¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, maio 30, 2006
 
NOTÍCIAS DA IDADE MÉDIA


Era uma bela tarde do ano da graça de 1385. Sua Santidade o papa Urbano VI passeava inquieto pelos jardins do castelo de Nocera, na Itália. Por mais que aguçasse os ouvidos, não ouvia a música que gostaria de ouvir.

Naquele ano, seis cardeais foram acusados de conspirar contra Sua Santidade. Que, incontinenti, os jogou numa cisterna do castelo em que habitava. A cisterna era tão estreita que o cardeal di Sangro, grande e corpulento, não podia nem mesmo se espichar. Foram aplicados a estes infortunados todos os métodos postos em honra pela Inquisição.

Quando se tratou do cardeal de Veneza, Sua Santidade confiou o trabalho sujo a um antigo pirata, que ele havia nomeado prior da Ordem de São João, na Sicília, com a ordem de aplicar a tortura à vítima até que o papa ouvisse seus berros. O suplício durou desde a manhã até a hora da janta. Durante este tempo, Sua Santidade passeava no jardim, sobre a janela da câmara de tortura, lendo seu breviário em alta voz, de maneira que o som de sua voz lembrasse ao executor as ordens que ele lhe havia dado. Mas foi em vão que o pirata apelou aos recursos da polé e do cavalete. Embora a vítima fosse idosa e enferma, só foi possível extrair dela um único grito: "Cristo sofreu por nós".

segunda-feira, maio 29, 2006
 
BOA PERGUNTA


"Por que, Deus, o senhor permaneceu em silêncio? Como pôde tolerar tudo isso? Onde estava Deus naqueles dias? Por que ficou ele em silêncio? Como pôde ele permitir esse massacre sem fim, esse triunfo do mal?" (Bento XVI, em visita a Auschwitz, na Polônia).

Teremos herege no Vaticano?

domingo, maio 28, 2006
 
QUANDO VERDADE É CRIME


Ao país dos Huyhnhnms ainda não fui. Bem que gostaria de ter ido. Lá não existe a palavra mentira. Se alguém diz algo que não confere com os fatos, diz-se que está dizendo a coisa que não é. Os Huyhnhnms não possuem na sua língua vocábulos para exprimir a verdade ou a mentira. Assim sendo, duvidar e não acreditar o que se ouve dizer é para os Huyhnhnms uma operação de espírito à qual não estão habituados. Quando são obrigados a isso, o espírito sai-lhes por assim dizer fora da órbita natural. Quem nos conta tais peculiaridades é o capitão Lemuel Gulliver.

"Recordo-me até de que, conversando algumas vezes com meu amo a respeito das propriedades da natureza humana - continua Gulliver - tal como existe nas outras partes do mundo, e havia ocasião para lhe falar da mentira e do engano, tinha muito custo em perceber o que lhe queria dizer, porque raciocinava assim: o uso da palavra foi-nos dado para comunicar uns aos outros o que pensamos e para sabermos o que ignoramos.Ora, se se diz a coisa que não é, não se procede conforme a intenção da natureza; faz-se um abusivo uso da palavra; fala-se e não se fala. Falar não é fazer compreender o que se pensa?
"- Ora, quando o senhor faz o que se chama mentir, dá-me a compreender o que não se pensa: em vez de me dizer o que é, não fala, só abre a boca para articular sons vãos, não me tira da ignorância, aumenta-a.
"Tal é a idéia que os Huyhnhnms têm da faculdade de mentir, que nós, homens, possuímos num grau tão perfeito e tão eminente".

Estou falando, é claro, das Viagens de Gulliver, certamente o livro mais sarcástico já escrito sobre a espécie humana. Os Huyhnhnms são cavalos. Neste país vivem também os Yahoos, seres simiescos e vis, semelhantes aos humanos, que costumam subir nas árvores para jogar excrementos nos Huyhnhnms. Os nobres cavalos, ao se defrontarem com Gulliver, o associam imediatamente aos repelentes Yahoos. A cultura e nobreza dos Huyhnhnms impressionou a tal ponto Gulliver que, ao voltar à sua Inglaterra natal, tomou distância de seus familiares e passou a freqüentar sua estrebaria, onde passava longas horas conversando com os cavalos.

Conversar com cavalos não é má idéia, neste nosso país de Yahoos, onde a todo instante lemos e ouvimos "a coisa que não é". Particularmente quando quem fala é um político. A começar pelo chefe da nação, Sua Excelência o Supremo Apedeuta, que consegue o milagre de transmitir, quando fala, onze mentiras em dez frases. A mentira é inerente ao político. Não há como ser eleito sem, pelo menos em algum momento, mentir. É inerente também aos advogados. Assistimos mentiras sórdidas todos os dias, proferidas por ilustres rábulas, vide os casos Richthofen, Pimenta Neves, Marcola. A advogada deste última, sem o menor resquício de pudor, afirma numa CPI que não sabia que seu cliente era líder do PCC. Não há, no entanto, como indignar-se pelo fato de que criminosos confessos mintam, quando mentem o presidente da República, o ministro da Justiça, o ministro da Fazenda, quando mentem os governistas e quando mente a oposição. A mentira se torna saúde e verdade insânia. Mente o pai para o filho, o filho para o pai, mente o marido à mulher e mente a mulher ao marido. Suponho que existam homens no mundo que não mintam para suas mulheres, mas por enquanto só encontrei um.

