¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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quarta-feira, setembro 30, 2009
 
FOLHA PUBLICA DEPUTADO
COMUNISTA E MENTIROSO



O deputado federal Aldo Rebelo (PC do B-SP), presidente do Grupo Parlamentar Brasil-China, ex-presidente da Câmara dos Deputados e ex-ministro da Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais, celebrou hoje na Folha de São Paulo os 60 anos da revolução chinesa, que serão comemorados amanhã.

Segundo o velho comunista, a revolução “mudou a história dessa grande nação asiática e influencia de forma decisiva as estratégias geopolíticas e econômicas da atualidade. Hoje, a contribuição da China para o crescimento mundial é superior à dos EUA e sua economia é considerada mais aberta que a do Japão pelos padrões internacionais. E, se podemos dizer que a China de economia agrária corresponde a um país de passado remoto, vale dizer também que a China dos produtos de baixo valor agregado já pertence ao passado recente, uma vez que se amplia a presença de mercadorias de alta tecnologia na pauta de exportações chinesas”.

E prossegue: “O que chama a atenção na revolução chinesa de 1949 é o fato de a construção da nova China ter se dado sobre base econômica extremamente atrasada, o que tornou desafios e conquistas ainda mais surpreendentes. Nos anos que precederam a conquista do poder pelo Partido Comunista, a atividade industrial moderna representava 10% da produção nacional, contra 90% da agricultura e da indústria artesanal. Era uma base "pobre e inexpressiva", como costumam definir os próprios chineses. A reforma agrária posta em marcha pelo governo revolucionário golpeou a estrutura feudal e dos senhores da guerra e liberou a força produtiva de 300 milhões de camponeses, que puderam ter acesso à terra e dedicar-se com entusiasmo à produção”.

Não bastasse isto, continua: “O Estado aboliu oficialmente atividades consideradas degradantes, como a dos eunucos e a das concubinas, e desenvolveu campanha contra o comércio e o uso do ópio. Em 1952, a produção industrial chinesa já havia aumentado 77,6% em relação a 1949, ano da revolução. Os salários dos trabalhadores tiveram ganho de 70%, e a renda dos agricultores, um aumento de 30% em relação ao período anterior”.

Só esqueceu um pequeno detalhe. O Livro Negro do Comunismo debita a Mao 65 milhões de cadáveres em tempos de paz. Em Mao, a História Desconhecida, de Jung Chang e Jon Halliday, os autores falam em 70 milhões. 65 ou 70, não se tem notícia na História de homem que, sozinho, tenha matado tanto. Entre 58 e 61, no Grande Salto para a Frente, 28 milhões de chineses morreram de fome. Segundo Jung Chang, foi a maior epidemia de fome do século XX - e de toda história registrada da humanidade. A China produzia carne e grãos, mas Mao exportava estes produtos para a União Soviética, em troca de armas e tecnologia nuclear. Segundo o Grande Timoneiro, como era chamado Mao, as pessoas "não estavam sem comida o ano todo - apenas seis ou quatro meses".

Aldo Rebelo é uma flor de eufemismos quando fala do Grande Salto: “A partir daí, a China conheceu uma fase de turbulências marcada por dois movimentos: o primeiro, o Grande Salto à Frente, de caráter voluntarista, buscava alcançar resultados econômicos acima das possibilidades reais e das condições do país. A economia chinesa declinou rapidamente por três anos consecutivos, e o povo viu-se ante grandes dificuldades”. Como militante comunista, informações não lhe hão de faltar. Omitiu acintosamente os 28 milhões de chineses que morreram de fome durante o Grande Salto.

Para Mao, morrer fazia parte da vida. Era preciso que as pessoas partissem para dar lugar às que chegavam. Claro que jamais lhe ocorreu perguntar se alguma pessoa aceita partir antes do devido tempo. "Vamos considerar quantas pessoas morreriam se irrompesse uma guerra - diz Mao -. Há 2,7 bilhões de pessoas no mundo. Um terço poderia se perder; ou um pouco mais, poderia ser a metade. Eu digo que, levando em conta a situação extrema, metade morre, metade fica viva, mas o imperialismo seria arrasado e o mundo inteiro se tornaria socialista."

A partir de 1953, foi imposto o confisco em todo o país, a fim de extrair mais alimentos para financiar o Programa de Superpotência. A estratégia era simples: deixar para a população apenas o suficiente para que permanecesse viva e tomar todo o resto. Segundo Chang, Mao via vantagem práticas nas mortes em massa. "As mortes trazem benefícios", disse em 1958. "Elas podem fertilizar o solo". Os camponeses receberam ordens para plantar sobre os túmulos. Usar luto foi proibido e até mesmo derramar lágrimas, pois segundo Mao a morte deveria ser celebrada.

O homem que brilha sobre o Leste – este é o significado de Tse Tung - não se contentou em matar e torturar. Procurou também humilhar a inteligência. Em 1966, durante o Grande Expurgo, fez arrastar e maltratar professores e funcionários da universidade de Pequim diante da multidão. "Seus rostos foram pintados de preto e puseram chapéus de burros em suas cabeças. Forçaram-nos a ajoelhar-se, alguns foram espancados e as mulheres foram sexualmente molestadas. Episódios semelhantes se repetiram em toda a China, provocando uma cascata de suicídios."

Os Guardas Vermelhos invadiram casas onde queimaram livros, cortaram pinturas, pisotearam discos e instrumentos musicais - conta-nos Yung Chang - destruindo tudo em geral que tivesse a ver com cultura. Confiscaram objetos valiosos e espancaram seus donos. Ataques sangrentos a residências varreram a China, fato que o Diário do Povo saudou como "simplesmente esplêndido". Muitos dos que sofreram os ataques foram torturados até a morte em seus lares. Alguns foram levados para câmaras de tortura improvisadas em antigos cinemas, teatros e estádios. Guardas Vermelhos vagando pelas ruas, fogueiras de destruição e gritos das vítimas: esses eram os sons e as cenas das noites do verão de 1966.

Que um tirano mate, isto nada tem de original. Faz parte de sua estratégia para manter-se no poder. O que mais me causa espécie em Mao foi um episódio de seu regime que bem demonstra a insanidade de homens que se atribuem poderes absolutos. Sigo ainda o relato de Yung Chang. "Um dia, Mao teve a brilhante idéia de que uma boa maneira de manter os alimentos seguros era se livrar dos pardais, pois eles comiam grãos. Então designou esses passarinhos como uma das Quatro Pragas que deveriam ser eliminadas, junto com ratos, mosquitos e moscas, e mobilizou toda a população para sacudir paus e vassouras e fazer uma algazarra gigantesca, a fim de assustar os pardais e impedi-los de pousar, de tal modo que eles cairiam de fadiga, seriam capturados e mortos pelas multidões".

Vi certa vez um documentário sobre esta insânia. Milhares de chineses perseguiam pardais por ruas, árvores e telhados, businando, batendo latas e tambores. Que Mao matasse, até que se entende. O mais difícil de entender é ver um líder levando milhões de chineses a matar pássaros... no grito. O problema é que estes pássaros, além de comer grãos, eliminavam muitas pragas, "e não é preciso dizer que muitas outras aves morreram na farra da matança. Pragas que eram mantidas sob controle pelos pardais e outros pássaros floresceram, com resultados catastróficos. Os argumentos dos cientistas de que o equilíbrio ecológico seria afetado foram ignorados".

Resultado da Grande Matança de Pardais: o governo chinês acabou pedindo, em nome do internacionalismo socialista, que os russos enviassem 200 mil pardais do leste da União Soviética assim que possível. E durante anos houve quem cultuasse no mundo todo - e principalmente entre nós - como salvador da humanidade, este assassino ridículo.

A Folha de São Paulo – jornal onde gostei de trabalhar – já não é mais o que era. Além de dar colunas a um senador corrupto, a um deputado corrupto e a um jornalista bolsa-ditadura, publica hoje esta excrescência de um deputado comunista e mentiroso.

O que não deixa de ser uma redundância. Ou alguém conhece algum comunista que não seja mentiroso?

terça-feira, setembro 29, 2009
 
AMBIENTALISTAS SENSATOS? ONDE?

Prezado Janer,

O homem destrói muito a natureza, e isso é fato! Quando o Sr. insiste em provocar os ambientalistas acredito que não perceba que ataca a todos, os sensatos e os não sensatos. É uma guerra burra. Temos que nos desenvolver enquanto nação, sem nos descuidarmos de ações que protejam ao meio ambiente. Sinceramente, acho essa discussão sem um propósito claro e bem definido.

E olha, esse é o primeiro tema no qual divergimos muito. Entendo sua posição. É clara e bem definida. Porém, acho que ajudaria muito mais com idéias pra recuperar o Meio Ambiente, para daqui cem anos ainda exista o Planeta Terra.

Atenciosamente
Jean Rodrigo Pituco


Que o homem destrói a natureza é óbvio, Pituco. Como expandir-se sem ocupar espaços? Quantos milhares de quilômetros quadrados de floresta destroem uma grande cidade? Poderia o homem viver sem suas megalópoles? Vamos devolver São Paulo à Mata Atlântica? Ou quem sabe aos selvagens que aqui habitavam?

Todo ser vivo destrói algo para viver. Não há espécie viva que viva sem a morte de outra. Qualquer rancho toma algum espaço da natureza. Imagine milhões de moradias, umas sobre as outras, ocupando milhares de quilômetros. Onde o homem se instala, tem de dar um chega-pra-lá pra natureza.

Animais também. Búfalos, elefantes, leões ou tigres, matam e devastam territórios para sobreviver. Quantos milhões de peixes uma baleia engole por ano? Quantos milhões de espécies menores engolem os peixes que a baleia engole? Quantos milhões de microorganismos morrem quando uma onda bate na praia? Vida é luta pela vida, meu caro. Só o homem não pode lutar pela sua? Um dos poucos animais que contribui com algo é, paradoxalmente, o urubu, que pelo menos limpa a superfície do planeta.

Nunca ataquei ambientalistas sensatos. Ataco esses vivaldinos que ganham gordas verbas de ONGs internacionais para brandir bagres e bugres, micos e curiós, gralhas e pererecas contra a construção de barragens, usinas e rodovias, essenciais ao desenvolvimento do país. São todos ecologistas, denunciam a poluição derivada dos automóveis, mas nenhum deles renuncia a seu carro. A filosofia é: “todos os carros poluem, menos o meu”. Eu, que não me pretendo ecologista, nunca tive carro e para essa poluição jamais contribui.

Mas onde estão os tais de ambientalistas sensatos? Se existem, não os ouço. Só leio nos jornais pronunciamentos de malucos querendo barrar barragens em nome de micos ou passarinhos. O ofício rende muita grana e turismo. Há anos, comentei o absurdo de tentar se proibir uma represa no Paraná em nome de um tal de macuquinho-do-banhado. De um leitor paranaense, recebi este depoimento:

"Felizmente, para Curitiba, o macuquinho só serviu mesmo para atrasar um pouco as obras da Barragem do Iraí, que já a mesma está concluída e em operação. Mas que foi uma picaretagem das grossas, foi. Depois, descobriu-se que o tal passarinho, além de não sofrer qualquer ameaça, é também muito comum, pelo menos nos campos de Paraná e Mato Grosso do Sul. O resultado, além de render viagens aos EUA para os ornitólogos e elevá-los ao cargo de consultores (se bem me recordo, foram a Washington expor o caso ao banco financiador) só serviu mesmo para atrasar a obra e, acredito que isto deve tê-los deixado felizes, diminuir o lucro do malvado do empreiteiro que a executou”.

Por outro lado, jamais vi ambientalistas condenando a proliferação de favelas, que inundam mares, rios e esgotos com seus dejetos. Favelado pode poluir à vontade. Morador de rua – essa nova condição de cidadania criada pela Igreja Católica – também. Rua também é meio ambiente. Mas seus “moradores” podem sujá-las à vontade, que nenhum ambientalista irá reclamar. Quem não pode poluir é o capital que serve para dar melhores condições de vida ao país. Os ecologistas hoje são o novo disfarce das viúvas do Kremlin, que encontraram uma bandeira nova para lutar contra o antigo inimigo, o capitalismo.

Ainda hoje, leio no Estadão, que um helicóptero da Prefeitura de Santo André flagrou um pedreiro construindo uma casa às margens da represa Billings, área de preservação e recuperação de mananciais. Um pedreiro? Uma casa? Há mais de três mil construções irregulares de moradias, de comércio e de outros usos em áreas cuja proibição para construir está prevista em lei. Recente projeto, a Lei da Billings, vai regularizar 200 mil imóveis localizados às margens do manancial que abastece 1,6 milhão de pessoas na região metropolitana de São Paulo.

