais tapar o sol com peneira. Em segundo lugar, alegando o tal de ECA, protegeram seu alto funcionário. O fato foi noticiado inclusive pelo portal UOL:

Adolescentes de classe média alta são acusados de estupro em Florianópolis

Mas Lucas Azevedo, o repórter que assina a notícia, não dá um pio sobre as famílias dos criminosos. Continua o medíocre colunista gaúcho:

A confusão é só uma: algum setor está querendo transformar um fato eminentemente policial ou criminal em luta por interesses empresariais, ligados à concorrência de empresas jornalísticas.

Ora, não há uma conspiração contra Sirotsky nenhum. O que há é a indignação popular quando acontece este tipo de crime. Hoje ainda, Bruno, o goleiro do Flamengo que assassinou sua amante, foi recepcionado com insultos e vaias na delegacia em que se entregou, no Rio de Janeiro. Estariam estas pessoas pretendendo transformar um fato eminentemente policial ou criminal em luta por interesses empresariais? Nada disso. É que há crimes que revoltam.

Já os blogs, que também estão sujeitos à legislação sobre adolescentes, não tiveram papas na língua. Muito menos o Twitter. A RBS está se revelando uma empresa covarde e acobertadora de criminosos. Quando Flávio Alcaraz Gomes arrancou a calota craniana de uma menina, a Caldas Júnior, empresa na qual trabalhava, foi a primeira a denunciar seu crime. Quando Pimenta Neves, editor do Estadão, fuzilou sua namorada pelas costas, o jornal, além de noticiar o crime, o demitiu incontinenti.

A pedido da família Sirotsky, o inquérito corre sob sigilo de justiça e não pode ser noticiado. Se os jornais se sentem constrangidos a respeitar tal sigilo, o mesmo não ocorre com os blogs. Além do mais, de que serve proteger nomes que são de conhecimento público?

Os jornais enchem a boca com liberdade de expressão, condenação à censura, democracia e outros chavões. No momento em que interesses mesquinhos estão em jogo, não se fala mais em liberdade de expressão. Nos blogs reside a última esperança de uma imprensa realmente independente.

Pretenderá algum juiz calar os blogs? Seria tão ridículo como o samurai que pretendia fazer cessar a chuva a golpes de sabre nos pingos de água.