¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, julho 07, 2013
 
O PERFIL DO HERÓI



A gloriosa revolução de Junho de 2013 pariu não um rato, mas um presidenciável. Que, sem ter manifestado pretensões a tal, foi nominado pelos jovens revolucionários, sedentos de justiça e paz social neste sofrido país. No caso, o ministro Joaquim Barbosa, presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça. Quais os méritos do súbito presidenciável? Em verdade, um só: defendeu enfaticamente a punição dos mensaleiros.

O ministro, que não está filiado a nenhum partido, parece estar sendo sobrevoado pela mosca azul. Tanto que defendeu o surgimento de candidaturas avulsas:

- Eu não falei para a presidente, mas sou inteiramente favorável às candidaturas avulsas em diversos níveis de eleição. Por que não? Já que a nossa democracia peca pela falta de identificação entre eleito e eleitor, porque não permitir que o povo escolha diretamente em quem votar? Por que essa mediação por partidos políticos sem credibilidade? Isso contribuir para a robustez da democracia. A sociedade brasileira está ansiosa por se ver livre, pelo menos parcialmente, desses grilhões partidários que pesam sobre o seu ombro - afirmou.

Em um momento em que o conceito dos partidos está abaixo do rabo dos cachorros, nada mais oportuno que candidatar-se a partir do nada. O E.T. de Xapuri já viu isto, e chamou seu partido de Rede, como se partido não fosse. Uma democracia sem partidos? Não sei se os árdegos revolucionários notaram, mas é o sonho de todo ditador.

O carisma do ministro é tal que até fatos nada abonadores foram esquecidos pela imprensa. Em 14/05/2003, sem imaginar que dez anos depois Joaquim Barbosa seria guindado pela revolução de Junho de 2013 à condição de salvador da pátria, Veja relatava o espancamento da ex-mulher do herói pelo próprio herói:

O então Presidente Lula, queria nomear ao STF um Ministro nordestino (Ayres Britto), um paulista (César Peluso) e um Ministro negro. Joaquim Barbosa tinha um currículo notável, mas acabou sendo a indicação mais trabalhosa. Tendo em visto que o então Ministro da Justiça Márcio Thomás Bastos foi informado de um episódio constrangedor da biografia de Barbosa Gomes. Muitos anos atrás, quando ainda morava em Brasília, ele estava se separando de sua então mulher, Marileuza, e o casal disputava a guarda do único filho – Felipe, hoje com 18 anos. Na ocasião, Barbosa Gomes descontrolou-se e agrediu fisicamente Marileuza, que chegou a registrar queixa na delegacia mais próxima. (...)

A ministra Ellen Gracie, a única mulher da corte, no intervalo entre uma sessão e outra, mostrou-se preocupada. "Vai vir para cá um espancador de mulher?", perguntou ao colega Carlos Velloso. "Foi uma separação traumática", conciliou Velloso. "Mas existe alguma separação que não é traumática?", interveio o ministro Gilmar Mendes. Para desanuviar o ambiente, o ministro Nelson Jobim saiu-se com uma brincadeira machista, a pretexto de justificar a agressão: "A mulher era dele".

Enfim, coisas da vida. Espancar mulheres não macula os vultos da pátria. Darcy Ribeiro se orgulhava de ter espancado uma em Paris e até hoje é um dos profetas adorados pelas esquerdas, que anteviu no Brasil uma nova Roma. Volto ao ministro. Após seu repentino surgimento como candidato sem partido, alguns fatos mais recentes começam a respingar em sua reputação.

Começou com um vôo, a custas do Erário, para assistir a um jogo de futebol no Rio, no camarote de um tal de Huck, potestade da rede Globo, empresa que acaba de dar um gordo emprego ao filho do juiz, justo aquele por cuja guarda espancou a consorte. O vôo de altas autoridades para assistir a festas, casamentos e jogos, com dinheiro do contribuinte, já está virando parte dos usos e costumes nacionais, a ponto de nos perguntarmos que mal tem o ministro ter aderido à prática.

O STF nega que o ministro tenha voado para ver um jogo de futebol. Se assim é, a Agência Estado cometeu crime de calúnia contra uma das mais altas autoridades da República. A reportagem não é anônima. Está assinada pelos repórteres Eduardo Brescianni e Mariângela Galucci. Irá Joaquim Barbosa representar contra os repórteres e pedir indenização por danos morais? Acho que não.

