¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, julho 06, 2010
 
PAVONÁRIO AO SUL

Do Sul, recebo simpática mensagem:

Prezado Janer!
Tudo bem? Sou o Leandro Rodrigues, editor da Revista Virtual Escritores do Sul (http://www.escritoresdosul.com.br). Antes de qualquer coisa, meus cumprimentos pelo trabalho literário que desenvolve, de modo que acredito que seu nome tem importância relevante para a literatura sulista.


De minha parte, muito obrigado. Mas você se equivoca. Meu nome não tem importância nenhuma, muito menos relevante, para a literatura sulista. Só tenho um mísero livro publicado em Porto Alegre, por uma editora que publicou um único livro, e isso – acho eu – porque o editor estava de porre quando tomou a decisão. Quando Sérgio Faraco publicou a primeira edição de seu Quem é quem nas letras rio-grandenses, meu nome foi omitido. Apesar de eu já ter publicado o próprio Faraco na antologia Assim Escrevem os Gaúchos. Meus livros, todos publicados no Rio, São Paulo e Buenos Aires, jamais tiveram uma resenha sequer nos jornais de Porto Alegre. Não tenho, meu caro Leandro, importância alguma para a literatura sulista. Por outro lado, revista que publica entrevista com Alcides Buss não pode ser revista séria.

Bom, estou lhe escrevendo porque – como você pode ver em nosso site – estamos selecionando escritores para participarem do livro-catálogo impresso, o DICIONÁRIO BIOGRÁFICO DE ESCRITORES DO SUL DO BRASIL (1900-2000), a ser publicado ainda este ano listando grandes escritores da Região Sul do Brasil – RS, SC e PR - e gostaríamos assim de lhe comunicar que o seu nome foi indicado e selecionado para o livro-catálogo. Parabéns!!!!!

Obrigado pelos parabéns com tantos pontos de exclamação. Mas há um segundo equívoco. Escritor não se seleciona para ser publicado em dicionário de escritores. Ou é escritor ou não é. Se é, tem de constar do dicionário. Não precisa ser selecionado. Claro que falta definir o que seja um escritor. Conheci um porto-alegrense já cinqüentão que havia publicado um reles livrinho de contos e fazia palestras sobre “meu universo ficcional”. Há quem publique plaquetinhas de poucas páginas e já se sinta poeta. Lembro que, lá pelos anos oitenta, houve um encontro de poetas na serra gaúcha. Achei curiosa a expressão, eu considerava que no Rio Grande do Sul havia um único poeta. Qual não foi minha surpresa ao saber que três ônibus de poetas estavam subindo a serra. Três ônibus de poetas! É muito poeta para tão poucos leitores. Antes que me esqueça: a data limite para o fechamento do dicionário - ano 2000 - nos permite deduzir que nesse tal de Sul já há escritores com dez ou onze anos de idade. Haja precocidade.

As grandes vantagens de ter seu nome no livro/catálogo Escritores do Sul é que além do privilégio de ter seu nome numa obra rara e seletiva entre os grandes autores da história literária do sul do país, você poderá contar com as propagandas e a publicidade que nossa Revista Virtual e outros meios de comunicação farão do livro e dos nomes encontrados na obra. Sem contar o fato de que você poderá divulgar seu site ou blog e não terá custo algum para que o seu nome seja incluído no catálogo, que contará com todos os grandes nomes históricos literários do sul, tais como: Érico Veríssimo, Mario Quintana, Lya Luft, Cruz e Sousa, Miguel Sanches Neto, Paulo Leminski, Martha Medeiros, entre diversos outros de extrema importância à literatura sulista.

Em primeiro lugar, caro, não me agrada a idéia de privilégios. Tampouco acho que seja privilégio constar de um dicionário de escritores. Estes dicionários estão cheios de nomes dos quais ninguém mais lembra, tanto que é necessário buscá-los em dicionários. Continuando que, Mário Quintana à parte, não considero grande escritor nenhum dos nomes que você cita. Mais ainda: como dicionarista você deixa muito a desejar. Erico Verissimo não leva acento, nem no Erico nem no Verissimo.