Onde estão os ambientalistas sensatos, que não os ouço? O que tenho ouvido na imprensa são vigaristas a serviço de empresas internacionais, em geral ianques ou britânicas, muito bem pagos, que não admitem a hipótese de um Brasil desenvolvido.

segunda-feira, setembro 28, 2009
 
HÁ ALGO DE PODRE NA
SECRETARIA DO VERDE



Enquanto nestes dias os judeus praticam um galinocídio, os vegans insistem em sua campanha da segunda sem carne. Pelo jeito, matar galinhas para expiar os pecados da raça pode. O que não pode é comer carne. É espantoso como jornais de prestígio assumem, talvez por ímpetos de algum redator alucinado, bobagens que ofendem a inteligência dos leitores. Ou de alguns leitores, porque leitor, afinal, não é sinônimo de inteligência. No Estadão de hoje, lemos uma seqüência da campanha estúpida da Segunda sem Carne, que será lançada no Parque do Ibirapuera no próximo sábado.

Lidar com números é uma das melhores fórmulas de mentir. Filipe Vilicic, o redator, pergunta: ‘Sabia que a indústria da pecuária é responsável por 18% das emissões globais de gases causadores do efeito estufa e por 80% do desmatamento do bioma amazônico? E que para produzir um quilo de carne são gastos 15 mil litros de água? Esses são três dos argumentos usados pela Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB) para convencer as pessoas a abandonar o consumo desse tipo de alimento”.

Mas em que dados se baseia a afirmativa de que a indústria da pecuária é responsável por 18% das emissões globais de gases causadores do efeito estufa e por 80% do desmatamento do bioma amazônico? De que para produzir um quilo de carne são gastos 15 mil litros de água? Isto o jornal não explica. É questão de fé. Você acredita ou não acredita. Continua a reportagem:

“São justificativas que estão por trás da nova campanha desse grupo, a Segunda sem Carne. O movimento tenta convencer carnívoros a se tornarem vegetarianos ao menos uma vez por semana. 'Além de preservar a natureza, essa atitude é benéfica para a saúde, porque previne, por exemplo, diabete e problemas cardiovasculares', prega a socióloga Marly Winckler, presidente da SVB e "vegan" há 14 anos (o tipo de vegetariano mais radical, que não come ovos, não toma leite nem usa roupas de lã ou de seda). 'O ideal seria que deixassem de consumir qualquer derivado de animais todos os dias. Mas adotar esse hábito na segunda já é um começo', acrescenta".

Desde quando socióloga vegan é autoridade para falar de medicina? Desde quando abstenção de carne preveniu diabetes ou problemas cardiovasculares? No fundo, a questão é religiosa. Não por acaso, nos destaques da campanha, há palestras sobre ioga e shivaísmo. Que é o shivaísmo? É uma derivação do hinduísmo, que consiste em ensinamentos transmitidos em diálogos entre Shiva e sua mulher, Shakti, chamada de Parvati, Durga ou Kali. Shiva é o Imutável e Shakti seu poder de criação, proteção e transformação.

Após o evento do próximo sábado, a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente pretende divulgar o projeto em escolas, empresas, bares, restaurantes, mercados e consultórios de médicos e nutricionistas. Os empresários que aderirem assinarão um termo em que se comprometem a incentivar seus funcionários a reduzir o consumo de carne.

Mas que temos nós a ver com Shiva, Shakti, Parvati, Durga ou Kali? Que temos a ver com âgamas e tantras? Ao que tudo indica, um grupo de mascadores de vegetais tomou posse de uma secretaria da Prefeitura e agora pretende impor aos paulistanos o hábito de pastar. Não bastasse a Igreja de Roma proibir o consumo de carne às sextas-feiras, agora fanáticos budistas querem proibi-la nas segundas-feiras. Ironicamente em um país onde para boa parte da população o consumo de carne é utopia.

Nada contra vegetarianos, já disse. Que cada um coma o que quiser. Mas pretender impor o vegetarianismo através de uma secretária municipal é abuso de poder religioso. Não bastasse a ditadura do Vaticano, que bem ou mal exerce sua influência neste país inculto, impõe-se agora aos paulistanos um autoritarismo oriundo do Oriente.

Há algo de podre na Secretaria do Verde. Para bem celebrar a campanha, fui hoje a um restaurante francês na Vilaboim, o bistrô Le Vin, onde regalei-me com um boeuf bourguignon.

domingo, setembro 27, 2009
 
AS KAPAROT, O GALINOCÍDIO JUDEU


Começa amanhã o Yom Kippur, o dia mais santo e solene do calendário judeu, em língua nossa o Grande Perdão, fixado no 19 Tichri, ponto culminante dos dez dias de penitência que começam no Rosh Hashaná, literalmente “cabeça do ano”. A propósito, foi um dia de sufoco para mim. Meu bairro é fundamentalmente judeu. No Rosh Hashaná, fui até meu provedor de vinhos, que também fornece comidas e bebidas kasher. Nossa! Filas imensas, toda a judiada se provendo dos alimentos e vinhos permissíveis à raça. Tive de esperar na fila por uma boa meia hora para comprar meus vinhos profanos.

Segundo meu Dictionnaire Encyclopédique du Judaïsme, a importância deste dia e a fonte de seu ritual provêm dos mandamentos bíblicos de fazer propiciação e de humilhar-se. A humilhação de si mesmo era interpretada pelos sábios como a abstinência de comida e bebida. A propiciação implica três atos que, em conjunto, devem aliviar do fardo do pecado: reconhecer suas transgressões, declarar seu arrependimento por um processo de confissão e depois fazer sua expiação ante Deus para obter o perdão.

Mas atenção: os rabinos insistem sobre o fato que o Yom Kippur permite ao homem de expiar seus pecados contra Deus, mas não os cometidos contra seu próximo. (Por próximo, entenda-se um outro judeu. Goy não conta). Sem pedir perdão a quem foi ofendido, a expiação não tem efeito e ninguém deve cometer transgressões esperando que seus pecados lhe sejam perdoados nesse dia. Até aí, nada demais. Mas que têm a ver as galinhas com isto?

Nos tempos bíblicos, havia o Azazel, lugar no deserto para o qual era enviado pelo Grande Sacerdote um entre dois bodes, durante o Yom Kippur celebrado no templo de Jerusalém. Este bode devia portar consigo todos os pecados de Israel, daí o conceito de bode expiatório. Nenhum dos dois bodes tinha alguma chance. Um era sacrificado e o outro enviado a Azazel, onde seria morto. Tudo muito confortável: você peca e debita seus pecados ao bode. Segundo os sábios do Talmude, a lei de Azazel pertence à categoria dos houqquim, as leis que o intelecto humano não pode compreender.

Mas Israel um dia abandonou o deserto e invadiu as urbes do Ocidente. Como não é fácil criar bodes na cidades, sobrou para os galináceos. Nas vésperas do Yom Kippur, todo judeu adulto deve pegar pelo pescoço uma galinha (para as mulheres) ou um galo (para os homens), girar a ave três vezes em torno à sua cabeça, dizendo: “Esta é minha expiação, esta é minha redenção, esta é minha substituição. Este galo (esta galinha) será morta, enquanto eu terei uma vida longa e feliz”. Logo após degola-se a ave que é dada aos pobres, a menos que seu valor seja dado a uma obra de caridade. Para uma mulher grávida, sacrifica-se um galo e uma galinha. As entranhas são jogadas aos pássaros, o que também é considerado uma obra de caridade. Os pecados do penitente são assim transferidos simbolicamente à ave, salvando o judeu de um eventual julgamento negativo no Yom Kippur. A galinha, que nada tinha a ver com o peixe, faz o papel do bode.

As kaparot, assim se chama esta cerimônia, sempre observada nos meios ortodoxos. Embora tenha sido combatida por numerosas autoridades, que a consideravam pagã e supersticiosa, hoje tem o aval dos rabinos, que consideram ser bem melhor do que expiar seus pecados diretamente: a cerimônia permite que neles se reflita e que deles se possa arrepender sinceramente. Sem dúvida alguma é bem melhor. Azar das galinhas.

Em geral, atribuímos os sacrifícios sanguinolentos de animais a bárbaros como africanos, em seus cultos animistas, ou aos árabes, durante a Eid al-Adha, a Festa do Sacrifício, quando milhões de animais são degolados, enquanto os peregrinos começam o apedrejamento do diabo em Meca.

Nestes dias, em pleno século XXI, os judeus, cosmopolitas e supostamente civilizados, continuam matando inocentes galinhas para purgar seus pecados.

sábado, setembro 26, 2009
 
ECOLOGISTA BEM QUE PODERIA
COMEÇAR DANDO UM EXEMPLO


Existem malucos para tudo neste mundo, não é verdade? O leitor Kenyo Rossas me envia um documento extraordinário, uma entrevista com Les U Knight, o ecologista que quer varrer a vida humana da face da terra, fundador, líder e mentor teórico da ONG Voluntary Human Extinction Movement. Segundo este senhor, nosso planeta está à beira do fim e a única maneira de salvá-lo é extinguindo a raça humana. De acordo com ele, depois de poluir o ar, envenenar rios, abrir buracos na camada de ozono, condenar populações inteiras à fome e à pobreza, o mínimo que a Humanidade poderia fazer era ter a decência de abandonar o barco e deixar este pedaço de rocha flutuante para a sua verdadeira dona: a Mãe Natureza. Reproduzo alguns trechos de uma entrevista sua.

- Acha realmente que a vida animal e os vegetais são tão importantes ao ponto de justificar a extinção da raça humana?
- Num ecossistema equilibrado todas as espécies são importantes e nenhuma é melhor que a outra. De uma forma geral, quanto mais alta a posição que uma espécie ocupa na cadeia alimentar menos ela importante ela é para aquele sistema. O homem já não faz mais parte da cadeia alimentar. Por outro lado, as bactérias presentes nos intestinos dos seres vivos são importantíssimas para a sobrevivência de toda a biosfera terrestre. Se levarmos isso em conta, chegaremos à conclusão que o homem vale menos do que uma bactéria.

- Então a raça humana não tem valor algum?
- Nós só temos valor para as pessoas com quem nos relacionamos. Mas, para a natureza e o ecossistema, nós não fazemos a menor falta.

- Nem se levarmos em conta o legado cultural e intelectual da humanidade?
- Talvez as traças achem os nossos livros um tanto quanto deliciosos, mas eu creio que elas não vão saber diferenciar o Pablo Neruda das Seleções do Reader's Digest. Pegue a maior criação literária já feita pelo homem e compare com qualquer forma de vida, mesmo a mais insignificante, e me diga: qual delas possui mais beleza, complexidade e potencial?


E por aí vai. Leitor do Reader’s Digest desde criança, consigo diferenciar muito bem a revista dos poemas de Neruda. O Reader’s Digest, apesar de medíocre, é muito mais interessante que o poeta chileno. Quanto a extinguir a raça humana, o fato é que se esta raça for extinta, não sobrará ninguém para dela sentir falta. Só o homem tem consciência de que existe. As demais espécies existem sem sequer saber que existem. Só o homem faz História e escreve História. Os bugres, por exemplo, ainda não chegaram lá. Eu não afirmaria incondicionalmente que o homem é um ser angelical. A humanidade produziu degenerados como Josué, o patriarca bíblico, Átila, Timur Leng – Timur, o Coxo, mais conhecido como Tamerlão -, Maomé, Hitler, Lenin, Stalin, Mao, Pol Pot. Mas também teve seus momentos sublimes, como Sócrates, Alexandre, Cervantes, Dante, Schliemann, Champollion, Fernão de Magalhães, Mozart, Vivaldi, Scriabin e tantos outros.

Estes arautos da extinção da espécie humana são uma decorrência lógica desses movimentos ecológicos histéricos, que interditam estradas e barragens em nome de bagres e bugres, curiós, micos e pererecas. Mais importante que o ser humano são os seres incientes que jamais conseguiram escapar de sua condição animal. Não nego inteligência aos animais. Mas é uma inteligência limitada, que não consegue construir uma civilização. Tanto o joão-de-barro como o jacu são habilíssimos na construção de seus ninhos. Mas não conseguem ir adiante. O mesmo diga-se dos castores ou ratões-do-banhado. E de todas as demais espécies. Até mesmo os vírus são inteligentíssimos, tanto que não é fácil derrotá-los. Mas só ao homem foi dada – ou adquirida – a consciência de que existe.

Interrogado sobre quantas pessoas fazem parte de seu movimento, Knight acha que seis bilhões e 50 milhões. “Na verdade eu falo isso porque é impossível dizer quantas pessoas já devem ter chegado a conclusão de que o mundo seria melhor sem a raça humana. Mas, baseado na quantidade de pessoas que entram em contacto comigo, posso dizer que temos por volta de uns três milhões de pessoas interessadas no nosso movimento. São pessoas que, embora não sejam membros da nossa organização e não tenham uma militância, apóiam as nossas ideias e gostariam de ver os nossos objectivos alcançados”.