A própria história nasce da mentira. A lenda é uma mentira que ao final se torna história, dizia Jean Cocteau. A humanidade tem suas bases na mentira religiosa e hoje vivemos os séculos da mentira ideológica. Assim como o medievo teve sua sustentação na mentira eclesial, o século XX foi, de ponta a ponta, uma mentira só, a mentira do comunismo. Para desfraldar a bandeira de uma doutrina assassina, só havia um recurso: mentir. Enquanto milhões de pessoas morriam de fome ou morriam nos campos de "reeducação" na China e na URSS, os jornais do século nos mostravam regimes paradisíacos, que haviam superado todas as contradições da sociedade humana e construído o "homem novo", antiqüíssimo chavão marxista, hoje retomado com ares de novidade por um bronco como Hugo Chávez. Que talvez já nem lembre que este chavão foi bandeira de um assassino recente, Che Guevara, hoje cultuado como santo, graças às mentiras que inundaram o século. "A mentira é um belo crepúsculo que realça cada objeto", escreveu Camus.

Nos dias de hoje, reproduzida pela imprensa, a mentira é tão avassaladora que pode passar por louco quem a nega. Por exemplo, o 14 de maio último, a "segunda-feira do terror" em São Paulo. Não houve terror algum nesta cidade. Se havia alguém aterrorizado eram os policiais, que aliás são pagos para evitar o terror. A mentira do terror percorreu o país e o mundo e quem hoje negar este terror passa por insano. Digamos que os paulistanos tenham ficado apreensivos. Mas apreensão não rende primeira página. Terror vende mais.

A mentira é universal, só não existe no país dos Huyhnhnms. Só podia ser um país mítico, do reino do imaginário. Se é universal, neste Brasil foi promovida a direito inalienável. Durante as CPIs, que são constituídas para chegar-se à verdade, habeas corpus preventivos são concedidos pelo Supremo Tribunal Federal para garantir aos depoentes o direito de mentir. O leitor pode procurar no universo das nações uma Suprema Corte garantindo o sagrado direito de mentir. Não vai encontrar. Se há países em que o prosaico hábito de mentir derruba presidentes, no Brasil é a mentira que os sustenta. A mentira tornou-se institucional.

Assim sendo, não surpreende fato ocorrido no Congresso na semana passada. Em sessão de acareamento no Congresso, o deputado Arnaldo Faria de Sá, disse a Sérgio Weslei dos Santos, um dos advogados do PCC: "Você aprendeu bem com a malandragem, hein". A resposta do advogado foi um límpido momento de verdade em meio a um festival de mentiras: "A gente aprende rápido aqui".

Foi preso e algemado na hora. Cuidado com a língua, leitor! Em país em que a mentira se tornou norma, verdade é crime.

sábado, maio 27, 2006
 
MINISTRO FALSÁRIO MOSTRA AO QUE VEM


Deu na Folha de São Paulo, hoje:


Tarso pede fim do "conceito arcaico" de direito adquirido

O ministro de Relações Institucionais, Tarso Genro, defendeu ontem a "redução drástica de despesas da União, com corte de salários, pensões e aposentadorias como uma medida exemplar" e crucial para que o país consiga crescer a médio prazo. Especializado em direito trabalhista, afirmou que é preciso "remover o conceito arcaico de direito adquirido" e "cassar privilégios para os quais as pessoas não contribuíram".

O ministro, petista de extração maoísta, finalmente mostra ao que vem. Teremos uma democracia sem a instituição do direito adquirido. Mais uma vez o Brasil inova. Do universo entre as nações, resplandece a do Brasil.

sexta-feira, maio 26, 2006
 
PARA A MENTIRA, HABEAS CORPUS
CONTRA A VERDADE, ALGEMAS



Nestes dias em que depoentes comparecem às CPIs sobre a corrupção pátria munidos de habeas corpus que lhes garantem o direito de mentir, falar a verdade é um perigo.

Em sessão de acareamento no Congresso, o deputado Arnaldo Faria de Sá, disse a Sérgio Weslei dos Santos, um dos advogados do PCC: "Você aprendeu bem com a malandragem, hein".

A resposta do advogado foi objetiva: "A gente aprende rápido aqui".

Foi preso e algemado na hora.

 
IDIOSSINCRASIAS


Deu hoje no Estadão:

Diretores da Enron são condenados por 26 crimes

Executivos foram considerados culpados no maior escândalo financeiro da história dos EUA


Um júri popular formado por oito mulheres e quatro homens condenou ontem em Houston, Texas, o fundador e ex-presidente da Enron, Kenneth Lay, e o ex-executivo-chefe, Jeffrey Skilling, por nada menos de 26 crimes federais no episódio que levou à espetacular bancarrota da empresa, no final de 2001. As sentenças serão anunciadas no dia 11 de setembro.

Se não conseguirem reverter ou limitar a decisão com os recursos que seus advogados anunciaram que apresentarão, sob a alegação de que os clientes não poderiam ter um julgamento justo em Houston, a cidade sede da Enron, Lay, de 64 anos, e Skilling, de 52, poderão passar o resto da vida na cadeia. Cada uma das acusações de que foram culpados é punível com até dez anos de prisão.


Cá entre nós, é diferente. Quando a Varig entra em falência, por óbvia gestão temerária, seus funcionários pedem ajuda ao governo. Ou seja, enfiam a mão no bolso do contribuinte. Depois há quem pergunte porque os EUA constituem um país bem sucedido e o Brasil é esta bagunça.

quinta-feira, maio 25, 2006
 
MAS NÃO JÁ!

Passou em brancas nuvens na imprensa brasileira a punição de Sua Santidade Bento XVI ao prelado mexicano Marcial Maciel Dellogado, fundador da Congregação Legionários de Cristo, por abusos sexuais cometidos entre... 1940 e 1960. A legião, estabelecida hoje em 20 países, possui 500 sacerdotes, 2.500 seminaristas, 65.000 membros e doze universidades. A justiça vaticana tarda mas não falha. Se não falha, também não pune. Pois a canônica punição consistiu em convidar o prelado "a uma vida discreta de prece e de penitência" e "a renunciar a todo ministério público". Cadeia, nem pensar.

