¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV
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Janer Cristaldo escreve no Ebooks Brasil Arquivos outubro 2003 dezembro 2003 janeiro 2004 fevereiro 2004 março 2004 abril 2004 maio 2004 junho 2004 julho 2004 agosto 2004 setembro 2004 outubro 2004 novembro 2004 dezembro 2004 janeiro 2005 fevereiro 2005 março 2005 abril 2005 maio 2005 junho 2005 julho 2005 agosto 2005 setembro 2005 outubro 2005 novembro 2005 dezembro 2005 janeiro 2006 fevereiro 2006 março 2006 abril 2006 maio 2006 junho 2006 julho 2006 agosto 2006 setembro 2006 outubro 2006 novembro 2006 dezembro 2006 janeiro 2007 fevereiro 2007 março 2007 abril 2007 maio 2007 junho 2007 julho 2007 agosto 2007 setembro 2007 outubro 2007 novembro 2007 dezembro 2007 janeiro 2008 fevereiro 2008 março 2008 abril 2008 maio 2008 junho 2008 julho 2008 agosto 2008 setembro 2008 outubro 2008 novembro 2008 dezembro 2008 janeiro 2009 fevereiro 2009 março 2009 abril 2009 maio 2009 junho 2009 julho 2009 agosto 2009 setembro 2009 outubro 2009 novembro 2009 dezembro 2009 janeiro 2010 fevereiro 2010 março 2010 abril 2010 maio 2010 junho 2010 julho 2010 agosto 2010 setembro 2010 outubro 2010 novembro 2010 dezembro 2010 janeiro 2011 fevereiro 2011 março 2011 abril 2011 maio 2011 junho 2011 julho 2011 agosto 2011 setembro 2011 outubro 2011 novembro 2011 dezembro 2011 janeiro 2012 fevereiro 2012 março 2012 abril 2012 maio 2012 junho 2012 julho 2012 agosto 2012 setembro 2012 outubro 2012 novembro 2012 dezembro 2012 janeiro 2013 fevereiro 2013 março 2013 abril 2013 maio 2013 junho 2013 julho 2013 agosto 2013 setembro 2013 outubro 2013 novembro 2013 dezembro 2013 janeiro 2014 fevereiro 2014 março 2014 abril 2014 maio 2014 junho 2014 julho 2014 agosto 2014 setembro 2014 novembro 2014 |
quinta-feira, julho 28, 2005
QUANDO MALA É DIZ-QUE-DIZ-QUE "Estamos vivendo uma crise política. É um tal de diz-que-diz-que, eu não sei como vocês estão se sentindo. Eu me sinto indignado" - disse o Supremeo Apedeuta da Nação em discurso em Bagé. E repetiu: "Me sinto indignado". Malas cheias de reais e dólares voam pelo Brasil - e certamente para muito além do Brasil -, os cheques da corrupção se cruzam na contabilidade dos bancos, as provas do mensalão se acumulam, e o indigitado, digo, indignado presidente fala em diz-que-diz-ques. Sente-se indignado, mas fez tudo o que podia para impedir a CPI do mensalão. Como a pressão da imprensa e da opinião pública se impuseram, teve de engolir a CPI de cabo a rabo e agora inclusive se jacta de tê-la desejado. Poderosos, esses diz-que-diz-ques. Já derrubaram a Eminência Parda de seu governo, mais uma dezena de ministros, isso sem falar nos altos próceres do sedizente Partido dos Trabalhadores. "Eu não faço julgamento precipitado" - continuou Lula -. "Eu, da mesma forma que sou contra a pena de morte, sou contra a condenação a priori de qualquer pessoa". Mas bastaram quatro palavrinhas de Roberto Jefferson - sem prova alguma de nada - para mandar passear o ministro mais forte de seu gabinete. Perdoai-o, Senhor, ele não tem a mínima noção do que diz. domingo, julho 24, 2005
VOTO COMPRADO VALE? "El que vendrá, bueno te hará" - diz um sinistro provérbio espanhol. Quantos leitores ainda lembram da affaire Collor? E do PC Farias - convenientemente assassinado como convenientemente assassinado foi Celso Daniel? O que muitos esquecem é que PC Farias jamais enfiou a mão no bolso de contribuintes. Extorquia dinheiro de empresários. Até aí, estamos no ramo da economia informal. Se o dono de meu boteco me vende uma cerveja a 50 reais e eu os pago, se não pagar com dinheiro público não houve corrupção. Houve babaquice de minha parte ou a esperança de alguma vantagem escusa. É uma transação entre um bobo e um espertalhão, ou entre dois espertalhões cada um julgando que desse negócio irá auferir alguma vantagem. Um empresário - ou um cliente de bar - pode aceitar ou recusar uma extorsão. O contribuinte não pode. Sua grana é extorquida na fonte. O governo petista esnobou as negociações no campo privado e enfiou fundo a mão no bolso do contribuinte, sem pudor algum ou piedade. Roubou bilhões do Erário. Ora, quem alimenta o Erário é o contribuinte. Mas quem tem as chaves do cofre é o governo. A cada dia que passa, ouço em mesas de bar, leio em cartas aos jornais, manifestações de saudades dos dias de Collor. O assassinato de PC Farias foi o ponto final de um processo de corrupção. Era preciso calar quem sabia demais. O assassinato de Celso Daniel foi o chute inicial de um projeto de roubalheira. Era preciso calar quem se dispunha a atrapalhar o jogo. É bom ainda lembrar que, na esteira da morte de Celso Daniel, já foram assassinadas seis outras pessoas com alguma vinculação com o crime. Se o governo de Collor terminou com um assassinato, o de Lula começou com sete. E ninguém parece ver isto. Há duas semanas, uma novela paulistana quase roubou o Ibope das produções do Planalto. Foi a intervenção da Polícia Federal na Daslu, a mais suntuosa loja de supérfluos do país e talvez da América Latina. Shopping preferido de onze entre dez novos ricos paulistanos, que se julgam muito sofisticados pagando cinco ou sete mil reais por trapos comprados a 15 dólares. Vestes com grifes européias, provavelmente confeccionadas por chineses ou vietnamitas em regime de semi-escravidão, pois esta é a mão-de-obra que desde há décadas constitui o suporte da moda européia. Eliane Tranchesi, proprietária da Daslu, foi acusada de sonegação fiscal e importação fraudulenta. Que sofra as conseqüências legais destes crimes seria o normal em um país decente. Mas enquanto a empresária e seus sócios eram levados para a prisão em uma operação quase bélica, o contrabando, a pirataria e a evasão de divisas correm soltos na Santa Ifigênia ou na 25 de Março, imensas feiras de contravenção a céu aberto. É como se, para combater a desigualdade social, fosse permissível aos pobres transgredir a lei e se proibisse os ricos de fazer o mesmo. Duas ou três vezes por ano, para mostrar serviço, a polícia faz uma razzia nestas ruas, invade duas centenas de apartamentos utilizados como depósito de contrabando e apreende quarenta ou cinqüenta caminhões de muamba. Dia seguinte, o contrabando e a pirataria voltam à rotina. A apreensão de quarenta caminhões de mercadorias não faz sequer mossa no mercado. Contrabandear, piratear, sonegar podem constituir crimes para os legisladores. Mas para o povo e mesmo para as elites, já passou a constituir