¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

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terça-feira, setembro 30, 2008
 
A QUEM APROVEITA O CRIME?


Há leitores que julgam ser uma ironia o fato de um semi-analfabeto assinar o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que entrará em vigor em 1º de janeiro do ano que vem. De minha parte, vejo a coisa de forma um pouco diferente. Vai ver que o Supremo Apedeuta quer alfabetizar-se e decidiu aplainar o caminho, eliminando esses escolhos como acentos diferenciais, hífens e trema.

Se o novo acordo pretende uniformizar a língua, que seus defensores tirem o cavalinho da chuva. Independentemente de hífens ou sinais diacríticos, o brasileiro é uma língua já bastante afastada do português. Quando se trata de traduzir literatura, tanto na Europa como nos Estados Unidos, há tradutores do brasileiro... e do português. Certa vez fui inclusive convidado por uma editora do Rio para adaptar uma tradução portuguesa ao idioma brasileiro. Não gostei da idéia e sugeri ao editor fazer logo uma tradução da língua original ao brasileiro. Ele não topou minha sugestão nem eu topei a proposta dele.

Português e brasileiro são línguas diferentes, e já nem falo do angolano ou moçambicano, que não conheço. Em Portugal, para um brasileiro, às vezes convém falar inglês para melhor entender-se com os lusos. Eles têm prosódia e vocabulário bastante distintos. A ênclise e a mesóclise são normais em Portugal. No Brasil, soam como afetação. Preferimos a próclise. Em Portugal, eu posso dizer “dá-mo” ou “trá-lo” ou "chupai-ma" sem passar por pernóstico. No Brasil, sequer seria entendido.

No que se refere a vocabulário, há horas em que o brasileiro pouco atilado se vê no mato sem cachorro. Algum leitor tem idéia do que seja uma bica? Uma sopa de grelos? Punhetas de bacalhau? Pregos? Bifanas? Safadinhas? Febras de porco? Se, no restaurante, o garçom lhe perguntar se quer a ementa, você talvez diga que prefere olhar o menu antes de pedir tal prato. Ocorre que ementa é o menu. Se estiver no metrô e ouvir um alerta aos utentes, saberá do que se trata? Se trafegar pelas estradas, vai encontrar constantes avisos de Bermas Baixas. Será uma cidade? Uma estação balneária? Um restaurante? Ora, não é nada disso. É acostamento.

A lista é longa e estas diferenças lingüísticas jamais serão aplainadas. Não serão acentos, hífens ou tremas que unificarão as diferentes expressões do português. Reforma ortográfica significa adaptar todo o acervo literário de um país às novas regras. Se é para ser feita, que seja radical e não apenas cosmética. Digamos que facilitasse a manipulação da língua aos analfabetos. Mas seria então necessariamente antietimológica. E aí perderiam as pessoas cultas que gostam de ver numa palavra sua origem.

A quem aproveita o crime? A resposta está nesta nota, na Folha de São Paulo de hoje:

Os livros didáticos adaptados à reforma ortográfica só começarão a chegar às escolas públicas em 2010, mas, até o fim do próximo ano, os alunos deverão ter acesso a dicionários com as novas regras.

O Ministério da Educação vai renovar em 2009 todo o acervo de dicionários para os estudantes do ensino fundamental e médio -cerca de 8 milhões a 10 milhões de novos exemplares, segundo o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). O acervo atenderá cerca de 37 milhões de alunos.

O FNDE estima gastar de R$ 70 milhões a R$ 90 milhões na compra dos dicionários. A alteração dos livros didáticos será feita de forma gradual até 2012. Em 2010, os estudantes da primeira a quinta série do ensino fundamental receberão os livros adaptados.


Junte a isto a transposição de todo o acervo literário nacional, desde o santo dos santos - o Machadinho - até pedintes públicos como Lygia Fagundes Telles ou Ignácio de Loyola Brandão. O mundo editorial deve estar esfregando as mãos de contente. Multiplique isto pelo número de países lusófonos e você terá uma idéia da festança. Quanto a mim, desculpem-me editores e gramáticos, não aceito tal reforma. Pretendo continuar escrevendo como sempre escrevi.

E tem mais: a malsinada reforma não passa de um wishful thinking da burritzia brasileira. Portugal não a assumirá. Quem viver, verá.

 
SOBRE BUGRES E MUÇULMANOS


A propósito do sepultamento em vida de três mulheres no Paquistão, recebo as interrogações de um leitor.

O que me impressiona muito são pais que não satisfeitos em contaminarem seus filhos com religião, cegamente fazem o mesmo com as filhas. Ora, pelo que eu saiba são raríssimas as religiões que reservaram para as mulheres algum papel digno - e creio que ficaram como episódios históricos já devidamente esquecidos no tempo - em sua esmagadora maioria estão associadas ao "pecado" , ao "mal" , à "tentação diabólica". Qual a opinião do senhor sobre o fato de mulheres inteligentes, bem sucedidas adotarem religiões, se a própria religião não as considera pessoas lá muito dignas de respeito?

A pergunta suscita várias questões. Em primeiro lugar, mulheres inteligentes e bem sucedidas não adotam religião alguma. Muito menos homens inteligentes. Religião é coisa de pobres de espíritos, que se apavoram ante a intempérie metafísica. Ou de pessoas incultas, sem acesso à educação e à leitura. Ou de sacerdotes, que vêem neste medo uma extraordinária fonte de renda. Em segundo lugar, o leitor se refere ao episódio no Paquistão, país islâmico onde mulher não tem voz. Naquelas plagas, nem mesmo um homem pode não ter religião. Mulher então, nem pensar.

Todo ser humano nasce ateu. Ninguém nasce acreditando em deus ou deuses. Toda religião é decorrência da família e da escola, quando não do Estado. O brutal assassinato das irmãs Hameeda, Ruqqaya e Raheena estão chocando o mundo dito civilizado. Mas esta barbárie está bem mais próxima de nós do que imaginamos. Em fevereiro passado, eu comentava o direito que os indígenas brasileiros se reservam, o de matar filhos de mães solteiras e os recém-nascidos portadores de deficiências físicas ou mentais. Gêmeos também podem ser sacrificados. Algumas etnias acreditam que um representa o bem e o outro o mal e, assim, por não saber quem é quem, eliminam os dois. Outras crêem que só os bichos podem ter mais de um filho de uma só vez. Há motivos mais fúteis, como casos de índios que mataram os que nasceram com simples manchas na pele – essas crianças, segundo eles, podem trazer maldição à tribo. Os rituais de execução consistem em enterrar vivos, afogar ou enforcar os bebês. Geralmente é a própria mãe quem deve executar a criança, embora haja casos em que pode ser auxiliada pelo pajé.

No Afeganistão, políticos locais defenderam o assassinato das meninas como sendo uma questão de tradição. O senador Israrullah Zehri, do Baluchistão, disse se trata de "um velho costume", e teve o apoio de seu colega senador Jan Mohammad Jamili, que se queixou da "desnecessária politização" do caso. Mir Israhullah Zehri, um representante de Partido do Povo Paquistanês (PPP), do Baluchistão, apresenta como argumento uma justificativa cultural dos crimes de honra. "Estas são tradições que remontam há muitos séculos e eu sempre lutarei em favor da sua manutenção". Ou seja, os representantes máximos da nação aprovam incondicionalmente o enterramento em vida de três meninas que quiseram casar-se com homens que haviam escolhido. Para Ali Dayan Hasan, da organização Human Rights Watch (HRW), com sede em Nova York, os comentários de Zehri são “abomináveis e doentios".

Ora, a prática do infanticídio – e mesmo o sepultamento com vida de crianças - já foi detectada em pelo menos 13 etnias no Brasil, como os ianomâmis, os tapirapés e os madihas. Só os ianomâmis, em 2004, mataram 98 crianças. Os kamaiurás matam entre 20 e 30 por ano. E tudo isto sob os olhares complacentes da Funai, que considera que os brancos não devem interferir nas culturas indígenas. Mesmo entre os sacerdotes católicos que vociferam contra o aborto, não encontramos um só que denuncie estes assassinatos. Muito menos supostos humanistas da HRW se escandalizem com tais práticas.

Um outro leitor acha que a “barbárie relatada (no Paquistão) poderá ter sido, tanto um ato odiento, execrável, repelente, como um exemplo modelar de justica. Tudo dependera do que suceder aos executores. Só há crime quando há castigo, proporcional. Impunidade institui a regra”.

Então será regra. Ou melhor, já é regra. Nada acontecerá aos executores. O instigador do assassinato seria Abdul Sattar Umrani, que não é ninguém mais que o irmão de Sadiq Umrani, o ministro da habitação do governo do Baluchistão, um respeitado membro do PPP, o partido do clã dos Bhutto que está atualmente no poder no Paquistão. Segundo os jornais, o PPP tenta evitar ofender os chefes de tribos do Baluchistão, uma província que contribuiu de maneira decisiva para a eleição, em 6 de setembro, de Asif Ali Zardari, o viúvo de Benazir, para a presidência do Estado.

Da mesma forma, nada acontece aos animais que lapidam mulheres nos demais países muçulmanos. Muito menos aos animais que neste Brasil do século XXI enterram vivas suas crianças. Bugres e muçulmanos em muito se parecem.

segunda-feira, setembro 29, 2008
 
EM NOME DA HONRA


Pelo menos três leitores me enviam notícia do Le Monde, sobre episódio ocorrido no Paquistão. Pensei em comentar o assunto. Mas não há nada a comentar. Os fatos falam por si.

No Paquistão, um crime bárbaro em nome da tradição

Frédéric Bobin
Em Islamabad (Paquistão)

Eram três irmãs, com idades de 16 a 18 anos. Hameeda, Ruqqaya e Raheena viviam em Baba Kot, uma aldeia no Baluchistão, uma província árida situada no sudoeste do Paquistão, nos confins do Irã e do Afeganistão, lá onde a terra se resume a areia, pedras e rochas buriladas pelo vento. Elas morreram enterradas vivas numa vala comum. Foram vítimas de um "crime de honra" que, pela sua selvageria inédita, vem assombrando as consciências nestas últimas semanas por todo o Paquistão, onde a população geralmente aceita sem problema esses assassinatos que são práticas costumeiras ancestrais.

Hameeda, Ruqqaya e Raheena foram assassinadas em nome da tradição. Elas cometeram o crime de querer casar-se com o homem da sua escolha, e não com os primos que a tribo - dos umrani - havia indicado para elas. O que aconteceu realmente em 14 de julho, naquele dia funesto em que o crime foi perpetrado? Uma sucessão de fatos delineou-se em função das indicações que foram publicadas pela imprensa paquistanesa. Em 13 de julho, as três jovens mulheres haviam deixado sua aldeia de Baba Kot a bordo de um táxi, acompanhadas pela sua mãe e por uma tia. O grupo dirigiu-se na direção de Usta Mohammad, um vilarejo situado a 80 km, onde Hameeda, Ruqqaya e Raheena queriam comparecer no tribunal civil local para se casarem com os homens que haviam escolhido.

A escapada revelaria ser breve e, sobretudo, fatal. Mal haviam chegado a Usta Mohammad, as cinco mulheres foram raptadas por um comando de homens da tribo umrani que as perseguiam desde a sua partida. Elas tinham vilipendiado a ordem ancestral, que sujeita as moças às estratégias matrimoniais do clã, e, portanto, elas precisavam ser castigadas. Elas foram então embarcadas á força - sob a ameaça de fuzis - dentro da van Land Cruiser dos seus seqüestradores, que as conduziram de volta para a aldeia familiar de Baba Kot. Lá, uma jirga - assembléia de notáveis - estava à sua espera, solenemente convocada para decidir sobre as sanções a serem aplicadas contra elas. Prometeram-lhes uma morte muito especial. Esta seria precedida por um pavoroso suplício que deveria servir de lição para todas as outras moças da comunidade.