A meu ver, não é tarefa impossível alcançar tais objetivos. Os militantes do Voluntary Human Extinction Movement bem que poderiam começar se extinguindo a si mesmos. Não sem antes entronizar como salvadores do universo esses beneméritos como Hitler, Mao, Stalin, Pol Pot, Fidel Castro, responsáveis por fantásticas contribuições à extinção dessa espécie daninha que assola o planeta.

“A extinção humana e a melhor saída para a Humanidade. A partir do momento que pararmos de procriar as brigas por territórios e recursos naturais irão cessar. Poderemos, inclusive, experimentar um período de saúde, felicidade e abundância de recursos a partir do momento em que formos desaparecendo da face da Terra. É a sociedade utópica com a qual temos sonhado desde que o homem passou a dominar este planeta”.

Que sociedade, cara pálida? Sem ser humano não existe sociedade. Existem bandos e – à la limite – tribos. Esse est percipi, já dizia Berkeley. Ser é ser percebido. Um planeta, sem quem o perceba, não existe. “Condenar alguém a viver neste mundo é como vender passagens para um navio que está afundando”, diz Knight. Grande descoberta. A vida é um navio que afunda. Mas enquanto não afunda, sempre podemos celebrá-la. É o que chamo de confraternização no naufrágio. Enquanto o barco navega, sempre podemos comer, beber, amar, trocar idéias, construir nações, filosofias, fazer história, literatura, música, arte. O que este bobalhão não entendeu é que o homem se extingue naturalmente, não precisa de nenhum estímulo para isso.

Se permanece como espécie é bom que assim seja, ou não teríamos ninguém para admirar este universo desprovido de humanidade que o celerado propõe.

sexta-feira, setembro 25, 2009
 
COMIDAS NATURALES


Pois, meu caro Augusto,

há uma evidente conspiração internacional contra a carne vermelha. Pelo jeito, vem do Norte e pretende condenar o Sul. Quase todas as restrições à carne vermelha, pelo que leio, têm suas fontes nos Estados Unidos. Logo aquele país em que metade ou mais da metade da população é obesa ou tem sobrepeso, de tanto beber refrigerantes ou comer em Mcdonalds.

Pero no pasarán.

Não tenho nada contra vegetarianos, até já convivi com alguns deles. Lembro que, nos tempos de universidade em Porto Alegre, uma menina conseguiu levar-me a um restaurante herbívoro. Comi umas gororobas esquisitas. Se não me falha a memória, cada bocado tinha de ser mastigado quarenta vezes. Em torno a mim, comensais esquálidos e pálidos ruminavam lentamente aqueles pastos, quais bois no campo, enquanto ela me fazia uma preleção sobre comida ying e comida yang. Fiz alguma piada sobre o assunto e quase levei um prato em pleno rosto, agora não lembro se de ying ou se de yang. A moça optara pelo budismo e considerava um crime comer subprodutos de seres vivos. Saí de lá faminto. Fui direto ao Chalé da Praça XV e me regalei com um suculento filé.

Vez que outra, surge uma vegetariana em minha vida. Falo assim no feminino, porque em geral são mulheres. Varões, somos mais omnívoros. A solução é buscar um restaurante italiano, onde além de carnes há pastas e pizzas. As restrições a alimentos de modo geral têm origens religiosas. Judeus e muçulmanos, por exemplo, se proíbem da carne suína. Tant pis pour eux! Jamais conhecerão as delícias de um cochinillo. Os judeus vão mais longe. Não comem nem mesmo frutos do mar. Das carnes bovinas, não comem a picanha.

E por quê? Porque lá no Gênesis, Jacó lutou contra um homem – ou contra um anjo, segundo algumas versões, ou contra o próprio Deus segundo outras – e seu adversário, ao ver que não prevalecia contra ele, tocou-lhe a juntura da coxa, e se deslocou a juntura da coxa de Jacó. “Por isso os filhos de Israel não comem até o dia de hoje o nervo do quadril, que está sobre a juntura da coxa, porquanto o homem tocou a juntura da coxa de Jacó no nervo do quadril”.

Quanto aos vermelhos, eles até podem detestar os produtores rurais. Está no DNA dos comunistas abominar o capital. Mas não desdenham a bona-chira. Já contei mas conto de novo. Em meus dias de Paris, eu tinha um amigo gaúcho, médico cheio da grana e comunista, que seguidamente passava por lá. Chamava-se Walter Simm e já morreu. Convidava-me para restaurantes caros nos quais, na condição de estudante, eu não tinha muito como ir. Que não me inquietasse, ele pagava tudo. Degustamos gigots e filés, steaks tartar e boeufs bourguignons, sem preocupação nenhuma com o efeito estufa. Naqueles dias, ainda não fora descoberto o novo apocalipse. Assim, foi graças a um defensor incondicional do proletariado que conheci a mais sofisticada cozinha francesa. A meu ver, como bom militante devotado à causa, ele pesquisava qual seria a cozinha ideal à qual um dia os affamés de la terre teriam acesso. Se você quiser conhecer os melhores restaurantes do mundo, consulte um comunista.

O que me espanta em tudo isto, repito, é ver uma secretaria de município assumir uma filosofia oriental e propor aos munícipes uma dieta vegetariana. Isso é impor princípios religiosos em um país que se pretende laico. Minha restrição a tal medida não é pessoal. Eu até que gosto de comidas naturais. Em meus dias de Madri, freqüentei muito um restaurante chamado Comidas Naturales. Lá tudo era natural, tanto o boi como o porco ou o cordeiro.

Nada contra.

 
OS VERDES E VERMELHOS
CONTRA CARNE VERMELHA



De Augusto Oliveira, recebo:

Olá, Janer

No assunto carne, tenho que agradecer, você faz melhor do que muitos representantes de classe que não sabem defender o produto que vendem. Uns dois meses atrás na Veja saiu uma matéria muito boa acho que o título era: "Vaca, a melhor amiga do homem". Mas os vegans sao insistentes. Vou te mandar um texto que mostra bem como o consumo de carne foi importante no nosso desenvolvimento:

http://meavels.blogspot.com/2008/07/o-que-aconteceria-se-o-homem-fosse.html

Vagando pela net encontrei as informações que resumi abaixo:

Diversos estudos mostram a correlação entre o ferro e o zinco na capacidade de cognição, ou seja, na inteligência. A carne vermelha é uma das fontes mais ricas e que apresentam maior biodisponibilidade nesses dois minerais.

Um trabalho com 544 garotos realizado ao longo de dois anos por cientistas do Serviço de Pesquisa Agrícola do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos concluiu o seguinte: aquelas que comiam carne vermelha cresciam mais e apresentavam melhor desempenho escolar quando comparadas com a meninada vegetariana.

O consumo de carne, como vimos, foi primordial na evolução de nossa espécie e ainda é fundamental no bom desenvolvimento dos indivíduos. A carne vermelha, entretanto, é especialmente mais mal-vista, ou difamada, do que a carne branca. Qual a razão da coloração avermelhada? Devido ao maior índice de mioglobina contida nela. A mioglobina é uma proteína que serve como reserva de oxigênio, e que possui Ferro na sua estrutura molecular.

A carne é vermelha essencialmente por isso. Ou seja, é mais nutritiva. Quanto à atual perseguição já escrevi a respeito também:

Nas páginas amarelas da Veja passada uma ambientalista declarou algo como 20% do efeito estufa é causado pela produção de carne vermelha e quem tem consciência ecológica deve diminuir o consumo de carne. Ai minha picanha, minha ponta de costela, lá vem eles de novo.

Não sei qual a acurácia desse dado que ela colocou, se for igual à história de que um quilo de carne para ser produzido consome 15 mil litros de água, então dá licença, é uma mentira, é uma besteirada pura. Vamos fazer uma conta simples da recria nesse caso dos 15 mil litros de água:

Engorda bovina média anual: 120 quilos de peso vivo = 62,5 quilos de carcaça = 48 quilos de carne. Consumo médio de água anual: 35 litros dia = 12775 litros ano. Portanto: 12775 litros/ 48 quilos de carne= 266 litros pra cada quilo de carne produzida.

Isto sem falar na reciclagem de água pela urina, transpiração, excrementos, etc. Quem chamou atenção pra esta reciclagem foi o Xico Graziano, se depender dos representantes de classe - da CNA que arrecada milhões anuais dos produtores - a carne, a soja e todos os produtos rurais podem ser vilipendiados à vontade, embora a Kátia Abreu esteja mudando um pouco isso agora. A falta de um midia watch nesse caso é de dar nojo. (...) O que acontece é que a pecuária, pelas suas caracteristícas, é uma atividade desbravadora, então os verdinhos detestam ela, assim como os vermelhinhos detestam os produtores rurais. Pronto! Juntou a fome com a vontade de comer.

quinta-feira, setembro 24, 2009
 
BOLCHE DESMENTE BOLCHE


Uma mentira, quando envolve vários mentirosos, tem de ser bem combinada. Ou então acontece o que está acontecendo. Interrogado pela Folha de São Paulo se foi Hugo Chávez quem planejou a volta de Zelaya a Honduras, diz o assessor internacional da Presidência, Marco Aurélio Garcia:

- Não acredito. Escuta, um sujeito que foi presidente da República, que tem o prestígio que ele tem em Honduras... Pela madrugada! Se não tiver esquema, é melhor ficar em casa. Ele certamente tem um esquema suficientemente forte para mobilizar pelo menos metade dos hondurenhos. Que esquema teria o Chávez? Não, não, isso foi obra dos próprios hondurenhos.

O repórter da Folha insiste: não é difícil de acreditar que o Zelaya fez tudo sozinho, chegou lá, bateu na porta da embaixada e foi entrando? Garcia não abre mão de sua tese:
- Zelaya é muito mais esperto do que alguns querem fazer pensar, com muita independência, com muita personalidade.

Hoje mesmo, Hugo Chávez sentiu necessidade de desmentir seu fanzoca incondicional. Em reportagem do Estadão, o presidente venezuelano afirma que "sabia de tudo" sobre a volta do presidente deposto de Honduras ao país e, mais ainda, afirmou ter ajudado a "despistar" as autoridades sobre o paradeiro de Zelaya, enquanto o hondurenho realizava a viagem de retorno a Honduras. Para ajudá-lo, Chávez disse ter telefonado para o hondurenho em um telefone que estaria grampeado. "Eu liguei, como sei que estão nos gravando por satélite, e disse: Zelaya, nos vemos em Nova York".

Ainda segundo o jornal, uma fonte da chancelaria da Venezuela confirmou à BBC Brasil que era um avião venezuelano que transportava Zelaya. De El Salvador, segundo Chávez, Zelaya teria entrado em Honduras "por terra" dentro do porta-malas de um carro, acompanhado por outros três homens.

Como fica o assessor internacional da Presidência, desmentido pelo próprio parceiro que defende? A mentira sempre foi uma segunda natureza nos comunistas, disto todos sabemos. Garcia deve ter saudades daqueles bons tempos em que os camaradas eram bem mais unidos. A mentira era previamente combinada e bolche não desmentia bolche. Os tempos mudaram.

 
IMPRENSA FAZ CORO COM
AS VIÚVAS DO KREMLIN



Da França, recebo:

Caro Janer,

vendo de longe, daqui da França, o que me parece é que houve uma tremenda barriga da imprensa e dos governos nesta questão (excetuando, claro, os bolivarianos e outros mal-intencionados de sempre, acho que não preciso nomeá-los). Guiando-se unicamente pelo fato de que o Exército de Honduras protagonizou o movimento, imprensa e governos acusaram um golpe de estado no pais, quando o que aparentemente houve foi que se seguiu o rito constitucional: um presidente que desrespeitou a Constituição do seu pais foi legalmente deposto, como não poderia ser diferente. Agora não querem assumir que se precipitaram, fazer o "mea culpa", e se for preciso uma guerra civil para dizerem, no final, que estavam certos desde o princípio (mas continuarão errados, evidentemente), oras, que venha a guerra civil!

Obama é uma figura patética, é um individuo que a cada dia demonstra mais e mais despreparo para o cargo que ocupa. Depois de oito anos de Bush, era tudo de que os EUA não precisavam. Agora só falta eles elegerem a Sarah Palin em 2012 pra acabar de vez com o país.

Um abraço,

Roberto Veiga


Meu caro Roberto:

Não consigo acreditar em barriga. Jornalista sabe ler e os fatos eram claros desde o início. A meu ver, foi o pronunciamento desastrado de Obama que orientou a imprensa. Obama, apesar de alguma queda em popularidade, ainda goza da condição de salvador do mundo e os jornalistas não ousaram contestar o Messias.

Por outro lado, numa época em que não dá mais para segurar Castro nem Kim Il Sung, as esquerdas precisam de outros gurus. Seguem então Chávez e Morales. Não por acaso, os quatro presidenciáveis no Brasil para 2010 são de extração marxista. O eleitor terá de escolher entre seis e meia dúzia.

Que o jornalismo brasileiro tenha afinado com este coral, até que se entende. No Brasil um fato histórico só é assimilado uns dez ou mais anos depois de acontecido, principalmente se este fato põe em xeque os dogmas das esquerdas.