Se Don Marcial cometeu crimes sexuais entre 1940 e 1960, o leitor já pode deduzir algo a respeito de sua atual idade. Poupo deduções ao leitor. Don Marcial tem hoje 85 anos. Ser condenado a uma vida de prece e penitência aos 85 é punição que até eu quero. Se uma moçoila por milagre me abordar, sempre posso alegar que estou em regime de prece e penitência. Não posso deixar de lembrar Agostinho, o malandro bispo de Hipona: "Senhor, dai-me a castidade. Mas não já!"

terça-feira, maio 23, 2006
 
STÉDILE E MARCOLA


Xico Graciano faz, no Estadão de hoje, o paralelo que impôs após a paralisação de São Paulo. Enfim, uma voz lúcida na imprensa.
http://www.estado.com.br/editorias/2006/05/23/opi-1.93.29.20060523.1.1.xml?

segunda-feira, maio 22, 2006
 
A FARSA DO TOQUE DE RECOLHER


Toque de recolher. Semana do terror. Estas são as manchetes de capas de caderno do Estadão deste último domingo. Para o visitante ou estrangeiro que estiver passando em São Paulo, fica a certeza de que houve um toque de recolher. E que a cidade viveu uma semana de terror. De fato, no prazo de uma semana houve 166 mortes, contados policiais e civis. Ocorre que a média de assassinatos na grande São Paulo, nos fins-de-semana, produz entre 40 e 60 cadáveres. A rigor, todo fim-de-semana é de terror. Se com este terror o paulistano convive bem, não será com um ligeiro pico de mortes que a cidade vai entrar em pânico.

O que houve foi uma cidade esvaziada pela boataria irresponsável. Primeiro, surgiram os indefectíveis motoqueiros avisando o comércio para baixar as cortinas. Consciente ou inconscientemente, a polícia deu boa ajuda à bandidagem, também mandando lojas e restaurantes fecharem. O rádio e a televisão fizeram o resto. Bastou um jornalista da Record dizer: "parece um toque de recolher", e a expressão correu a cidade. No fundo mesmo, quem decretou o toque de recolher não foi nenhuma autoridade constituída, mas a televisão.



Na segunda-feira dita negra, que de negra nada teve, a televisão descarregou imagens dos massacres de sexta-feira, sábado e domingo. O efeito foi assustador. No restaurante, o garçom me avisou que fora decretado toque de recolher na Avenida Paulista. Exagero de jornalista, pensei com meus botões. Ao pagar, fui avisado que o toque de recolher fora estendido a meu bairro, Higienópolis. Bom, aí já era mais grave. Na Angélica, algo estranho na rua. Tráfego nervoso, pessoas com ar de quem vai, não com ar de quem vem. Na altura da praça Buenos Aires, tropeço com duas amigas assustadas, que corriam para seus apartamentos. Me alertaram que estávamos sob toque de recolher e mais: que o toque de recolher fora decretado pelo PCC. "Palhaçada" - resmunguei, e continuei meu caminho despreocupadamente.

Resolvi observar melhor o mundo em torno. Bares, escolas, lojas e shopping fechando. Pelo jeito, era toque de recolher mesmo. Numa rara padaria ainda aberta, uma multidão fazendo fila, abastecendo-se como em tempo de guerra. Cheguei em casa resmungando contra a estupidez de um governo que, impotente ante a bandidagem, resolve decretar toque de recolher para fingir que está fazendo algo. Liguei a televisão, reportagens e entrevistas alarmantes, autoridades descobrindo o óbvio, que é preciso eliminar o uso de celulares por presidiários para acabar com este surto de terror em São Paulo, que naquelas últimas 48 horas já havia feito 86 cadáveres, mais da metade de policiais. Nada sobre toque de recolher. Fui então à Internet. Muito menos.

O mais parecido que encontrei foi uma notícia no Terra. As lojas da rua Teodoro Sampaio, zona oeste de São Paulo, e do Largo 13 de Maio, na zona sul, estavam de portas fechadas. Segundo os lojistas, a ordem de fechar as portas viera dos policiais que atuavam na região. Com o alarmismo do rádio e da televisão, o boato espalhou-se na cidade e as empresas começaram a liberar seus funcionários. Os ônibus deixaram de circular, as paradas ficaram lotadas de gente amedrontada com pressa de voltar para casa. O trânsito triplicou e atingiu engarrafamentos típicos de sexta-feira. As linhas de celulares congestionaram e os aparelhos ficaram mudos.

Nestes dias em que o PCC resolveu mostrar quem manda na cidade, se alguém ficou preocupado foram as autoridades. O paulistano ficou apenas apreensivo, afinal se nem a polícia tem mais segurança, com que segurança posso contar eu, cidadão comum? Num Estado que não dá garantias mínimas de segurança ao cidadão, crime já não é crime, mas fatalidade. Marcola, o delinqüente tido como líder dos ataques à polícia, em uma conversa com um delegado, foi claro: "Eu posso entrar numa delegacia e matar um policial, mas um policial não pode entrar na cadeia e me matar, pois é obrigação do Estado me proteger".

Por trás de seu repto, está a tranqüilidade de um criminoso com salvo-conduto das ONGs e entidades dos tais de Direitos Humanos, mais a cumplicidade de políticos e a leniência dos juízes. Sabe que, ao melhor arranhão que sofrer, podem cair até secretários de Segurança, isso se não tiverem de enfrentar júri. Quanto a policiais, ele pode mandar matar à vontade. Nenhuma entidade de direitos humanos denunciará a morte de policiais.

O paulistano convive bem com o medo. Quem ainda não aprendeu a conviver com o medo foi a polícia. Para partilhar seu pânico, sem ordem judicial alguma, constrangeu comerciantes a fechar suas lojas. Para honra e glória da bandidagem, São Paulo parou.