No dia seguinte, conduzem as cinco condenadas até a parte central de uma área deserta. Os carrascos da tribo levaram consigo uma escavadeira. A máquina começa a cavar uma fossa. Então, o motorista que está nos comandos do buldôzer aciona a lâmina dentada. Ele a dirige sobre as mulheres que estão amarradas e alinhadas. A ferramenta funciona como uma faca gigante que tritura sua carne, seus ossos, seu crânio. Depois disso, uma rajada de tiros de fuzil as ceifa. A escavadeira empurra então os corpos martirizados para dentro da vala que se tornaria o seu túmulo. Elas sangram em abundância, mas, conforme relatarão mais tarde os jornalistas paquistaneses, elas ainda não haviam sucumbido aos seus ferimentos quando os torturadores começaram a cobri-las com areia e pedras.

 
MARXISTAS NEPALESES
CRIAM DEUSA VIVA



Parece que os marxistas estão com dificuldades para vender seus peixes podres no Oriente. Leio que uma menina de seis anos, Shreeya Bajracharya, assumiu ontem o trono de Kumari, ou seja, deusa viva, em Katmandu. Bajracharya foi nomeada – se assim podemos dizer – deusa pelo governo maoísta, que assumiu o poder há três meses. Um ritual no templo de Kumari celebrou a ascensão da nova deusa, onde ficará reclusa até a puberdade.

No fundo, os camaradas nepaleses indicam ter mudado de tática. Como a guerrilha maoísta não conseguiu convencer os nepaleses em sua campanha contra o líder espiritual tibetano Dalai-Lama – Oceano de Sabedoria, em bom português – decidiram atacar com as mesmas armas, criando na marra uma nova divindade.

Até a proclamação da República, a indicação era uma atribuição real. Na semana passada, o governo decidiu que a decisão passaria a recair sobre o encarregado de manter o templo. Decisão sem dúvida das mais pragmáticas. Cria deuses quem sustenta o templo.

domingo, setembro 28, 2008
 
MELHOR CAMPANHA NENHUMA



Do Canadá, escreve Daniel Garros:

Uma coisa que me deixa triste ao ir ao Brasil é o que vejo em todo o lugar, seja em filas de SUS, consultórios médicos, rodoviárias, aeroportos, dentro dos ônibus, enfim... pessoas OLHANDO para os lados, sem distração, a pensar em nada e ver o mundo passar... Ninguém lendo!!! E se lêem, é jornal do dia (maioria na página esportiva). Seria o preço dos livros? Seria uma questão de estímulo? Falta de hábito estabelecido em casa (claro!), e na escola? Lembro que na minha época de 1º grau, recebi muito estímulo à leitura, e muitas análises de livros fizemos...

Aqui no Canadá, o que se vê, é ninguém nesse ócio! Todo mundo tá com livro na mão, sempre, em todo o lugar... até minhas enfermeiras na UTI têm que ser alertadas para deixarem em certas horas os livros de lado e olharem mais pros pacientes. Seja rico, seja pobre, seja burro ou inteligente... todo mundo tá lendo! A diferença entre as pessoas é somente o tipo e a classe de leitura (populares, eruditos, classicos, top of the chart)... Os livros do Harry Potter, por exemplo (críticas a parte), são devorados por crianças, adolescentes e até adultos. Eles reacenderam a paixão pela leitura para aqueles que ainda não a possuíam (poucos)...


Pois, Daniel, também tive a ventura de viver em países assim. Tanto na França como na Suécia, os vagões de metrô parecem salas de leitura. Em outros países por onde andei, observei o mesmo hábito. Vi inclusive jovens lendo partituras e vibrando com a música. Certa vez, voltando de uma dessas viagens, fui visitar uma amiga em São Paulo. Ela morava a uma hora de ônibus do centro. Muni-me de dois ou três jornais para suportar a viagem. Santa ingenuidade. Entrei num ônibus lotado, usei uma mão para pendurar-me num gancho enquanto a outra segurava meus inúteis jornais. Ocasionalmente, faço viagens noturnas de ônibus para o Sul. Uma excelente oportunidade de leitura, dirás. Nada disso. A iluminação não é suficiente para ler. Osman Lins, um dos raros bons escritores nacionais, chegou a fazer uma campanha para melhorar a iluminação nos ônibus. Para poder ler e não ficar olhando o vazio. Foi tido como louco.

Por um lado, as condições são hostis à leitura. Por outro, o brasileiro não é muito chegado a ler. O Brasil está contaminado pela comunicação visual. Há pessoas que adoecem se ficam um dia sem televisão. As NETs da vida sabem disto e os técnicos vêm voando quando há uma pane qualquer no sistema. Quanto a ler, disto não sentem falta alguma. Conheci professores de literatura que não tinham sequer um livro em casa. Entre meus colegas de jornalismo, notei a mesma miséria. Por necessidade profissional, o jornalista lê. Mas geralmente lê jornais e revistas. Raros são os jornalistas que têm uma biblioteca.

Pessoalmente, não consigo sair de casa sem um livro ou jornal na mão. Mas só ver
pessoas lendo de nada resolve. É preciso ver o que se lê. Em julho passado, quando naveguei pela costa norueguesa, fiquei contente ao constatar que muitos passageiros liam. Fui olhar o que liam. De Harry Potter a Paulo Coelho, passando pelo Código da Vinci. Vi pelo menos cinco lendo o Coelho. Em norueguês. Não tenho nada contra crianças ou adolescentes lerem Harry Potter. O problema é que vi marmanjos lendo Harry Potter.

Na época da ditadura no Brasil, me recordo de campanhas de leitura que tínhamos na escola. Selinhos que ganhávamos por livro lido, posters, outdoors, etc... Onde ficou isso? Será que nossos governos democráticos não querem que leiamos? Quem sabe uma campanha nacional pela leitura?

Ora, em um país cujo presidente se gaba de sua incultura, estimular a leitura soa quase como desacato à “otoridade”. Se com cultura não se chega ao poder, então cultura não serve para nada. Mas campanhas de leitura existem. Os editores adoram. Os escritores também. Servem para desencalhar seus entulhos. Com o pretexto de fornecer leitura, as editoras enviam milhares de livros a bibliotecas e escolas. Livros de amigos do rei, bem entendido. A finalidade das campanhas de estímulo à leitura no Brasil não é exatamente estimular a leitura, mas vender o tal de autor nacional. Isto é, o lixo literário nacional. Imortais que ninguém conhece, escritores medíocres e vendidos ao poder, pavões que se pretendem poetas. Nenhuma campanha dessas vai propor a leitura de Cervantes, Swift ou Nietzsche. Propõe-se a leitura das sumidades tupiniquins: Machado, Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Rubem Fonseca, Ignácio de Loyola, Lygia Fagundes Telles, Nélida Piñon, Moacyr Scliar, Carlos Nejar. Et caterva.

Para que tenhas uma idéia, meu caro Daniel, do que se passa em teu distante país: Lygia Fagundes Telles, há alguns anos, participou de uma comissão que escolheria 300 títulos a serem comprados pelo Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação. A imortal, ocupante da cadeira 16 da Academia Brasileira de Letras, teve o desplante de sugerir um livro seu, Ciranda de Pedra, para a lista dos trezentos. Do dia para a noite, sua cotação subiu nesta suspeita bolsa de valores. Segundo a revista Veja, seu passe foi comprado pela editora Rocco, para a publicação de doze livros, por 500 mil reais. Ora, se isto não é corrupção, não sei o que significa corrupção.

Ou seja, melhor que não se faça campanha alguma em prol da leitura. Só serviria para enfiar péssima literatura goela abaixo dos alunos. E para afastar os jovens da leitura.

sábado, setembro 27, 2008
 
BIBLIOANÁLISE, A NOVEL VIGARICE


Essa agora! Leio na Folha de São Paulo que a School of Life, de Londres, lançou um projeto de biblioterapia. Mediante certo pagamento, não exatamente módico, a terapia pelos livros. “A idéia é a seguinte: o cliente preenche uma ficha com informações sobre sua história, suas aspirações e seus hábitos e, a partir da consulta com um especialista, recebe indicações de leitura que o ajudem a enfrentar uma nova fase, encarar uma etapa importante ou simplesmente aproveitar um momento de sua vida”.

Uma sessão custa 35 libras (120 reais), mas pode-se escolher um contrato de cinco meses, em que o biblioanalista acompanha suas leituras e troca informações por e-mail, por 50 libras (170 reais).

Que livros fazem bem à saúde mental, não há dúvida alguma. Vou mais longe: fora da leitura não há salvação. Claro que você não vai morrer se não lê. Há milhões, senão bilhões de pessoas que não lêem e nem por isso vivem mal. Mas não entendem o mundo em que vivem e muito menos entendem a si mesmas. A leitura – a boa leitura, é claro – sempre teve um efeito terapêutico. Daí a pagar profissionais para orientá-lo sobre o que ler vai uma grande distância.

Os autores que me esclareceram sobre o mundo e sobre mim mesmo, eu os encontrei ao acaso, geralmente em bares. Explico: através de conversas com amigos em bares. As bibliografias de universidade foram mais ou menos inúteis. Nunca encontrei Nietzsche, Swift, Thackeray, Herman Hesse, Huxley, Orwell, Kazantzakis, Istrati, Ingenieros, Bertrand Russel, Reich, em currículos universitários. Aliás, pelo que intuo, a universidade sempre detestou estes autores. Em meu curso de filosofia, Nietzsche era visto como um vândalo irresponsável, não como um pensador. A academia sempre foi conservadora e não tem muito apreço por leituras que transformam.

Talvez não os tenha encontrado exatamente ao acaso, afinal não por acaso eu curtia pessoas que liam muito. Fora isto, sempre gostei de praticar a ronda das lombadas, como dizia Mário Quintana. Entrar numa livraria, ir bolinando os livros ao sabor dos títulos, trecheá-los. Através deste método, encontrei muita literatura vital. Hoje, quando já não leio mais ficções, vou direto às estantes de ensaios. Minha única queixa, nas grandes livrarias, é que as estantes são grandes demais. E misturam gêneros. Criou-se atualmente um título genérico para livros sobre religião – espiritualismo – e nessas estantes há um conúbio obsceno entre estudos sérios de religião e livros de auto-ajuda. Mas sempre dá para separar o joio do trigo.

Se você é leitor compulsivo, sempre saberá o que buscar e onde buscar. Um livro conduz a outros e o melhor biblioterapeuta é o autor que você está lendo. E sempre podemos nos aconselhar com amigos que lêem, que terão prazer em nos sugerir autores e jamais nos cobrarão um vintém. Eu, inclusive, sempre recebo consultas sobre leituras e sugiro títulos e autores com muito prazer. O único problema é que as leituras que me fascinaram talvez não fascinem outros. Gosto muito de recomendar Cervantes. Mas sei que não é uma leitura fácil. Além de exigir tempo, exige conhecimento de um vocabulário de quatro séculos atrás. Penso que Cervantes é mais indicado para pessoas que curtem a ironia, adoram a Espanha e querem viajar no tempo. Sem estes predicados, a leitura do Quixote pode ser uma tortura.

A School of Life abriu há três semanas e cerca de trinta pessoas já procuraram as sessões de biblioterapia. “Um casal planejava fazer uma viagem e procurava obras que ao mesmo tempo transmitissem o clima do lugar e dessem uma idéia não-ficcional do que iriam encontrar. Nosso consultor sugeriu alguns livros”. Ora bolas, precisa consultor? Não basta ir à estante de livros de viagem? O tal de biblioanalista, em verdade, é um substituto daquele antigo livreiro, que sabia do que tratavam os livros que vendia. Este profissional ainda existe, mas é cada vez mais raro. A verdade é que, com o gigantismo das livrarias e com a profusão de títulos editados, este conhecimento se torna mais ou menos inviável.

Certa vez, em uma livraria em Brasília, sei lá por que estranhas razões, andei procurando o romance Engenharia do Casamento, de Esdras do Nascimento. O balconista me encaminhou ao setor de livros técnicos. Outra vez, em Porto Alegre, pedi Sexus, do Henry Miller. O balconista atroz disse que estava em falta, mas ele tinha Nossa Vida Sexual, do Fritz Khan. Ou seja, desde há muito os funcionários de livrarias nada entendem da mercadoria que vendem.

A incultura dos balconistas parece estar gerando uma nova profissão, a dos tais de biblioanalistas. Ora, se psicanálise já é vigarice, biblioanálise é vigarice ao quadrado. A moda ainda vai chegar até nós. Se você tem amor a seu dinheiro, fuja destes picaretas.