uma espécie de direito adquirido. Que me perdoem os tributaristas, mas esta mentalidade não deixa de ter sólidos fundamentos. Por que não sonegar? Para alimentar malas de dinheiros empunhadas por deputados e altos funcionários do governo, no melhor estilo das máfias italiana ou americana? Nos dias em que vivemos, eu diria que sonegar é obrigação cívica. Pelo menos faz mermar o botim destinado a nossos nobres representantes no Congresso e seus sequazes. "Quando a gente começa a mentir, não pára mais" - disse o presidente da República, em admirável confissão de autoconhecimento. Como diria Agripino Grieco, é a chispa da ferradura quando bate na calçada. Lula começou sua carreira mentindo. Pois o PT, desde o berço, sempre foi uma grande mentira. No fundo, um lobo bolchevique travestido de cordeirinho social-democrata. Lula elegeu-se presidente mentindo, a tal ponto que eleitores e até mesmo os inocentes cordeirinhos sociais-democratas cobram hoje suas mentiras. Evidentemente, não pode mais parar de mentir. Sua última fanfarronada é a de um ego maior que o próprio Brasil: "Entre os 180 milhões de brasileiros, não há homem ou mulher que tenha moral para me dar lições de ética" - jactou-se Lula na última sexta-feira. Como garante de sua suposta ética, dá o aval de seus progenitores: "Sou filho de pai e mãe analfabetos". E continua seguindo fielmente a tradição - temos de acrescentar. "O único legado que me deixaram é andar de cabeça erguida. Não vai ser a elite brasileira que vai me fazer baixar a cabeça". Estranha lógica. Como se ter pai e mãe analfabetos fosse título ou motivo de orgulho, ou atestado de honestidade. Como se pudesse ostentar ética um presidente cujo filho recebe de mãos beijadas cinco milhões de reais de uma empresa de telefonia, só porque é filho do dito pai. (Aliás, o Fabinho também pode orgulhar-se de ser bem sucedido, apesar de ter um pai analfabeto). Como se pudesse arrotar ética um presidente que combina uma entrevista de mentirinha em Paris, para afirmar: "o que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente". Ou seja, corrupção faz parte da vida. Sempre que encurralado, Lula empunha como um mantra sua condição de nordestino nascido na pobreza. Pobre, mas voa alto quando sonha. Uma vez eleito, tratou imediatamente de consumar uma birra inarredável: comprar, para seus turismos inúteis, um avião digno de um sultão do Brunei, ao custo de 56,7 milhões de dólares. E para não macular seu caráter sem jaça, fez o que nem o sultão do Brunei faria: pagou-o antecipadamente. Ironicamente, entre os 180 milhões de brasileiros, o homem com moral para dar-lhe lições de ética estava ali a seu lado, no Planalto mesmo. Era Roberto Jefferson, deputado venal e réu confesso de um colossal esquema de corrupção. Quando cabe a um deputado venal e réu confesso dar aulas de moralidade ao país, as reservas éticas da nação há muito estão no vermelho. Quem fará Lula baixar a cabeça não será a tal de elite brasileira - como se deter o poder supremo do país não caracterizasse elite - pois esta elite está nadando em felicidade com os juros mais altos do mundo e os mirabolantes lucros das entidades financeiras. Quem fará o Supremo Apedeuta baixar a cabeça será seu próprio partido. As esquerdas, ao perceber que pelas armas não dominariam o país, apelaram a método mais sutil e eficaz: projetaram tomar o poder pela corrupção. É método mais ameno, já testado e aprovado no México pelo PRI, que não exige o árduo e complicado manejo de armas, nem o desconforto da selva ou da clandestinidade. Nem produz guerrilheiros de três tapas, como José Genoíno: um para falar e dois para calar a boca. O PT foi com demasiada sede ao pote e chegou até mesmo a usurpar da oposição o dever de fazer oposição. Quem hoje faz oposição ao governo é o próprio partido do governo. À oposição, basta esperar de braços cruzados o desvendamento do saque voraz aos cofres públicos. Não foi nenhum político de oposição que ordenou "Sai rápido daí, Zé!". Foi Roberto Jefferson, presidente de partido aliado do PT. Sua ordem não admitiu tergiversações. Não passaram 48 horas e o Zé se esvanecia como fumaça ao vento. Bastaram quatro palavrinhas para demitir a Eminência Parda do governo. É óbvio que atrás das quatro palavrinhas havia uma mensagem cifrada, cujo sentido, a nós, pobres mortais, não foi dado entender. Só o presidente e seu todo-poderoso ministro o captaram. E o captaram rapidinho. Políticos começam a balbuciar timidamente a palavra impeachment, mas sem muito entusiasmo. Melhor ver um Lula rastejando em 2006 que jogá-lo agora ao ostracismo. Fala-se em cassar dez ou quinze deputados. Em verdade, deveria ser destituído o Congresso todo. Quando Roberto Jefferson declarou, alto e bom som, que nenhum dos deputados ou senadores presentes declarava corretamente seus gastos de campanhas - "inclusive eu", apressou-se a acrescentar - fez-se um silêncio sepulcral no plenário. Para reforçar sua denúncia, Jefferson apalpou uma maleta, onde estavam as declarações dos gastos eleitorais de cada deputado. Um silêncio divino perpassou o recinto do Congresso Nacional. Foi como se um anjo tivesse passado pelas galerias do sofisticado lupanar. Como o silêncio também foi garantido aos operosos operadores da corrupção. O Supremo Tribunal Federal, liderado pelo sempre coerente Nelson Jobim (o Meritíssimo sempre está com o poder, esteja o poder com quem estiver) autorizou os depoentes a mentir sem risco nenhum de prisão. O que Lula e o PT não conseguiram - sabotar a CPI - o STF autorizou. Que se pode esperar de uma investigação, quando os investigados levam no bolso um habeas corpus que os autoriza a calar, sonegar informações e mesmo mentir? Habeas turpitudinis, melhor diríamos. Começam agora a fazer sentido certos movimentos estranhos em Brasília. Por quatro vezes, os congressistas rejeitaram a taxação dos aposentados e pensionistas, por considerá-la afrontosa a princípios jurídicos como o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Mas a carne é fraca. Na quinta vez, o Congresso não resistiu e inclusive obteve do mandalete gaúcho instalado no STF a autorização definitiva para implantar a taxação da velharada indefesa. Considera-se que pelo menos uma centena de deputados foram comprados. É um punhado considerável de prostitutas, capaz de virar qualquer votação. Pergunta que nenhum jornal ainda fez: voto comprado vale? Venalidade pode criar legislação? Pode derrubar cláusulas pétreas e extinguir direitos adquiridos? Se cassados estes deputados, não seria o caso de cassar também seus votos passados? Esta é a pergunta que deve ser feita, a meu ver, aos ministros das supremas cortes. Se é que, humanos sendo, ainda não se renderam às tentações do mensalão. quinta-feira, julho 21, 2005
