¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, agosto 16, 2010
 
AINDA A NOMOFOBIA


Pois, Calil,

sou meio neoludita em matéria de eletrônicos. Celular tem um monte de conveniências, mas não me habituei. Não me agrada a idéia de ser interrompido quando estou conversando com amigos. Entendo que, para pessoas que se locomovem em função do trabalho, o celular seja uma mão na roda. Não é meu caso. Já vi, em bares, três ou quatro pessoas reunidas em uma mesa, cada uma telefonando para alguém distante da mesa. Me pareceu ridículo. Se vou a um bar, é para conversar com quem está comigo.

Por outro lado, um e-Reader até que topo. Me parece um aparelho interessante para profissionais que viajam ou trocam de país. Um professor ou jornalista, por exemplo, pode levar uma biblioteca considerável no bolso. Os livros contemporâneos, no entanto, ainda não passaram para o formato digital. De qualquer forma, não consigo ler um livro em uma tela de iPod. Até que conseguiria, se fosse a única opção. Enquanto existir página maior, não troco.

Mas... se posso ter todos os livros do mundo em meu PC, notebook ou netbook, pra que e-Reader? Um amigo me contava que, quando viaja, leva cinco mil ou mais livros consigo. Não é má idéia. Mas para que cinco mil? Quando viajo, claro que leio alguns livros. Mas os que mais me atraem são os cardápios. Curtos e objetivos. Sem advérbios nem adjetivos.

Ainda há pouco, li uma observação de George Packer, no The New Yorker:

“Não há como ficar online, navegando, enviando e-mails, postando mensagens, twitando e lendo twits e, em breve, ocupando-se da próxima novidade digital, sem pagar um preço elevado, sem roubar nosso tempo, nossa atenção, sem afetar nossa capacidade de apreender o que lemos e nossa experiência do mundo que imediatamente nos cerca.”

Não concordo. Estou online boa parte do dia, navego, troco e-mails, posto mensagens e twits, mas isso em nada afeta meus relacionamentos nem a experiência do mundo que me cerca, muito menos a capacidade de apreensão do que leio. Assinei inclusive um 3G, mas o uso mais para viagens. Isso de levar notebooks para bares me parece um certo exibicionismo, ou talvez dependência de quem não consegue desgrudar-se do computador. Aos bares, vou para conversar, beber e mesmo ler. Este último vício adquiri em Paris, onde os cafés mais parecem salas de leitura.

Verdade que me sinto mal se passo um dia sem Internet. Sinto-me ilhado. É que gosto de ler imprensa internacional e troco muita correspondência. Mas só me sinto mal em geografias onde há Internet. Se viajo pelo deserto ou por mares onde não há conexão, Internet não me faz falta. Há uns três ou quatro anos, naveguei por dez dias pelo Antártico. Sem Internet, sem rádio nem televisão nem jornais. Se o resto do planetinha desmoronasse naqueles dias, eu nem tomaria conhecimento. Foi muito bom.

Entendo que pessoas sejam dependentes de drogas. São substâncias químicas que provocam dependência. Mas computador não é substância química. Tem log on e log off. Findas minhas navegações, aciono este último e vou encontrar seres humanos.