 
ARCEBISPO REJEITA BÍBLICA PUNIÇÃO


Leio que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) quer a abertura dos arquivos do regime militar e a punição dos torturadores que atuaram a serviço da ditadura. Foi o que defendeu ontem o presidente da CNBB, Dom Geraldo Lyrio Rocha, com o alerta de que "perdão não é sinônimo de impunidade", e a defesa da tese de que "a abertura dos arquivos poderá elucidar e trazer a lume uma página dolorosa da história".

Ora, longe de mim pretender defender a tortura. Mas temos de admitir que é punição legítima, defendida pelo livro que embasa a fé de Dom Geraldo. Na Bíblia, mais precisamente no Apocalipse, quando o quinto anjo toca a sua trombeta, abre-se um poço no abismo. Dele sobe fumaça, que escurece o sol e o ar.

9, 3 - Da fumaça saíram gafanhotos sobre a terra; e foi-lhes dado poder, como o que têm os escorpiões da terra. 4 Foi-lhes dito que não fizessem dano à erva da terra, nem a verdura alguma, nem a árvore alguma, mas somente aos homens que não têm na fronte o selo de Deus. 5 Foi-lhes permitido, não que os matassem, mas que por cinco meses os atormentassem. E o seu tormento era semelhante ao tormento do escorpião, quando fere o homem. 6 Naqueles dias os homens buscarão a morte, e de modo algum a acharão; e desejarão morrer, e a morte fugirá deles.

Se cinco meses buscando a morte sem encontrá-la não é tortura, então não entendo o idioma da Bíblia.

sexta-feira, setembro 26, 2008
 
ESSA AGORA!


Comentei outro dia a insólita idéia de um cozinheiro de um restaurante suíço de usar leite materno em alguns de seus pratos. Após ter pedido que mães vendessem o material, ante a grita generalizada, teve de voltar atrás. Um leitor me envia recorte sobre outro uso inusitado do leite das mães. Um grupo de defesa dos animais nos Estados Unidos, a Ethical Treatment of Animals, está instando os produtores de sorvete a usar leite materno em vez de leite de vaca, para reduzir o sofrimento das vacas. Depois da religião criada a partir de Guerra nas Estrelas, esta é talvez a mais recente demonstração da humana estupidez.

É preciso ser um idiota urbano total para achar que uma vaca sofre quando é ordenhada. Pelo contrário, sofre se não for ordenhada. Que os seres humanos consumam leite humano, nada demais. Aliás, começamos assim nossas vidas. Daí a alegar o sofrimento das vacas, é fundamentalismo ecológico. Sem falar que leite materno só é bom mesmo na fonte.

A humanidade não tem cura.

 
NUNCA FOI TÃO FÁCIL



Há uns três meses, teci comentários sobre a cientologia, igreja que foi definida na Alemanha, Áustria e Holanda como seita gananciosa, filosofia inescrupulosa, lavagem cerebral. A religião foi criada por um escritor de ficção científica, Lafayette Ron Hubbard. Há 75 milhões de anos, dezenas de planetas eram governados por um líder maligno, Xenu. Para sanar um problema de superpovoamento, Xenu teria segregado bilhões de seus habitantes na Terra. Eles foram mortos com bombas de hidrogênio, e seus espíritos - os thetans - passaram a vagar pelo planeta. Os thetans foram ainda submetidos a um processo que os tornou inaptos a tomar decisões. Cada habitante da Terra atual seria uma reencarnação desses espíritos.

Consta que Hubbard estava insatisfeito com seus ganhos em direitos autorais e decidiu aumentar sua renda criando uma religião. A nova crença, curiosamente, conquistou fiéis e financiadores poderosos em Hollywood, entre eles Tom Cruise, John Travolta e Lisa Marie Presley. A religião foi criada nos anos 50 e já tem quase 10 milhões de fiéis. É curioso que esteja sendo perseguida juridicamente em alguns países europeus. Afinal, qual religião não é uma seita gananciosa, uma filosofia inescrupulosa e lavagem cerebral? O problema de Hubbard e seus seguidores é que a seita tem apenas meio século, enquanto outras gozam do prestígio de dois ou mais milênios.

Bom, discutindo religiões com amigos de Internet, comentei que se poderia criar uma a partir do roteiro de Guerra nas Estrelas. Tarde piei. A igreja já existe, contou-me um de meus interlocutores. Dois irmãos - Barney e Daniel Jones - fãs de Star Wars fundaram uma igreja Jedi no País de Gales. Barney – conhecido como mestre Jonba Hehol – e Daniel – mestre Morda Hehol – planejam incluir entre o cerimonial sermões sobre a Força, treinamento de sabres de luz e técnicas de meditação. A Universal Life Church, como se denomina a nova fé, está emitindo certificados que atestam ser o portador um cavaleiro Jedi.

Mais ainda. Crentes da Nova Zelândia, Inglaterra, País de Gales e Austrália pretendem que a nova religião conste das estatísticas censitárias. Na Nova Zelândia, milhares de emails sugeriram que a Universal Life Church fosse declarada religião oficial no país.

Vasto é o mercado dos famintos de fé. Nunca foi tão fácil criar religiões. Pobres de espírito é material que não falta.

quinta-feira, setembro 25, 2008
 
DO QUAGLIO



Caro Janer,

Saudações,

Logo que li o título de seu último artigo, lembrei-me de outros textos seus, em que você narra a educação católica que recebeu na infância, ministrada por padres. Isso me faz pensar que pertencemos a gerações diferentes, cujas experiências com educação na infância foram bem diferentes. Tenho 31 anos e, portanto, freqüentei a escola entre 1980 e 1994, ano em que concluí o segundo grau. É possível concluir, então, que a maior parte de meus professores freqüentou a universidade nas décadas de 1960, 1970 e 1980. Logo, quase todos saíram de seus cursos universitários encharcados de marxismo, principalmente os saídos de cursos de licenciatura em história.

Penso que não há muita diferença entre o catecismo dos seus professores padres e o discurso marxista dos meus professores vermelhos. A situação não mudou muito desde que eu saí da escola, e é por isso que não me espanto (mas lamento muito) quando vejo jovens louvando o mal, digo, o Mao, o Che, o Lênin, e outras figuras do bestiário dos dois últimos séculos. Não são todos os seres humanos que conseguem remover o imprint insculpido na mente durante a juventude. Assim como muitas pessoas mais velhas manterão a carolice católica por toda a vida, muitos jovens manterão esse esquerdismo idiota até a morte. Infelizmente.

Um grande abraço,

Humberto Quaglio

quarta-feira, setembro 24, 2008
 
SHARIA EM CAHORS



Escândalo na França. Por ter enviado quatro cartas postais representando seios nus, um artista de mail-art, Philippe Pissier, está arriscando três anos de cadeia. É acusado de perturbação da ordem pública.

Mail-art é uma forma de arte que consiste em enviar obras de arte pelo correio. Em junho passado, Pissier participou de uma exposição de mail-art erótica na Alemanha. Enviou então, devidamente seladas, quatro cartas postais representando os seios de uma mulher. O centro de triagem postal de Cahors depositou imediatamente queixa na justiça. Estimando que imagens de um busto feminino são pornográficas, Isabelle Ardeef, substituta do procurador da Justiça de Cahors, ordenou uma investigação preliminar.

Convocado à delegacia de polícia, Philippe Pissier descobriu ser passível de três anos de cadeia e de 175 mil euros de multa, em virtude do artigo 227-24 do Código Penal. Motivo: perturbação da ordem pública e exposição ao perigo do psiquismo das crianças por uma obra pornográfica.

Pissier protesta: “Eu sou maior, os funcionários do centro de triagem postal são maiores, o carteiro é maior e o destinatário é maior. Não vejo onde está o problema”. O artista teve sua casa invadida, a polícia de Cahors requisitou seu computador e algumas dezenas de obras. Privado de seu instrumento de trabalho, Pissier espera saber o que a Justiça francesa lhe reserva.

Estará a França assumindo pudores muçulmanos? Porque hoje em dia, só mesmo no mundo islâmico para considerar-se que seios nus sejam pornografia. Os quiosques de Paris estão repletos de cartões postais que mostram seios e glúteos e mesmo púbis, e nunca procurador algum pensou em processar o dono de algum quiosque por perturbação da ordem pública. É comum encontrar-se, não só nas praias da França mas até mesmo nos parques de Paris, mulheres fazendo topless. Os museus da França, todos freqüentados por crianças de idade escolar, também. A arte erótica francesa – que aliás vai muito além da exibição de seios – faz parte do patrimônio cultural do país.

Maître Baduel, o advogado de Philippe Pissier, se indgina: “Precisamos no perguntar se a sharia é aplicável a Cahors. Posso entender que em Dubai se aconselhe aos turistas evitar o monoquíni. Mas na França? Estaremos agora em terra de Islã?”

Pelo jeito, estão. Mais um pouco e se proíbe também o Cahors, um dos mais generosos vinhos da França.

 
MOMENTOS SUBLIMES DO LIVRO:
DE COMO O BOM PROFETA ELIAS
DEGOLOU 450 SACERDOTES DE BAAL




I REIS 18, 22 - Então disse Elias ao povo: Só eu fiquei dos profetas do Senhor; mas os profetas de Baal são quatrocentos e cinqüenta homens 23 Dêem-se-nos, pois, dois novilhos; e eles escolham para si um dos novilhos, e o dividam em pedaços, e o ponham sobre a lenha, porém não lhe metam fogo; e eu prepararei o outro novilho, e o porei sobre a lenha, e não lhe meterei fogo. 24 Então invocai o nome do vosso deus, e eu invocarei o nome do Senhor; e há de ser que o deus que responder por meio de fogo, esse será Deus. E todo o povo respondeu, dizendo: É boa esta palavra. 25 Disse, pois, Elias aos profetas de Baal: Escolhei para vós: um dos novilhos, e preparai-o primeiro, porque sois muitos, e invocai o nome do Senhor, vosso deus, mas não metais fogo ao sacrifício.

(...)

36 Sucedeu pois que, sendo já hora de se oferecer o sacrifício da tarde, o profeta Elias se chegou, e disse: ó Senhor, Deus de Abraão, de Isaque, e de Israel, seja manifestado hoje que tu és Deus em Israel, e que eu sou teu servo, e que conforme a tua palavra tenho feito todas estas coisas. 37 Responde-me, ó Senhor, responde-me para que este povo conheça que tu, ó Senhor, és Deus, e que tu fizeste voltar o seu coração. 38 Então caiu fogo do Senhor, e consumiu o holocausto, a lenha, as pedras, e o pó, e ainda lambeu a água que estava no rego. 39 Quando o povo viu isto, prostraram-se todos com o rosto em terra e disseram: O senhor é Deus! O Senhor é Deus! 40 Disse-lhes Elias: Agarrai os profetas de Baal! que nenhum deles escape: Agarraram-nos; e Elias os fez descer ao ribeiro de Quisom, onde os degolou.

19, 1 - Ora, Acabe fez saber a Jezabel tudo quanto Elias havia feito, e como matara à espada todos os profetas.

terça-feira, setembro 23, 2008
 
DA SENILIDADE DE NOSSOS JOVENS



Que antigas múmias ainda louvem Stalin, Mao, Pol Pot, Castro, Che Guevara, isto não me surpreende. Fizeram carreira montados no marxismo e ainda encontram algum caldo de cultura, nesta América Latina atrasada, onde podem cultivar suas flores podres. Assim sendo, faz parte do previsível que velhos comunistas como Oscar Niemeyer, Zuenir Ventura, Ariano Suassuna, Luís Fernando Verissimo ou Antônio Abujamra continuem fiéis a exauridas doutrinas do século XIX.

Árvore velha não se dobra, quebra. Intelectuais que fizeram fortuna – não só literária, mas também pecuniária – incensando tiranias socialistas não conseguem renegar suas bibliografias ou biografias. Seria algo como admitir: “fui um canalha toda minha vida”. Um jovem ainda consegue fazer tal confissão, ainda lhe sobra existência para redimir-se. Para o velho não sobra nada. Se admitir, está confessando que toda sua vida foi um fracasso.

