¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sexta-feira, agosto 06, 2010
 
LONDRES VALE UMA MISSA?


Eu, ateu, já assisti a não poucas missas na Europa. Tanto na Stephansdom, em Viena, como na Madeleine em Paris. Não pela missa, mas pela música. Canto gregoriano pode ser um tanto monótono, mas não deixa de ter sua beleza. Aos domingos, na Notre Dame, assisti a não poucos concertos de órgão. Também já vi uma missa no mosteiro de São Bento, aqui em São Paulo. Esta é a última isca que a Igreja consegue balançar a um ateu. Fora a arquitetura, é claro. Conheço boa parte das catedrais européias. Mas por razões estéticas, não de crença. Uma de minhas boas lembranças do velho continente, foi ver o botafumeiro acionado na catedral de Santiago de Compostela.

Antes que me esqueça, esta peregrinação já fiz. Peguei um trem em Lisboa e desci em Santiago. Peregrinação ferroviária não deixa de ser peregrinação. Porque teria de ser feita a pé?

Mas nunca paguei um vintém por isso. Ou melhor, até paguei. Ano passado, em Toledo, tive de pagar alguns euros para revisitar aquela catedral que tanto me comove. Que comovia também a Baixinha, que chegava a chorar quando a percorria. Em minhas primeiras andanças pela Espanha, não se pagava nada. Ok, pago sem reclamar. Pago pela contemplação da arte, não pelo culto. Mas Sua Santidade Bento XVI está exagerando.

Leio no El País que, em sua visita em setembro ao Reino Unido, Bento XVI cobrará uma entrada que oscilará entre seis euros, na cerimônia em Hyde Park, e trinta euros, na missa em Birmigham. A entrada em Glascow custará 24 euros.

Por um lado, me espanta saber que um crente terá de pagar para cultuar seu deus. Jamais vi isso na história das religiões. Os deuses que se dêem por contentes se alguém os cultua. Bento está inovando, e temerariamente. Numa época em que a maioria dos europeus vai à missa para ouvir música e não prédicas, Sua Santidade ousa cobrar pela presença no culto. Pelo jeito, está influenciado pelos evangélicos tupiniquins, que cobram caro pelo culto ao Senhor Jesuis.

O Vaticano assegura que sua iniciativa de cobrar dos fiéis deve ser entendida como uma “contribuição”, à qual decidiram chamar de passaporte do peregrino, e dela estariam isentos aqueles que não podem se permitir tal gasto. Ao que tudo indica, a Santa Sé adotou a terminologia tupiniquim, na qual o fisco chama de contribuinte quem é coagido a pagar impostos. O pagamento inclui o transporte até o cenário das missas. Já há quem chie. Muitos fiéis fizeram ver aos organizadores dos eventos que a maioria dos procedentes da periferia de Londres já tem paga a viagem até o centro da capital com seus bônus de transporte público, e assim não têm porque pagar mais uma vez.

"Paris vaut bien une messe", disse Henrique IV, no século XVI, ao renunciar ao protestantismo. Londres valerá uma missa? Bento XVI está brincando com fogo. Por menos do que isso, Lutero afixou suas 95 teses na porta da catedral de Wittenberg contra a Igreja de Roma.

O pastor alemão parece não entender o século em que vive. Em época em que seus templos se esvaziam de clientela, passa a cobrar para entrar.

Falta de tato.