A segunda-feira foi pintada como um dia de terror. Em verdade, foi o dia do grande fiasco. São Paulo foi paralisada por boatos, nada mais que boatos. A imprensa mostrou multidões fugindo para abrigar-se em casa. Ora, uma vez fechados bares, lojas, shoppings, escolas, não há nada melhor a fazer senão voltar para casa. Os paulistanos, acovardados pelo sensacionalismo de rádios e TVs, conferiram ao PCC um poder que o grupo criminoso não tem, o de paralisar uma cidade de dezoito milhões de habitantes. São Paulo exagera. O terror sequer começou. Teremos terror quando começarem a explodir os primeiros carros-bomba. Quando chegar este dia, o PCC terá então de fato poder sobre a cidade.

Por enquanto, o poder do PCC se exerce em outras instâncias, junto às autoridades. Ao decidir negociar com o Senhor da Guerra, o tal de Marcola, Estado e polícia renderam-se vilmente à bandidagem. Quando o Senhor da Guerra ameaçou o delegado dizendo que poderia entrar numa delegacia e matar um policial, o delegado, com o rabo entre as pernas, engoliu a ameaça.

Não bastasse a arrogância do marginal todo-poderoso, o porta-voz do PCC, advogado Anselmo Neves, proferiu nova ameaça. Que se o governo estadual não acolhesse as reivindicações da facção e não abrandasse o rigor do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), a tensão aumentaria nos próximos dias. Atemorizadas, as autoridades foram voando - literalmente - até a cela do Marcola. O Estado, humildemente, negociou um cessar-fogo com o criminoso responsável pelas matanças. Com um simples telefonema, o Senhor da Guerra encerrou um conflito que duzentos mil homens armados não conseguiram controlar.

Que podemos esperar nos próximos anos? À menor reivindicação não satisfeita dos presidiários, nova onda de matanças. Marcola está no melhor lugar em que poderia estar: em uma cela de alta segurança, protegido por centenas de policiais. Estivesse comandando a batalha no campo de batalha, correria o risco de ser ferido e mesmo morto. Encarcerado, não corre risco algum.

O Estado rendeu-se vergonhosamente. O PCC foi vitorioso em toda extensão. O que não é de espantar. Se uns comandam o crime a partir de um cárcere de São Paulo, outros comandam o crime a partir de um ministério em Brasília. Que se pode esperar de um país que teve recentemente como chefe da Casa Civil um terrorista treinado em Cuba e como ministro da Fazenda um chefe de quadrilha? E que hoje tem como ministra de Minas e Energia uma ex-assaltante de bancos e como ministro da Justiça um criminalista que fez fortuna defendendo narcotraficantes? Não dispondo da máquina estatal para roubar, Marcola faz o que pode a partir de seu cárcere.

Cláudio Lembo, o governador de São Paulo, negou com veemência a negociação óbvia: a violência só acabou depois que o Estado enviou interlocutores para parlamentar com o Senhor da Guerra. Não bastasse mentir à população, o governador teve arroubos de um Farrakhan inspirado por Lênin, ao responsabilizar a "minoria branca perversa", a "burguesia má", pela criminalidade. Esta mesma burguesia má que paga a uma faxineira o dobro do que o Estado paga a uma professora. O Explicador-Geral da República, Tarso Genro, acusou o governador de preferir negociar com o PCC do que aceitar a ajuda oferecida pelo governo federal. Tem toda razão o Explicador-Geral. O PT tem muito mais experiência quando se trata de negociar, vide as absolvições dos deputados mensaleiros.

Já o Supremo Apedeuta considerou que as ações do PCC eram decorrência da falta de investimentos na educação: "Na hora que você não investe em uma escola, você vai ter de investir depois em uma cadeia". Vai ver que a quadrilha montada pelo PT em Brasília só existiu porque faltou escola ao José Dirceu, José Genoíno, Antônio Palocci, Delúbio Soares, Silvinho Pereira, Duda Mendonça, Marcos Valério e demais quadrilheiros.

Que se espera para entregar um ministério ao Marcola? Este pelo menos não brinca em serviço.

sábado, maio 20, 2006
 
BRASIL FAZ ESCOLA


Já passou no Senado brasileiro - e espera aprovação na Câmara de Deputados - um monstrengo jurídico, de autoria do senador Paulo Paim, o projeto de lei n° 3.198/2000, também chamado de Estatuto da Igualdade Racial. "Para efeito deste Estatuto, consideram-se afro-brasileiros as pessoas que se classificam como tais e/ou como negros, pretos, pardos ou definição análoga" - diz o projeto. Estipula também que os negros, a partir da aprovação do mesmo, farão constar sua raça em documentos de identidade.

Consta que uma lei aprovada ontem no Parlamento iraniano obrigará os judeus que vivem no Irã a usar uma listra amarela costurada em suas roupas. Os cristãos usarão uma listra vermelha e os zoroastristas uma listra azul.

Se procede a notícia, honra e glória a este Brasil que, com seus futuros negros de carteirinha, já começa a fazer escola até mesmo no Oriente.

domingo, maio 14, 2006
 
CLOTILDE



Lembras, Clotilde, daquele guri boca suja e sem respeito que fugia para o chircal quando chegavam visitas? E que só voltava do mato para exibir aos visitantes - especialmente se eram moças - seu vasto repertório de nomes feios? Eu já não lembro muito dele. Entre aquela época e hoje se passaram mais de trinta anos, que dão a impressão de trezentos. Mas sei que lembras dele melhor do que eu.

Me dá teu braço. Vamos passear pelos campos de Ponche Verde e Upamaruty. Rever a sanga onde pesquei minhas primeiras joaninhas. Os mundéus para onde mangueei perdizes. A sombra da parreira onde me ensinaste as primeiras letras. A cacimba em que me debrucei para beber a água gelada do manancial. Vamos passear em silêncio, não sou de muito falar. Sabes que no campo não se admite intimidades entre pais e filhos. Se hoje tenho a coragem de te falar, decerto é porque estou longe.