Costumo afirmar que há uma época para renunciar ao marxismo. Se for exigente, eu fixaria os anos 35 e 36, quando ocorreram as primeiras purgas stalinistas. Foi nessa época que homens como Gide, Camus, Koestler, Silone, Sábato, fizeram marcha à ré. Se for mais condescendente, fixo 1949 como última data para um homem honesto abandonar o marxismo. Foi o ano do julgamento do processo Kravchenko, em Paris. Naquele ano, foram desvelados, urbi et orbi, os campos de concentração e as matanças do regime soviético. Quem foi comunista depois de 49, ou era desinformado ou bandido.

O que me espantou, na homenagem a São Carlos Marighella, foi ver um grupo de jovens fazendo a apologia do terrorista em Porto Alegre. Espantou-me também ver uma jornalista de um jornal liberal, como o Estadão, que sempre defendeu a democracia e o Estado de direito, assinando embaixo da apologia ao terrorismo.

Nossos jovens são senis.

 
NÉSPOLI X ABUJAMRA


Caro Janer...

Possivelmente a apologia financiada pelo Estadão que Beth Néspoli fez da peça sobre o Marighella nem seja a pior coisa que ocorre nesse sentido ultimamente. Outras piores ocorrem com o suado dinheiro dos impostos. Semana passada vendo casualmente TV aberta assisti o final de um programa chamado “Provocações” na TV Cultura onde um tal de Abujamra entrevistava a si mesmo como candidato a vereador de São Paulo. Apesar da visível tendência da Cultura em apoiar democracias de cunho mais populares, algumas mitologias vendidas sempre enauseiam. Lá pelas tantas, depois de algumas frases de efeito, evidentemente chegou-se ao eterno problema-chavão da educação. Qual a solução apresentada por este senhor? Ele simplesmente teatraliza que pega um telefone, liga para Cuba e então pede para Fidel vir para o Brasil por um ano para resolver este problema “porque já tinha resolvido em Cuba” e desliga. A seguir fala-se da saúde. Novamente ele pega o dito telefone imaginário e liga para Fidel outra vez e pede para que fique mais um ano para resolver o problema da saúde também...

Este é o mesmo senhor que se orgulha de ter trazido o teatro de Bertold Brecht para o Brasil. O mesmo Brecht que ajudava a polícia política comunista da STASI onde muitos membros pertenceram a antiga Gestapo. E que, pelo que consta, quando soube que alguns implicados nos expurgos stalinistas não eram culpados disse algo como “Quanto mais inocentes eram, tanto mais mereciam morrer”. Ou então os famosos: “Mentir em prol da verdade”, “é melhor errar com o partido do que acertar fora dele”, "Ppra um comunista a verdade e a mentira são apenas instrumentos, ambos igualmente úteis à prática da única virtude que conta, que é a de lutar pelo comunismo.". E por aí vai...

Quantos precatórios será que já se gastou ao longo dos anos com a promoção televisiva de tais preciosidades?

Emerson Schmidt

P.S. - Apesar do Machado ser evidente forçação editorial nos vestibuares, a meu ver o Sagarana é bem pior. Que filólogos se interessem pelo registro de idiossincrasias lingüísticas, isto é natural. O que já não é natural é que alguém que será cobrado pelo seu conhecimento da norma culta da língua tenha de perder tempo se adentrando nesse tipo de coisa, especialmente se for de Exatas. Ou então que se restrinja a sua recomendação ao pessoal que estudará Letras. Até a revolução dos bichos seria uma indicação melhor...

segunda-feira, setembro 22, 2008
 
OS SANTOS PRECEITOS DE SÃO CARLOS MARIGHELLA


Transcrevo trechos do Manual do Guerrilheiro Urbano, de autoria do amargo santo da purificação:


A característica fundamental e decisiva do guerrilheiro urbano é que é um homem que luta com armas; dada esta condição, há poucas probabilidades de que possa seguir sua profissão normal por muito tempo ou o referencial da luta de classes, já que é inevitável e esperado necessariamente, o conflito armado do guerrilheiro urbano contra os objetivos essenciais:

a. A exterminação física dos chefes e assistentes das forças armadas e da polícia.

b. A expropriação dos recursos do governo e daqueles que pertencem aos grandes capitalistas, latifundiários, e imperialistas, com pequenas exropriações usadas para o mantimento do guerrilheiro urbano individual e grandes expropriações para o sustento da mesma revolução.

É claro que o conflito armado do guerrilheiro urbano também tem outro objetivo. Mas aqui nos referimos aos objetivos básicos, sobre tudo às expropriações. É necessário que todo guerrilheiro urbano tenha em mente que somente poderá sobreviver se está disposto a matar os policiais e todos aqueles dedicados à repressão, e se está verdadeiramente dedicado a expropriar a riqueza dos grandes capitalistas, dos latifundiários, e dos imperialistas.

(...)

No Brasil, o número de ações violentas realizadas pelos guerrilheiros urbanos, incluindo mortes, explosões, capturas de armas, munições, e explosivos, assaltos a bancos e prisões, etc., é o suficientemente significativo como para não deixar dúvida em relação as verdadeiras intenções dos revolucionários. A execução do espião da CIA Charles Chandler, um membro do Exército dos EUA que venho da guerra do Vietnã para se infiltrar no movimento estudantil brasileiro, os lacaios dos militares mortos em encontros sangrentos com os guerrilheiros urbanos, todos são testemunhas do fato que estamos em uma guerra revolucionária completa e que a guerra somente pode ser livrada por meios violentos.

Esta é a razão pela qual o guerrilheiro urbano utiliza a luta e pela qual continua concentrando sua atividade no extermínio físico dos agentes da repressão, e a dedicar 24 horas do dia à expropriação dos exploradores da população.

(...)

A metralhadora ideal para o guerrilheiro urbano é a INA calibre .45. Outros tipos de metralhadoras de diferentes calibres podem ser usadas - com o prévio conhecimento, dos problemas de munições. É preferível que o potencial industrial do guerrilheiro urbano permita a produção de um só tipo de metralhadora, para que a munição utilizada possa ser padronizada.

Cada grupo de tiro das guerrilhas urbanas tem que ter uma metralhadora manejada por um bom atirador. Os outros componentes dos grupos têm que estarem armados com revólveres calibre .38, nossa arma "padrão". O calibre .32 também é útil para aqueles que querem participar. Mas o .38 é preferível já que seu impacto usualmente põe o inimigo fora de ação.

As granadas de mão e as bombas convencionais de fumaça podem ser consideradas como armamento leve. Com poder defensivo para a cobertura e retirada.

As armas de carregador longo são mais difíceis de transportar para o guerrilheiro urbano já que atraem muita atenção devido seu tamanho. Entre as armas de carregador longo estão a FAL, as armas e rifles Máuser, as armas de caça tais como a Winchester, e outras.

(...)

A vida do guerrilheiro urbano depende de atirar, na sua habilidade de manejar bem as armas de pequeno calibre como também em evitar ser alvo. Quando falamos de atirar, falamos de pontaria também. A pontaria deve de ser treinada até que se converta num reflexo por parte do guerrilheiro urbano.

Para aprender a atirar e ter boa pontaria, o guerrilheiro urbano tem que treinar sistematicamente, utilizando todos métodos de aprendizado, atirando em alvos, até em parques de diversão e em casa.

Tiro e pontaria são água e ar de um guerrilheiro urbano. Sua perfeição na arte de atirar o fazem um tipo especial de guerrilheiro urbano – ou seja, um franco-atirador, uma categoria de combatente solitário indispensável em ações isoladas. O franco-atirador sabe como atirar, a pouca distância ou a longa distância e suas armas são apropriadas para qualquer tipo de disparo.

(...)

Quando já tem os recursos, o guerrilheiro urbano pode combinar a expropriação de veículos com outros métodos de aquisição.

Dinheiro, armas, munições e explosivos, como também veículos tem que ser expropriados. O guerrilheiro urbano tem que roubar bancos e lojas de armas, e conseguir explosivos e munições onde queira que os encontre.

Nenhuma destas operações se realizam com um só propósito. No entanto quando o assalto é somente pelo dinheiro as armas dos guardas também são tomadas.

A expropriação é o primeiro passo para a organização de nossas logísticas, que por si assume um caráter armado e permanentemente móvel.

O segundo passo é o de reforçar e estender a logística, dependendo das emboscadas e armadilhas em que o inimigo será surpreendido e suas armas, munições, veículos e outros recursos capturados.

Uma vez que o guerrilheiro urbano tem as armas, munições e explosivos, um dos problemas de logística mais sérios que terá em qualquer situação, é encontrar um lugar de esconderijo no qual deixar o material e conseguir os meios de transportá-lo e montá-lo onde é necessitado. Isto tem que ser completado mesmo quando o inimigo estiver vigiando e tiver as estradas bloqueadas.

 
JORNALISTA DO ESTADÃO FAZ
APOLOGIA DO TERRORISMO



Beth Néspoli, jornalista do Estadão, viajou a Porto Alegre a convite de um festival de teatro, Porto Alegre em Cena. E dedica farto hagiológio a uma peça, O Amargo Santo da Purificação, dirigida pelo grupo gaúcho Oi Nóis Aqui Traveiz e encenada na Praça da Alfândega. Quem é o amargo santo da purificação? Nada menos que o assassino e terrorista baiano Carlos Marighella.

O aprimoramento do grupo nesse teatro democrático fica evidente já na primeira cena que começa em dois pontos distintos do calçadão. Por um lado chegam atores cujas máscaras, figurinos, canto e coreografia remetem com graça a ancestrais africanos. O mesmo vale para os que chegam do extremo oposto cujas máscaras, figurinos e música informam tratar-se de imigrantes italianos. Nessa encenação, a clássica coreografia abre-alas vai além da função básica que é a de atrair o espectador distraído e anestesiado em sua rotina: transmite de forma poética e sutil informações importantes. Amálgama que se repetirá a cada cena.

O encontro dos dois grupos dá conta da ascendência de Marighella, filho de mãe negra e pai imigrante italiano, e estende tal origem à nação brasileira. Esse trânsito entre o privado (a trajetória de Marighella) e o público (a história do Brasil) se dará o tempo todo. E mais, as evoluções coreográficas, muito bem marcadas e atraentes, têm sempre dupla função, dramática e técnica. De forma sutil e eficiente, demarcam o espaço de representação. A roda amplia-se, ou se retrai, conforme a coreografia evolui. Enquanto isso, a trajetória de Marighella vai sendo narrada de forma atraente, com poesia e humor.

Numa das cenas, informações importantes chegam em versos cantados ao som do berimbau numa roda de capoeira da qual Marighella participa, uma de suas paixões, fica-se sabendo então, assim como o carnaval. Nessa fase jovem, a interpretação de Pedro De Camillis humaniza Marighella e faz dele um personagem de forte empatia. Paulo Flores interpreta o político maduro, já engajado na luta armada. O humor popular e picaresco dá o tom no momento do encontro amoroso entre Marighella e sua mulher Clara, vivida por Tânia Farias.

Numa bela cena, o grupo cita Glauber Rocha ao recriar a morte de Corisco em Deus e o Diabo na Terra do Sol para narrar a resistência de Marighella à prisão. Um divertido boneco de Getúlio Vargas sabiamente serve para quebrar resistências à contundente crítica que se segue, ao Estado Novo. Vale ressaltar ainda o impacto visual do carro alegórico que representa o golpe militar de 1964. Grupo que faz teatro de rua, de graça e por opção ideológica, a qualidade dessa criação do Ói Nóis foi uma das provas na programação do Porto Alegre em Cena do aprimoramento alcançado pela arte teatral brasileira.


Como paga de suas mordomias no festival de teatro gaúcho, Beth Néspoli faz a apologia do terrorismo. Em um jornal que se pretende defensor da democracia e do Estado de direito.

 
SINAL DOS TEMPOS



O Libération de hoje traz uma curiosa pergunta: quais são as causas da heterossexualidade? O jornal francês cita um estudo de 1905, Três Ensaios sobre a Teoria Sexual, no qual Freud afirma: “o interesse exclusivo do homem pela mulher é também um problema que requer uma explicação e não algo evidente”.