A CHISPA DA FERRADURA "Quem começa a mentir, não pára mais" - disse recentemente Luis Ignácio da Silva Lula. Eu, que vivo me queixando da incultura do presidente, dou a mão à palmatória. Mesmo entre analfabetos, encontramos momentos de profundo conhecimento de si mesmo. Como diria Agripino Grieco, é a chispa da ferradura quando bate na calçada. segunda-feira, julho 18, 2005
COLABORAÇÃO DE UM LEITOR IRADO Nada melhor do que ser lido por leitores bem informados. Do Canadá, recebo estas observações: "Anote, então, por favor que: (1) são 13 as universidades de Paris, e não 12, como o senhor acredita; (2) se é para ser preciso, como o senhor insiste, a Sorbonne não "deixou de existir há exatos 37 anos", mas há exatos 34 anos, visto que o desmantelamento das cinco faculdades da antiga Université de Paris só ocorreu três anos após a promulgação da lei que a autorizou (Loi Faure, 1968); (3) Paris III não é a "única universidade a herdar o nome de Sorbonne" - o nome oficial de Paris I é Panthéon-Sorbonne, e o de Paris IV é Paris-Sorbonne; (4) dado de menor importância, quando se leva em conta o que precede, o histórico prédio da Sorbonne abriga igualmente parte de Paris V, ou Université René Descartes, a Chancellerie des Universités e o Rectorat de Paris". Nilo Damata Montreal, Canadá -------- Meu caro Nilo: só posso agradecer sua colaboração. Eu não tinha todos esses dados e sua mensagem nos traz informações mais precisas. Mas o fundamental permanece: a Université de Sorbonne não existe mais. CHANCE NA SORBONNE Os grandes escritores sempre tentaram - mas nem sempre conseguiram - criar um personagem que sintetize uma coletividade ou, pelo menos, um certo tipo de seres. Jerzy Kozinski o conseguiu. Falo de Being There, traduzido no Brasil como O Vidiota. Chance Gardiner, o personagem, é dos mais perturbadores de nossa época. Quem não leu o livro, pode ainda pegar o filme, que passou no Brasil com o título de Muito além do Jardim e tem uma interpretação magnífica de Peter Sellers. O tradutor brasileiro do livro teve um momento de iluminação ao traduzir o título americano por O Vidiota, isto é, o idiota do vídeo. Gardiner é o jardineiro de um misterioso senhor, identificado na obra como "o Velho". Chance vive recluso no jardim da mansão e só teve contato, em toda sua vida, com duas pessoas, o Velho e a criada do Velho. Chama-se Chance porque nasceu por acaso. Não sabe ler nem escrever. Seu único contato com o mundo exterior é através da televisão. Quando o que vê não lhe agrada, é simples: desliga o aparelho ou muda de canal com o controle remoto. Morre o Velho e Chance é largado no mundo pelos herdeiros. Sem lenço nem documento, literalmente. Quando a esposa de um senador o atropela na rua e lhe pergunta quem é, diz: I?m the gardener. A mulher imediatamente o relaciona com algum milionário de sobrenome Gardiner, e nosso personagem passa a ser conhecido como Chance Gardiner. Como não portava nem dinheiro nem documentos, a mulher do senador considera que deve ser alguém muito importante e o recolhe à sua casa. Além do mais, vestia as antigas roupas do velho, que agora eram o must em termos de moda. Chance, sem jamais ter pensado no assunto, passa a fazer parte do círculo do poder. Certo dia, o senador recebe a visita do presidente dos Estados Unidos e o apresenta como economista. - E você, Mr. Gardiner, o que pensa do mau clima na Bolsa? - pergunta o presidente a Chance. Chance Gardiner, da vida só conhece o jardim onde se criou. Como se sente obrigado a uma resposta, fala da única coisa que conhece: - Em um jardim, há uma estação para o crescimento das plantas. Há a primavera e o verão, mas também o outono e o inverno. E depois, a primavera e o verão voltam. Enquanto as raízes não forem cortadas, tudo está bem, e tudo continuará bem. O presidente se mostra satisfeito: - Mr. Gardiner, devo confessar que o que você acaba de dizer é uma das declarações mais reconfortantes e otimistas que me foi dado ouvir, desde há muito tempo. Dia seguinte, o presidente fala em cadeia nacional e, ao discorrer sobre economia, cita a sábia observação de Gardiner. Jornalistas e serviços de segurança, CIA e FBI, se desesperam na busca de dados sobre o novo economista. Descobrem até o número de sua cueca, mas não encontram um único registro documental de sua existência. Estamos em plena Guerra Fria e os agentes americanos já começam a desconfiar da existência de alguma tramóia soviética. Mas também a KGB quer saber quem é o novo conselheiro do presidente e não chega a resultado algum. Quem leu o livro ou viu o filme conhece o fim da história: a força de repetir chavões que ouviu na televisão, Chance faz uma brilhante carreira na mídia e começa a ser cogitado para presidente dos Estados Unidos. E quem não leu Kosinski, deve lê-lo imediatamente: é uma das mais profundas parábolas da literatura contemporânea. Estamos vivendo em plena época Gardiner, de ascensão do analfabeto. Com a televisão, qualquer iletrado pode ter uma idéia mais ou menos geral do que ocorre em torno a si e no mundo. A rigor, ninguém precisa mais ler para entender - ou supor que entende - o mundo. Quem chegou até aqui, já intuiu de quem pretendo falar. Desde as primeiras candidaturas de Lula, vi no Supremo Apedeuta a mais perfeita encarnação do personagem de Kozinski. Venho afirmando isso há muitos anos, desde as primeiras candidaturas de Lula, e se hoje me repito é porque tenho consciência da frágil memória dos leitores. De líder sindical no ABC paulistano, um nordestino analfabeto - manipulado pela Igreja Católica e pelos intelectuais uspianos, que ainda cultivam o velho sonho bolchevique de um presidente operário - foi crescendo até tornar-se a esperança de um país novo. Tenta três vezes a presidência da República e é por três vezes derrotado. Insiste e na quarta chega à Suprema Magistratura. Sem instrução alguma, sem leituras, sem nenhuma experiência administrativa, nem mesmo a gestão de uma padaria ou boteco, é saudado urbi et orbi como a Esperança não só do Brasil, mas da América Latina. Se alguém objetava como poderia este ser tosco e despreparado gerir uma economia vasta e complexa como a brasileira, a resposta já estava na ponta da língua: basta que seja honesto e escolha bons assessores. A