O que me espanta é que a imprensa européia ainda faça coro com as viúvas do Kremlin.

quarta-feira, setembro 23, 2009
 
O NOVO MANDALETE DE OBAMA
APÓIA ESCÓRIA DO CONTINENTE



Há três meses, escrevi:

“Um presidente que quer reeleger-se propõe um plebiscito para permitir sua reeleição. O plebiscito é considerado ilegal pela Suprema Corte de seu país. É uma das cláusulas pétreas de sua Constituição. O Congresso aprova uma lei que impede a realização de consultas populares 180 dias antes e depois das eleições. O presidente ignora a lei e a decisão da Suprema Corte e mantém o plebiscito. A Suprema Corte ordena que o Exército destitua o presidente do país. Em defesa da Constituição, do Congresso e da Suprema Corte, o Exército o destitui. Dia seguinte, a imprensa internacional toda fala em golpe. Quando Exército rasga a Constituição é golpe. Quando a defende, também é golpe. Não entendi”.

Manuel Zelaya, o presidente de Honduras, legalmente deposto pela Suprema Corte de seu país, está de volta a Tegucigalpa, sob as asas cúmplices da embaixada brasileira. Isto é, por obra de Lula e Celso Amorim, que ninguém é ingênuo para acreditar que Zelaya bateu no portão da embaixada, assim de surpresa, e pediu para entrar. Protegido pela representação diplomática, Zelaya conclama seus partidários à luta armada. Não solicitou o estatuto de exilado político. Sabe que se o solicitar, pelas normas diplomáticas, não pode manifestar-se politicamente. Sua condição é a de um bandoleiro procurado pela Justiça hondurenha, que se refugia em território brasileiro para conclamar seus sequazes a tentar uma guerra civil.

A imprensa internacional, unanimemente, passou a defender o presidente que pretendia dar um golpe branco e colocou na condição de golpistas a Corte Suprema e o Exército que defendem a Constituição. A imprensa brasileira, obviamente, não poderia deixar de fazer coro. Na Folha de São Paulo de hoje, Clóvis Rossi ergue o famoso bracinho do Dr. Strangelove:

“Quando o chanceler Celso Amorim diz que o Brasil não tolerará nenhuma ação contra a sua embaixada em Tegucigalpa está apenas dizendo o óbvio. País algum tolera violações de sua soberania - e não custa lembrar que a embaixada é tecnicamente território brasileiro”.

Esquece Rossi, ou propositadamente omite, que o Brasil está violando a soberania hondurenha, ao dar abrigo a um presidente legalmente deposto e permitir-lhe que conclame os hondurenhos à revolta contra suas instituições.

O Estadão, em editorial, curiosamente fica em cima do muro. O editorialista começa dando razão aos hondurenhos:

“A aparição do deposto presidente hondurenho Manuel Zelaya na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa foi - sem jogo de palavras - um golpe para o regime que se instalou no país em 28 de junho. Na madrugada daquele domingo em que pretendia realizar uma consulta popular considerada ilegal pelo Congresso e pela Justiça, Zelaya foi preso e despachado, ainda de pijama, para a Costa Rica. No dia seguinte, o então presidente do Legislativo, Roberto Micheletti, assumiu o governo. O plebiscito se destinava a abrir caminho a uma mudança constitucional que permitiria a Zelaya disputar um segundo mandato. Refletindo a preocupação dos seus autores com o passado de quarteladas, violência política e perpetuação no poder dos dirigentes de turno, a Constituição hondurenha considera cláusula pétrea o mandato presidencial único. Era, portanto, uma ameaça à democracia instalada no país a manobra chavista de Zelaya, um abastado político de origens conservadoras que, depois de eleito em 2006, se deixou levar pela lábia bolivariana e o petróleo subsidiado do caudilho de Caracas”.

No período seguinte, temendo passar por herege e cedendo à pressão das esquerdas internacionais, o articulista deixa por não dito tudo que disse:

“No entanto, a comunidade interamericana não poderia, a esta altura da história do Hemisfério, resignar-se à violação consumada da Carta Democrática adotada em 2001 pela OEA. A entidade foi coerente com os seus princípios ao condenar de imediato, sem meios tons, o ato de força em Tegucigalpa, repudiado igualmente pela União Europeia e a Assembleia-Geral da ONU. O chamado governo de facto de Roberto Micheletti ficou completamente isolado e assim permanece. Os EUA e organismos internacionais congelaram cerca de US$ 300 milhões em ajuda ao país”.

Uma no cravo e outra na ferradura. O que já é muito para quem antes só batia no cravo. Em suas reportagens, no entanto, o jornal continua chamando de golpistas os hondurenhos que se opuseram ao golpe tentado por Zelaya.

Ontem, em Nova York, Lula, o mais entusiasta mandalete de Obama, foi incisivo: "O que deveria acontecer agora é os golpistas darem um lugar a quem tem direito a este lugar, que é o presidente democraticamente eleito pelo povo".

Deve ter sido acometido mais uma vez de amnésia. Já não lembra que, há 17 anos, ele e seu partido pediram o impeachment de Collor de Mello, presidente democraticamente eleito pelo povo. Se não conseguiram o impeachment, conseguiram a renúncia. Mas tapa de amor não dói. Hoje Collor e Lula estão abraçados na defesa do mais corrupto dos senadores.

Lula tampouco deve lembrar que há onze anos, seu atual ministro da Justiça, após ter derrotadas suas pretensões eleitorais no Rio Grande do Sul, pedia o impeachment de Fernando Henrique Cardoso, presidente também democraticamente eleito pelo povo.

Honduras é que não pode. Zelaya foi eleito com uma plataforma nitidamente de direita e virou a casaca durante seu mandato, tornando-se aliado da escória latinoamericana, Hugo Chávez, Evo Morales e Daniel Ortega. A escória tupiniquim não se furtaria a apoiar a escória amiga do continente.

terça-feira, setembro 22, 2009
 
AÇÚCAR COMO VENENO:
UMA HISTÓRIA ANTIGA
QUE PASSA POR NOVA



Todo jornal deveria ter, em sua redação, um jornalista antigo de plantão. Seria uma espécie de guardião da memória, cuja função seria alertar os jovens de que a América já foi descoberta. Pois não passa dia em um jornal sem que fatos antigos passem por notícia nova. Exemplo disto citei em crônica recente. Jornalista algum lembrou que o projeto de lei de um número de identidade pessoal único, agora aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), já havia sido aprovado em 1996.

A Veja desta semana apresenta como grande novidade o livro Sugar, a Bittersweet History, da historiadora canadense Elizabeth Abbott. Segundo a escritora, o açúcar redesenhou o mapa demográfico, econômico, ambiental, político, cultural e moral do mundo. “Em séculos de tragédia e glória, o açúcar transformou a alimentação do Ocidente, escravizou gerações de africanos nas Américas, foi combustível da Revolução Industrial, promoveu guerras e impérios, dizimou paraísos ecológicos, ergueu e pulverizou fortunas – e, nos trópicos, moldou a identidade brasileira. Movido pela sua energia calórica, o mundo segue girando rápido, tão rápido que estamos agora na soleira de outra mudança vertiginosa: o açúcar começa a ser considerado um vilão da saúde humana, um veneno tão prejudicial que merece ser tratado com o mesmo rigor empregado contra – suprema decadência! – o tabaco. Está mais perto o dia em que um pacote de açúcar trará a inscrição: O Ministério da Saúde adverte: este produto é prejudicial à saúde".

Já comentei o assunto em 1989, no século passado, quando caía o Muro de Berlim. Não que a descoberta fosse minha. Mas de Carson Ritchie, cujo ensaio Food in Civilization - How History Has Been Affected by Human Tastes alerta para os efeitos danosos do açúcar. O livro foi publicado em 1981. Ou seja, há quase três décadas.

Ritchie um dia convidou alguns amigos a um bom restaurante. Jantaram à la farta e tudo transcorreu muito bem, pelo menos até o momento da dolorosa. Ritchie puxou a carteira e nela não encontrou dinheiro suficiente. Teve de apelar aos amigos que convidara para jantar. Passado o episódio, considerou que a história da alimentação em algo se parece com esta anedota: quando chega o momento de pagar o banquete, podemos descobrir que aquilo que desfrutamos custa bem mais do que estávamos dispostos a pagar quando nos sentamos à mesa. Terá sido talvez esta gafe o que deu origem a seu livro.

"O açúcar para adoçar o chá e o café europeu - escreve Ritchie - foi cultivado às custas da escravidão negra. Os peles vermelhas foram expulsos sem piedade das pradarias onde caçavam para que o homem branco pudesse cultivar trigo e milho, e seus búfalos foram exterminados para dar lugar a grandes rebanhos vacuns. Os escritores norte-americanos responsabilizaram as grandes multinacionais fruticultoras pelo caos das economias centro-americanas, construindo ferrovias ilegais, sonegando impostos, manipulando os baixos salários da mão-de-obra não qualificada (já por si suficientemente baixos), expropriando as terras dos camponeses e exaurindo a fertilidade do solo. E tudo isso para que os norte-americanos tivessem bananas como sobremesa!"

Ao debruçar-se sobre os efeitos dos alimentos na História, Ritchie descobre que foram os conceitos errôneos de alimentação e não os corretos, os que demonstraram ter maior influência. "Crenças em que as especiarias aumentavam a virilidade, que o açúcar era essencial para a saúde, ou que para ser forte devia-se beber muita cerveja, condicionaram mais os destinos da humanidade que as autênticas e consolidadas leis da ciência da alimentação".

Mas como convencer minha Cristina de que seu vício não passa de um hidrato de carbono sem nenhum valor alimentício? Se os europeus, para açucarar suas tardes, destruíram homens e culturas, na África e nas ditas Índias Ocidentais, como queixar-me de minha faxineira?

Já vi universitários e professores universitários se lambuzando com sorvetes, que além de açúcar contém algo mais nocivo, o sal. (Isso até que não é tão grave: há universitários que acreditam em Deus). Pior ainda, já vi muitos destes senhores que, por uma questão de ofício possuem, ou deveriam possuir, noções de bem comer, dando sorvetes a seus filhos. Assim sendo, sempre tenho em casa um açucareiro cheio para saciar os instintos primários de Cristina e de eventuais formigas que já descobriram o mapa da mina. Sem falar que, quando o café é forte, tipo exportação, não me furto a ajuntar-lhe uma colherinha de veneno.

Pois este hidrato tão prestigiado, que no fundo só serve para produzir cáries, obesidade e doenças cardíacas, produziu mais estragos na trajetória do ser humano do que o próprio sal, que pelo menos tem a virtude de conservar as carnes, fator aparentemente banal mas decisivo na caminhada do Homo Sapiens, seja rumo ao combate, seja rumo a descobertas. E já fez levas de jovens do mundo todo partirem em revoadas rumo àquela ilha tanto amada por Paulo, Cardeal Arns, para cortar cana em prol da revolução.

Pois a cana-de-açúcar deve ser colhida rapidamente quando madura e Castro, preocupado em seguir as diretrizes de Moscou, mandou para Angola a juventude cubana, onde, em vez de ceifar cana, ceifaram vidas alheias e muitas vezes perderam as suas. Mas Estados Unidos, Europa, América Latina e mesmo o Brasil, pronto supriram a falta de mão-de-obra. Milhares de jovens, que jamais haviam visto de perto um canavial, bravamente acorreram, de machete em punho, em apoio à ditadura cubana.

O açúcar foi introduzido no mundo mediterrâneo por Dario, o rei dos persas, trazido da Índia após suas conquistas por lá. Difundiu-se pela Europa e passou ao Novo Mundo graças aos colonizadores espanhóis. Hernán Cortez introduziu a cana-de-açúcar no México. O Caribe proporcionava ao açúcar o clima mais adequado que seu próprio lugar de origem, a Índia, pois lá chovia muito mais. Acontece que os espanhóis jamais iriam trabalhar se encontrassem alguém que o fizesse por eles.

A tarefa foi delegada, se assim se pode dizer, aos índios caribes e arawaks, culturas que logo foram exterminadas. Tendo de buscar mão-de-obra em outra parte, os colonizadores das "Índias Ocidentais" deram uma piscadela de olhos aos portugueses. Estes, tendo observado que os índios, não se adaptando ao trabalho duro, morriam na colheita de açúcar, os deixaram de lado e foram buscar escravos na África.

"Já que espanhóis e portugueses haviam começado a desenvolver suas plantações de cana com a colaboração dos escravos negros, todos os demais pensaram que tinham de seguir seu exemplo. Se assim não faziam, expunham-se a produzir um açúcar mais caro, sem saída no mercado. Resulta irônico comprovar a que ponto haviam chegado os primeiros colonos franceses e ingleses no Caribe: homens idealistas, freqüentemente perseguidos por suas crenças religiosas, e muitas vezes indivíduos de princípios elevados que queriam viver de uma forma mais livre da qual lhes era permitido viver na Europa". Pois estes senhores, diz-nos Ritchie, tornaram-se escravocratas nas Índias Ocidentais. Para satisfazer o paladar europeu.

