¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

Powered by Blogger

 Subscribe in a reader

quinta-feira, janeiro 20, 2011
 
MANIA DE STATUS
ENCARECE BRASIL


Comentei outro dia o absurdo dos preços praticados no Brasil. Como vivo bastante distanciado do mundo do consumo, me ative ao que melhor conheço, preços de restaurantes aqui e no Exterior. Restauradores brasileiros alegavam o alto custo da mão de obra e do metro quadrado, como causa da carestia. Como se o metro quadrado em São Paulo fosse mais caro que o metro quadrado na Rive Gauche. Ou um garçom em Higienópolis ganhasse mais que um garçom em Manhattan. Um leitor atento me remete a um artigo da Superinteressante, de dezembro passado, assinado por Pedro Burgos e Alexandre Versignassi, “Por que tudo custa mais caro no Brasil?” Os repórteres, que conhecem bem o mercado nacional, nos trazem dados que fazem pensar.

“Estamos virando um país de contrabandistas. Natural. Veja o caso do iPad. Aqui, nos EUA ou na Europa, ele é importado. Vem da China. Em tese, deveria custar quase igual em todos os países, já que o frete sempre dá mais ou menos a mesma coisa. Mas não. A versão básica custa R$ 800 nos EUA. Aqui a previsão é que ele saia por R$ 1 800. No resto do mundo desenvolvido é raro o iPad passar de R$ 1 000. E isso vale para qualquer coisa. Numa viagem aos EUA dá para comprar um notebook que aqui custa R$ 5 500 por R$ 2 300. Ou um videogame de R$ 500 que bate em R$ 2 mil nos supermercados daqui. E os carros, então? Um Corolla zero custa R$ 28 mil. Reais. Aqui, sai por mais de R$ 60 mil. E ele é tão nacional nos EUA quanto no Brasil. A Toyota fabrica o carro nos dois países”.

A reportagem nos mostra os preços de alguns produtos, em reais, aqui e lá:

Hyundai Veracruz
EUA - R$ 48 mil
Brasil - R$ 150 mil

Playstation 3
EUA - R$ 500
Brasil - R$ 1 999

Perfume CK One 200 ml
EUA - R$ 50
Brasil - R$ 299

Carrinho de bebê Chicco
EUA - R$ 500
Brasil - R$ 1 849

Tentando uma explicação para estes preços, os autores aventam a alta incidência de impostos sobre os produtos. Enquanto o padrão global é ter um imposto específico para o consumo, aqui são seis - IPI, ICMS, ISS, Cide, IOF, Cofins. Pior ainda, os impostos incidem em cascata. “O ICMS, por exemplo, incide sobre o Cofins e o PIS. Ou seja: você paga imposto sobre imposto que já tinha sido pago lá atrás. Tudo fica mais caro”.

O que não me parece ser exatamente o caso, pois estes impostos existem desde há muito e os preços continuam subindo. Em minha opinião, os consumidores têm muita culpa nesta disparada de preços. Um dos fatores de encarecimento é a mania de status do brasileiro. Há quem pague, para exibir-se, 15 ou 16 mil reais por uma garrafa de vinho. Ora, isso é bem mais do que gastei, por cabeça, nesta minha última viagem, que durou 25 dias. Com hotéis e passagens, cabe salientar. Burgos e Versignassi também chegam lá:

“Mas sozinho o imposto não explica tudo. Outra razão importante para a disparidade de preços é a busca por status. Mercado de luxo existe desde o Egito antigo. Mas no nosso caso virou aberração. Tênis e roupas de marcas populares lá fora são artigos finos nos shoppings daqui, já que a mesma calça que custa R$ 150 lá fora sai por R$ 600 no Brasil. O Smart é um carrinho de molecada na Europa, um popular. Aqui virou um Rolex motorizado - um jeito de mostrar que você tem R$ 60 mil sobrando. O irônico é que o preço alto vira uma razão para consumir a coisa. Às vezes, a única razão. Como realmente estamos ficando mais ricos (a renda per capita cresceu 20% acima da inflação nos últimos 10 anos), a demanda por produtos de preços irreais continua forte. Os lucros que o comércio tem com eles também. E as compras lá fora idem”.

Não sou consumidor inveterado nem pertenço a essa raça que viaja para comprar. As únicas coisas que trago na volta são produtos que não encontro aqui, determinados livros, CDs e óperas. Nesta última viagem fiz uma extravagância, comprei um par de sapatos para neve. Até paquerei um iPad em Londres, mas conclui que é algo que não me faz falta.

Não é o custo da mão de obra e do metro quadrado que encarecem a restauração no Brasil, como pretendem os proprietários de restaurantes. Nem a alta incidência de imposto. O que está tornando o Brasil um dos mais caros países do mundo é essa maldita mania de status de uma nova geração de nouveaux riches, que considera que pagar caro os torna mais nobres, refinados e elegantes que os demais mortais.