¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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sábado, abril 06, 2013
 
ELAS AGORA SÃO TERAPEUTAS


O Paraíso Sexual Democrata, publicado em 73, foi um livro que envelheceu. A Suécia daqueles dias não é mais a Suécia de hoje. Se por um lado envelheceu, por outro tornou-se o retrato de uma época da história do país.

Naquelas décadas, teve grande repercussão um panfleto de Lars Ullerstam, intitulado De Erotiska Minoriteterna (As Minorias Eróticas), que reivindicava: “Criar bordéis! A criminalização destas instituições é uma das maiores besteiras de nossa época. Autorizando os bordéis, se remediaria a miséria sexual da sociedade e se diminuiria o número de gravidezes fora do casamento. Mas principalmente não se precisaria mais temer a perigosa criminalidade que a prostituição de rua traz consigo. Os gigolôs perderiam seu mercado e ninguém mais teria de pagar preços exorbitantes pelos prazeres sexuais.

“Os bordéis preenchem uma importante função de higiene social. Estas instituições seriam evidentemente dirigidas por médicos e assistentes sociais e a direção geral da Saúde Pública controlaria suas atividades. Assim organizada, a indústria de bordéis ofereceria garantias razoáveis de trabalho e colocação. Muitos jovens de ambos os sexos acorreriam a este ofício humanitário. Uma organização racional poderia fazer com que os preços da consumação sexual baixassem consideravelmente.

Para adolescentes na puberdade e pobres poderiam existir preços reduzidos. Para os celibatários, os bordéis significariam um grande ganho de tempo, ao menos em casos mais urgentes, e assim lhes sobraria tempo para estudos. As mulheres sexualmente extenuadas poderiam repousar enviando seus maridos a estas casas de prazer sem ter de temer complicações. Sendo as festinhas e bailes formas de sociabilidade de nossa civilização, uma visita ao bordel após estas preliminares seria uma medida natural de higiene.

“A função mais importante dos bordéis seria no entanto aliviar a miséria sexual dos indivíduos que, por diferentes razões, não podem por si mesmos encontrar objetos de satisfação sexual”.

Assim falava Lars Ullerstam, nos anos 60. Na época, a prostituta era vista como uma espécie de assistente social. Lembro inclusive de ter lido entrevista de um policial, que não via nada de inconveniente na hipótese de sua filha optar pelo ofício. Que mais não fosse, ganharia mais do que ele. As profissionais eram em prosa e verso louvadas e tidas como heroínas.

Os tempos mudam, e como mudam. Uma lei de 1999 determinou que é perfeitamente legal vender sexo. Mas é ilegal comprar sexo. Os homens que pagam por sexo com uma prostituta - e também cafetões e donos de bordéis - estão sujeitos a multas ou a penas de até seis meses de prisão, além da humilhação decorrente da exposição pública.

É espantoso ver como idéias antigas se repetem com roupagem de novo. Quase meio século depois, leio no portal Terra que a terapeuta sexual Cheryl Cohen Greene já foi para a cama com cerca de 900 pacientes, tentando curar traumas e disfunções de homens e mulheres.

Em inglês, a profissão é denominada “surrogate partner”, que pode ser traduzida como “parceira substituta”. Em seu consultório, recebe pessoas com os mais variados tipos de bloqueios entre quatro paredes – de problemas comuns como ejaculação precoce aos difíceis de se acreditar, como o de um senhor de 70 anos que a procurou porque ainda era virgem.

Segundo Cheryl, as pessoas se assustam quando ela fala o número de pessoas que já passaram pelo seu consultório. “Fui chamada de muitos nomes. Mas vejo homens e mulheres com problemas e quero ajudá-los a se sentirem melhor sobre a sua sexualidade”.

Cheryl descobriu a técnica em 1973, justo na época em que provocava polêmicas na Suécia o livro de Ullerstam. Na época, seu trabalho era “ser mãe”, já que se casou pela primeira vez aos 19 anos e teve o primeiro filho aos 20. A naturalidade com as questões do corpo começaram dentro de casa. “Meus filhos eram pequenos quando eu comecei. Quando perguntavam o que eu fazia, eu dizia ‘eu vou ajudar as pessoas a se sentirem melhor sobre a sua sexualidade’. Sempre que faziam perguntas, à medida que iam crescendo, eu respondia com honestidade”, contou.

De sua experiência, resultou o livro As Sessões, publicado este ano no Brasil pela editora BestSeller. A terapeuta tem hoje 68 anos e não tem o seio direito, devido a câncer de mama em 2006. Parafraseando Casanova: “agora que eu não posso mais trabalhar, sento e escrevo sobre meu trabalho”. A história foi adaptada para o cinema, com foco na história do seu cliente Mark O’Brien, vítima de poliomielite. Segundo ela, este foi o primeiro deficiente físico que se tratou com ela e o mais difícil caso que já enfrentou. “Tive que aprender como tocar o corpo dele”.

Ela contou que Mark pesava pouco mais de 30 kg e, no filme, nem conseguiram retratá-lo tão magro. As dificuldades incluíam desde o medo do próprio cliente até questões práticas, como o cuidado em não depositar muito peso em cima dele. “Foi difícil, mas aprendi a lidar e foi muito profundo”.

O livro tem boas chances, ao lado de tantos outros relatos de sexo, de entrar na lista dos mais vendidos, ainda mais tendo o filme como apoio. Talvez até inaugure um novo – e promissor? – gênero erótico, o sexo com aleijadinhos.

Tive não poucas sessões de terapia em minha juventude. Às profissionais daquela época nunca ocorreu se chamaram de terapeutas. Poderiam ter feito escola. Ocorre que atendiam por outro nome.