¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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segunda-feira, julho 22, 2013
 
VICE-DEUS BAJULA JOVENS


Comentando os livros que passam, falei há pouco do polonês que se radicou em Buenos Aires após a Segunda Guerra, Witold Gombrowicz, e de seu livro Pornografia. Onde faz a apologia da imaturidade: "O homem está suspenso entre Deus e a juventude. Isso quer dizer que o homem tem dois ideais, a divindade e a juventude. Ele quer ser perfeito, imortal, onipotente. Ele quer ser Deus. E ele quer estar em plena florescência, fresco e róseo, para sempre instalado na fase ascendente da vida - ele quer ser jovem."

O que não quer dizer que faça a apologia do jovem. No prefácio desta novela, afirma: “Quando o velho é que forma moço, tudo vai muito bem do ponto de vista social e cultural. Mas se o velho está submetido ao moço, que trevas! Quanto de perversidade e de vergonha! Quantas armadilhas! E, no entanto a juventude, biologicamente superior, fisicamente mais bela, não tem problemas em seduzir e conquistar o adulto, já envenenado pela morte”.

Para Gombrowicz, a fórmula “o homem quer ser Deus” exprime muito bem as nostalgias do existencialismo, “enquanto que oponho a essa uma outra, ferozmente incomensurável: “o homem quer ser jovem”.

O polaco considerava que as convulsões idealistas da juventude resultam da impotência de viver, da tristeza do artifício, da melancolia do aborrecimento. Em maio de 68 vivia na França e não deu importância alguma à “revolução" dos jovens:

"Do ponto de vista político e ideológico, o movimento da juventude não me interessa em absoluto. As suas novas ideologias foram previamente moldadas por pessoas mais velhas e são de má qualidade; são aparências, palavras vazias. Vejo na crise da juventude uma crise dos adultos. Frente à juventude, os adultos são covardes, servis, sem energia, e as suas idéias não têm peso. Os intelectuais neste movimento são ridículos, e o Sartre é igual ao resto... em cima de bidões e cercado de microfones. Pediu-me conselhos, como se eu fosse um segundo Marcuse. A minha resposta foi: ‘Não perco tempo com idiotices!' Atualmente, este conflito é uma espécie de revolução artificial."

Nestes dias de Brasil, em que a visita papal sucede a gloriosa revolução de Junho de 2013 – como propôs a Veja – tanto em um como em outro evento o grande herói é este solene bobalhão, o jovem. A deduzir-se dos jornais, a Igreja já não se interessa mais pelos adultos ou pelos velhos. Sua Santidade ignorou-os solenemente. Segundo a Veja, o papa espera que suas atitudes e palavras motivem os jovens do mundo a agir como verdadeiros cristãos. A edição on line mancheteia:

PAPA DISCURSA NO RIO: ‘CRISTO BOTA FÉ NOS JOVENS’

Neste desejo de bajular a juventude, os Evangelhos viraram casa-da-mãe-Joana. Cada um colhe neles o que bem entende e nem mesmo está lá. De onde o argentino tirou que o judeu aquele bota fé nos jovens? Nos Evangelhos, há um único contato do Cristo com um jovem, e o desfecho não é nada animador. Lemos em Mateus:

E eis que se aproximou dele um jovem, e lhe disse: Mestre, que bem farei para conseguir a vida eterna? Respondeu-lhe ele: Por que me perguntas sobre o que é bom? Um só é bom; mas se é que queres entrar na vida, guarda os mandamentos.
Perguntou-lhe ele: Quais? Respondeu Jesus: não matarás; não adulterarás; não furtarás; não dirás falso testemunho; honra a teu pai e a tua mãe; e amarás o teu próximo como a ti mesmo. Disse-lhe o jovem: Tudo isso tenho guardado; que me falta ainda?
Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, segue- me. Mas o jovem, ouvindo essa palavra, retirou-se triste; porque possuía muitos bens.


Tudo, menos vender o que tem e dar aos pobres. Ao jovem que foi consultar o Cristo, o tesouro no céu pouco interessa. O que importa são seus bens terrenos. De onde então tira o Chico que Cristo bota fé nos jovens? Claro que jornalista algum irá checar os Evangelhos para ver se o papa disse ou não disse bobagem.

A Folha de São Paulo é mais dramática:

JOVENS NÃO TÊM MEDO DE ARRISCAR A ÚNICA VIDA QUE POSSUEM, DIZ PAPA EM 1º DISCURSO

No texto: “Também os jovens 'botam fé' em Cristo. Eles não têm medo de arriscar a única vida que possuem porque sabem que não serão desiludidos", declarou o pontífice.

Quem disse que não têm medo? Mais ainda, desde quando jovem está arriscando a vida por botar fé no Cristo? Lá no mundo islâmico, sem dúvida alguma. Mas não vivemos em teocracias muçulmanas. Ninguém é ameaçado ou arrisca a vida entre nós por entrar em uma igreja ou praticar o cristianismo.

Por que diz então o papa tamanha bobagem? A meu ver, falta de assunto, carência de discurso, vazio de conteúdo. Parlapatagens do argentino, que sabe muito bem que nestes dias ninguém se preocupa com o sentido das palavras quando elas são proferidas por um ícone qualquer da mídia.

O que espanta é ver jornais dando garrafais a palavras que nada querem dizer. A imprensa parece ter ficado obnubilada com a chegada do Paco. E passa a procurar pêlo em ovo.

No fundo, esse desejo incontido de louvar os “jovens”, essa massa informe que não sabe o que quer, a não ser consumir. Imagine o leitor o Cristo conclamando estes jovens ao reino dos Céus: “Larga teu iPad, larga teu carro, larga teu pai e tua mãe e me segue”.

Passaria por louco varrido. “O cara endoidou” – seria o mínimo que ouviria. Enquanto isso, a imprensa finge que o Papa está dizendo alguma coisa com algum sentido.