Não bastasse a affaire do jogo, o ministro acaba de receber R$ 414 mil do Ministério Público Federal por conta de controverso bônus salarial criado nos anos 90 para compensar, em diversas categorias, o auxílio-moradia concedido a deputados e senadores.

Até aí, nada demais. Direito seu. Ocorre que o próprio herói já se posicionou contra a regalia ao analisar o pagamento de auxílio-alimentação a magistrados de oito tribunais, no CNJ. Na ocasião, ele classificou como esdrúxula e inconstitucional a resolução do CNJ que permite este tipo de benefício. Joaquim Barbosa chegou a ironizar, dizendo que "não cabe a cada estado estabelecer auxílio-moradia, auxílio-funeral ou auxílio-paletó".

Como ficamos? Virá o ministro a público para dizer que não disse o que disse? Não será fácil.

Mas os revolucionários da revolução de Junho de 2013 precisam de heróis. Em falta destes míticos personagens, vai um irremediavelmente humano, de carne e osso mesmo. Basta retocar o que era tosco e temos um flamante salvador de nações. De boa fonte jurídica, sou informado que Barbosa não galgou a magistratura por seus méritos. Ele só ingressou na magistratura como ministro.

Antes disso - segundo meu informante - tentou várias vezes a carreira no Itamaraty, mas foi reprovado em sucessivos concursos. Concorreu então a oficial de chancelaria, que é um cargo de funcionário burocrático, apesar do nome pomposo. Em Paris, atendia os pedidos de visto e outros relativos a passaportes no consulado da rue du Berry. Depois dessa experiência, entrou para o Ministério Público, sendo da mesma turma do Gilmar Mendes.

Quando foi escolhido ministro, estava como espécie de attaché no consulado do Brasil em Los Angeles. Lula de fato havia optado por um negro, fosse lá quem fosse. Até um desembargador mulato do Rio Grande do Sul foi sondado. Seria um desastre. Tratava-se de um "negro comunitário", criado por família branca de São Leopoldo. Outras opções parecidas foram pesquisadas. Só aparecia gente sem qualidade. O ministro da Justiça, na época, M. T. Bastos, fez uma lista de nomes dos seus amigos, mas eram todos brancos. Lula foi mais teimoso do que ele, pois tinha a obsessão de ir mais longe que o FHC, e, por exclusão dos mais medíocres, ambos chegaram ao desconhecido (por eles) Joaquim Barbosa.

Joca subiu ao Supremo quando pontificava como decano Sepúlveda Pertence. Homem pernóstico mas com grande experiência jurídica e política, senso de oportunidade e domínio das técnicas e do histórico das leis e do funcionamento do Judiciário. Depois dele, tornou-se decano Celso de Mello, mais pernóstico ainda, e sem as qualidades do outro. Joca era peixe fora d’água. Não entendia a complexidade das questões. Tinha visíveis dificuldades jurisdicionais. Seus votos eram voluntaristas. Sofria com a petulância de Marco Aurélio e Gilmar Mendes. Deve ter passado por muitos momentos de pura humilhação, na sua perspectiva. Chegou a mudar de Turma, por atrito com Marco Aurélio, no tempo da presidência de outro pedante, Jobim.

Demorou para reagir, e quando o fez foi aos pataços e socos no ar. Ameaçou bater no Eros Grau. JB não tem obra jurídica conhecida. Dá aulas no Rio, mas nunca se destacou pelo conteúdo delas. Esse conjunto de situações fez ele optar por uma atuação simplificadora, anti-elitista por excelência, chegando a salientar um "mérito" próprio contra alguém de temperamento mais fraco. Chamou Peluso de caipira e menosprezou-o porque não fazia idéia de quem era Scott Joplin, o grande músico (negro) divulgador do Ragtime, enquando ele, JB, sabia... Ressentimento puro.

Este é o perfil do herói que a imprensa ignora. Mas o ídolo de pés de barro está desmoronando a olhos vistos. Para a saúde da nação, que está namorando para o cargo de salvador um ministro ressentido, racista e atrabiliário.