¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, fevereiro 28, 2011
 
20 ANOS ESTA NOITE: DO
FÓSFORO VERDE AO IPAD



O primeiro computador a gente nunca esquece. O meu, comprei-o em 90, quando vivia em Curitiba. Era época em que os PCs eram caríssimos no Brasil. Telefonei para Asunción e pedi um. Qual você quer? Não sabia. Eu nem sabia muito bem para servia um computador. Intua que era algo útil para escrever. Quero o mais avançado, mais potente, respondi. Do outro lado da linha, apenas pediram meu endereço e disseram que eu receberia a máquina em dois dias.

No ano anterior, havia caído Alfredo Stroessner. Mas o Paraguai em nada mudara e continuava sendo uma solução para muitos brasileiros. Eu já descobrira, vários anos atrás, as conveniências do país vizinho. Quando comecei a viajar, nos anos 70, a Varig tinha o monopólio das linhas aéreas no Brasil e impunha preços leoninos. A solução eram as Líneas Aéreas Paraguayas, a LAP. Para felicidade geral dos brasileiros, a Varig acabou morrendo, morte que antecipei em 2004, na crônica “Morte à Varig”.

Desde os 70, eu viajava para o exterior, praticamente quase todos os anos, e sempre evitei a empresinha infame. Minhas primeiras viagens foram por mar, é verdade. Mas quando a falta de tempo me obrigou a voar, meu primeiro vôo foi pela LAP. Não lembro de tarifas nem da moeda da época - suponho que cruzeiros - mas o preço da passagem era um terço do preço praticado pela Varig. Havia um porém. A LAP não podia pegar passageiros no Brasil e levá-los diretamente à Europa. Tinha de voltar a Asunción e de lá repartir para a Europa.

Brasileiro pode ser besta, mas há uma considerável parcela que não o é. Esta parcela era mais que suficiente para lotar qualquer vôo da LAP. A empresa tinha de partir de território paraguaio, mas nada exigia que o avião aterrissasse em território paraguaio. Ora, aterrissar e decolar são operações que consomem não poucos dólares. Como não havia um só assento vazio no avião, este apenas sobrevoava Asunción e embicava rumo ao Norte. Várias vezes, sem querer, sobrevoei a capital paraguaia, sem jamais pôr os pés por lá. Voar pela Varig era rasgar dólares.

Na época, comprar computador no Brasil também. Meu PC do Paraguai custou-me quatro mil dólares, muito mais barato do que aqui. Chegou pontualmente dois dias após meu telefonema. Para comprar um, no Brasil, era necessário preencher um longo cadastro, com RG, CPF, endereço e sei lá mais o quê. Meu agente de operações internacionais não me pediu nada. Pegou os dólares – não aceitava moeda nacional – disse tchau e se foi.

O monitor era de fósforo verde. Mais ainda: era a época do DOS. Comprei livros para decifrar o sistema operacional e afixei na parede uma longa lista de comandos. As novas gerações certamente não conheceram isso. Disco rígido, 40 Mb. Atenção, eu disse megabytes. Outro dia, esteve aqui em casa um técnico e eu lhe falei de meu primeiro pendrive, 42 megabytes. Ele não acreditou. “Isso não existe”. Tive de furungar meus baús para provar-lhe que um dia havia existido. Maior que o HD de meu primeiro computador. Ano passado, comprei em Rivera um pendrive de 16 gigas, e não comprei maior porque não preciso. Por cerca de 200 reais. Uma memória 16 mil vezes maior que a de meu primeiro HD, por um preço, ao câmbio de hoje, 33 vezes menor.

Isto num espaço de vinte anos. É reconfortante. De lá para cá, tenho renovado meu PC a cada cinco anos, mais ou menos. Mas a indústria informática está exagerando. Ano passado, comprei um netbook Vaio, diminuto e extremamente portátil, a rigor cabia no bolso de minha parka. Eu tinha um notebook Itautec, que me servia mais como back up, recurso para eventuais panes no PC e talvez para viagens. Monitor 17 polegadas, o que se revelou incomodo e pesado na hora de viajar. Optei então pelo Vaiozinho. Que acabou sendo desconfortável na hora de digitar. Ao viajar, tenho preferido cybercafés. O Vaio ficou meio esquecido aqui em casa, em meio às tralhas eletrônicas que a gente junta.

Eis senão quando leio no New York Times: “Lembra-se da Última Grande Novidade na informática? Você estará perdoado se tiver esquecido que foi o netbook, um laptop pequeno nas dimensões e no preço, cerca de US$ 300. Hoje, a febre são os tablets como o iPad, da Apple, e seus concorrentes de marcas como Dell e Hewlett-Packard. Mas, em 2009, os netbooks eram vistos como a força que poderia alterar a economia do setor e abalar líderes como Intel e Microsoft”.

Em menos de um ano, obsolesci. O NYT continua: “As vendas de netbooks foram meteóricas em 2009, octuplicando nos EUA e chegando a 7,5 milhões, e triplicando no mundo para atingir 34 milhões. Os netbooks continuam bem em mercados mais preocupados com o preço, como os da China e América Latina, e nas vendas para escolas. Mas o crescimento estancou em 2010”.

Justo no ano em que comprei meu Vaio. Isso é o que dá viver em Terceiro Mundo. Acabamos comprando o que já se tornou obsoleto no Primeiro. Eu o comprei pensando em portatibilidade. Foi compra equivocada. Pode ser portatibilíssimo. Mas é uma tortura na hora de digitar. O top agora é o iPad. Mas já estou curtido. Em Londres, em dezembro passado, andei brincando com um iPad. Me pareceu uma bobagem, brinquedinho para exibir em bares. De digitação desconfortável, não é bom companheiro de viagem. Mas, pelo que leio, já está virando peça de museu.

Em abril, chega o iPad 2. Essa gente está exagerando. Um produto já não dura mais que um ano. Em verdade, exploram a excitação dos jovens ante as novidades. Juventude é imaturidade. Pessoa sensata não fica comprando tralhas só porque são novas. Talvez um dia eu chegue lá.

Mas vou esperar pelo iPad 10.