Outro subproduto da cana, o rum, serviu para incrementar o tráfico de escravos. Quando surgem as primeiras campanhas abolicionistas, seus líderes implantam o primeiro boicote ao comércio infame, adoçando o café com nata em vez de açúcar, e pedindo conhaque francês em lugar de rum. Para ajudá-los a propagar suas idéias, lady Henderson, comerciante em Londres, vende açucareiros com gravado em letras douradas: "Açúcar das Índias Orientais, não produzido por escravos".

Ritchie considera que se o açúcar fosse descoberto hoje seria classificado como droga. Droga que já produziu mais estragos em sua trajetória – acrescentemos – do que a maconha ou cocaína. Em suma, o livro de Elizabeth Abbott nada tem de novo. Apenas repete antigas denúncias sobre este veneno que as pessoas ingerem prazerosamente todos os dias.

segunda-feira, setembro 21, 2009
 
PERGUNTAS DO EDUARDO


Caro Janer

Algumas perguntas aos coordenadores da campanha:

- Sendo a superpopulação de gado uma conseqüência direta da superpopulação humana, por que será que ninguém fala da causa do problema abertamente?

- A digestão dos humanos não provoca gases estufa também?

- A geração de gases estufa de um vegetariano é menor que a de um carnívoro? Quanto?

- Será que se virarmos vegetarianos o plantio de tais alimentos não iria contribuir da mesma forma com o desmatamento da Amazônia?

- Quantas toneladas de vegetais correspondem a uma tonelada de carne em termos calóricos?

- Uma vez estabelecida a relação acima, quantos hectares de terra seriam necessários para substituir a produção de carne por vegetais?

- Poderíamos eliminar a carne da alimentação básica das crianças para que no futuro ninguém precisasse mais deste tipo de alimento?

- Já foi provada a longevidade dos vegetarianos?

- Temos que deixar de comer peixes e aves também?

- Será que Kassab e Sir Paul McCartney vão deixar de comer carne?

Agora algumas afirmações (minhas):

- A grande maioria da população mundial não come carne todos os dias.

- Ingleses e paulistanos pode ser que comam. Todos os brasileiros, não.

- A superpopulação de animais não é “gerada artificialmente” é gerada por demanda real crescente. Não vai parar com campanhas nem chicotes. Todos os subdesenvolvidos querem e vão exigir sua picanha, cachaça, TV, carro poluidor, etc, ao quadrado. O problema é quantidade de gente precisando comer.

- As ONGs ao invés de contratar ex-Beatles e aliciar prefeitos para controlar e proibir isto e aquilo deveriam bolar métodos aceitáveis para controlar e reduzir o crescimento populacional, desta forma todos os problemas vão se resolver naturalmente. Verba para começar eles têm.

- As ONG vomitam números e não mostram as contas, a população embarca por que não pára para pensar.

- Eles são aproveitadores e quem acredita em este tipo de campanha: estúpido!

- A secretaria do verde e do meio ambiente da PMSP deveria cuidar do cocô humano que polui a água do Tieté mais que a atmosfera.

Eduardo Bernasconi

 
SOBRE COMO ACEITAR SÃO PAULO


A Folha de São Paulo de hoje traz, em sua primeira página, foto para mim muito significativa. Dez remadores, equipados com máscaras, óculos e luvas de borracha, enfrentando 25 km do trecho metropolitano do rio Tietê. Além de agüentar o cheiro, os atletas tiveram se esforçar nos trechos mais rasos, por causa do assoreamento. Alguns remadores foram vacinados contra hepatite A e febre tifóide.

Esta foi a primeira imagem que tive de São Paulo. Creio que foi em 61, quando eu vinha para um congresso estudantil em Campinas. Eu passava de ônibus pela marginal do Tietê. Não adiantava fechar a janela, o mau cheiro atravessava o vidro. Olhei para o rio. Dois atletas faziam regata tranqüilamente em meio às águas podres. Pensei com meus botões: esta gente se acostuma a tudo, até mesmo ao fedor de um rio poluído. Jamais me acostumarei a isto. Jamais viverei em São Paulo.

O Brasil não tem respeito algum por suas águas. Enquanto na Europa os rios são componentes do lazer urbano, para nós constituem depósitos de lixo. Em Paris, o Sena faz a alegria da cidade. Em Londres, este papel é desempenhado pelo Tamisa. Já foram rios poluídas, mas tanto britânicos como franceses tiveram o bom senso de recuperá-los. Há nove anos, passei um sábado delicioso às margens do Limmat, em Zurique. O bar se chamava Panta Rei, o que me evocou Heráclito. Me lembrei muito de São Paulo naquele sábado. O rio, que atravessava a cidade, era cristalino, podia-se ver uma moedinha jogada em seu leito. Lá pelas tantas, alguém desceu a rampa e passou uma boa hora nadando. Nadar em um rio que atravessa o centro de uma cidade, para mim, egresso de Porto Alegre e São Paulo, pareceu-me utopia. Não era.

Estou aqui há praticamente vinte anos. E daqui não sairei nem de pés juntos, já que determinei que meus restos serão cremados no cemitério da Vila Alpina. É a cidade onde vivi mais tempo em minha vida. Abstraí o Tietê. Só o vejo quando vou ou volto de viagem. Durante muitos anos, assim assinei minha coluna: Janer é jornalista e sofre São Paulo. Foi quando um leitor chamou-me a atenção. “Escuta, pelo que conheço de teu perfil, São Paulo é a cidade que melhor se adapta a ti no Brasil”. O leitor tinha razão. Eliminei o bordão de minhas colunas.

É que eu via São Paulo como um todo. Em sua totalidade, a cidade é monstruosa, um emaranhado de favelas e bairros pobres, com algumas ilhas viáveis. Tomei então uma decisão intelectual: eu não vivo em São Paulo. Eu vivo em Higienópolis. Aí minha vida se tornou mais amena. O bairro não é nenhum Saint-Germain-de-Prés, mais on peut survivre, como me dizia um amigo francês. Meus dias, eu os vivo nesta pequena geografia, muito menor que a geografia de Dom Pedrito. Não gosto de cidades verticais. Mas, enfim, tudo bem. É aqui onde está a maior parte de meus amigos e isto vale muito. Quando sinto necessidade de cafés mais sofisticados, comida diferente, outras arquiteturas, tiro o pó do passaporte e parto.

O espaço que utilizo nesta megalópole é bastante curto, não passa de uns seis quilômetros. É a distância que me separa de Vila Madalena, onde às vezes vou almoçar. No meio do caminho estão Pinheiros e Jardins, que também visito, impelido pelo desejo de bons vinhos e boa comida. Acho que só uma vez em meus dias de Paulicéia fui mais longe. Foi quando fui ao Itaim Bibi em busca de um smörgåsbord em um restaurante escandinavo. Fora isto, nada mais conheço de São Paulo. Conheço melhor Paris e Madri, onde vivi muito menos tempo. Há outros bairros interessantes. Mas ficam muito longe de meu chão. Se é para ir longe, prefiro começar por Cumbica.

São Paulo tem suas vantagens. Estando aqui, você não precisa fazer escala para ir a Paris. Como disse alguém, fica pertinho do Brasil, não é preciso visto de entrada e todo mundo fala português. Voltando às regatas: os paulistanos continuam remando em meio ao pútrido. Eu, como não remo, não tenho maiores dificuldades em assumir a cidade.

 
APOLOGISTA DA DROGA
QUER IMPOR DIETA DE
CARNE A BRASILEIROS



Quando vejo autoridades tentando proteger a saúde de pessoas adultas com a proibição do fumo, me fica a pergunta: para quando será a proibição do álcool? E do açúcar? Ou da picanha? Porque álcool, açúcar e picanha gorda também matam. (Voltarei ao assunto do açúcar). No que diz respeito ao álcool, já andam jornalistas católicos se entusiasmando. Que o álcool só não é proibido para que se sejam evitados os efeitos funestos da clandestinidade. Não fosse isto, deveria ser proibido. Quanto à carne, desde há muito ONGs do Primeiro Mundo tentam proibi-la. No Terceiro Mundo, é claro.

Que tem a ver o hambúrguer com o meio ambiente? Leio esta pergunta no site ecológico Tuverde, provavelmente financiado por alguma ONG, já que não traz a assinatura de ninguém. Segundo um estudo da FAO – prossegue o texto – a indústria da carne representa 18% do total das emissões mundiais de gases. Graças à superpopulação de animais gerada artificialmente pelo homem (bilhões de cabeça e contando), a indústria da carne teria o triste recorde de ser a maior produtora mundial de gás metano e óxido nitroso, cada um 20 e 300 vezes mais poderosos que o dióxido de carbono como gases causadores do efeito estufa. O gás metano é produzido pelos animais durante a digestão e o óxido nitroso é emanado por seus excrementos.

A indústria da carne, segundo a FAO, é a principal responsável pelo desmatamento de bosques e selvas em nível mundial. Estima a entidade que 70% da superfície desmatada da Amazônia é dedicada a pastagens. Conclusão: se você quiser salvar o planeta, seja vegetariano.

Esta filosofia safada foi assumida pelo ex-beatle Paul McCartney, que se associou a uma campanha internacional que recomenda às pessoas renunciarem a comer carne em algum dia da semana para combater as mudanças climáticas. Segunda-feira sem carne. É o que propõe um dos maiores apologistas internacionais das drogas. “Deveríamos nos preocupar com a mudança climática porque, se não o fazemos, vamos deixar como herança para nossos filhos e aos filhos destes um problema gravíssimo” – disse McCartney ao The Independent. O apologista das drogas e suas filhas, Stella e Mary, tentam persuadir os consumidores para que adotem uma dieta vegetariana ao menos um dia por semana, com o objetivo de reduzir as emissões de gases-estufa da cabanha mundial, que contribuiriam de modo significativo para o aquecimento global.

LSD, canabis, cocaína pode. Carne é que não pode. Os vegetarianos têm nomes ilustres em suas hostes. Schickelgruber foi um deles. Antes que me esqueça: Schickelgruber era o sobrenome daquele austríaco que foi amado por multidões, Adolf Hitler. É claro que o Brasil não perderia esta oportunidade de ouro de adotar uma estupidez do Primeiro Mundo. A Prefeitura de São Paulo vai apoiar o boicote à carne para “salvar o planeta”. É o que leio na Folha de São Paulo. A campanha "Segunda Sem Carne" será lançada no próximo dia 3 no Estado. Para os organizadores, dieta carnívora é "insustentável". A campanha é parte do lobby de ONGs e liderada no Brasil pela Sociedade Vegetariana Brasileira, que pretende tornar o movimento nacional. E tem o apoio da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente de São Paulo.

Não sei se ongueiros e lobistas sabem, mas esta moda tem suas origens na Espanha de Franco. Durante a Guerra Civil, para financiar a luta, Franco instituiu o chamado "lunes sin postre". Às segundas-feiras, os espanhóis dispensavam a sobremesa, para colaborar com o esforço de guerra. Com um detalhe: a sobremesa era paga, mas não consumida. O objetivo não era a salvação do planeta, mas da Espanha. Lá por 2001, o PT – sabe-se lá para salvar o quê – pensou em proposta semelhante. Pretendeu taxar as refeições em restaurantes de luxo. Era quando o PT ainda não estava no poder e seus próceres ainda não podiam comer nos Fasanos da vida às custas do contribuinte. Hoje não se fala mais no assunto.

Voltando à carne: desde há muito avança uma conspiração internacional contra a carne, particularmente a carne vermelha, conspiração oriunda de países ricos. Por um desses paradoxos da economia, nos países ricos a carne é cara e nos países pobres continua sendo relativamente barata. Proíba-se então aos pobres um dos poucos prazeres que lhes restam.

Não tenho nada contra vegetarianos, que cada um coma o que julgue ser melhor comer. Quem gosta de pastar, que paste a gosto e bom proveito. Daí a uma prefeitura assumir campanhas malucas de ONGs internacionais vai uma longa distância. Era só o que faltava, um dos grandes difusores das drogas no mundo pretender impor uma dieta a brasileiros.

Há algo de podre, não no reino da Dinamarca. Mas na Prefeitura de São Paulo.

domingo, setembro 20, 2009
 
CARPIDEIRA DA GUERRA
FRIA CONDENA EUROPA



Conheci Gilles Lapouge, o correspondente do Estadão na França, no final dos anos 70, em um debate em uma livraria em Paris. Conheci e não gostei. Era jornalista de evidente desonestidade intelectual. Na ocasião, coordenava um debate com Hélio Bicudo, que proferia suas bobagens costumeiras sobre o Brasil. Em dado momento, Lapouge, que por ofício devia conhecer muito bem o país, pergunta, já inserindo na pergunta a resposta que queria ouvir:

- É verdade que os esquadrões da morte existem em todas as capitais do Brasil?