O principal de tudo é que é um livro único, exclusivo (não há outro igual no país, reunindo os escritores dos 3 estados) que visa ser uma referência a pesquisadores, professores, estudantes e todos que se interessam por Literatura em geral, listando não somente os autores consagrados como os bons autores em geral (como você), colocando todos numa “galeria”, numa VITRINE LITERÁRIA, onde todos que gostam de literatura se interessarão em apreciá-lo. Ademais, será distribuído em universidades, escolas e centros culturais da região sul do país, podendo se estender igualmente por outros estados.

Gentil, “os bons autores em geral (como você)”. Ça me flatte! Mas seria interessante saber se você conhece um único título dos livros que escrevi. Tenho minhas dúvidas. Para começar, eles não existem mais em livrarias. Por outro lado, não me interessam vitrines, nem universidades nem escolas nem centros culturais. O que me interessa é ter contato com o leitor. Isso nenhuma vitrine ou universidade garante. O máximo que a universidade e escolas fazem é enfiar autores goela abaixo nos coitados dos estudantes. O que os leva a uma reação previsível. Passam a detestar literatura. Por outro lado, você demonstra desconhecer o que se publica no Brasil. Em História da Inteligência Brasileira, Wilson Martins reuniu não escritores de três Estados, mas de todo o país. Agora vem a cereja do bolo:

O livro será vendido pelo preço médio de R$ 45,00, e a única coisa que pedimos é o seu comprometimento com este projeto comprando pelo menos 1 (um) exemplar quando ele ficar pronto para ajudar no projeto, divulgando-o também a todos os seus parentes, amigos ou conhecidos, para que todos os custos da edição possam ser devidamente pagos.

Ou seja, o ilustre dicionarista está me propondo pagar 45 reais para ter meu nome incluído num dicionário que ninguém vai ler. Nem mesmo comprar. Ou melhor, se bem conheço os bois com que lavro, quem paga 45 reais para ter seu nome num dicionário vai comprar não um, mas dez ou mais exemplares. Os parentes, filhos, cunhados, primos, sobrinhos e netos precisam saber que o sublime fulano foi julgado digno de constar de um dicionário. Considerando por baixo – e bota por baixo nisso – que sejam arrolados mil escritores, temos a simpática soma de 450 mil reais. Explorar vaidades sempre deu bons lucros.

Não existe literatura sulista. Se assim for, São Paulo também é sul. Afinal, está ao sul do norte. Quando leio Swift ou Dostoievski, Cervantes ou Pessoa, Lagerkvist ou Orwell, não me pergunto se são sulistas ou nortistas. Existe boa literatura ou má literatura. Se é do sul ou do norte, do leste ou do oeste, tanto faz como tanto fez. Faraco, Ari Martins e Pedro Villas-Bôas publicaram dicionários de escritores gaúchos. Não cobraram um vintém de escritor nenhum. Escritor que paga 45 reais para ter seu nome publicado em dicionário, antes de ser escritor é pavão. Continua o Leandro:

Acreditamos que deva ser do seu total interesse, sim, participar da obra, afinal não é sempre que uma reunião de grandes nomes da literatura como essa num só livro acontece, e depois que a obra for impressa nada mais se poderá fazer, visto que não sabemos se haverá segunda edição mais adiante. Podemos contar com a sua participação? Caso positivo, mande-nos a ficha de participação preenchida (em anexo) em até 10 dias. Caso não deseje que seu nome seja incluído no livro/catálogo Escritores do Sul, comunique-nos e explique-nos a razão.

Não tenho interesse algum, meu caro Leandro. Se vocês quiserem fazer um dicionário de escritores do sul, meu nome terá de ser incluído. Ou o dicionário estará incompleto. Tampouco vou explicar razão alguma. Vá buscar grana junto aos pacóvios que aceitarem pagá-lo para ver seus nomes dicionarizados. Busque medíocres. São legião.

O que estou vendo não é dicionário. Mas pavonário.