Esperança da América Latina escolheu então seus ministros. Para começar, elegeu como eminência parda um ex-terrorista com curso de guerrilha em Cuba. Os demais ministérios, distribuiu-os a comunistas, compagnons de route e companheiros de partidos que haviam sido rejeitado pelos eleitores de seus respectivos Estados. O resultado aí está: um deputado federal - réu confesso de crimes eleitorais - lança uma série de denúncias, denúncias graves mas sem prova alguma, e os ministros da Esperança dos Oprimidos da Terra começam a cair como uma fileira de dominós. Denúncias vazias, conspiração das elites, resmunga a Esperança dos Povos. Mas porque então derrubar ministros e demitir assessores e militantes de seus cargos, se não há prova de crime algum? Estamos vivendo dias de O Processo, de Kafka. Ninguém é culpado de nada e todos caem como moscas borrifadas com inseticida. As denúncias começaram com um magro achaque de três mil reais, que logo se revelou girar em torno de milhões e hoje já ultrapassa a casa do bilhão de reais. E o imbróglio está longe de seu fim. A Esperança dos Humildes, cúmplice da mais vasta rede de conspiração jamais vista na História do país, só não é destituído porque seus adversários querem vê-lo rastejando nas eleições de 2006. Semana passada, Chance da Silva largou a crise à deriva e foi a Paris, para participar da dilapidação do dinheiro dos contribuintes, em nome de supostas comemorações culturais entre França e Brasil. Digo supostas comemorações culturais porque de cultura não se tratou, mas sim da promoção do show business tupiniquim. Lula saudou Jacques Chirac como grande estadista, logo Chirac que há uns vinte anos era insultado pelas esquerdas como homem de extrema direita. Chirac mandou o elevador de volta e distribuiu mimos similares ao Chance Gardiner de Garanhuns. Pois os europeus, e particularmente os franceses, adoram presidentes operários... desde que seja longe da Europa. O Supremo Apedeuta fez, na ocasião - segundo a imprensa nossa - uma palestra na Universidade de Sorbonne. É de supor-se que até mesmo Lula tenha certeza de que fez uma palestra na Universidade de Sorbonne. Jornalista, por ofício, é um homem bem informado e em verdade não podemos nos queixar do nível de informação de nossos profissionais de imprensa. E é exatamente isto que demonstra a ciclópica desinformação de nossos jornalistas. A Universidade de Sorbonne deixou de existir há exatos 37 anos. Morreu em 1968. Há quase quatro décadas. O que hoje existe são as universidades de Paris I, II, III... até Paris XII, creio. A única universidade a herdar o nome de Sorbonne é a Paris III, também conhecida com Université de la Sorbonne Nouvelle. O que existe hoje é o antigo prédio da Sorbonne, onde hoje funciona a Paris IV. O prédio, e nada mais. O Gardiner tupiniquim deve ter-se sentido muito orgulhoso por ter saído de uma infância pobre em Garanhuns para deitar falação na Université de la Sorbonne. A Esperança das Nações, que de francês parece conhecer apenas duas palavras - merci bocu, pois assim deve soletrá-las em seu bestunto - talvez um dia rememore a seus netos o momento memorável de sua palestra na Universidade de Sorbonne, afinal assim a imprensa brasileira atesta. O pobre coitado, prisioneiro da língua e da própria insciência, deficiência inconcebível em um chefe de Estado, nem sabia onde estava. Idi Amin Dada, de triste memória, pelo menos falava inglês além de sua língua nativa. A grande imprensa brasileira, ou quis ser gentil com o Supremo Apedeuta, ou talvez participe de boa parcela de sua ignorância. Outra explicação não há. domingo, julho 17, 2005
REMEMBER POL POT Comemora-se, nestes dias, os trinta anos da tomada do poder no Camboja pelo Khmer Vermelho, que gerou um dos mais fulminantes genocídios do século passado. Como quase ninguém mais sabe quem foi Pol Pot, reproduzo artigo que publiquei em 17/08/2001. ------------------------- A guerra semântica, no século que passou, foi sem dúvida alguma ganha pelas esquerdas. Quando Hitler mata, temos um genocídio. Quando os assassinos se chamam Stalin, Mao ou Pol Pot, ninguém pensa em genocídio. Tampouco a imprensa fala em genocídio ao referir-se aos cem milhões de mortos do comunismo. Intelectuais mais ousados, entre eles os atuais líderes petistas, até já admitem que houve... um desvio. Ora, não vamos levar ninguém a tribunais por meros desvios. Neste início de milênio, algo parece estar mudando. O Ocidente se regozija por ter submetido ao julgamento do Tribunal Penal Internacional, instituído em Haia por resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas, um homem de Estado, o primeiro depois de Nurenberg. No caso, o líder sérvio Slobodan Milosevic. Há neste fato um detalhe escanteado pela mídia. Ninguém mais parece lembrar que Milosevic era líder do Partido Comunista iugoslavo. O romeno Ceaucescu foi fuzilado, em uma queima de arquivo sumária. O campeão de tiro na nuca da ex-Alemanha Oriental, Honecker, morreu em liberdade no mesmo Chile que pede a cabeça de Pinochet. Sobrou para o iugoslavo. Foi preciso morrer cem milhões de gentes e um império afundar, para que um chefe de Estado comunista fosse julgado. É pouco, mas já é algo. Um outro assassino - e dos mais entusiastas - quase chegou às barras de um tribunal, o cambojano Pol Pot. Em 97, um tribunal constituído por cúmplices seus do Khmer Vermelho o teria condenado à prisão perpétua. Falo no condicional, pois ao morrer, em circunstâncias suspeitas em abril de 98, o ditador vivia livre como um passarinho. Do julgamento pra valer, a morte o poupou. Norodom Sihanouk costumava afirmar que se tivesse de mandar os estudantes cambojanos estudar no Exterior, os mandaria para Moscou. Jamais para Paris, de onde voltavam marxistas. Sabia muito bem do que falava. Pol Pot, que em cinco anos de ditadura conseguiu matar um quarto dos cambojanos, tivera sua formação humanística no Quartier Latin. Abril de 75, Porto Alegre, Rua da Praia. Excitado, um advogado me aborda: - Viste aqueles jovens? Todos de preto, lenço vermelho no pescoço, hieráticos, olhar frio e altivo? Os jovens hieráticos que encantavam o advogado eram os khmers vermelhos que entravam em Pnom Penh e faziam a primeira página de todos os jornais. A capital foi esvaziada à força e os trabalhadores urbanos foram enviados para o campo, para trabalhar em grandes projetos agrícolas. Pol Pot queria criar uma economia sem dinheiro, coletivizada e isolada do resto do mundo. As vítimas, de um modo geral, eram espancadas até