Olhando paras trás, tudo me parece sonho. Lembras de quando escarafunchavas meus pés arrancando rosetas e espinhos de tala e coronilha? Sinto saudades daqueles espinhos. Aquele cascão grosso que protegia meus pés é hoje uma pele fina, sensível até mesmo a grãos de areia. Forçado pelas convenções, ao pôr sapatos me sinto um pouco como cavalo ferrado. Mas a cidade assim o exige.

Me passa um mate. Vamos sentar na frente da Casa, ao lado da pedra onde Canário afiava facas e tesouras. Enquanto o sol vai caindo e as sombras avançam, como fantasmas tristes coxilha arriba, vamos corujar a primeira estrela, ouvir a canção dos grilos, ver as ovelhas se aprochegando em fila para o abrigo de uma canhada.

Não sei se imaginaste alguma vez as andanças futuras daquele guri xucro. Eu jamais imaginaria. Se, naquela época, me dissessem que há um país onde o sol não se põe, eu insultaria o mentiroso. E não é que um dia fui parar lá? E à meia-noite o sol ameaçava esconder-se, mas era só ameaça, continuava rodando quase paralelo ao horizonte.

Lembro de ti muitas vezes atrelando o tordilho à aranha. Li há algumas semanas, num jornal, a queixa de umas professoras rurais que tinham de ir à escola a cavalo. Gente boba, não é? Durante trinta anos, alfabetizaste duas gerações, graças ao tordilho. E nunca ouvi de ti queixa alguma.

Devo ter sido bom aluno, não é verdade? Uma das coisas que lembro muito foi daquele quinto ano primário. Tirei o primeiro lugar da aula. Foi barbada. Pra começar, só tinha dois alunos, eu e a Chica. Como viriam fiscais da cidade para os exames, e a turma não estava bem preparada, as professoras nos deram a prova num domingo, para decorar em casa. Não sou ruim de memória, respondi tudo em dois minutos.

Lembras da professora que pulou o alambrado atrás de nós, quando a aranha já descia o lançante da coxilha? "Espera, pára, o teu filho é um gênio, tens de mandar esse guri pra cidade". Pois é! Mandaste o geninho pra cidade. Lá já foi mais difícil continuar sendo o primeiro da classe. As professoras jamais deram a alguém as provas antes do dia do exame. Resultado: no fim do ano, um monte de reprovações. Por isso que o ensino moderno anda em crise.

Mais um chimarrão antes de a gente terminar este passeio! Já está ficando tarde, tenho de voltar ao presente. Só há um lugar no mundo para onde sempre volto com o coração aos pulos: Ponche Verde. Qualquer dia estarei de novo aí. Não é por meu gosto que vivo nos povoados. Sabes, já faz alguns anos que não dou uma boa galopada nem vejo um nascer de sol. Há muito não ouço um galo cantar nem vejo galinhas ciscando o pátio depois de uma chuva. Já nem sei se formigas de asa existem ou são lenda. Esqueci o gosto de um tatu assado na casca. Bebo um leite de sabor desagradável que nada mais tem a ver com um apojo quentinho.

Virei bicho da cidade, mãe. Mas qualquer dia desses, o diabo sai de trás da porta, ato a mala nos tentos e me mando à la cria!

sábado, maio 13, 2006
 
USP SEMPRE NA VANGUARDA



Em minha passagem pelo curso de Letras,em Florianópolis, vi que o magistério pode não levar a nada, mas implica mordomias nada desprezíveis. Bolsas no Exterior, congressos literários, intercâmbio universitário. Isto é, turismo à la farta, boa gastronomia, vida sexual mais diversificada que na província. Tudo isto às custas do contribuinte. Denunciei amplamente na imprensa esta corrupção na Universidade Federal de Santa Catarina, que eu chamava de UFSCTUR, a mais barata e confortável agência de turismo do país. Um congresso de Literatura Comparada, por exemplo, ao reunir entusiastas do comparatismo de universidades do mundo todo, faz a festa da hotelaria, restauração, agências de turismo e até mesmo companhias aéreas. Para facilitar as coisas, a UFSC instalou uma agência de turismo no prédio da Reitoria.

A USP vai mais longe. Pioneira na interpretação do Zeitgeist tupiniquim, a universidade paulista vai instalar em sua Cidade Universitária não uma mera agência de turismo, mas um hotel com 150 vagas e um centro de convenções. A idéia do hotel - segundo a Folha de São Paulo - surgiu para atender à demanda de professores, visitantes e conferencistas que passam pela universidade e para atender as empresas instaladas no eixo da marginal Pinheiros. Serão 120 apartamentos de 21 m2 e 30 suítes, com diárias girando em torno de R$ 100, com a possibilidade de uma expansão para mais 80 a cem vagas, de acordo com a procura.

Além disso, o projeto prevê restaurantes e um serviço básico de hotel destinado a executivos em viagem. "Foi apresentado um modelo de hotel de categoria econômica, como de categoria três estrelas", afirmou o arquiteto da USP Sérgio Luiz de Assumpção.

O que é - a meu ver - uma falha do projeto. Professores, visitantes, conferencistas, congressistas, coloquiarcas, simposiarcas et caterva adoram mordomias. Faz parte da vida universitária. Se é para inovar, que se inove com requinte: hotéis cinco estrelas para os bravos acadêmicos. De qualquer forma, a USP parece ter interpretado a verdadeira vocação da universidade brasileira. Responsável pela disseminação tardia de uma doutrina fadada ao fracasso do século XIX , o marxismo, a USP continua sempre pioneira.

quinta-feira, maio 11, 2006
 
UMA FATWA CATÓLICA


Segundo o jornal indiano Hindustan Times, o Fórum Social Católico da Índia ofereceu uma recompensa de quase U$ 25 mil para quem capturar o escritor Dan Brown, autor de O Código da Vinci, vivo ou morto. A fatwa católica constrangerá o Ocidente a tomar a defesa de um vulgar autor de bestsellers.

terça-feira, maio 09, 2006
 
A SAGA DO GRANDE COMPUTADOR


A Saga do Grande Computador, de Olof Johanesson, pseudônimo literário de Hannes Alfvén, astrofísico sueco, prêmio Nobel de Física em 1970, inaugura a entrada do computador na literatura de antecipação, com todas as suas conseqüências para o futuro da sociedade humana.