Sinal dos tempos. Ainda há pouco perguntava-se pelas causas da homossexualidade. De minha parte, sempre pensei que homem se interessasse por mulher – e vice-versa – simplesmente porque é bom.

Mas Freud fala do interesse exclusivo do homem pela mulher. Bom, não era assim no auge da cultura grega, antes que o cristianismo poluísse o mundo com sua idéia de pecado. A questão proposta pelo vienense tem uma resposta: judaico-cristianismo.

domingo, setembro 21, 2008
 
SOBRE A SABEDORIA DOS CATÓLICOS



Mais dia, menos dia, não falta quem reclame: que eu, ateu, pretendo dar lições de catolicismo aos católicos. Não é bem isso. Penso que quem professa uma fé deve pelo menos entendê-la. Assim como um marxista deve - ou deveria - pelo menos ter lido Marx, considero que um católico tenha pelo menos lido a Bíblia. Pelo jeito, não é o que acontece. Ainda há pouco, um leitor atento me transcreveu esta notícia.

A Bíblia, apesar de ser o livro mais difundido e traduzido no mundo, com versões em 2.454 idiomas, continua sendo quase desconhecida em muitos países que se dizem católicos, segundo pesquisa encomendada pela Federação Bíblica Católica, de Roma.

Participaram da pesquisa 13 mil pessoas de nove países: Estados Unidos, Grã-Bretanha, Holanda, França, Alemanha, Itália, Espanha, Polônia e Rússia. Somente 14% dos italianos entrevistados deram respostas corretas a perguntas básicas de conhecimento sobre a Bíblia, como "Os evangelhos são parte da Bíblia?", "Jesus escreveu livros da Bíblia?" e "Quem, entre Moisés e Paulo, era um personagem do Antigo Testamento?".

Os resultados não foram muito melhores nos outros países: somente 17% souberam as respostas nos Estados Unidos e na Inglaterra, 15% na Alemanha, 11% na França e 8% na Espanha. Os mais bem classificados foram os poloneses, com 20% de respostas corretas, e os piores foram os russos, com 7% de acertos.

Apesar disso, 75% dos norte-americanos afirmaram ter lido passagens da Bíblia nos últimos 12 meses, sendo que somente 27% dos italianos disseram o mesmo. França e Espanha tiveram respectivamente 21% e 20% de leitores da Bíblia.

Quanto a freqüentar a igreja, 32% dos italianos disseram fazê-lo, contra 55% dos poloneses e 45% dos norte-americanos. Entre os católicos ortodoxos russos, somente 6% vai a missa a cada domingo.


Ou seja, há gentes que são católicos como seriam corintianos ou palmeirenses. É questão de apostar num time. Nada entendem da fé que professam. Cabe a nós, ateus, que precisamos entender o que negamos, dar lições aos crentes.

Coisa que faço com muito prazer.

sábado, setembro 20, 2008
 
SOBRE MACHADO



Não gosto de caju. Nem de goiaba. Muito menos de Coca-Cola. Pepsi, ni pensar. Pensando bem, não gosto de refrigerante nenhum. Vinho rosé, muito menos. Até hoje, pelo menos, nunca ninguém acusou-me de preconceito em relação a caju, goiaba, Pepsi ou vinho rosé. Mas basta dizer que não gosto de Machado de Assis, lá vem a acusação: preconceito.

Ora, preconceito seria se eu jamais tivesse lido o Machado e afirmasse não gostar de sua leitura. Não é o caso. Li os principais romances de Machado e muitas de suas crônicas. Não vou afirmar que seja um escritor medíocre. Mas não consigo gostar. Trata-se de um pós-conceito: digo que não gosto após tê-lo lido. É curioso observar que quando elegemos um vinho, damos preferência a vinhos estrangeiros. Uísque, idem. Carro, também. Por que raios, na hora da literatura, tenho de preferir a nacional?

Nasci no Brasil, mas me criei embalado pelas coplas de Fierro. Quando ainda vivia no campo, antes mesmo de buscar as vacas para a mangueira, em torno ao fogo no galpão, meu pai me recitava os versos de Hernández. Eu não sabia quem era Hernández, provavelmente meu pai também não. Imaginávamos que Fierro era um gaúcho daqueles pagos, talvez até mesmo de nossa época. E nisto reside a importância de uma obra, quando o personagem mata o autor. Quando Hernández morreu, um jornal argentino noticiou:

Se murió el senador Martín Fierro

Lá pelos dez anos, conheci cidade. Não que tenha esquecido Fierro, suas coplas ficaram guardadas num desvão da memória. Mas havia uma biblioteca na prefeitura de Dom Pedrito e naquela pequena biblioteca estava o suficiente para nutrir o espírito de um jovem. Nela, li Platão e Cervantes, Balzac e Montesquieu, Voltaire, Flaubert e Maupassant. Quando fui ler Machado, já estava enamorado pela grande literatura.

Mais tarde, em Porto Alegre, mergulhei em Swift e Dostoievski. Foi certamente nos bares, e não na universidade, que descobri a melhor literatura. Li ainda Koestler e Orwell, Somerset Maugham, Papini e Pitigrilli. Descobri Nietzsche, leitura que mudou meus rumos. Machado foi ficando cada vez mais distante, com sua preocupação ridícula, mesmo para o século XIX, sobre se Capitu traiu ou não traiu Bentinho. Cervantes ironizava a humana loucura, Dostoievski estava discutindo religiões e o assassinato, Swift vituperava o gênero humano, Nietzsche decretava a morte de Deus, Marx planejava uma revolução. Enquanto isso, o Machadinho estava preocupado com um reles caso de infidelidade conjugal.

Nunca consegui gostar de Machado. Admito que escrevia bem, mas era muito raso como escritor. Em algum momento da história, tomou força a idéia que a literatura define uma nacionalidade. Criou-se então um afonsocelsismo na literatura nacional. É preciso louvar autores nacionais. E se entre eles não houver um que preste, elege-se um. Ora, quando leio, não estou preocupado com reflexões sobre ser brasileiro. Prefiro autores que me falem do ser humano.

A Veja desta semana, na esteira do centenário da morte de Machado, o saúda como “gênio da virada do século XIX para o XX”, como “um escritor atual, de uma vitalidade artística única no panorama brasileiro e mundial”. Brasileiro, vá lá! Afinal Machado é empurrado goela abaixo de adolescentes, como leitura obrigatória na escola e nos vestibulares. Daí a considerar Machado importante no panorama mundial, vai uma grande distância.

As traduções do escritor carioca no Exterior são obras de embaixadas que precisam vender algum produto tupiniquim. Também são produto de intercâmbios universitários. Sempre rendem bolsas, tanto no Brasil como lá fora. Machado é boa mercadoria, não fere convicções. Afinal, jamais tomou partido em relação a filosofia nenhuma. Neste centenário de sua morte, cita-se muito a inclusão de seu nome no cânone da literatura ocidental de Harold Bloom. Ora, Bloom já admitiu que seu cânone dependeu de encomenda de editoras. Se não pusesse Machado no cânone, é claro que não seria publicado no Brasil. Além disso, sequer menciona Hernández, o poeta maior do continente latino-americano. Trecheei seu ensaio numa livraria. Quando vi que não mencionava Hernández, deixei-o de lado.

Na universidade, o carioquinha impulsiona muitas carreiras. Se você escreve sobre Machado, entra automaticamente em bibliografias nacionais e internacionais, é chamado para deitar falação em simpósios e colóquios, ganha viagens, bons hotéis e excelente restauração. Machado é aposta certa, não há como perder. Acadêmico algum ousa atacar Machado. Viraria leproso na academia.

“Sê como o Machado, que perfuma o vândalo que o fere”, disse um PhDeus uspiano pretendendo criar um calembour engraçadinho. Talvez se referisse ao Millôr Fernandes, que o considera um escritor de segunda categoria. Ou talvez a Paulo Francis: “aquele mulatinho jamais devia ter aberto a boca”. Eu não chegaria a tanto. Mas, a partir da reação de leitores, concluí que não gostar de Machado é crime de lesa-pátria.

Não sou acadêmico, não disputo bibliografias, viajo, bebo e como com meu dinheiro. Não preciso louvar Machado para passar bem. Mesmo que precisasse, não louvaria. Não gosto e me reservo o direito de não gostar. Antes dele, há centenas de autores mais importantes na literatura universal.

A machadianos e machadistas, lanço um desafio. Não obriguem mais escolas e universidades a ler Machado. Joguem-no no mercado livre, ao sabor da oferta e da procura. E quero então ver se algum editor ousará editar o carioquinha.

 
SCHOPENHAUER E O ISLÃ



O leitor Aender dos Santos me envia um parágrafo de O Mundo como Representação:

"Templos ou igrejas, pagodes ou mesquitas, em todos os países, em todos os tempos, testemunham, no seu esplendor e grandeza, essa necessidade metafísica, que vivaz e indestrutível, mui de perto acompanha no homem a necessidade física. Se estivéssemos dispostos à sátira, poderíamos acrescentar, é na verdade, que se trata dum modesto comparsa, que nada custa satisfazer. Fábulas grosseiras, contos insípidos bastam por vezes para contentá-lo. E, com a só condição de lhe terem sido inculcados bem cedo, aceita-os voluntariamente como explicações de sua existência e como apoios de sua moralidade. Leia-se, por exemplo, o Alcorão: este mau livro bastou para fundar a religião de um mundo todo, para satisfazer durante doze séculos a necessidade metafísica de inumeráveis milhões de homens, para estabelecer sua moral, para introduzir nesta um supremo desprezo pela morte e para lhe inspirar o fanatismo de guerras sangrentas e de longínquas conquistas. Apresenta-nos o teísmo sob sua forma mais triste e mais pobre. É possível que se perca muito na tradução, mas eu não pude descobrir nele um só pensamento de algum valor. Isto prova que a capacidade metafísica não caminha a par com a necessidade metafísica".

sexta-feira, setembro 19, 2008
 
JUSTIÇA ELEITORAL CENSURA RELIGIÃO



Longe de mim defender o PT ou petistas. Ou defender religiões. Ou condenar comportamentos sexuais. Quem me acompanha sabe muito bem que considero o PT uma espécie de quadrilha organizada em torno de antigos ideais marxistas. Que considero toda religião vigarice. E que defendo o direito de qualquer pessoa optar pelo tipo de sexualidade que preferir.

Mas a Justiça Eleitoral de São Paulo andou exagerando ao multar uma rádio religiosa da capital por veiculação de propaganda contrária à candidata à prefeitura Marta Suplicy (PT). A rádio Musical, que ainda pode recorrer da decisão ao Tribunal Regional Eleitoral (TER), terá que pagar uma multa de R$21,2 mil. De acordo com a decisão, a emissora veiculou uma enquete dentro da sua grade de programação com a pergunta "Você fica com a Bíblia ou com o que diz a dona Marta?", ressaltando que a candidata defende posições contrárias à doutrina religiosa. Para a Justiça Eleitoral, "há propaganda negativa em que se aconselha aos fiéis a não votarem na candidata que defende os interesses dos homossexuais".

Estes histéricos pastores, que histericamente condenam o homossexualismo, em verdade temem sentir prazer com uma carícia na nuca. Só pode ser isso. Que tem a ver uma pessoa com as opções sexuais alheias? A cultural ocidental, que tem suas origens naquela Grécia onde homossexualismo era prática normal, há muito desistiu de condenar as relações entre pessoas do mesmo sexo. Estas relações só são puníveis, hoje, em culturas de bárbaros, como a muçulmana. Mesmo os religiosos que as condenam sabem muito bem que, se é pecado, não é crime.

De fato, os textos bíblicos condenam as relações sexuais entre homens. “Não te deitarás com varão, como se fosse mulher; é abominação”, diz o Levítico. E continua: “Nem te deitarás com animal algum, contaminando-te com ele; nem a mulher se porá perante um animal, para ajuntar-se com ele; é confusão”. Judeu não gosta de confusão. Talvez isto explique porque denunciaram Cristo aos romanos. Ou é homem, ou é Deus. Homem e ao mesmo tempo Deus, isto não cabe na cabeça de um judeu. Verdade que uma porta fica aberta. Não há, em momento algum do Livro, interdição a que uma mulher deite com uma mulher. Os pastores parecem estar cientes disto, pois até hoje não vi nenhum brandir a Bíblia contra as lésbicas.

