¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sexta-feira, maio 20, 2011
 
AFFAIRE PALOCCCI:
A MINA DE OURO
ESTÁ NA PLANÍCIE



Comentando em março passado as falcatruas da Máfia do Dendê, patrocinadas pelo Ministério da Cultura (MinC), afirmei que no Brasil, mal se puxa o fio de uma meada, vem um novelo junto. Que o diga Antonio Palloci, o atual ministro da Casa Civil, aliás já enrolado em falcatruas anteriores, como a chamada Máfia do Lixo e quebra de sigilo bancário de um pobre caseiro. Domingo passado, a Folha de São Paulo revelava que o petista, em apenas quatro anos, multiplicou por vinte seu patrimônio.

Em 2006, o ministro havia declarado à Justiça Eleitoral que tinha uma casa de R$ 56 mil em Ribeirão Preto, onde fora prefeito junto com a Máfia do Lixo. Além disso, tinha um terreno e três carros, entre outros bens, num total de R$ 375 mil. Entre 2006 e 2010, este patrimônio passou para cerca de R$ 7,5 milhões. Que incluem um apartamento de R$ 6,6 milhões, adquirido no ano passado, e um escritório de R$ 882 mil em 2009, ambos não no Planalto, mas na planície, em São Paulo. E depois ainda existem negativistas profissionais que acham que este país nosso não compensa quem trabalha.

Ora, homem nenhum investe cem por cento de seu patrimônio em um apartamento e um escritório. Obviamente, havia mais fio a ser puxado. Já na segunda-feira, surgiram as primeiras camadas do imbróglio. O Estadão noticiava que pelo menos mais cinco ministros do atual governo tinham empresas de consultoria que continuavam ativas em pleno exercício do cargo.

Hoje recém é sexta-feira e a Folha desenrolou o resto do novelo. O faturamento da empresa de consultoria de Palocci, a Projeto, foi de R$ 20 milhões em 2010, ano em que o atual ministro coordenou a campanha que elegeu Dilma. Não é que o patrimônio deste operoso consultor tenha se multiplicado por 20 em cinco anos. Multiplicou-se 56 vezes, apenas no ano passado.

Em documento que deve ser enviado hoje à Procuradoria-Geral da República, Palocci informa que trabalhou para pelo menos vinte empresas, incluindo bancos, montadoras e indústrias, e que boa parte dos pagamentos foi concentrada entre novembro e dezembro do ano passado quando anunciou aos clientes que não mais atuaria no ramo de consultoria.

A reportagem da Folha encontrou, no escritório do ministro, apenas uma única telefonista, que disse não ter a mínima idéia do que seu chefe fazia. Não havia sequer uma servente, para oferecer cafezinho a tão distinta clientela. Palocci é um virtuose em matéria de consultoria. Atende 20 empresas de porte sem os serviços de nem mesmo um assessor. Isso sem falar no trabalho na Casa Civil. É homem que deve viver estressado.

Folga para a irmã do irmão aquele, Ana de Holanda, do MinC, que há duas semanas autorizou a captação de R$ 1,9 milhão para a primeira turnê no Brasil da cantora Bebel Gilberto, sua sobrinha. A propósito, a titia tem um carinho especial pelos sobrinhos. Em março passado, o MinC liberou 1,3 milhão de reais para um projeto de produção de vídeos da musa da Máfia do Dendê, Maria Bethânia, dos quais 600 mil iriam para sua modesta poupança. Outra parte do dinheiro iria o produtor dos vídeos, o cineasta Andrucha Waddington. Sobrinho adivinhe de quem? Sobrinho da tia Ana.

Graças ao providencial escândalo envolvendo o ministro da Casa Civil, a ministra da Cultura sai da berlinda e das manchetes. Para blindar o ministro, o governo usou de uma truculência insólita. Na edição de hoje, o Estadão bota a boca no mundo.

“Nunca se viu em algum país civilizado, na vigência do regime democrático, o que o governo fez na manhã da quarta-feira para impedir que o ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, fosse chamado a explicar ao Congresso como conseguiu multiplicar o seu patrimônio por 20 enquanto exercia mandato de deputado federal, entre 2006 e 2010. Cumprindo a sua parte na operação decidida na véspera no Palácio do Planalto, o líder do governo na Câmara, o petista Cândido Vaccarezza, acionou os serviços da Casa, com a provável cumplicidade da presidente em exercício, Rose de Freitas, do PMDB, para bloquear - pela força - o acesso dos membros de duas comissões legislativas permanentes às respectivas salas. (...) Numa iniciativa equivalente, no plano simbólico, ao fechamento do Poder Legislativo, políticos transformados em cães de guarda do principal quadro do governo Dilma Rousseff mandaram trancar os plenários das citadas comissões - e chamaram a Polícia Legislativa para, no papel de leão de chácara, barrar a passagem dos parlamentares”.

Tais abusos por parte do governo atestam mais do que nada o temor de uma convocação do ministro. Que está enrolado em um caso óbvio de tráfico de influência, advocacia administrativa e venda de informações privilegiadas. A presidente não tem ainda seis meses de governo e já tem sete ministros envolvidos em falcatruas. Uma média de mais de um por mês.

Para um ministro, ministério no Planalto é argent de poche. A mina de ouro mesmo está na planície. Pelo jeito ainda há muito novelo a desenrolar. E recém é sexta-feira.