É minha última tradução do sueco e está disponível em vários formatos em http://www.ebooksbrasil.org/nacionais/index.html#saga

 
MANCINI ACEITA MAFIOSOS


O restaurante Famiglia Mancini é uma das glórias gastronômicas de São Paulo. Em horas de almoço, normalmente tem filas de uma a duas horas, o que faz com que dele me afaste. Mas é uma das casas que escolho quando recebo amigos e amigas de outras cidades ou países. Busco um horário de menos demanda e contorno o inconveniente das filas. Comentário de um amigo francês, amante da bonaxira, após um almoço no Mancini: "On peut survivre au Brésil".

É pena que ultimamente o Mancini aceite a freqüência de mafiosos. Há dois domingos, um grupo de deputados quadrilheiros petistas, liderados por Professor Luizinho, expulsou clientes do restaurante com a truculência típica dos militantes petistas. Em vez de proibir a entrada de marginais, a direção do Mancini orientou-os a silenciar sobre o assunto.

Outro marginal habitué do oásis da rua Avanhandava, o ex-deputado José Genoino, já foi xingado por um freqüentador. Não há almoço que caia bem, nem vinho que possa ser degustado com prazer, quando estamos ao lado de um delinqüente. Outro dia, em meu boteco de fins-de-semana, tive o desprazer de ver sentado numa mesa ao lado, o advogado Luis Eduardo Greenhalgh, defensor incondicional dos capi da máfia petista.

Está ficando desagradável almoçar em São Paulo. Pelo menos enquanto delinqüentes permanecem em liberdade. O ex-capo José Genoíno teve pelo menos um segundo de humildade. Sem insultar os fregueses, como fez o tal de Professor Luizinho, pediu a conta e foi embora sem concluir o lauto almoço, merecido pelos serviços prestados à Máfia.

segunda-feira, maio 08, 2006
 
ATÉ LÁ, MORREU O NEVES!



A justiça brasileira foi implacável na semana passada. O Tribunal Regional Federal condenou o ex-senador Luiz Estevão de Oliveira, os empresários Fábio Monteiro de Barros e José Eduardo Corrêa Teixeira Ferraz, sócios da construtora Incal, e o juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto a um total de 115 anos de prisão, pelo desvio de verbas na construção do Fórum Trabalhista de São Paulo. Os indigitados réus foram também condenados a mais de R$ 5 milhões em multas. Verdade que, considerando-se um desvio de R$ 169,5 milhões, o investimento destes senhores teve uma rentabilidade extraordinária, fora do alcance dos comuns mortais.

O juiz Nicolau, mais conhecido na imprensa por Lalau, já condenado a 22 anos, recebeu mais 26 anos de reclusão. O ex-senador Estevão foi condenado a 31 anos de prisão: 9 anos e 4 meses pelo crime de peculato-desvio; 8 anos por estelionato qualificado; 8 anos e 8 meses por corrupção ativa; 2 anos e 6 meses por documento falso e, igualmente, 2 anos e 6 meses por formação de quadrilha. O empresário Fábio Monteiro de Barros também recebeu penas semelhantes às de Estevão, no total de 31 anos de prisão. José Eduardo Teixeira Ferraz foi condenado a 27 anos e oito meses.

Nesta mesma semana, Antonio Marcos Pimenta Neves, ex-diretor de redação do Estadão, assassino frio e confesso da jornalista Sandra Gomide, editora de Economia do mesmo jornal, no dia 20 de agosto de 2000, foi condenado pelo tribunal do júri a dezenove anos, dois meses e doze dias de prisão. Jornalista senil, não conseguindo mais exercer o direito de pernada sobre uma subordinada, preferiu matá-la. Por unanimidade, o júri considerou o jornalista culpado de crime qualificado, o que o torna sujeito à Lei de Crimes Hediondos, que prevê o cumprimento integral da pena em regime integralmente fechado. Entre o crime e a decisão do júri, decorreram cinco anos, oito meses e quinze dias. O assassino, confesso, passou a maior parte deste tempo em liberdade.

Dura lex sed lex. Finalmente o martelo da justiça abate os poderosos, estará imaginando o cidadão desavisado. Em sua inocência, este cidadão deve estar supondo que o senador, o juiz, os empresários e o jornalista estão encerrados no cárcere a que foram condenados. Acontece que estamos neste Brasil, onde o Supremo Tribunal Federal considera que criminosos devem responder a processo em liberdade, enquanto não forem esgotados os recursos a que têm direito. A situação do Lalau, 78 anos, não muda em nada. Já cumpria - e continuará cumprindo - prisão domiciliar, por problemas de saúde e de idade. A situação dos demais condenados no escândalo da construção do Fórum tampouco. Continuarão esperando o julgamento dos recursos.

Idem, Pimenta Neves, que já tem 69 anos e se aproxima da idade confortável da impunidade. A defesa vai apresentar recurso ao Tribunal de Justiça e o novo julgamento deve demorar pelo menos mais dois anos. Segundo o ex-juiz Luiz Flávio Gomes, que acompanha o caso, "até lá, Pimenta terá 70 anos e, se ficar comprovado que está doente, poderá ficar em prisão domiciliar mesmo condenado em definitivo". Considerando-se que cada instância demora cerca de três a cinco anos para julgar um recurso, o leitor já pode ter uma idéia muito precisa de quando estes senhores olharão o mundo por trás das grades: nunca.

