¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sábado, março 16, 2013
 
PAPA PACO BRANDE
FANTASMA MEDIEVAL



Papa Paco promete. Tanto que ainda não parei de escrever sobre ele. Citando o escritor francês Léon Bloy, que escreveu que "quem não reza para Deus reza para o diabo", o papa advertiu em sua primeira homilia, que "quando não se confessa Jesus Cristo, se confessa o mundanismo do diabo, o mundanismo do demônio". Neste sentido, segue João Paulo II. Mal começa seu papado, Paco já brande um fantasma da Idade Média. Digo Idade Média, porque foi a Idade Média que demonizou o demônio. Na Bíblia, Satanás goza de um relativo prestígio.

Se há um gênero literário que ainda me fascina, este é a literatura fantástica. Em minha biblioteca, tenho vários tratados de teologia, inclusive a monumental Suma Teológica, de meu confrade de Sorbonne, o Tomás de Aquino. Há poucos anos, o Vaticano publicou um novo manual de fazer inveja a este gênero literário, o Exorcismus et Supplicationibus Quibusdam (A Propósito de Todo Tipo de Exorcismo e Súplicas), que dispõe sobre os rituais para expulsar o demônio.

João Paulo vinha há horas alertando seu rebanho sobre a realidade da existência deste personagem fascinante, que contracena com Jeová na história da criação. Lucifer, para começar, é o mais brilhante dos anjos e o mais amado por Deus.

Literalmente, é o "portador da luz". Segundo certas seitas gnósticas, ditas luciferistas, Lucifer seria o verdadeiro Deus da Luz, que pretende revelar aos homens a incompetência do Deus do Antigo Testamento. Isaías, porta-voz insuspeito, pergunta: "Como caíste do céu, ó estrela d'alva, filho da aurora? Como foste atirado à terra, vencedor das nações?" O gesto satânico — o "non serviam" — é a bandeira de todos os rebeldes. No evangelho de João, Satanás é o príncipe deste mundo. No Apocalipse, segundo boas fontes, no caso uma voz forte provinda do céu, é uma espécie de ombudsman, "acusador de nossos irmãos".

Mesmo depois da expulsão do céu permaneceram cordiais as relações entre o Senhor e o Insurgente. No Livro de Jó, Satanás participa de um coletivo de anjos que marcou audiência com o Senhor. "De onde vens?", quer saber Jeová. "Venho de dar uma volta pela terra, andando a esmo", responde o príncipe deste mundo. Jeová dá carta branca a Satanás: que faça o que quiser com o santo homem Jó, desde que lhe poupe a vida.

O demônio, mais que real, é necessário, ou o Senhor não teria como testar a devoção de seu rebanho. Satanás é personagem fundamental na História da Criação, ao mesmo título que Jeová. Tentou Adão, Jó e Jesus. Cristo com ele conviveu quarenta dias e nada nos indica que tenha se entediado.

Em Il Diavolo, Giovanni Papini faz três observações interessantes sobre este convívio: "Jesus não quis rechaçar o Diabo; Jesus tolerou e suportou as repetidas tentações do Inimigo; em sua solidão, Jesus aceitou uma única e só companhia, a do Diabo". Suportar durante quarenta dias a mesma companhia no deserto exige um escroto ecumênico. Deve ter sido interlocutor no mínimo interessante ou Jesus — que tinha poderes para tanto — o teria mandado de volta aos infernos.

A Igreja precisa proteger-se dos ataques do demônio. "As portas do inferno não prevalecerão contra Ela", disse Jesus. Só há uma arma contra o Maldito, o exorcismo. O novo ritual, mais conhecido como Ritual Romano, por enquanto só está disponível em latim. Mas segundo o cardeal Jorge Arturo Medina Estevez, chefe da Congregação para o Rebanho Divino e Disciplina Sacramental, o exorcista já pode usar esta versão “hoje à noite, se quiser, porque o Diabo entende latim”. O que nos revela uma qualidade insuspeita do Príncipe: tem mais erudição que muito acadêmico de nossos dias.

Satanás sempre gozou de um charme do qual jamais pode gabar-se Jeová. Se Deus manda, o Diabo sugere. Enquanto o Altíssimo se comporta como um autocrata arrogante, que impõe e dispõe do traçado de seu plano de obras, o Insurgente é o public-relations sedutor, que insinua modificações no rígido projeto divino: "quem sabe não poderia ser assim?"

Desta forma, sempre foi caitituado por artistas e literatos. Em Valéry, o demônio só tinha uma queixa, a dificuldade em seduzir os curtos de espírito. Diz o Diabo: "Aquele homem não tinha inteligência suficiente para que eu desse conta dele. Não tinha bastante espírito. Que problema seduzir um imbecil! Não entendia patavina de minhas intenções".

O Sedutor, com sua lábia, é perigoso. O exorcismo deve ser realizado por sacerdotes, diz o manual. O próprio João Paulo II, seguindo o exemplo de Cristo, fez um exorcismo em 1982, expulsando o demônio do corpo de uma possessa. Uma das características do demônio é falar línguas estranhas. O vice-Deus, apesar de emérito poliglota, não conseguiu comunicação com o Maldito. O ritual começa com aspersão de água benta sobre o possuído, seguida de orações e da proclamação do Evangelho. O exorcista invoca o Espírito Santo para que o Diabo saia do corpo e apresenta-lhe a Cruz, símbolo do poder de Cristo.

Bergoglio fala em tom depreciativo do Príncipe das Trevas. Deve ter feito gazeta em suas aulas de Bíblia.