Bicudo, participando da mesma desonestidade intelectual, não hesita em confirmar a pergunta cretina:

- Sim, os esquadrões da morte existem em todas as capitais do Brasil.

Ora, os ditos Homens de Ouro, policiais que compunham o esquadrão da morte, só existiam no Rio de Janeiro, e talvez no Espírito Santo. Não havia esquadrão em São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, muito menos em Salvador, Recife, Manaus ou Belém. Em suma, não existia esquadrão em nenhuma outra capital do Brasil. Mas o objetivo, tanto de Lapouge como de Bicudo, apparatchiks a serviço da União Soviética, era condenar o regime militar. Estenderam então o esquadrão para o país todo.

Há muitos anos leio os artigos de Lapouge. Pior ainda: em meus dias de Estadão, tive de traduzi-lo. Pois o correspondente em Paris se dá ao luxo de enviar seus artigos em francês. Na edição de hoje do jornal, Lapouge acusa de perseguir imigrantes uma Europa que busca se proteger ante a imigração ilegal. Seu artigo é de evidente má-fé. Senão, vejamos:

“A França de Sarkozy exibe um comportamento repugnante. Utiliza vôos charter para levar os imigrantes de volta, sem considerar os perigos (econômicos ou mesmo políticos) que os aguardam no país de origem. O ministro da Integração se vangloriou de ter expulsado 30 mil clandestinos este ano”.

Ora, clandestinos têm mesmo é de serem mandados de volta a seus países. Ao defendê-los, Lapouge advoga a desintegração da Europa. Sem falar que Lapouge não pode ignorar que os ditos “vols de la honte” (vôos da vergonha) datam do governo Giscard d’Estaing. Giscard oferecia dez mil francos na época a todo imigrante que quisesse voltar a seu país. Mas, como me dizia Slimane Zéghidour, jornalista e escritor argelino: “Podem me dar a França inteira, não aceito. Não posso levá-la no bolso”. Os chamados vôos da vergonha prosseguiram durante o governo Mitterrand e, desta vez, sem um vintém sequer para voltar. Mas Lapouge jamais diria uma palavrinha contra o sedizente socialista François Mitterrand. Debita hoje a Sarkozy o que foi prática rotineira em governos passados. É que Sarkozy não é de esquerda.

“Além dessas baixezas, Sarkozy vem se batendo pelo que chama de “imigração selecionada”. A França necessita de cérebros, pessoas inteligentes, instruídas, se possível limpas. Assim, um africano que saiu da Escola Politécnica, um argelino licenciado em Direito, essa Paris apresentada como humanitária adora. É uma tese traiçoeira. De um lado rejeita nas trevas exteriores os mais desesperados; e de outro priva a África do pequeno número de pessoas de alto nível, técnicos, diplomados, que esses países conseguiram formar com muito sacrifício. Um enorme egoísmo!”

Ou seja: Lapouge defende que a França – e por extensão, a Europa – acolha a escória do Terceiro Mundo e rejeite o que de melhor o Terceiro Mundo oferece. Como se a França – ou a Europa – tivesse como obrigação receber os detritos humanos decorrentes das ditaduras do mundo árabe e africano. O que um dia Stalin e Hitler sonharam – destruir a Europa livre e democrática – os muçulmanos já estão perto de conseguir. Lapouge toma o partido da barbárie.

Prossegue o correspondente: “Proliferam ideologias fascistas por toda a Europa, o partido de Jörg Haider na Áustria, os neonazistas flamencos, dinamarqueses, alemães orientais e, na França, o perverso partido da Frente Nacional de Le Pen”. Lapouge omite safadamente apenas um detalhe. Nem Haider nem Le Pen militaram em partidos nazistas. Mitterrand não só foi colaborador nazista, como também foi condecorado com o galardão máximo da República de Vichy, a Francisque, por seus bons serviços prestados ao Reich. Lapouge, que não nasceu ontem, sabe muito bem que Mitterrand virou a casaca e passou a militar nas esquerdas. Está portanto acima do bem e do mal.

É deplorável que essas carpideiras da finada União Soviética ainda tenham espaço, num jornal que se pretende liberal como o Estadão, para caluniar uma Europa que tenta se proteger – tardiamente – da invasão árabe e africana. Que Lapouge tenha sua opinião pessoal sobre a política de imigração da França é uma coisa. Que falseie a realidade omitindo fatos que não desconhece, é outra e bem mais grave.

sábado, setembro 19, 2009
 
COPISTAS, TRADUTTORI E TRADITORI


Pois, Quaglio, as diferentes traduções do versículo de Samuel sobre a serra é talvez a demonstração mais contundente de que não se pode confiar em tradução alguma da Bíblia. Houve um grande esforço em amenizar os métodos do sábio rei Davi. De nada te adiantaria ser capaz de ler o texto em hebraico. Pois não existe mais texto original algum da Bíblia. Nem mesmo cópias em primeira mão. Sequer cópias de cópias de cópias. O que hoje temos são cópias de muitas outras cópias anteriores.

O que me remete ao livro citado de Bart Ehrman, O que Jesus disse? O que Jesus não disse? – Quem mudou a Bíblia e por quê, que me foi recomendado pelo leitor Ricardo Donizetti. O autor tem uma trajetória igual à minha. Lendo a Bíblia, perdeu a fé. Só que foi bem mais longe do que eu. Estudou grego e hebraico para conseguir ler o Livro no original. Mais ainda: foi atrás de cada fragmento das cópias que ainda restam da Bíblia, em diferentes bibliotecas, para cotejá-las. Meu caminho foi bem mais singelo.

Inicialmente, li a Bíblia apenas em português. De alguma forma, nela algo há de restar do livro original. O que restou foi suficiente para convencer-me que o tal de deus é uma criação da mente humana. Desde muito jovem, tornei-me ateu. Ehrman, na verdade, não ousou tanto. Tornou-se agnóstico. O que, a meu ver, é ficar em cima do muro. Mas sua reflexão sobre as modificações – involuntárias ou propositais – dos textos originais é fundamental para todo estudioso da Bíblia.

Segundo Ehrman, um estudioso da Bíblia, John Mill, membro do Queens College, Oxford, examinou cerca de cem manuscritos gregos e neles encontrou trinta mil variantes. Outros pesquisadores fazem estimativas bem mais discordantes. “Alguns falam de duzentas mil variantes conhecidas, outros de trezentas mil, alguns falam de quatrocentas mil ou mais! Mas não se tem certeza, porque, apesar dos impressionantes avanços da informática, ainda não houve quem fosse capaz de contar todas. Talvez, como eu já disse, seja melhor falar em termos comparativos. Há mais variações entre os nossos manuscritos que palavras no Novo Testamento”.

Os copistas que reproduziram os textos originais, ao longo dos séculos, foram influenciados por controvérsias políticas, teológicas ou culturais de suas épocas. Sem falar que muito copistas sequer conheciam a língua da qual copiavam. Apenas reproduziam as formas das letras que viam. Um escorregão da pena e o sentido de uma palavra podia mudar muito.

“Com isto se quer dizer que, uma vez que um copista muda um texto – acidental ou intencionalmente -, essas mudanças se tornam permanentes em seu manuscrito (a menos, é claro, que outro copista venha a corrigir o erro). O próximo copista que copia aquele manuscrito copia os erros (pensando serem eles a genuína expressão do texto) e ainda pode acrescentar erros de sua própria lavra. Depois disso, o próximo copista que copia aquele manuscrito copia os erros de todos os seus predecessores e acrescenta erros de sua própria lavra, e assim vai. A única forma de os erros serem corrigidos é quando um copista reconhece que um predecessor cometeu um erro e tenta consertá-lo. Mas não há garantia, porém, de que um copista que tenta corrigir um erro corrija-o corretamente. Isto é, ao mudar o que lhe parece um erro, ele pode, de fato, mudá-lo incorretamente, de modo que se passa a ter três formas de texto: o original, a versão errada e a tentativa incorreta de resolver o erro. Os erros se multiplicam e se repetem; algumas vezes são corrigidos, outras são ampliados. E assim por diante, durante séculos”.

Ou seja: lasciate ogni speranza, voi ch'entrate na leitura dos textos bíblicos. Não existe livro no mundo que tenha sido mais deturpado ao longo dos séculos. Cada época, cada copista, cada tradutor puxa brasa para seu assado. A meu ver, o caminho mais curto para se tornar ateu é ler atentamente a Bíblia. Ehrman, homem de fé, não conseguiu chegar lá. Mas pelo menos colocou sua fé entre parênteses.

Recomendo vivamente, a todo estudioso de assuntos bíblicos, a leitura de seu ensaio. Para aproveitar o azo, recomendo mais um, O Problema com Deus, no qual o autor analisa as respostas que a Bíblia não dá ao sofrimento no mundo.

E boas leituras, leitor!

 
REI DAVI E TRADUÇÕES


Olá Janer,

Saudações!

Lendo seu texto recente sobre o Hildebrando, o Luiz Francisco e o Rei Davi, comparei a redação dada ao versículo 31 de II Samuel 12 por diferentes tradutores da Bíblia. Você mencionou em outro artigo que tradução é impossível, mas necessário. Alguns traduttori, no entanto, são mais traditori que outros. Infelizmente não sou capaz de ler o texto em hebraico, e estou muito curioso para saber como o mencionado versículo é redigido nos textos mais antigos. Na vulgata, o texto dá a impressão que Davi serrou, esmagou e mandou para o forno os corpos dos habitantes de Rabá (...populum quoque eius adducens serravit et circumegit super eos ferrata carpenta divisitque cultris et transduxit in typo laterum...). As diferentes edições da tradução de Almeida (lembre-se de que existem várias edições modificadas da Bíblia de Almeida, e algumas diferem entre si como se fossem traduções diferentes) sugerem claramente o mesmo (...fê-lo passar a serras, e a picaretas, e a machados de ferro e em fornos de tijolos..., na edição revista e atualizada, e ...pôs [o povo] às serras, e às talhadeiras de ferro e aos machados de ferro, e os fez passar por forno de tijolos... na edição revista e corrigida). A King James Version, mais célebre tradução da Bíblia para a língua inglesa, também é clara em seu texto (...put them under saws, and under harrows of iron, and under axes of iron, and made them pas through the brickkiln...).Tenho uma tradução protestante italiana da Bíblia (isso mesmo, italiana e protestante, valdese). Lá também se lê sobre a matança, com um texto ainda mais explícito, sem ambigüidades (...mise i loro corpi sotto dele seghe, degli erpici di ferro e delle scurri di ferro, e li fe' gettare in fornaci da mattoni...).

Algumas traduções, porém, mudam completamente o sentido do texto. Tenho comigo aqui três Bíblias cujos textos sugerem que Davi não fez picadinho e assado dos amonitas de Rabá, mas apenas os fez trabalhar com as ferramentas e os fornos aludidos. Uma versão revisada da tradução de Almeida, publicada pela Imprensa Bíblica Brasileira (ligada à Igreja Batista), traz em seu texto esta narrativa mais branda (... os pôs a trabalhar com serras, trilhos de ferro machados de ferro e em fornos de tijolos...). Uma Bíblia que possuo, publicada pela Editora Vozes, cuja tradução foi feita por diversas pessoas (os dois livros de Samuel foram traduzidos por um certo João Kipper) também abranda a conquista de Rabá (...ele os deportou, pondo-os a manejar serras, picaretas e machados de ferro e a trabalhar no fabrico de tijolos...). A última tradução que tenho, para a língua espanhola, é a de Casiodoro de Reina, de 1569, porém revisada em 1960, e publicada por protestantes. Não sei como estaria a redação do versículo na edição de 1569, mas esta revisão de 1960 também abranda a conquista (...y los puso a trabajar con sierras, con trillos de hierro y hachas de hierro, y además los hizo trabajar en los hornos de ladrillos...).

Quais traduções estão corretas? Provavelmente nenhuma. Há pouquíssimas fontes históricas confiáveis sobre Davi. O "Davi histórico", em comparação com o Davi da Bíblia, é tão nebuloso quanto o "Jesus histórico". Há até quem tenha dúvidas sobre a existência do famoso rei. Hoje já se sabe, com bastante segurança, que os relatos bíblicos sobre Davi e Salomão são exagerados, fruto de ufanismo do Reino de Judá, sulista, que pretendia afirmar sua superioridade em face do Reino de Israel, ao norte. Davi, cuja existência é bem possível, provavelmente era um simples chefe tribal de Judá, e jamais um conquistador e mantenedor do um império. O grande reino unificado do povo hebreu, fundado por Saul, expandido por Davi e que atingiu o auge com Salomão, provavelmente nunca existiu.

Aproveito para agradecer a recomendação do livro de Bart D. Ehrman, que eu não conhecia. Vou ler assim que puder.