Há alguns anos, o Estadão publicou artigo de uma ativista internacional que propunha a absolvição coletiva de todos os assassinos responsáveis pelo genocídio ocorrido em Ruanda, em 1994. Os criminosos eram tantos, de tão difícil identificação - alegava a generosa articulista - que qualquer processo se tornava impossível. No Brasil, parece que estamos rumando a esta solução proposta para Ruanda, embora os criminosos não sejam tantos e sejam perfeitamente identificáveis.

O segredo da impunidade? Advogados caros e safados, que jamais discutem o mérito da questão, atendo-se aos arabescos colaterais do direito adjetivo. A persistir esta tendência do Judiciário, teremos uma privilegiada elite de megatérios, todos devidamente condenados pelo rigor das leis e gozando das delícias de suas posses, em meio à afável companhia de amigos e parentes. Com uma pequena restrição, a de não poder viajar ou sair de casa. Mas idade provecta é idade de ficar em casa mesmo. Principalmente quando lei alguma impede a entrada de bons vinhos e champanhes, boa trufa e bom caviar.

Cada vez que comento esta malandragem perfeitamente aceita nos tribunais, não resisto a citar Swift, que já no século XVIII via este recurso tão usual no século XXI. Em As Viagens de Gulliver, escreve o deão, a propósito da hipotética disputa de uma vaca:

- Ao defender uma causa,os advogados evitam cuidadosamente entrar no mérito da questão. Mas são estrondosos, violentos e enfadonhos no discorrer sobre todas as circunstâncias que não vêm a pêlo. Por exemplo, no sobredito caso, não querem saber quais ou direitos ou títulos que tem o meu adversário à minha vaca, mas se a dita vaca era vermelha ou preta, se tinha os chifres curtos ou compridos, se o campo em que eu a apascentava era redondo ou quadrado, se era ordenhada dentro ou fora da casa, a que doenças estava sujeita, e assim por diante. Depois disso, consultam os precedentes, adiam a causa de tempos a tempos e chegam, dez, vinte ou trinta anos depois, a uma conclusão qualquer. (...) por maneira que são precisos trinta anos para decidir se o campo, que me legaram há seis gerações os meus antepassados, pertence a mim ou pertence a um estranho que mora a seis milhas de distância.

Enquanto isso, o ex-motorista e ex-mecânico Marcos Mariano da Silva, 57, conseguiu também na semana passada pensão indenizatória no valor de R$ 1.200 por mês, a partir de junho. A indenização foi concedida pelos dezenove anos em que esteve preso injustamente no Recife, acusado de homicídio. Foi preso por uma questão de homonímia: o criminoso se chamava Marcos Mariano Silva. Neste período, o outro Mariano perdeu sua frota de seis táxis, sua oficina, sua mulher e suas dez filhas. Não bastassem estas perdas todas, perdeu também a visão.

Dezenove anos de vida foram roubados deste pobre coitado, como também sua família e seus olhos. Mariano não teve a chance de ter advogado caro. Luiz Inácio Lula da Silva hoje recebe R$ 4.294 mensais, por ter passado ... 31 dias na cadeia. O investimento do Supremo Apedeuta nada deixa a invejar ao investimento do Lalau e seus comparsas.

Gente fina é outra coisa. Dez, vinte, trinta anos depois..., como diz Swift. Até lá, morreu o Neves. Terão morrido também o Lalau, o Luiz Estevão, o Monteiro de Barros e o Teixeira Ferraz. Morrerão condenados, mas terão vivido até seus últimos dias como passarinhos em gaiolas douradas.

É preciso terminar com essa lenda de que o crime não compensa. As novas gerações estão arriscando perder uma velhice confortável, melhor que qualquer aposentadoria, caso continuem a acreditar nessas potocas.

sexta-feira, maio 05, 2006
 
OPUS DEI PROMOVE DAN BROWN


Leio no noticiário on line:


Londres, 5 mai (EFE).- Um grupo de católicos do Reino Unido, entre eles membros da Opus Dei, vai combater as supostas falsidades do romance O Código Da Vinci, de Dan Brown, cuja adaptação para o cinema estréia este mês. Em comunicado emitido hoje, o Grupo de Resposta ao Código Da Vinci explica que sua missão é defender a Igreja Católica das críticas que recebe no livro de Brown, que já vendeu 40 milhões de exemplares no mundo todo.

A Opus Dei está se candidatando a substituir o Index Prohibitorum, catálogo de livros proibidos pelo Vaticano, hoje desativado. Sempre foi uma honra para um autor constar dessa listagem, que constituía excelente promoção para sua obra. Mas o Vaticano tinha critérios, sempre escolhia os melhores autores. Entre outros, Copérnico, Galileu, Maquiavel, Erasmo, Espinosa, Locke, Diderot, Pascal, Sterne, Heine, Alexandre Dumas (o pai e o filho), Voltaire, Swift, Daniel Defoe, Thomas Hobbes, Descartes, Rousseau, Vítor Hugo, Zola, Stendhal, Flaubert, Montesquieu, David Hume, Kant, Renan, Anatole France, Balzac, Papini.

A Opus Dei está promovendo um escritor medíocre.

quinta-feira, maio 04, 2006
 
RATOS ABANDONAM BARCO


O ator Carlos Vereza deu entrevista ontem no programa do Jô Soares, onde apressou-se a vomitar indignação contra Lula e o PT. Partindo de quem parte, um velho militante de esquerda, suas invectivas são alvissareiras. Quando os ratos começam a abandonar o barco, é porque pressentem naufrágio.

Bom também ouvir que a palavra apedeuta está chegando à televisão.