a morte ou sufocadas com sacos plásticos, para poupar balas. Trinta anos e dois milhões de mortos depois, pergunte a um universitário qualquer se ele algum dia ouviu falar em Pol Pot. Terá ouvido falar em sexpol, em pot pourri. Mas Pol Pot, assim junto, jamais. Se perguntarmos por Franco ou Pinochet, este jovem sabe na ponta da língua de quem se trata. É que Pol Pot era um dos tantos milenaristas adorados pelas esquerdas, e a imprensa é cheia de dedos quando tem de falar de tiranos de esquerda. Melhor esquecer. (Faço uma pausa e passo numa cantina de Higienópolis. Encontro um companheiro de charlas, médico, 43 anos, leitor compulsivo. Em 75, quando os khmer entraram em Pnom Penh, tinha 17 anos. Testo minha tese. Pergunto-lhe se já ouviu falar de Pol Pot. Jamais ouvira falar). Mas não são poucos os que lembram a frase lapidar do general espanhol Millán Astray, proferida no dia 12 de outubro de 1936, na Universidade de Salamanca, e dirigida ao reitor, um Miguel de Unamuno apoplético. "Muera la inteligencia!' -- disse o general, que as esquerdas sempre definiram como franquista. Ocorre que Astray insultava Unamuno, que naquela cerimônia do Día de la Raza, representava oficialmente ... Francisco Franco. No hagiológio das esquerdas, até hoje o reitor passa por antifranquista. Morte à inteligência, este foi o programa do Khmer Vermelho. Como os revolucionários soviéticos de primeira hora, que queriam inaugurar um calendário novo, Pol Pot pretendia partir do Ano Zero. Tentou eliminar toda cultura passada e toda lembrança do passado. A universidade e o ensino foram destruídos. Quem quer que demonstrasse um mínimo de conhecimentos era enviado aos chamados campos de morte e sumariamente eliminado. Usar óculos constituía atestado de óbito. Se usa óculos, quer ler. Se quer ler, quer conhecer. Se quer conhecer, deve morrer. O grito irracional do general espanhol, proferido há quase sete décadas, ainda reboa na mídia contemporânea. Mas Astray nem de longe matou tanto quanto o cambojano. Pol Pot, morto apenas há três anos, já foi banido da memória contemporânea. Houve um hiato na comunicação. O leitor jovem que lê estas linhas pode estar ouvindo falar de Pol Pot pela primeira vez. Se já o conhece, pode fazer um teste com seus coetâneos. Pergunte a seu colega de universidade ou de trabalho se ouviu falar do homem. Na maioria das vezes, a resposta será negativa. Mas os cambojanos não esqueceram o Khmer Vermelho. De cada quatro habitantes do país, um foi eliminado pelo revolucionário formado em Paris. São mortos demais para serem esquecidos em tão pouco tempo. Norodom Sihanouk, pressionado pela ONU, anuncia para este ano o julgamento dos dirigentes remanescentes da guerrilha. Será um julgamento sofrido e difícil, senão inviável. Para começar, o atual primeiro-ministro, Hun Sen, é ex-membro do Khmer Vermelho. E muitos dos assassinos sobreviventes eram crianças quando foram obrigados a matar colegas, professores, parentes e inclusive os próprios pais. Sempre é bom saber que os comunistas começam a ser julgados. Na América Latina, não falta quem ponha as barbas de molho. Mas, pelo menos por enquanto, Castro continua protegido por uma imprensa cúmplice, que ainda o trata como presidente. A luta pela memória é a eterna luta do homem contra o poder, escreveu Milan Kundera. Não esqueçamos Pol Pot. PRIVILÉGIOS DE UM VICE-DEUS O papa Bento XVI elogiou neste domingo na oração do Angelus, durante seu descanso no valle de Aosta (norte da Itália), as férias. "Esta pausa estival é um dom de Deus verdadeiramente providencial depois dos primeiros meses do exigente serviço pastoral que a providência divina me confiou". Segundo ele, as férias tornam possível a meditação sobre o significado profundo da vida. O santo homem tomou posse do cargo, não trabalhou sequer dois meses e já decretou as próprias férias. Nada mau ser chefe de si mesmo. quarta-feira, julho 13, 2005
MORAL DE CUECAS, LITERALMENTE "Nós dilapidamos o nosso capital moral perante a sociedade" - disse Tarso Hertz Genro, o novo presidente do PT. "Dilapidamos a nossa referência ética porque não havia duros controles no partido, para que isso fosse reprimido, controlado", afirmou, em relação às irregularidades descobertas no PT. Que ética, cara-pálida? O PT é um saco de gatos egressos do marxismo, do trotskismo ou compagnons de route. Desde a fundação do partido, reivindicaram suas raízes socialistas. Como pode evocar a ética quem parte de filosofia para a qual os fins justificam os meios? segunda-feira, julho 11, 2005
PIOR QUE MENSALÃO Segundo os jornais, a Igreja Universal anunciou hoje por meio de uma nota que o dinheiro transportado pelo deputado João Batista tinha como finalidade depósito em São Paulo para o pagamento de despesas da Igreja - como impostos, aluguéis, empregados. A nota também afirma que o dinheiro "é resultado de doações dos fiéis em uma comemoração especial ocorrida ontem nos templos da Igreja Universal". É sabido que a Igreja Universal, com promessas de benesses aqui na Terra e no Além, extorque o que pode de seus fiéis. É atitude mais perversa que a instituição do mensalão, pois este exigia uma contraprestação, enquanto a Igreja Universal nada dá de volta, a não ser palavras vazias. E coletar seis milhões numa só noite, às custas da credulidade pública, se ainda não foi tipificado como crime é porque a tal de Justiça é cega mesmo. CRISE NO MERCADO DA CORRUPÇÃO Quando foram encontrados 26.800 notas de 50 reais - o que totalizava 1,34 milhão de reais - nos armários dos escritórios de Jorge Murad em São Luís do Maranhão, fui tomado de um súbito orgulho cívico. Finalmente tínhamos moeda forte. A corrupção já aceitava reais, dólares se tornavam dispensáveis. O dinheiro amealhado pelo marido de Roseana Sarney foi acondicionado em duas caixas de papelão, lacradas pelos policiais. A inflação parece estar voltando. Na penúltima apreensão de dinheiro vivo, tivemos uma maleta com 200 mil reais. Persistia a confiança nacional, mas prudência e chá de marcela nunca fizeram mal a ninguém. Nas cuecas, o portador do pecúlio destinado ao irmão do ex-presidente do PT, José Genoíno, levava mais 100 mil dólares. Nunca se sabe. Seguro morreu de velho. Mais do que nunca, a expressão "moral de cuecas" adquiriu um sentido tão visível, palpável. Mas a moeda nacional já perdia prestígio para as verdinhas. Só havia três pacotinhos de 100 reais na maleta, os demais eram de 50. A corrupção chegara a tal ponto que no mercado circulante já escasseavam suas cédulas