Que religiosos desrecomendem candidatos cuja filosofia aceita comportamentos que eles, religiosos, consideram condenáveis, me parece absolutamente normal. Condenável seria pretender que a humanidade toda siga suas idiossincrasias. Condenável seria se exigissem que um candidato condenasse o homossexualismo. Não é o caso. Recomendam não votar na petista porque ela não só aceita, como também promove tal comportamento.

A Justiça Eleitoral, ao multar a rádio Musical, está impondo censura a um grupo religioso. Ora, num país em que as religiões neopentecostais não passam de ostensivos caça-níqueis que operam impunemente no espaço televisivo, é espantoso que juízes eleitorais se preocupem com a postura ética de uma emissora.

Chegamos a um momento em que não gostar de negros constitui racismo. Agora, pelo jeito, não gostar de homossexuais também constitui crime.

quarta-feira, setembro 17, 2008
 
SUÍÇA PROÍBE LEITE MATERNO EM RESTAURANTES


Uma inusitada discussão está sendo travada na Suíça. O cozinheiro de um restaurante de Winterthour teve que voltar atrás em sua intenção de usar leite materno em alguns de seus pratos, após ter pedido que mães vendessem o material. É o que leio no noticiário on line. Hans Locher, dono do restaurante Storchen, convencido das virtudes e do sabor agradável do leite materno, que redescobriu recentemente após o nascimento de uma filha, se pergunta: "Todos nos alimentamos do leite materno quando éramos bebês. Então, por que não tomá-lo também como adultos?" Para o cozinheiro, o leite materno é mais suave e tem mais gordura que o leite de vaca, por isso é excelente para elaborar sopas ou ensopados.

Passou então a oferecer 6,50 francos suíços (4 euros) por 400 mililitros do líquido, garantindo o anonimato da identidade das mães. As autoridades do cantão de Zurique não gostaram e ameaçaram denunciá-lo se colocasse a idéia em prática. "A legislação não considera os humanos como produtores de leite. Não estão na lista das espécies autorizadas, como as vacas e as ovelhas, embora também não estejam entre as espécies proibidas, como os macacos", disse Rolf Etter, do laboratório de controle alimentício de Zurique. Apesar do vazio legal, os responsáveis de saúde concluíram que a utilização de leite materno em um restaurante seria crime. Locher desistiu de incluir leite materno em seus pratos.

A questão é mais antiga do que parece. Três são os elementos que caracterizam a aliança dos filhos de Israel com Javé: a circuncisão, a observação do shabbat e as prescrições alimentares. O judeu piedoso só pode comer a carne de animais puros, ou seja, os que são ungulados, têm cascos fendidos e ruminam. E assim mesmo olhe lá!

No primeiro livro do Livro, Jacó – que passará a chamar-se Israel – luta com um enviado de Javé ou, segundo certas traduções, com o próprio Javé. Quando este enviado – ou talvez Javé – viu que não vencia, tocou a juntura da coxa de Jacó e a deslocou. “Por isso – diz o Gênesis - os filhos de Israel não comem até o dia de hoje o nervo do quadril, que está sobre a juntura da coxa, porquanto o homem tocou a juntura da coxa de Jacó no nervo do quadril”.

Ou seja: picanha, ni pensar. Volto à discussão sobre o leite. No excelente La Loi de Moïse, de Jean Soler, leio que esta grave questão já preocupava os judeus. Baseados numa prescrição do Deuteronômio, que se repete no Êxodo, os judeus não misturam o leite com a carne. “Não cozerás um cabrito no leite de sua mãe”. A interdição diz respeito ao cabrito, mas o judaísmo rabínico a estendeu a tudo que se refere a carne e leite.

Resta o problema: leite humano pode? Curiosamente, a questão implica uma outra: a antropofagia é permissível? Ou seja, carne humana é impura? Porque se for impura, o leite, produto da carne humana, também é impuro, já que o homem não está entre as espécies puras. O leite materno deveria ser então proibido. Mas outros rabinos, entre eles Nahmanide, afirmaram que a Torá não proibia, nem mesmo implicitamente, a carne humana. O leite estava salvo.

Com uma restrição. Segundo The Concise Book of Mitzvoth, de autoria de um rabino americano, aparecido em 1931 e republicado em 1990 em Nova York e Jerusalém, destes debates teológicos da Idade Média resultou um mandamento que se exprime assim: “O leite humano é permitido, mas um adulto não tem o direito de mamar”. (But a grown person is forbidden to suck at the breast).

Ora, assim sendo não tem graça.

 
HIPROCRISIA AO NORTE


Em janeiro de 1971, o deputado sueco Sten Sjöholm, do Partido do Povo, apresentou uma moção ao Parlamento sugerindo a estatização dos bordéis. Suas razões: o Estado vende bebidas alcoólicas e cigarros e não se escusa por receber dinheiro de ambos os lados. Tabaco e álcool são certamente mais prejudiciais para um homem que uma visita ao bordel. Os poseringsateljér (salas onde as mulheres se exibiam nuas) originavam mal-estar e problemas sanitários. Ao mesmo tempo, a necessidade de suas existências era inegável. O representante do Partido do Povo exigia um monopólio estatal dos bordéis para sanar o pântano da pornografia. Toda organização privada no ramo seria proibida. As profissionais seriam examinadas regularmente. A exploração desordenada das mulheres seria substituída pela responsabilidade da sociedade e cuidados mais humanos.

Na época, teve grande repercussão um panfleto de Lars Ullerstam, intitulado De Erotiska Minoriteterna (As Minorias Eróticas), que reivindicava:

“Criar bordéis! A criminalização destas instituições é uma das maiores besteiras de nossa época. Autorizando os bordéis, se remediaria a miséria sexual da sociedade e se diminuiria o número de gravidezes fora do casamento. Mas principalmente não se precisaria mais temer a perigosa criminalidade que a prostituição de rua traz consigo. Os gigolôs perderiam seu mercado e ninguém mais teria de pagar preços exorbitantes pelos prazeres sexuais.

“Os bordéis preenchem uma importante função de higiene social. Estas instituições seriam evidentemente dirigidas por médicos e assistentes sociais e a direção geral da Saúde Pública controlaria suas atividades. Assim organizada, a indústria de bordéis ofereceria garantias razoáveis de trabalho e colocação. Muitos jovens de ambos os sexos acorreriam a este ofício humanitário. Uma organização racional poderia fazer com que os preços da consumação sexual baixassem consideravelmente. Para adolescentes na puberdade e pobres poderiam existir preços reduzidos. Para os celibatários, os bordéis significariam um grande ganho de tempo, ao menos em casos mais urgentes, e assim lhes sobraria tempo para estudos. As mulheres sexualmente extenuadas poderiam repousar enviando seus maridos a estas casas de prazer sem ter de temer complicações. Sendo as festinhas e bailes formas de sociabilidade de nossa civilização, uma visita ao bordel após estas preliminares seria uma medida natural de higiene.

“A função mais importante dos bordéis seria no entanto aliviar a miséria sexual dos indivíduos que, por diferentes razões, não podem por si mesmos encontrar objetos de satisfação sexual”.

Assim falava Lars Ullerstam, nos anos 60. Na época, a prostituta era vista como uma espécie de assistente social. Lembro inclusive de ter lido entrevista de um policial, que não via nada de inconveniente na hipótese de sua filha optar pelo ofício. Que mais não fosse, ganharia mais do que ele. As profissionais eram em prosa e verso louvadas e tidas como heroínas.

Os tempos mudam, e como mudam. Uma lei de 1999 determinou que é perfeitamente legal vender sexo. Mas é ilegal comprar sexo. Os homens que pagam por sexo com uma prostituta - e também cafetões e donos de bordéis - estão sujeitos a multas ou a penas de até seis meses de prisão, além da humilhação decorrente da exposição pública.

Em meio a isso, o fisco sueco identificou o crescimento de um novo universo de contribuintes: o das prostitutas que querem pagar impostos no país onde a carga tributária está entre as mais altas do mundo. Segundo o jornal sueco Göteborgs-Posten, a tendência vem sendo registrada nos últimos três anos pelo Skatteverket, a entidade fiscal sueca. A razão apontada para a nova leva de declarações de renda é que mais prostitutas estariam decidindo regularizar sua situação fiscal a fim de poder se beneficiar do generoso sistema de previdência social sueco. Os rendimentos declarados seriam taxados como atividades comerciais e dariam direito a auxílio-maternidade, compensações por motivo de doença e aposentadoria.

A nova tendência está gerando polêmicas. Para a deputada Désirée Pethrus Engström, líder da Associação de Mulheres do partido Democrata Cristão sueco, legitimar a prostituição através do recolhimento de impostos significa enviar uma mensagem errônea. "A segurança econômica é um fator que torna uma situação permanente. Isto pode estimular a prostituição, o que é um erro", disse a deputada.

Para Pethrus Engström, é inaceitável que uma pessoa "compre" o corpo de outra, e isto está explícito na legislação de 1999: "Ser uma prostituta é indiretamente ilegal, já que é ilegal comprar sexo. Mas esta é uma questão complexa, para a qual não há uma solução simples".

Como é que ficamos? Vender o corpo não é ilegal. Comprá-lo, é. Os suecos não ousam proibir o comércio sexual. Mas punem seus clientes. Se um dia foram coerentes, acabaram optando pela hipocrisia.

terça-feira, setembro 16, 2008
 
TÁ TUDO DOMINADO


Leitor me envia notícia do Sunday Times. Que a lei islâmica foi oficialmente adotada no Reino Unido, com cortes da sharia com poderes para decidir em processos civis muçulmanos. O governo sancionou discretamente os poderes de juízes da sharia desde processos de divórcio e disputas financeiras até aqueles envolvendo violência doméstica. Essas cortes foram instaladas em Londres, Birmingham, Bradford e Manchester. Duas outras cortes estão sendo planejadas para Glasgow e Edinburgh.

Quer dizer, está agora garantido aos muçulmanos o direito de espancarem suas mulheres, cortar o clitóris das filhas, vendê-las desde crianças a primos ou demais parentes próximos. Se levarmos em conta a fatwa do xeque marroquino Mohamed Ben Abderrahman Al Maghraoui, estão liberados os casamentos de adultos com crianças de nove anos.

Será talvez influência brasílica? Chez nous, os índios podem matar, estuprar, invadir prédios, instalar barreiras em estradas e fica tudo por isso mesmo. Só não pode fazer isso quem é branco.

Tá tudo dominado. A Europa se rende. Se você é jovem e quer conhecer um continente que ainda guarda alguns resquícios de civilização, vá logo antes que seja tarde.

 
COITADO DO ABUBAKAR


O nigeriano Mohammed Bello Abubakar, de 84 anos, foi preso ontem por um tribunal islâmico de seu país depois de descumprir a ordem de divorciar-se de 82 de suas 86 esposas. Acusado de insultar as crenças religiosas e de casamentos ilegais - afinal a islâmica proíbe que os homens tenham mais do que quatro mulheres ao mesmo tempo - Bello Abubakar, que vive com suas esposas e cerca de 170 filhos na cidade de Bida, alega que as ordens judiciais contrariam seus direitos à vida e liberdade pessoal.

Coitado do Abubakar, que vive em tempos de intolerância. Três mil anos atrás, o sábio rei Salomão amou muitas mulheres estrangeiras, além da filha de Faraó: moabitas, amonitas, edomitas, sidônias e hetéias. Isso que Javé dissera aos filhos de Israel: “Não ireis para elas, nem elas virão para vós; doutra maneira perverterão o vosso coração para seguirdes os seus deuses. A estas se apegou Salomão, levado pelo amor. Tinha ele setecentas mulheres, princesas, e trezentas concubinas; e suas mulheres lhe perverteram o coração”.

Bons tempos que não voltam mais.

segunda-feira, setembro 15, 2008
 
VIRGEM AMERICANA
SUPERESTIMA HÍMEN



Por falar no assunto, nos Estados Unidos, uma outra virgem quer vender... sua virgindade. Por um milhão de dólares. A menina, que se esconde sob o pseudônimo de Natalie Dylan, anunciou na semana passada que está colocando sua virgindade em leilão para pagar seus estudos universitários.