 
A ARROGÂNCIA DE MEZAN



Desde muito jovem, abominei a psicanálise. Sempre defendi a tese de que psicanálise é fé, religião, vigarice, tudo menos ciência. O que me levou a ser submetido, em um concurso público, a uma junta psicanalítica. Velha tese dos psicanalhas: quem contesta a psicanálise é porque precisa de psicanálise.

Nestes dias em que Freud passou a ser uma espécie de escroque religioso - do qual derivaram várias seitas - o psicanalista Renato Mezan, nas páginas amarelas de Veja, pretende que Freud não morreu, mas continua presente em toda a psicologia e também na cultura. Melhor faria se dissesse que continua presente em uma cultura daquela classe média que gosta de pagar caro pelo que não entende. Há vigarices em que só caem pessoas cultas. O marxismo é uma delas, a psicanálise é outra. Analfabeto algum cairá nesses contos do vigário. Tais vigarices intelectuais só encontram fortuna em países subdesenvolvidos, que seguem a reboque de crendices pseudocientíficas oriundas da Europa.

Tentando explicar por que no mundo árabe a psicanálise não tem muito futuro, Mezan diz que "nos países islâmicos é mais complicado, não porque os muçulmanos não tenham inconsciente. O fato é que um xiita em crise dificilmente procuraria um analista. É mais provável que ele procurasse um líder religioso".

Ou seja: nós, que abominamos a psicanálise, somos comparados a fanáticos muçulmanos que jamais procurariam um analista, mas sim um líder religioso. Em parte, Mezan tem razão. Psicanálise, como religião, não passa de uma muleta metafísica, um placebo para enfrentar o desconforto - pelo menos para os fracos de espírito - de existir.

Poucas pessoas sabem que psicanálise não é profissão regulamentada por lei. Na França, para efeitos de imposto de renda, os psicanalistas são equiparados - e com sobejas razões - a astrólogos, videntes e quiromantes. Desconheço país em que psicanálise seja profissão regulamentada. Nem os psicanalistas têm interesse na regulamentação, pois as igrejas são várias e nenhuma quer ceder terreno às rivais.

Se o leitor estiver em crise financeira e quiser de algum modo ser bem remunerado sem ter especialização alguma, pode colocar em seu endereço uma placa de psicanalista. Lei alguma o proíbe de fazer isto. Não precisa nem mesmo ter curso superior. Aliás, juridicamente, não precisa ter curso nenhum. É preciso, é claro, adquirir um certo linguajar esotérico, para melhor enganar os pobres de espírito.

Adquirido este linguajar, prepare-se para exercer poder sobre seus semelhantes, gozar de prestígio intelectual e usufruir de altas rendas. Nunca foi tão fácil enganar multidões.

terça-feira, maio 02, 2006
 
FAVOR PASTAR NO CAMPUS


Quando preciso de um médico, sempre procuro informar-me se ele fez pós-graduação nos Estados Unidos ou na Europa. Por precaução. De longa experiência, sei que o médico formado nos Estados Unidos provavelmente vai querer cortar-me o álcool e fará sérias objeções à carne vermelha. Se se formou na Europa - particularmente na Espanha ou França - terá perfeita consciência de que um bom vinho ou um bom cochinillo fazem parte do bem viver.

Sempre vi algo de místico nestes senhores que abominam carne vermelha. Muitos transitam na área do budismo, superstição que tem como pressuposto a reencarnação. Nada de matar seres vivos, como se o homem pudesse hoje estar vivo se não tivesse se alimentado a vida toda de seres vivos. São pessoas que não gostaria ter a meu lado em uma viagem. Se um almoço já constitui problema, imagine uma viagem. Mas já encontrei solução para conviver com estes místicos, as cantinas italianas: eu como o cordeiro, eles a massa da guarnição.

Místicos também são, a meu ver, estes senhores que empunham a redução da camada de ozônio querendo induzir-nos a uma vida materialmente mais pobre. Basta um glaciar diminuir um quilômetro nos pólos e já sentem o planeta ameaçado. Seus argumentos, que dependem de conhecimentos multidisciplinares, são mais confusos que os dogmas da Igreja Católica. Mas nunca falta um chofer de táxi que, do alto de sua sapiência, explique convictamente que o verão quente em São Paulo se deve ao derretimento das calotas.

Há uma conspiração - e das mais ferozes - contra a carne vermelha no mundo. Não hesito em afirmar que a conspiração tem suas raízes no puritanismo ianque, são sempre de lá que vêm as restrições ao melhor da gastronomia. Quarta-feira passada, dois geofísicos professores da Universidade de Chicago alertaram os adeptos da carne vermelha que o aumento de sua flatulência contribui para os gases estufa.

Era só o que faltava! Os místicos do efeito estufa marchando lado a lado dos zen-budistas. A escola dos Unidos contra o Prazer avança. Ecochatos unidos jamais serão vencidos. Por favor, senhores professores, vão pastar no campus. Pastem e ruminem e não pretendam responsabilizar os carnívoros pelo Armagedon. Ainda há pouco, cientistas australianos estudavam uma vacina para reduzir as flatulências bovinas e ovinas, que seriam em parte responsáveis pelo efeito estufa. Agora, o apocalipse chegará através de nós, cultores de uma boa picanha. O pum primevo, que inaugurou o processo de derretimento das calotas, terá sido emitido por aquele nosso ancestral que, tendo descoberto o fogo e já cansado do steak tartar, resolveu assar uma costeleta de javali.

Em meus dias de Madri, fiz memoráveis almoços no Comidas Naturales, antigo restaurante da calle San Bernardo. Lá, tudo era natural. Tanto o boi como o cordeiro, o javali ou o coelho, todos eram naturais. Nada era de plástico. Foi minha homenagem máxima ao meio ambiente.

Last but not least, cuidado ao escolher um médico.