prediletas. O leitor já viu uma cédula de cem reais? É possível que sim. Mas não deve tê-las visto muitas vezes na vida. Estas cédulas, dado seu valor de face, circulam privilegiadamente no território da corrupção. Vêm sempre amarradas em pacotes de cem cédulas, e talvez jamais sejam desamarradas, pois sendo as maracutaias dimensionadas sempre na base do milhão, não há porque desamarrá-las. Os pacotes, como chegam, seguem adiante. Hoje, a imprensa nos brinda com notícia inefável. O deputado João Batista (PFL-SP) foi flagrado carregando sete maletas com mais de dez milhões de reais. Segundo os policiais, o dinheiro estava distribuído em notas de R$ 5, de R$ 10, de R$ 20, de R$ 100 e principalmente de R$ 50. São tantas notas que a PF vai pedir ao Banco Central ou ao Banco do Brasil uma máquina para contar dinheiro. Uma das malas estava tão cheia de dinheiro que dois policiais precisaram carregá-la. O montante das mesadas aos senhores deputados já não mais cabe em caixas de papelão. O que já nos dá uma idéia da amplitude da crise monetária do país. Quando a corrupção se digna a aceitar cinco merrecas - o preço pago a um fiscal de trânsito para não multar - é porque já há uma crise de moedas altas no mercado da corrupção no país. OS POMBOS FARÃO JUSTIÇA Comentar o atentado em Londres? Não, muito obrigado. Todos os jornais o estão comentando e eu nada teria a dizer de novo senão reiterar meu repúdio ao terrorismo. Só uma digressão rápida: como observou o jornalista Steven Plaut, os ingleses finalmente descobriram a palavra terror. Pois antes deste atentado, a mídia inglesa sempre se referia aos terroristas e assassinos que atentavam contra os judeus como "militantes" ou "ativistas". Nada como algumas bombas na própria carne para restituir às palavras o verdadeiro sentido. Comentar o mar de lama petista que inunda o país? Remeto o leitor à leitura quotidiana dos jornais, que só trazem páginas cheias de boas notícias ao cidadão honesto. A propósito, você notou a quantidade de políticos vertendo lágrimas de crocodilo em seus pronunciamentos? Curiosamente, são sempre políticos do PT. Os petistas parecem ter sido acometidos por uma crise lacrimogênea capaz de iludir o espectador mais incauto. Chora a Heloísa Helena, chora o Delúbio, chora o Genoíno, chora o Sílvio Pereira, chora o Suplicy. O impoluto Partido dos Trabalhadores, campeão da moral e da ética - como se houvesse diferença entre uma e outra - está me lembrando o Salve Rainha, Mãe de Misericórdia, vida e doçura esperança nossa salve! A vós bradamos degredados filhos de Eva. A vós suspiramos gemendo e chorando neste vale de lágrimas. E haja lencinhos para secar as lágrimas do PT. Prefiro comentar notícias que passaram quase despercebidas. Semana passada, o vendedor Reginaldo de Lima foi preso em sua residência na Vila Carioca, zona sul de São Paulo, sob acusação de fazer apologia ao nazismo. Na casa de Lima, a polícia encontrou e apreendeu livros, filmes, medalhas, selos, carteiras de trabalho alemãs, suásticas e CDs sobre nazismo. "Não esperávamos encontrar tanto material. Ele também vendia e comprava alguns itens pela Internet", disse a delegada Margarette Barreto, responsável pelo caso. É o que nos dizem os jornais. Lima tem um site hospedado na Argentina, que teria conteúdo nazista. Segundo a polícia, ele procurou países onde a divulgação de material nazista não é considerada crime. O mesmo não pensa Lima. O material contido no site seria usado como fonte de pesquisa. "O que está ali é uma visão pura, sem distorção ou juízo de valor sobre o assunto. Nunca imaginei que teria problema com isso", afirmou o comerciante. Lima foi autuado em flagrante por crime de racismo, sob acusação de fazer apologia ao nazismo. A prisão está baseada na lei 7.716, de 1989, que em seu artigo 20, § 1, prevê pena de dois a cinco anos de prisão por fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propagandas que utilizem a cruz suástica, ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. Poderoso, este Brasil. Não consegue punir os crimes praticados em seu território e sai à cata de atos praticados em outro país, onde não são considerados crimes. No site de Lima, Hitler é considerado "grande personalidade", embora não haja declarações explícitas de anti-semitismo. Em 1998, a revista americana Time, promoveu uma votação para eleger a Personalidade do Século. Cristo foi votado em primeiro lugar, e Adolf Hitler foi o segundo. Como Cristo não havia vivido no século XX, Hitler foi para o topo da lista. Claro que a votação restou inútil, pois a Time não ousou respeitar o pensamento dos eleitores. Embora a lei tupiniquim fosse de 1989, o Brasil preferiu manter um silencioso obsequioso ante as preferências do grande irmão do Norte. Já o Lima é um pobre diabo. Cadeia nele. Toda vez que se publica ou se tenta publicar Mein Kampf, há um alarido nacional denunciando os eventuais editores como criminosos. Ora, como conhecer o pensamento de Hitler sem ler sua obra? Não publicá-lo é esconder dos contemporâneos a ideologia que gerou um dos maiores massacres do século passado. Digo um dos maiores, porque maior mesmo foram os perpetrados por Lênin e Stalin, inspirados por Marx, cujas obras podem ser encontradas em qualquer livraria, sem que autoridade alguma se preocupe em proibi-las. O nazismo teve vida breve, pouco mais de década, e vingou só na Alemanha. O marxismo durou quase um século e contaminou um terço do planeta. Diante dos crimes de Stalin ou Mao, Hitler foi aprendiz de genocida. No entanto, todo símbolo, publicação ou site que a ele se refira, é considerado crime neste nosso incrível país. Em seu site, Lima expõe condecorações a soldados alemães e as últimas palavras dos líderes nazistas condenados por crimes de guerra pelo tribunal de Nuremberg, na Alemanha, depois do final da guerra, em 1946. Na página inicial, lê-se que o site pretende ser apenas uma fonte alternativa de pesquisa e que "repudia qualquer forma de nazismo". A propósito, trouxe de Paris, em DVD, o belíssimo documentário de Leni Riefenstahl, O Triunfo da Vontade, sobre a reunião anual do NSDAP (Partido Nacional Socialista Alemão) realizada em 1934, em Nuremberg. Os nazistas realizaram paradas, desfiles e discursos, e exibem um exército colossal, cuja derrota não parecia concebível. Foi o filme mais proibido do século passado. A meu ver, deveria ser exibido em todas as escolas. Para que as novas gerações vissem que aquele poderio aparentemente invencível, dez anos depois, virou