Nobilíssimo, o esforço da moça para educar-se. Tudo pela aquisição de cultura, até o próprio hímen. Só acho que Natalie está superestimando o valor de sua virgindade. No mercado contemporâneo ocidental, o valor da membraninha é praticamente igual a zero. Enfim, quem sabe no universo muçulmano a moça consiga um bom lance.

 
VIRGEM VENDE BEM



Sua Santidade Bento XVI visitou ontem o mais próspero mercado da fé na Europa, Lourdes, também conhecida como a Disneylândia do catolicismo. Segundo o Libération, com seus 223 hotéis, 14 mil quartos e 28 mil leitos – duas vezes mais que o seu número de habitantes - Lourdes é a segunda cidade hoteleira da França, depois de Paris.

Com mais de seis milhões de peregrinos por ano – ainda segundo o jornal parisiense – os santuários de Lourdes gerem um orçamento colossal de certa de 30 milhões de euros anuais. Cerca de 12 milhões de euros circulam em dinheiro líquido através das oferendas, caixas de esmolas e coletas, após cada missa. Três outros milhões provêm de doações e legados, solicitados aos crentes por correio, duas vezes por ano. O resto decorre das atividades conexas à peregrinação: hospedagem, restauração, compras em lojas, venda de livros, revistas, CDs, DVDs.

Apesar de a hotelaria oferecer hospedagens relativamente baratas, o município recolhe três milhões de euros por ano em impostos. O próprio prefeito da cidade, Jean-Pierre Artiganave, não é insensível a esta fábrica de dinheiro e mantém uma cervejaria e um comércio de objetos de culto junto aos santuários.

Quando Bernadette Soubirous, em 1858, disse ter visto a Virgem, certamente não tinha idéia da importante contribuição de sua visão mística à próspera indústria da fé. A cidade marial é a prova mais evidente de que a fé move montanhas... de euros.

 
MAIS UMA FATWA



Não bastasse o xeque marroquino Mohamed Ben Abderrahman Al Maghraoui emitir uma fatwa que legaliza a união entre uma menina de nove anos e um homem adulto, o xeque saudita Saleh Al-Louheïdane, Membro do Conselho Superior dos Ulemás e presidente do Alto Conselho de Justiça da Arábia Saudita, emitiu uma outra, que autoriza a matar, por intermédio da justiça, os proprietários de redes de televisão que suscitam a fitna (discórdia entre muçulmanos) e a depravação.

“É lícito matar quem quer que apele à discórdia se não for possível impedi-lo. É lícito matar, por intermédio da justiça, todo predicador da depravação das crenças ou de atos, se se revela impossível de impedi-lo por sanções menores que a morte”.

Ou seja, o xeque Saleh Al-Louheïdane está convidando os terroristas muçulmanos ao assassinato puro e simples. A fatwa visa emissões de variedades e de séries televisivas árabes – ou estrangeiras – julgadas impudicas e mesmo imorais ou ofensivas pelos ultraconservadores ou ultra-religiosos. As televisões européias que se protejam. Uma reportagem sobre alguma praia do Mediterrâneo ou Egeu sempre será impudica para um mulá. Um desfile de modas, também. Já deflorar uma menina de nove anos é salutar, digno e justo.

Como dizia o saudoso aiatolá Khomeiny: criminosos não devem ser julgados. Devem ser executados.

domingo, setembro 14, 2008
 
CRIA CUERVOS...

Ontem, em Paris, Sua Santidade Bento XVI perguntou retoricamente: “O mundo contemporâneo não criou seus próprios ídolos? Não imitou os pagãos da Antiguidade, desviando o homem de sua finalidade verdadeira, da felicidade de viver eternamente com Deus? Esta é uma questão que todo homem honesto consigo mesmo deve se colocar. O que é mais importante em minha vida? O que é que eu coloco em primeiro lugar? (...) É urgente falar de Cristo em sua volta, à sua família e a seus amigos, em seu lugar de estudos, de trabalho e de lazer”.

Bento parece querer trazer de volta ao seio de sua crença la fille aînée de l’Église, como já foi chamada a França, a filha mais velha da Igreja. Se um dia a França foi majoritariamente católica, hoje só um francês entre dois ainda se declara católico. E só um católico entre dois crê em Deus. Comentei, ano passado, uma enquete publicada no Le Monde des Religions, suplemento do jornal francês Le Monde, segundo a qual apenas 8% assistem a uma missa por semana. 46% só a assistem em ocasiões especiais, como batismos, casamentos, enterros. 16% rezam todos os dias. 30% jamais rezam. Apenas 52% crêem que Deus existe. Mas atenção: destes, se 26% têm certeza de sua existência, outros 26% a julgam provável. 31% não sabem que dizer, 10% acham que é pouco provável e 7% crêem que não existe. Para 26%, não há nada após a morte. Para 53%, “deve existir qualquer coisa, mas não sei o quê”. Apenas 10% acreditam na ressurreição dos mortos; 8% acreditam na reincarnação na terra em uma outra vida e 3% não se pronunciam.

Ou seja, Bento XVI está pregando no deserto. Quando fala, pretende estar falando a um universo católico. Em verdade, fala a pessoas que se dizem católicas, mas sequer sabem em que consiste o catolicismo. O insuportável nos papas é esta mania de se julgarem na posse da verdade. Que história é essa de achar que a finalidade verdadeira do homem é a felicidade de viver eternamente com Deus? No mundo contemporâneo, a idéia de felicidade passa muito longe disto. Bento o sabe muito bem. Como bom ator, finge que não sabe. Afinal um papa sempre se sente no dever de acreditar que as pessoas acreditam em deus.

Enquanto Bento profere suas bobagens às margens do Sena, os muçulmanos, mais pragmáticos, depositam suas esperanças no baixo ventre. Na Inglaterra, um grupo de radicais islâmicos pediu que casais muçulmanos façam mais filhos para que, pela explosão demográfica, eles possam tomar o Reino Unido, diz o jornal Daily Mail. A população muçulmana inchada seria bastante para "ocupar" o Reino Unido sem a necessidade de uma ação de fora. Essas revelações foram feitas durante encontro de novos muçulmanos no aniversário do 11 de Setembro. De acordo com o que foi exposto à platéia no evento, seria fácil impor a lei da sharia à população.

Nada de novo sob o sol. Em La Forza della Ragione, publicado em 2004, Oriana Fallaci mostrava uma Europa prestes a render-se à nova invasão do Islã. Se os árabes foram expulsos do velho continente pela força das lanças e espadas há cinco séculos, estão voltando agora munidos de armas mais sutis: direitos humanos, tolerância religiosa, diversidade cultural ... e o uso do ventre das muçulmanas.

Repito o que escrevi há três anos. Fallaci fala de uma Eurábia – e o neologismo não é seu, mas título de uma revista criada em 1975, por entidades européias em parceira com grupos árabes – na qual os muçulmanos passaram a impor suas mesquitas, seus ritos e atrocidades, sem respeito algum aos poderes europeus. Na Inglaterra já existe uma organização chamada Parlamento Muçulmano, cujo primeiro objetivo é recordar aos imigrantes que não estão obrigados a respeitar as leis inglesas: “Para um muçulmano respeitar as leis em vigor no país que o acolhe é algo facultativo. Um muçulmano tem que obedecer à sharia e ponto”, diz sua Carta Constituinte.

Em Granada, no bairro de Albaicín, os árabes criaram um Estado dentro do Estado espanhol, que vive com suas próprias leis e instituições. Com seu hospital, cemitério, matadouro, jornal, bibliotecas e escolas (onde se ensina exclusivamente a memorizar o Corão). Não bastasse isso, criaram moedas próprias, de ouro e prata, cunhadas segundo o modelo dos dirham utilizados nos tempos de Boabdil, que o Ministério da Fazenda espanhol finge ignorar.

Na Itália, centro histórico e político do cristianismo, as comunidades islâmicas já exigem o ensino do Corão não só nas escolas como nas faculdades de Direito, Teologia, Filosofia e História. Conquistaram ainda uma antiga e absurda reivindicação (que comentei há alguns anos, quando ainda era projeto), a de permitir que as mulheres árabes portem véu... nas carteiras de identificação. Em 1995, um ex-ministro do Interior emitiu uma circular informando a polícia que a obrigação de aparecer com a cabeça descoberta nas fotos dos documentos se referia somente ao chapéu. “Para não atentar contra o princípio constitucional garantido pelo artigo 19 em matéria de culto e liberdade religiosa, está, pois, permitido colocar nos documentos de identidade uma foto com a cabeça coberta com as citadas prendas” (as que formam parte da indumentária islâmica, entre elas o chador, o hijab e o turbante).

As mesquitas estão nascendo em todas as capitais e grandes cidade européias como cogumelos após a chuva, com apoio político e financeiro do Estado... e mesmo da Igreja Católica. Em Paris, o Instituto Cultural Islâmico da Rue Tanger, dirigido pelo fundamentalista argelino Larbi Kechat (preso mais tarde por seus vínculos com a Al Qaeda), foi criado graças ao apoio de dois padres católicos. Em Lyon, a Grande Mesquita foi mandada fundar pelo cardeal Decourtray. A Igreja Católica, diz Fallaci, “no fundo está de acordo com o Islã, porque os padres se entendem entre eles”.

E por aí vai. Para concluir, transcrevo este depoimento surpreendente de uma italiana de Milão, Aisha Farina, convertida ao islamismo. Para Aisha, a dominação da Europa é apenas uma questão de tempo.

- Um dia Roma será uma cidade aberta ao Islã e, de fato, já é uma cidade aberta. Porque nós, os muçulmanos, somos muitos. Milhares e milhares, muitíssimos. Mas não devem assustar-se. Isto não significa que nós queiramos conquistá-los com os exércitos, com as armas. Talvez todos os italianos acabem convertendo-se e de todas as formas os conquistaremos pacificamente. Porque a cada geração nós nos duplicamos ou mais. Por outro lado, vocês se reduzem à metade. Têm um índice de crescimento zero.

Segundo a ONU, os muçulmanos têm uma taxa de crescimento entre 4,6 e 6,4 por cento ao ano. Os cristãos, só 1,4 por cento. Enquanto Sua Santidade faz perguntas retóricas a uma platéia fictícia, os cabeças-de-toalha se reproduzem. Segundo o líder muçulmano Anjem Choudary, em 2020 a bandeira da sharia estará tremulando sobre Downing Street, já que 500 pessoas por dia estariam se convertendo ao islamismo e as famílias muçulmanas em locais como Whitechapel e Bethnal, a leste de Londres, estariam gerando de dez a 12 filhos cada uma.

Todos sustentados pela previdência britânica, é bom lembrar. Cria cuervos – dizem os espanhóis – y te picarán los ojos.

sábado, setembro 13, 2008
 
MOMENTOS SUBLIMES DO LIVRO



Êxodo, 32:25 - Quando, pois, Moisés viu que o povo estava desenfreado (porque Arão o havia desenfreado, para escárnio entre os seus inimigos),
26 pôs-se em pé à entrada do arraial, e disse: Quem está ao lado do Senhor, venha a mim. Ao que se ajuntaram a ele todos os filhos de Levi.
27 Então ele lhes disse: assim diz o Senhor, o Deus de Israel: cada um ponha a sua espada sobre a coxa; e passai e tornai pelo arraial de porta em porta, e mate cada um a seu irmão, e cada um a seu amigo, e cada um a seu vizinho.
28 E os filhos de Levi fizeram conforme a palavra de Moisés; e caíram do povo naquele dia cerca de três mil homens.

sexta-feira, setembro 12, 2008
 
INTOLERÂNCIA OCIDENTAL


Uma menina de nove anos, “dá com freqüência melhor resultado na cama que uma jovem de vinte”, disse o xeque marroquino Mohamed Ben Abderrahman Al Maghraoui. Maomé que o diga. Sua última mulher, Aicha, tinha nove anos quando casou-se com o Profeta.

Al Maghraoui lançou uma fatwa, no início deste mês, na qual legaliza a união entre uma menina e um homem adulto. “Contaram-nos, e nós constatamos, que as meninas nessa idade são capazes de melhores prestações que as mulheres adultas. Em conseqüência estão tão capacitadas para contrair matrimônio como as jovens de 20 anos.