Um grande abraço,

Humberto Quaglio

sexta-feira, setembro 18, 2009
 
PROCURADOR EX-SEMINARISTA
ACUSA DISCÍPULO DO REI DAVI



Nesta segunda-feira que vem, deverá sentar no banco dos réus para ser julgado pelo “crime da motosserra”, o ex-deputado Hildebrando Pascoal. Afirma o folclórico procurador da República, Luiz Francisco Fernandes de Souza, ex-seminarista, 47 anos, principal responsável por desarticular a organização criminosa da qual o deputado era o líder e que submeteu o Acre ao terror e barbárie nas décadas dos 1980 e 1990:

“Espero também que ele, na prisão, pegue a Bíblia, leia, se acerte com Deus direitinho e possa até cuidar melhor da esposa e dos filhos dele. Ele e eu, quando morrermos, vamos nos encontrar com Deus. É bom que a gente tenha coisas boas para poder mostrar a Deus. O “diacho” é que foram muitos crimes que ele praticou. Claro que não tenho a menor raiva de ninguém, graças a Deus, e torço para que não aconteça nada de mal com ele. Eu só não gosto da impunidade. Quando uma pessoa é serrada viva, neste caso não pode ter impunidade”.

Pelo jeito, o ex-seminarista sempre manteve uma distância respeitosa da Bíblia. Se tivesse uma relação mais íntima com o Livro, teria de condenar um dos mais relevantes personagens bíblicos. Se o deputado ler atentamente atentamente a Bíblia, encontrará precedente para seus crimes. Se Davi pode, porque Pascoal não pode?

A serra, muito usada no século XVIII, é tida como criação espanhola. A não ser pelos dentes mais espaçados, em nada difere de uma prosaica serra de madeira. Pelo que vi em uma xilogravura que explica a utilização do instrumento, pareceu-me que naquele século faltou imaginação ao verdugo: pendurava-se a vítima pelos pés em uma vara, e dois homens passavam a serrá-la, a partir do cóccix. Tortura idiota, pensei, o homem deve morrer já no início do suplício. Santa ingenuidade minha! Devido à posição invertida do corpo, que garante suficiente oxigenação ao cérebro e impede a perda geral de sangue, a vítima só perdia a consciência quando a serra alcançava o umbigo e, às vezes, o peito.

Embora se associe este suplício à Espanha, sua origem vem de época em que nem se pensava em Espanha. Os leitores atentos da Bíblia devem lembrar que o rei Davi (II Samuel 12:31) exterminou os habitantes de Rabbah e de todas as outras cidades amonitas submetendo homens, mulheres e crianças ao suplício da serra e sofisticações outras da época. Era aplicada preferentemente a homossexuais de ambos os sexos. Na Espanha foi utilizada como método de execução militar, na Alemanha luterana era destinada aos líderes camponeses rebeldes e, na França, fazia justiça às mulheres emprenhadas por Satanás.

Se procedem as acusações feitas ao deputado Hildebrando Pascoal, diga-se em sua defesa que ele apenas recorreu a milenares métodos bíblicos de execução. Foi discípulo do sábio rei de Israel.

 
CONGRESSO AMNÉSICO APROVA
LEI QUE JÁ FORA APROVADA



Quando vivi na Escandinávia – e já lá vão quase quarenta anos - para o Estado sueco eu era o cidadão nº 4707029917. As seis primeiras cifras indicam a data de nascimento. O número pertence a um homem, pois as três cifras seguintes são ímpares. Para uma mulher, teríamos, por exemplo, 864. A última cifra é dada por um computador e estabelece a univocidade do número pessoal. Para conferir-se se o número está correto, dobra-se alternadamente suas cifras, começando pela primeira, o que dá 08 7 00 7 00 2 18 9 02 7.

Somadas estas cifras uma a uma, temos 60, o que indica estar correto o número, pois a soma é divisível por 10. Relatei estes fatos em meu primeiro livro, O Paraíso Sexual Democrata, publicado em 1973. Até aí, tudo muito prático. Ocorre que o cidadão é interrogado sobre seu número pessoal, em quase todas as circunstâncias de sua vida. Ao se matricular na universidade, comprar a crédito, solicitar auxílios sociais, internar-se em hospital, pagar multas de trânsito, casar ou divorciar-se, está alimentando um banco de dados. Não existem limitações para o tipo de dados que podem ser registrados num computador, sejam verdadeiros ou falsos.

A Suécia, na época, era um dos países mais informatizados do mundo e o problema começava a causar inquietações. O alerta foi dado por Harry Björk, na antologia Kontrol av Individen (Controle do Indivíduo), publicada em Lund, 72. "A limitação prática dos dias atuais - dizia o autor na época - é que as informações devem ser expressas em letras e cifras". Hoje, nem esta limitação existe.

Björk sugeria um exemplo no qual dados inocentes, uma vez combinados, produziriam novos efeitos: a compra de um casaco de pele para senhora, nº 42. Ora, A é casado com a senhora A, que veste 38. "Os que dispõem destes dados combinados, dando apenas asas à fantasia e talvez se informando um pouco sobre a vida da família, têm elementos para tudo, entre a difamação, calúnia e chantagem". Se considerarmos que nos bancos de dados das associações estudantis suecas constavam desde os certificados obtidos até eventuais contribuições para movimentos guerrilheiros no Exterior, temos uma pálida idéia do que o Estado sabia a respeito do cidadão. Na época, lei nenhuma regulava o comércio de informações.

Número pessoal mais informática mais bancos de dados, além de prevenir e permitir a punição de não poucas falcatruas, tornam mais clara a administração pública. Mas invadem inexoravelmente a vida de cada um. É comum citar-se George Orwell e 1984 quando pairam ameaças à privacidade do cidadão. Isso porque tiveram pouca fortuna em língua portuguesa livros anteriores, como o magnífico Kalocain, de Karin Boye (que tive a honra de traduzir do sueco e talvez possa ser encontrado em algum sebo) e o menos conhecido Nós, de Evguéni Zamiatine. Na distopia do autor russo, as paredes dos edifícios são de vidro, pois afinal cada cidadão nada tem - ou não deve ter - a esconder do Estado.

No livro da autora sueca, mediante a injeção da droga kalocain, todo cidadão confessa alegremente qualquer pensamento ou ação contra o Estado. O desejo kantiano de transparência, por parte dos ideólogos destas sociedades, torna-se hoje cada vez mais factível graças ao computador. Não por acaso, um dos movimentos que contribuiu para a derrocada do comunismo chamava-se glasnost. Em russo, transparência.

Cá no Brasil, onde ninguém tem interesse algum em transparência, haja memória para carregarmos vida afora os números que nos identificam. Eu resolvi o problema de maneira simples. Só sei de cor meu CPF e meu código postal. Não penso sobrecarregar meu modesto HD com dados inúteis. Os outros números ficam na memória RAM. Mal desconecto o cérebro – e sempre o desligo quando vou dormir - eles se volatilizam.

Leio nos jornais que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) aprovou, quarta-feira passada, parecer do senador Almeida Lima (PMDB-SE) favorável a projeto do deputado Celso Russomano (PP-SP) que altera a Lei 9.454/97 para definir que, à medida que forem sendo adquiridos, o Cadastro de Pessoa Física (CPF), a Carteira de Trabalho e Previdência Social, a Carteira Nacional de Habilitação, o passaporte e quaisquer outros documentos necessários ao cidadão terão o mesmo número do Registro de Identidade Civil.

O oportuníssimo projeto aprovado na CCJ segue agora para o Plenário. É possível que haja resistência à nova lei. O Congresso desde há muito trabalha no sentido de proteger interesses escusos e um número pessoal é um breve contra a criminalidade. Com distintos números identificativos, nada impede que alguém cometa fraudes em diferentes Estados sem ser identificado como o mesmo criminoso. Com o número pessoal, isto se torna mais complicado. Até aí, palmas ao projeto do deputado Russomano.

Só há um porém. O Senado Federal aprovou, em 1996, lei de autoria do senador Pedro Simon, que instituía um número único para cada cidadão brasileiro, composto de letras e algarismos. Com a nova regra, seriam extintos todos os atuais cartórios de registro civil. Tudo seria centralizado num único cartório, responsável pelo Cadastro Nacional de Registro Civil. Em abril de 97, o presidente Fernando Henrique Cardoso sancionou o projeto. Esta lei, que de certa forma regulamenta o imperativo categórico kantiano, devia entrar em vigor cinco anos depois, ou seja, em 2002. No Brasil, as leis pegam... ou não pegam. Pelo jeito, esta não pegou.

Em um Congresso cujos parlamentares renovam seus mandatos por décadas, bem que poderia existir pelo menos alguma alma com um mínimo de memória capaz de lembrar que, há pouco mais de dez anos, a lei que agora está sendo discutida já havia sido aprovada.

quinta-feira, setembro 17, 2009
 
COMENTÁRIO DO CATELLI


Grande Janer,

“Para começar eu diria que o normal seria as pessoas gostarem de música erudita.”

Não gosto muito do termo “erudita”, tampouco do “clássica”, que se refere a um período precedido pelo barroco e sucedido pelo romântico. Música clássica é Mozart, Haydn, Glück, Salieri, etc. Música romântica é Beethoven, Brahms, Berlioz, etc.

Eu e um amigo nos referimos a ela como “A Música”, afinal foi, com suas inúmeras variantes, a música por séculos, e incorporava elementos folclóricos, marciais, exóticos. Os estilos atuais são variações de música dançante, com harmonia pobre e sem muita inventividade, notórios pelo autoditatismo, que impede a evolução e torna tudo mais do mesmo, pelo caráter de artesanato e não de arte. Apesar de eu gostar de rock, a harmonia do 1-4-5-1 e quase tudo o que se faz é anjinho de pedra sabão vendido na saída de Ouro Preto. É artesanato.


“Não considero que se precise conhecer música a fundo para gostar de ópera.”

Acho que devemos conhecer o “idioma” para entender o que o compositor pretende dizer. Só captei o idioma de Richard Strauss, seus termos, suas alusões, após ouvi-lo algumas vezes. Incrível como hoje sua Elektra, moderna, sangrenta, me parece mais grega do que qualquer música pueril, que a mim chegasse, da época de Agamenon. Já Verdi, por exemplo, é de um idioma muito conhecido. Se nunca escutamos determinada ópera sua e, pelo libretto, vemos que um confronto é iminente entre rivais, esperaremos um (belíssimo, provavelmente) umpá-umpá marcial com o tenor e o barítono sobressaindo do coro e um gran finale com mudança de Ato.

“Quando me perguntam se uma ópera foi bem executada, minha resposta é: ‘não sei’”

Alguém pergunta, depois de uma Tosca com aquele ceguinho:

- O que você acha da execução do Andrea Bocelli?

- Acho demais... Prisão perpétua já está bom!

“Não conheço música a ponto de saber se os cantores foram sublimes em suas interpretações. Fico apenas no adorei, gostei ou não gostei.”

Faltou o “detestei”, para o caso do Bocelli cantar. Aliás, qual o desafio em cantar sendo cego? Ouve-se gente dizendo: “nossa, ele canta tão bem e é cego...” Beethoven compor surdo é outra coisa....


“Uma mulher gorda ou velha pode cantar muito bem Carmen. Daí a representá-la, em carne e osso, vai uma longa distância.”

Desde que cante bem, não me importa a sua aparência.


“Sou capaz de rever e rever a versão filmada de Francesco Rosi, com Julia Migenes.”

Só não gosto de ver ópera dublada, que é este caso. Às vezes abrem pouco a boca e sai aquele vozeirão... Incomoda-me sobremaneira


“Vou mais longe: Carmen, se não tiver cara de puta, não convence.”

E Micaela deve ser aquele anjo... Aliás, aquela sua ária (Je dis que rien ne m'épouvante) antes de encontrar o José decadente vivendo com contrabandistas é de cortar o coração...


“Música erudita é como literatura. Você começa lendo autores como Machado e passa a detestar toda a literatura.”

Não adianta, nada escrito hoje se compara aos grandes do passado. Acho que porque havia escolas, mestres, dedicação, ócio. Hoje impera o autodidatismo e o maldito improviso. Sem falar que para existir um Mozart deve-se ter mil compositores bons em um universo fervilhante como a Viena do século XVIII. É preciso uma imensa base de pirâmide para existir um ápice.

Estive lendo alguns contos que não conhecia de Maupassant, e relendo outros, como Bola de Sebo (que o Chico plagiou na sua Geni e o Zepelim) e Yvonne, e fiquei abobado... Garcia Márquez, Saramago e qualquer outro Nobel atual passa a ser emético quando lido após os clássicos (usei o termo errado, eu sei).


“A ópera foi um gênero popular entre os séculos XVII e XIX. Era o cinema da época...”