cinzas. Espero que polícia alguma me incrimine ou me prenda como nazista pela posse deste importante documento histórico. Curiosamente, neste país que prendeu Lima, este documentário pode ser encontrado em qualquer locadora mais provida. Abomino tanto o marxismo quanto o nazismo, mas defendo a publicação dos textos tanto de Hitler quando de Marx, Mao, Lênin ou Stalin. Como conhecer uma doutrina sem ler seus livros básicos? Aqui no Brasil, no entanto, criou-se uma cultura paradoxal. Enquanto as obras marxistas ou de inspiração marxista abundam nas livrarias e têm livre curso nas universidades ou imprensa, ai de quem ouse publicar Hitler. É jogado à execração pública e arrisca ir em cana. Soa estranho o excesso de zelo policial, já que os sites nazistas - nem falo dos comunistas - são comuns na Internet, sem que seus autores sejam presos ou condenados. Enquanto isso, em qualquer feira de antiguidades, você pode comprar bandeirinhas da finada União Soviética ou efígies de Lênin ou Stalin, sem que autoridade alguma tenha algo a objetar. Enquanto o nazismo passou para as mentes como a representação do mal absoluto, o comunismo - ainda hoje, após sete décadas de atrocidades - goza do prestígio de ter sido um dos mais belos sonhos da humanidade. Em Porto Alegre, em homenagem ao desastrado caudilho Leonel Brizola, o PDT houve por bem erguer-lhe um monumento. Até aí, tudo muito inteligível, bajuladores de nulidades é que não falta neste país. É quando entra então em cena um macróbio stalinista, o arquiteto Oscar Niemeyer, que propôs expandir a homenagem, estendendo-a a Getúlio Vargas, João Goulart e - como seria de esperar-se - a Luiz Carlos Prestes, o mais famoso russófilo que o Rio Grande do Sul produziu e certamente o mais medíocre líder comunista que o Brasil já teve. Proíba-se qualquer efígie ou insígnia que lembre o nazismo. Aplausos ao celerado que queria transformar o Brasil num imenso gulag tropical. Que, aliás, é o ídolo mais adorado pelo atual presidente do PT, o ex-poeta Tarso Genro. Ao historiador gaúcho Sérgio da Costa Franco, em crônica publicada na Zero Hora, ocorreu citar a boutade de Mário Quintana, proferida quando quiseram erguer-lhe um busto em Alegrete: "um erro em bronze é um erro eterno". Era. Nos meses seguintes à queda do Muro e ao esboroamento da União Soviética, as estátuas colossais em bronze de Stalin e Lênin começaram a vir abaixo onde quer que existissem, como também as gigantescas estrelas vermelhas, que simbolizavam o pesadelo socialista. Verdade que ainda sobram algumas estátuas de Lênin na Rússia, mas o bronze já não é eterno. O Brasil vive nestes dias uma crise brutal de governo - melhor dir-se-ia de desgoverno - provocada pelos herdeiros do marxismo, que estão se revelando mais eficazmente corruptos que os antigos inimigos de classe, os famigerados capitalistas. Enquanto isto, um stalinista decrépito e com o pé na cova, quer deixar sua marca abominável na capital gaúcha, em homenagem ao assassino de Elsa Fernandes. Que deixe. Enquanto não chegar ao Brasil a salutar prática de demolir bronzes em homenagem a assassinos, os pombos farão justiça. sábado, julho 09, 2005
CÉREBRO DE DINOSSAURO Para o ministro da Controladoria Geral da União, Waldir Pires, "realmente o mensalão pode ter existido" durante o governo Lula. SENADORA EVOCA HEROÍNA CORNIFICADORA Enquanto isso, no Congresso Nacional, para defender-se das acusações do deputado Roberto Jefferson, a senadora petista Ideli Salvati subiu nos tamancos e evocou Anita Garibaldi. "Santa Catarina é a terra de Anita Garibaldi. Se ainda não apareceu um homem para enfrentá-lo, agora apareceu uma mulher". É de supor-se que a senadora não se referia à forma como Anita enfrentou Giuseppe Garibaldi. Anita, se alguém não sabe, é aquela virtuosa senhora lagunense, que largou o marido para servir de vivandeira do primeiro aventureiro de olhos azuis que passou pela porta de seu rancho. Garibaldi, se alguém não lembra, era um mercenário italiano que, para capear o desemprego, pôs suas armas a serviço da oligarquia rural gaúcha, sob pretexto de separar do Brasil o Sul do país. sexta-feira, julho 08, 2005
INSULTO ÀS BRASILEIRAS Na cerimônia de posse dos novos ministros, hoje, em Brasília, disse Lula à nova ministra Dilma Roussef: "Você exemplifica todas as mulheres brasileiras". Curiosamente, nenhum grupo feminista, nem sequer um jornalista, reclamou do insulto dirigido a todas as mulheres brasileiras. Pois celeradas como Dilma Roussef, que apostaram na ideologia mais assassina do século passado, são exceções. A imensa massa feminina brasileira não é insana a ponto de militar em movimentos armados para instituir no país um ditadura infamante. domingo, julho 03, 2005
TAXADO COMO DIREITISTA Quando voltei de Estocolmo, em 72, dei uma longa entrevista ao Correio do Povo, de Porto Alegre. Lá pelas tantas, o repórter me pergunta: como é a oposição na Suécia? Respondi que lá não havia oposição, pois a Suécia era o país do consenso. Os deputados debatiam no plenário e se acertavam nos corredores. No outro dia, a manchete letal: Segundo Janer, não há oposição na Suécia por ser o país do bom senso Ou algo semelhante, estou citando de memória. Reclamei ao repórter, mas preferi não pedir retificação. A menos que se trate de grave ofensa à honra, calúnia ou difamação, retificação em jornal é gol contra. O leitor que não havia lido o jornal ontem fica sabendo hoje do que você não afirmou, mas segundo o jornal teria afirmado. Como eu não era de esquerda, o repórter me via como de direita. Em seu bestunto, a manchete errada fazia sentido. Minha fama de direitista já era antiga. Começou, creio, em 64, quando eu estudava em Santa Maria. Mal eclodiu o movimento militar, fui convidado para participar da guerrilha. Sem sequer levar em conta considerações ideológicas, me recusei. Considerava a guerrilha luta suicida, algo como lutar de bodoque contra tanques. Mas os candidatos ao suicídio tinham suas convicções. Que o Palácio de Inverno, em 17, fora tomado por um punhado de homens decididos. Que outro punhado de barbudos havia derrubado Fulgencio Batista em 59, em Cuba. Que os rumos da História sempre haviam sido decididos por um punhado de homens decididos. Esqueciam que o tzar vivia num palácio estival em São Petersburgo, completamente desprotegido, mais adequado a bailes da corte que ao exercício do poder. Tivesse o Kremlin como sede de seu governo, o século passado certamente não sofreria a tirania de assassinos como Lênin e Stalin. Esqueciam