¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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domingo, outubro 27, 2013
 
DEMÉTRIO MAGNOLI
E MINO CARTA,
O MESMO COMBATE



Demétrio Magnoli, normalmente autor de artigos lúcidos e independentes, revelou-se um desastre em sua estréia como colunista da Folha de São Paulo.

Há uma boa década venho falando naquilo que os franceses chamam de glissement idéologique. O conceito de esquerda sempre muda, à medida em que se corrompe. A direita é o repositório de todos os males do mundo, inclusive os das esquerdas. Pois quando as esquerdas cometem crimes – ou “erros”, como preferem seus líderes – é que não eram de esquerda, mas de direita.

Ainda há pouco voltei ao tema e é bom que volte mais vezes, pois cá nestas terras pátrias ainda não se tem noção clara desta safadeza das esquerdas. Convivendo há mais tempo e mais de perto com os comunistas, os franceses logo perceberam o truque.

Magnoli, em seu artigo, caiu no lugar comum. Para o cronista, os petistas financiaram com dinheiro público a bolha Eike Batista. Na fogueira do Império X, queimam-se US$ 5,2 bilhões do povo brasileiro. "O BNDES para os altos empresários; o mercado para os demais": eis o estandarte do capitalismo de Estado lulopetista.

“Anteontem, Lula elogiou o "planejamento de longo prazo" de Geisel; ontem, sentou-se no helicóptero de Eike para articular um expediente de salvamento do megaempresário de estimação. O lobista do capital espectral é "de direita"; eu, não.

“Eles são fetichistas: adoram estatais de energia e telecomunicações, chaves mágicas do castelo das altas finanças. Mas não contemplam a hipótese de criar empresas públicas destinadas a prestar serviços essenciais à população.

“Eles são corporativistas. No governo, modernizaram a CLT varguista, um híbrido do salazarismo com o fascismo italiano, para integrar as centrais sindicais ao aparato do sindicalismo estatal. Eles são restauracionistas. Na década do lulismo, inflaram com seu sopro os cadáveres políticos de Sarney, Calheiros, Collor e Maluf, oferecendo-lhes uma segunda vida. O PT converteu-se no esteio de um sistema político hostil ao interesse público: a concha que protege uma elite patrimonialista. "De direita"? Isso são eles.

“Eles são racialistas; a esquerda é universalista. O chão histórico do pensamento de esquerda está forrado pelo princípio da igualdade perante a lei, a fonte filosófica das lutas populares que universalizaram os direitos políticos e sociais no Ocidente. Na contramão dessa herança, o lulopetismo replicou no Brasil as políticas de preferências raciais introduzidas nos EUA pelo governo Nixon. Inscrevendo a raça na lei, eles desenham, todos os anos, nas inscrições para o Enem, uma fronteira racial que atravessa as classes de aula das escolas públicas. Esses plagiários são o túmulo da esquerda.

"Esquerda"? O lulopetismo calunia a esquerda democrática enquanto celebra a ditadura cubana. Fidel Castro colou a Ordem José Martí no peito de Leonid Brejnev, Nicolau Ceausescu, Robert Mugabe e Erich Honecker, entre outros tiranos nefastos. Da esquerda, eles conservam apenas uma renitente nostalgia do stalinismo”.

Que quer dizer o cronista? Que o PT, ao financiar com dinheiro público a corrupção, ao adorar estatais, ao integrar as centrais sindicais ao aparato do sindicalismo estatal, ao serem racialistas e conservadores, não é mais de esquerda. O PT calunia a “esquerda democrática”. petistas são "o túmulo da esquerda".

Em verdade, em nada difere de Mino Carta, este impoluto porta-voz oficioso do PT, que em um vídeo antigo, de 2008, revelava notável espírito de síntese. Ser de esquerda, para Mino, é defender a liberdade e igualdade. Mas se o regime vira ditadura, mesmo tendo partido das melhores intenções, o regime é de extrema-direita.

Ou seja, o PT não é mais esquerda. A esquerda permaneceu, límpida e ética, naquele topos uranos das idéias lindas e inefáveis, sempre a salvo da ferrugem corruptora do tempo e dos partidos. Magnoli, evidentemente, deve ter tido um passado de militante nas esquerdas. Quando se descuida, ergue seu bracinho de Dr. Strangelove, sem que possa controlá-lo.

Se alguém não lembra, no filme Dr. Strangelove–, de Stanley Kubrick – o personagem homônimo era um cientista alemão paraplégico refugiado nos Estados Unidos. De tempos em tempos, seu braço esquerdo se erguia na saudação ao Führer, sem que pudesse controlá-lo.

O velho Marx não dá mais para salvar. Suas palavras estão impressas em papel. Quanto a esquerdas, é uma idéia abstrata, que pode ser entendida ao gosto de cada um. Desmoralizadas historicamente, seus militantes agora alegam que o que a esquerda real fez não é coisa que a esquerda ideal faça.

Só faltou Magnoli dizer que Lênin, Stalin, Mao, Pol Pot e Castro são de direita.