O povão levava comida gordurosa e fazia a maior farofa, cantava junto, interrompia uma ária, vaiava, pedia para repetir quando cantava o tenor famoso (a ária do Arlecchino, no Pagliacci, foi repetida incontáveis vezes na estréia). Fãs de um compositor usavam matraca para atrapalhar a ópera do compositor rival, etc. Hoje há uma certa empáfia entre os que gostam de ópera. Têm-se em alta conta apenas por conhecer ou gostar, quando o mérito há em compor, não em gostar. Se algum desavisado aplaude entre movimentos, logo os "conhecedores" fazem "shhhhhht" e meneiam a cabeça, como se estivessem de fato injuriados com a grosseria... Parvoíce!


“Uma das poucas coisas que gostei em Nova York foi a nonchalance dos freqüentadores do Metropolitan ou da City Opera. Não lembro de ter visto ninguém emperiquitado.”

Estive lá em janeiro deste ano e assisti a uma montagem minimalista do Orpheo Ed Euridice (versão italiana; prefiro a francesa) de Glück e constatei exatamente isso. Ponto a favor dos americanos. Gostei também da legenda opcional sobre a cadeira da frente, em alemão, inglês ou espanhol.


“Ópera é o espetáculo multimídia por excelência...”

Wagner que o diga. Foi o arquiteto do teatro, inventou o fosso da orquestra, inventou a poderosa tuba de Bayreuth, desenhou os cenários, o figurino, escreveu o libretto – excelente, aliás -, e a maravilhosa música, claro.


“O libreto de Don Giovanni é de uma poesia extraordinária.”

Sou fã do Lorenzo da Ponte!


“Uma missa cantada sempre tem um pouco de ópera.”

Principalmente as missas mais recentes, de Beethoven (solemnis), Cherubini (réquiem), Rossini (stabat mater) e de Verdi – o seu mais-do-que-operístico réquiem. E Dvorak (requiem), Fauré (requiem), etc.


“Nós, ateus, não somos hostis à grande arte. Ainda que religiosa.”

Eu escrevi, recentemente: Muitos consideram o Vaticano um bom exemplo de inspiração divina, do quão alto o homem pode ir motivado pela fé no verdadeiro deus. Ora, na Renascença, o mesmo artista que pintava uma madona ou um menino Jesus poderia pintar, enquanto a outra obra secava, uma Afrodite e um menino Hércules lutando contra serpentes. Para ambos temas às vezes eram os próprios papas os clientes, que encomendavam obras sacras para as igrejas e profanas para seus palácios. Tudo que um artista precisa é de técnica, demanda, competição, remuneração e até mesmo de um pouco de inspiração e talento.

Os devotos veem mais santidade em um lugar como a Basílica de São Pedro do que em uma capelinha miserável no interior do Piauí com rachaduras nas paredes e ar cheirando a ricota velha, ainda que para eles o pão transubstanciado em carne no interior do Piauí não deveria ser menos Cristo do que aquele transubstanciado perante o Papa B16. Mas o que a presença física do próprio Cristo pode contra Bernini, Bramante e Michelangelo? Nada! A aura "santa" que se sente no Vaticano sente-se também no Louvre, embora no primeiro caso a fé potencialize a sensação e crie aquela estupefação pretendida por Leão X.

Um abraço!

André Catelli

 
TÁ TUDO DOMINADO


As viúvas do Kremlin estão monopolizando as eleições de 2010. Mês passado ainda, eu afirmava que todos os eventuais candidatos à Presidência da República são de extração marxista. José Serra, que hoje posa de tucano liberal, foi um dos fundadores da Ação Popular (AP), um dos braços marxistas da Igreja Católica. Dilma Roussef, hoje petista, foi terrorista dos quadros do COLINA e da VAR-Palmares. Já Ciro Gomes, que declarava em meados de agosto estar pessoalmente decidido – “eu já escolhi. Sou candidato à Presidência” – fez percurso inverso. Iniciou sua carreira na Aliança Renovadora Nacional, a famigerada Arena que deu sustentação à ditadura militar, girou bolsinha no PPS, atual nome de guerra do antigo Partido Comunista Brasileiro e hoje faz ponto no PSB, também de origens marxistas.

O Supremo Apedeuta certamente não lê blogs, mas até parece ter lido. “Pela primeira vez, não vamos ter um candidato de direita na campanha. Não é fantástico isso? Vocês querem conquista melhor do que, numa campanha, neste país, a gente não ter nenhum candidato de direita? Uns podem não ser mais tão esquerda quanto eram. Não tem problema. A história e a origem dão credibilidade para o presente das pessoas. Era inimaginável até outro dia que chegássemos a esse momento no Brasil. Não tem um candidato que represente a direita. É fantástico”.

É uma maneira de ver a coisa. O que Lula omite é que todos são, de uma forma ou outra, ligados à filosofia que afundou no final do século passado. Só neste Brasil que sempre vai a reboque da História o eleitor não terá, ano que vem, opção: ou vota em velhos comunistas ou vota em um comunista novo. Ao afirmar que é fantástico não ter nenhum candidato de direita, Lula está assumindo seu viés totalitário. É o antigo braço do Dr. Strangelove, que se ergue em movimento involuntário, na saudação nazista. Em uma democracia, o normal é que haja candidatos de todas as ideologias. Nas eleições de 2010, teremos representantes de uma ideologia só. Tá tudo dominado. Blanc bonnet, bonnet blanc - como dizem os franceses. O eleitor terá de optar entre seis e meia dúzia.

“Antigamente – prossegue o êmulo de Castro e Hugo Chávez - a campanha era o candidato de centro-esquerda ou de esquerda contra os trogloditas de direita. Começou a melhorar já comigo e com o Fernando Henrique Cardoso, já foi um nível elevado. Depois, eu e o Serra também. Depois veio o Alckmin e baixou o nível, por conta dele, não por minha conta”.

Fernando Henrique ou Serra, em suas campanhas, jamais ousaram dizer uma palavrinha contra Lula. Como Alckmin fez algumas críticas a Lula, logo é jogado no rol dos trogloditas de direita. Neste sentido, Lula demonstra sua profundidade identidade com o senador corrupto. Para Sarney, se a imprensa o critica, é inimiga das instituições. Tanto um como o outro sonham com o paraíso de todos os tiranos: um país onde não haja oposição nem dissidência alguma. O pior é que, ao que tudo indica, acabamos de chegar lá.

Que Ciro, Dilma ou Marina não façam oposição a Lula até que se entende. São gatos do mesmo saco. Mas Serra, que se apresenta como o mais viável candidato à sucessão, bem que poderia ousar criticar os desmandos e abusos do poder do PT. Mas Serra não ousa. Nenhum candidato ousaria. Ou seja, oposição no Brasil é conversa pra boi dormir.

É a mexicanização da política no Brasil. Após a Revolução de 1910, o México foi governado durante sete décadas por um único partido, o Partido Revolucionário Institucional, o PRI. Sob a aparência de democracia, durante sete décadas o México viveu uma ditadura. Este é o sonho de todo marxista. Tanto que as ditaduras do mundo soviética adoravam apresentar-se como “democracias populares”. Filhos espirituais de Marx, os petistas não pensariam diferente.

Os intelectuais que assinaram manifesto contra a Folha de São Paulo por ter definido o regime militar como uma ditabranda, ainda não perceberam o que seja uma ditabranda. É o que estamos vivendo. Anátema seja toda crítica ao Grande Guia. O Judiciário e o Legislativo já foram domesticados. Só resta a imprensa para denunciar os desmandos e a corrupção. Mas tanto faz como tanto fez que jornais denunciem corruptos. O Judiciário e o Legislativo os absolvem.

E ainda há quem me reprove por ter deixado de votar há mais de duas décadas.

quarta-feira, setembro 16, 2009
 
TRADUÇÃO TEM VALOR LITERÁRIO?


De Thiago Peixoto, recebo:

Gostaria de saber sua opinião sobre traduções de romances. Ouvi uma professora universitária dizer que é impossível compreender uma obra fora de sua língua original. Não concordei e citei como exemplo o fato de que quase ninguém leria Dostoievski em russo e nem por isso perderia a oportunidade de ler uma obra profunda. Ela disse que quem lê Dostoievski fora do russo é um leitor simplório.
Eu acredito que uma tradução deveria carregar todo o sentido da obra, mesmo que se percam alguns detalhes estéticos, pois isto não seria prejudicial ao leitor. Na sua opinião, uma tradução é algo sem valor literário?



Traduzir é impossível, Thiago. Mas é necessário. Ninguém fala todas as línguas do mundo. Mas é claro que se perde algo do texto original. O ideal é ler Dostoievski em russo. Mas nem todos o conseguem. Por outro lado, há livros intraduzíveis.

O Tratado Geral dos Chatos, de Guilherme de Figueiredo, é um deles. Contou-me Figueiredo que recebeu propostas de tradução, mas teve de recusá-las. Sugeriu aos editores que pegassem sua idéia central e construíssem um outro texto. O livro se apóia em uma série de trocadilhos e nas diversas acepções da palavra, que vão desde o chato, como o entendemos, até o Phtirius púbis, aquele piolhinho pubiano que nos chateia terrivelmente. Figueiredo propõe até mesmo um aparelho para medir o nível de chatice de um chato, que batizou de chateômetro de Figueiredo. Elabora inclusive as leis da chateação. Uma delas é brilhante: dois chatos entre si não se chateiam. Ora, estes jogos verbais são de impossível tradução.

Eu mesmo me deparei com esse problema. Pensei certa vez em traduzir um poema relativamente curto, o Fausto, do argentino Estanislao del Campo. É um dos grandes momentos da gauchesca, anterior ao Martín Fierro. O entrecho é singelo. Um gaúcho vê o Fausto, de Goethe, “en el tiatro de Colón”, em Buenos Aires. Pega seu pingo e, ao voltar a seus pagos, encontra um outro gaúcho na estrada. Conta então, a seu modo, o que viu no palco. Dá para traduzir? Claro que dá. Mas o poema perderá muito. Melhor construir uma outra história.

O Martín Fierro, por exemplo. Há muitas traduções da obra, mas sempre se distanciam do original. Tenho quatro traduções, em francês, inglês, italiano e português. A inglesa é um asco. Curiosamente, a que mais se aproxima do original é a italiana. Há duas traduções no Brasil, uma do Nogueira Leiria e outra do Walmir Ayala. O Leiria, homem conhecedor do campo, fez o que pode. A do Ayala, poetinha urbano, é bichesca. Fierro mais parece um gaúcho dançando chula de leque em punho.

Ainda há pouco, li o excelente O Cântico dos Cânticos – Um ensaio de interpretação através de suas traduções, de Geraldo Holanda Cavalcanti, presente da Primeira-Namorada. É um belo estudo das diferentes traduções do poema, um dos mais complexos e mais curtos livros da Bíblia, terá apenas umas dez páginas. Sem conhecer as inúmeras traduções do texto, a de Fray Luis de León pareceu-me melhor que as traduções bíblicas que já li. Não direi melhor que o texto original, já que deste não temos mais notícias. Tampouco eu teria condições de lê-lo. O frei traduz o poema em versos rimados, o que já é um grande feito intelectual.

Mas traduzir pode ser perigoso. Por ter traduzido este poema e mais alguns textos bíblicos, Fray Luis foi perseguido pela Inquisição. Teve sorte, foi condenado a apenas quatro anos de prisão. Na universidade de Salamanca, estive na sala onde dava aula, preservada ainda hoje como era no século XVI. Consta que, ao voltar à universidade, em 1576, continuou a aula que havia sido interrompida pelos inquisidores em 1572: “Como decíamos ayer...”

Pode ocorrer que a tradução seja até melhor que o original. Por exemplo, O Corvo, do Poe. Acho a tradução do Fernando Pessoa muito melhor que o texto do poeta americano. Pessoa encontrou uma solução de gênio para a rima Lenore e nothing more. (Há uma tradução do Machado de Assis que é um desastre. Ovelha não nasceu para mato). Muitos outros casos semelhantes existirão na história da literatura. As traduções são como as mulheres – diz-se entre tradutores -. Quanto mais belas, mais infiéis.

O leitor devia perguntar a essa professora se ela consegue ler a Bíblia no original. Raríssimas pessoas no mundo são capazes disso. Para começar, os originais não mais existem. Nem por isso vamos deixar de ler a Bíblia. A propósito, recomendo vivamente a leitura de O que Jesus disse? O que Jesus não disse? – Quem mudou a Bíblia e por quê, de Bart D. Ehrman. É um ensaio brilhante sobre as modificações dos textos bíblicos durante os séculos, seja por obra de copistas ou de tradutores. O autor tem uma trajetória curiosa. Estudou grego e hebraico para ter acesso aos originais. Descobriu então que de original nada mais existe da Bíblia. Foi atrás dos fragmentos de cópias de cópias de cópias e cotejou as traduções. Acabou perdendo a fé.

A professora que afirmou que quem lê Dostoievski fora do russo é um leitor simplório é uma esnobe que deve ter estudado russo. Se Dostoievski tivesse de ser lido apenas em russo, não teria os milhões de leitores que hoje tem no mundo. Por outro lado, quem quer que não conheça russo, estaria teoricamente impedido de lê-lo.