também que Cuba era uma ilhota, guarnecida por um exército despreparado. Desde então - quando tinha 17 anos - fui jogado às trevas da direita. Trinta anos depois, o jornalista e guerrilheiro Fernando Gabeira chegou à minha mesma conclusão. Mas só depois de cárcere, tortura e exílio. Longo é o caminho das esquerdas até o entendimento. Em meus dias de universidade, por não participar de grupos de esquerda, fui jogado na direita. Cursei Filosofia, o mais aguerrido ninho de marxistas da capital gaúcha. Tachado como direitista, paguei preço caro por não seguir a filosofia do alemão iracundo. (Para começar, nunca considerei Marx filósofo, mas um economista). Perdi um monte de mulheres. Mal me aproximava de uma, vinha a informação: "cuidado, esse cara é direita". Logo fui promovido a agente do DOPS. Um episódio fez folclore em Porto Alegre. Estava com uma jornalista debaixo de um chuveiro (vínhamos da praia), ambos nus, quando ela me repeliu suavemente com os braços: "Estou com vontade, mas me desculpa. Não combinamos política e ideologicamente". Assim eram aqueles 70 e este "direitista" que vos escreve ficou a ver navios. Os jovens de hoje certamente ignoram, mas houve época em que o Partido Comunista proibia seus militantes de falar com qualquer pessoa que não fosse comunista. Para evitar contágios burgueses, suponho. Com o tempo, fui promovido ao SNI, e a pecha teve conseqüências mais graves. Perdi amigos e empregos, o que torna a vida nada fácil para quem a está começando. Em 71, fui para Estocolmo. Ao voltar, nova promoção: agora eu era agente da CIA. Tudo isto para chegar a um outro lapso, desta vez meu. Em um debate na Internet, falei que fora taxado como esquerdista. Entre mais de 50 mil participantes do fórum, pelo menos um notou minha gafe e corrigiu-a asperamente. Me penitenciei, mas logo percebi o lapso como providencial. Quem é tachado de direitista, é ao mesmo tempo duramente taxado. E a taxa é alta, particularmente para um jovem. Hoje tenho vida estável, acusações de tal jaez não me fazem mossa. Mas podem destruir o futuro de quem está se iniciando na vida. Como destruíram, por exemplo, a carreira de Wilson Simonal. E de tantos outros que foram barrados no jornalismo, no magistério e no mercado das artes e não ficamos sabendo. Gostei de meu lapso, tanto que o uso como título. Talvez tenha emergido do inconsciente. Mas, se não sou de esquerda, nada tenho a ver com a tal de direita, hipótese que o maniqueísmo das esquerdas não admite. Deixemos de lado a origem da classificação, oriunda da divisão entre jacobinos e girondinos, que hoje perdeu o sentido e não passa de mera curiosidade histórica. Por esquerdas, entendo os que se proclamam esquerdistas. Se assim se proclamam, que o sejam. Mas que é a direita? Direita, hoje, é quem não aceita os dogmas das esquerdas. São as esquerdas que definem o que seja direita, algo assim como se um desafeto meu resolvesse batizar meu filho. Ora, não tenho razão alguma para aceitar definições ideológicas alheias. Pago a taxa até hoje, mas recuso o epíteto. Há também os que me tacham de ateu, como se ser ateu fosse crime. De fato, sou ateu. Como não vivo em nenhum estado teocrático, não estou cometendo crime algum e devo confessar que não sinto este apodo como taxa. Pelo contrário, o assumo como comenda. Que vivam os ateus, estes seres estóicos que dispensam muletas para enfrentar a intempérie metafísica. A propósito, direita no Brasil de hoje está assumindo um significado ainda mais restrito. Direitista, nestes exatos dias, é quem denuncia a azeitada rede de corrupção do PT, ainda que tal rede venha sendo denunciada por aliados do próprio. O conceito está assumindo novos contornos. Recentemente, fui incluído na "direita que alimenta a tropa do desbunde anaeróbico". Esta não entendi. Ça me dépasse. O jornalismo, desde sempre, teve suas gralhas e falhas, equívocos de nomes e grafias erradas. Gralhas e falhas que subsistem no jornalismo eletrônico. Semana passada, cometi mais uma. Na última crônica, atribuí a Nelson Rodrigues a frase: "o mineiro só é solidário no câncer". E concluí, em função dos dois terroristas mineiros designados para a chefia da Casa Civil, que eram solidários também na estupidez. Pelos mails que recebi, a crônica teve extensa circulação e os cumprimentos choveram na telinha de meu computador. Mas as Alterosas, mesmo endossando os termos da crônica, caíram em cima de mim. Reproduzo parte do protesto mais indignado: "Excelente o artigo do jornalista! Só que as referências infelizes e desairosas - generalizando que "os mineiros são solidários também na estupidez" mexeu com minhas origens, de nossos ilustres e alguns também modestos antepassados, de minha família, de milhares de amigos e seus parentes nascidos nas ALTEROSAS MONTANHAS, ONDE PULSA UM CORAÇÃO DE OURO NUM PEITO DE FERRO de nossos coestaduanos!" Sobrou também para o Nelson Rodrigues: "Peço, sob veemente protesto que ele se retrate das infelizes comparações, partindo ainda de outro suspeito filósofo de grandes aberrações, tão ao gosto dos esquerdinhas que endeusam todo aquele que, nos seus escritos, peças, e todos os meios, buscam desmoralizar a nossa "célula máter" - a família brasileira. Nelson Rodrigues pautou sua "magnífica" obra literária e teatral em explorar o lado podre da família, do relacionamento pais e filhos, expostos nos seus degradantes filmes e peças teatrais, para gozo dos ideólogos do marxismo-leninismo e gramscismo e outros "ismos" dessa desgraça ideologia que tanto mal nos tem feito e onde fincou os pés. Pobre dos cubanos! Minas não pode aceitar tamanha ofensa a seus filhos. Estupidez deve pautar os atos e escritos daquele jornalista. Apenas um deslize pode justificar palavras tão insensatas. (...) Não dá para segurar uma justa revolta face à infeliz comparação dos jornalistas Nelson Rodrigues e Janer Cristaldo, uai!" Segue-se um extenso ror de ilustres filhos da terra para comprovar as excelências das Gerais. Perdão mineiros, perdão Nelson. (Que, aliás, foi um ferrenho adversário das esquerdas). "O mineiro só é solidário no câncer" é frase de Otto Lara Resende, mineiro da gema, de São João del-Rei. De tanto ler a frase em Nelson, julguei que fosse de sua autoria. Entre os milhares de leitores da crônica, havia felizmente uma leitora mais perspicaz, que me apontou o erro. Grato, leitora. Quanto à estupidez, eu me referia evidentemente aos dois terroristas mineiros, Zé Dirceu e Dilma Roussef. |
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