O xeque me faz evocar Madame Claude, uma célebre caftina parisiense dos anos 60. Costumava fornecer meninas de treze e quatorze anos a potentados árabes. Em um interrogatório, um policial perguntou-lhe porque não trabalhava com meninas a partir de 18 anos.

- Mais à cette âge-là, Monsieur, elles sont à la retraite. (Nessa idade, Monsieur, elas já estão aposentadas).

Longe de mim negar razão ao xeque Mohamed Ben Abderrahman Al Maghraoui. Afinal, quem balizou a idade de uma menina para casamento foi Maomé. Se o Profeta pode, por que não poderiam os crentes? E se os crentes podem no mundo islâmico, podem também em qualquer outra geografia onde vivam.

O Ocidente tem de parar com essa mania de considerar pedofilia relações com meninas de nove anos. É no mínimo, racismo, intolerância religiosa, falta de respeito para com as crenças alheias.

quinta-feira, setembro 11, 2008
 
"QUANDO ALLENDE MORREU..."



Logo após o golpe no Chile, em 1973, a primeira versão dos fatos dizia que Salvador Allende fora assassinado pelos militares. Durante algum tempo, a própria viúva de Allende aceitou esta versão.

Em Os Dois Últimos Anos de Salvador Allende, publicado originalmente em 1985, Nathaniel Davis demoliu definitivamente este mito. Não faltarão objeções ao autor, afinal era o embaixador americano no Chile na época do golpe. O fato é que Hortencia Allende, no dia 15 de setembro de 1973, confirmou a um jornal mexicano o suicídio de seu marido. Quatro dias depois, falou em assassinato. Mais tarde, distante dos fatos e de quaisquer pressões, a viúva Allende reconheceu que de fato ocorreu um suicídio.

Acabo de assistir noticiário na Globo News sobre os 35 anos do golpe no Chile. "Quando Allende morreu...", diz o locutor. Em momento algum é dito o que realmente ocorreu. Allende suicidou-se.

 
PCC E PRECATÓRIOS



Em 1º de julho de 2004, uma quadrilha foi detida depois que escutas telefônicas feitas pelo Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic) detectaram que o PCC e o CV se preparavam para tomar de assalto a Penitenciária 2 de Franco da Rocha. Houve tiroteio e dois policiais por pouco não morreram e um acusado de ser do CV morreu. O bando tinha cinco fuzis, cinco submetralhadoras, seis pistolas, dois revólveres, três granadas e cinco coletes à prova de bala. Pretendiam tomar de assalto um presídio e soltar 1.279 presos, incluindo o seqüestrador Jorge de Souza, o Carioca, integrante do CV.

Terça-feira passada, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade e com aval do Ministério Público Federal, concedeu habeas corpus para nove integrantes do bando, considerado como a tropa de choque do PCC. Segundo o Estadão, a razão de o STF ter concordado em soltar os acusados é o fato de os réus estarem presos há quatro anos sem que nem mesmo a instrução do processo - fase em que são recolhidas as provas e depoimentos - tivesse sido concluída. O motivo de tanto atraso, como ressaltou o ministro Carlos Ayres Brito em seu voto, não foi nenhuma ação protelatória dos defensores dos réus, mas o fato de que muitas audiências foram canceladas e remarcadas por “falta de efetivo estatal para apresentação de presos ao juízo criminal, tendo em vista a alta periculosidade dos agentes”. Ou seja, não havia escolta policial suficiente para levar os presos com segurança do presídio ao tribunal.

Ou seja: como o aparelho judiciário não tem instrumentos suficientes para julgar e condenar criminosos, solta-se os criminosos. Sempre preservando-se rigorosamente as formas da lei. Uma quadrilha armada até os dentes é posta em liberdade porque não houve instrução de processo. “Não há quem discorde entre os juristas: o Supremo Tribunal Federal tinha de cumprir a lei e soltar os presos acusados de pertencer ao PCC – escreve Marcelo Godoy -. A demora do processo dos réus foi classificado como absurda e intolerável por juristas ouvidos pelo Estado”.

Para o presidente da seção São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o criminalista Luiz Flávio Borges D’Urso, manter alguém preso por quatro anos sem decisão em seu processo é um "excesso muito além do razoável. Não podemos permitir que os processos se perpetuem, pois Justiça tardia é injustiça. A segurança da sociedade reside na segurança jurídica e defesa inflexível dos direitos e garantias individuais."

Só no Estado de São Paulo 80 mil servidores já morreram sem receber seus precatórios. Fora os que morreram no país todo sem receber o que lhes era devido. Quando se trata de precatórios, jurista algum diz que Justiça tardia é injustiça, nem que a segurança da sociedade resida na segurança jurídica e defesa inflexível dos direitos e garantias individuais.

 
CHE REDIVIVO


Leio no El País que estreou na Espanha, na sexta-feira passada, a primeira parte do filme sobre Che Guevara, dirigido por Steven Soderbergh e protagonizada por Benicio del Toro. O filme está sendo projetado em 340 salas e foi o mais visto no último fim de semana. Ainda segundo o jornal, o célebre personagem, que também é um ícone da cultura de massas, conserva excelente saúde. O magnetismo do herói revolucionário cresce entre os jovens que renunciam ao maniqueísmo.

Para o escritor argentino Pacho O’Donnell, autor do livro Che. La vida por un mundo mejor (Plaza & Janés), "el mito del Che ha crecido alimentado por la sociedad en la que vivimos, frívola y materialista, que está justo en las antípodas de los valores que él representa. La caída del régimen comunista lo ha desposeído además de su condición ideológica, con lo que ha quedado de él su idealismo y su fuerza de personaje épico. Mientras más crezca la carencia de valores, más va a crecer ese mito".

A humanidade não tem cura. O assassino frio que sonhou transformar a América Latina em republiqueta soviética continua sendo cultuado como herói. Stalin, Pol Pot, Mao já foram desmitificados. A boa imagem do Che persiste. Se você quer ler um manual de fracassos, leia uma biografia do Che. Perdeu todas as lutas que encetou, exceto uma. Essa uma, Cuba, é hoje a mais antiga ditadura da América Latina e um dos países mais miseráveis do continente.

Volto a repetir Nelson Rodrigues. Envelheçam, jovens, envelheçam. Antes que seja tarde.

 
MENSAGEM DO ANDRÉ


Olá, Janer.

Meu nome é André, moro em Brasília e já escrevi umas poucas vezes lá no Pugnacitas. Andei lendo os últimos posts no seu blog. “Uma mudança de dieta é importante para diminuir o efeito estufa e outros problemas do meio-ambiente, que estão associados à alimentação do gado e outros animais.” Pois é, até parece que isso iria fazer alguma diferença.

“Diogo Mainardi, com suas trapalhadas, a cada processo que perde, está minando a credibilidade da revista. O recórter chapa-branca tucanopapista hidrófobo qualquer dia tem edema de glote, de tanto vociferar contra o PT. Não que eu defenda o PT, muito antes pelo contrário. Mas a obsessão diária com o partido cansa o leitor.”

Engraçado, porque o Mainardi vive dizendo que ganha tudo na Justiça. Ganhando ou perdendo, ele também está ficando cansativo. Mas o Reinaldo Azevedo já se tornou cansativo há muito tempo, uns quatro anos pelo menos. Ele é um obcecado anti-PT. Vou dizer um lugar-comum agora, mas acho que ele tem mesmo sérios problemas. É muito ódio dirigido contra um grupo só. Claro que ele nunca vai admitir que o fim de sua revista, Primeira Leitura, por falta de anunciantes/propaganda, explica boa parte de seu ódio ao PT — já que revistas vagabundas como Carta Capital vivem exatamente disso, propaganda, e pior, propaganda oficial, estatal. Sua cruzada começou aí.

Ele e o Mainardi são muito inteligentes e escrevem muito bem, mas sofrem da síndrome do “rempli de soi-même”. Sempre sabem tudo, explicam tudo, discutem tudo e dane-se o resto. Mal fingem ter alguma consideração pelos leitores. Para o Reinaldo, só servem os amestrados, aqueles ignorantes de extrema direita que cometem erros grosseiros de ortografia, concordância e regência nos “comentários”.

Esses dois não tem mais jeito. Não tem solução. O comportamento do Reinaldo quando o STF discutiu as pesquisas com células-tronco foi uma coisa tosca, medieval. Até falei sobre isso no meu último post no Pugnacitas. E o Mainardi se acha muito especial, o homem a quem coube a tarefa de continuar a tradição de Paulo Francis (mas nem se compara, coitadinho... esse também dizia muitas bobagens, mas acertava muito também e tinha estilo). Mais uma vez, algo que ele jamais vai admitir.

No final de 2007, eu, ingênuo, critiquei um monte de bobagens que o Reinaldo disse no dia em que mataram a Benazir Bhutto no Paquistão. Ele dizia coisas como “só um idiota não vê que foi o presidente Musharraf quem mandou matá-la”. Bem, o fato é que não foi. Musharraf era suficientemente inteligente e esperto pra saber que mandar matá-la era burrice, pois o resultado seria ainda mais caos no país e ódio dirigido contra ele. Por mais que ele a detestasse, não faria isso. Quem tinha bons motivos para fazê-lo era algum grupo jihadista local ou vizinho, ligado ou não à al-Qaeda. Eles vivem de insuflar o caos.

Claro, havia outros dois ou três bons argumentos, meus, sobre a política e a geopolítica interna no Paquistão, que deixavam bem evidente que Musharraf e os militares nada tiveram a ver com esse assassinato. Não fiz uma critica estúpida. De qualquer maneira, ela nem foi publicada.

“Lya Luft, com sua anódina coluna de auto-ajuda, está mais para Lair Ribeiro que para colunista. O mesmo diga-se de Betty Milan.” Ah, boa... Lya Luft é mesmo muito chata. Um saco! E a Betty Milan não tem jeito. Ela é muito “falsa sofisticada” pro meu gosto. Ainda que acerte em alguns conselhos. Costuma tropeçar feio quando quer demonstrar muita erudição. Soa como livro de história de 2o Grau ou livro de auto-ajuda.

Sobre os genes, o problema é que a genética às vezes é parte da coisa, não a coisa toda. Mas essa gente acha que tudo é "determinado" por ela e acabou. E eu sou outro homem sem pecados, pois pra mim pecado não existe. Acho que não seria difícil me canonizarem também!

Até mais!

André Barros

quarta-feira, setembro 10, 2008
 
OUTROS APOCALIPSES


Luiz Bonow me envia um link - http://www.bible.ca/pre-date-setters.htm - que lista todas as datas em que foram previstos fins-do-mundo. Fica o registro. Quando escrevi que profetas do apocalipse não fixam datas, exagerei no plural. Tinha em mente apenas João de Patmos.

 
ALGUMAS COISAS A FAZER
ANTES DO FIM DO MUNDO




- ler a meia centena de livros das últimas viagens, que ainda me esperam em minha cabeceira
- organizar meus baús de cartas, herança daquela distante época em que se escrevia cartas. Se bem que... para quê?
- comprar um leitor de ebooks
- rever uma bugra guarani, que namorei nos dias de Dom Pedrito e que me sussurrava ao ouvido: xemboraihú
- rever uma gaúcha de Porto Alegre que um dia reencontrei no Kungsträdgården, transida de frio, em Estocolmo. E com ela fazer de novo tudo o que fiz naquele dia
- ouvir czardas no Café Central, em Viena
- ouvir violinos ciganos nalgum café de Budapeste
- tomar uma Leffe radieuse no Metropole, em Bruxelas
- uma jarra de cerveja, daquelas de litro, na Hofbräuhaus, em Munique
- um cochinillo no Sobrino de Botín, em Madri, regado por um Marqués de Riscal
- uma andouillette A.A.A.A.A. no Aux Charpentiers, em Paris, com um bom Cahors
- um baba au rhum no Julien, em Paris
- uma île flottante, no Bofinger, em Paris
- rever aquela Carmen filmada pelo Francesco Rosi, com a Julia Migenes
- rever Die Zauberflötte, com a orquestra do Ludwigsburger Festspiele, com Deon van der Walt e Ulrike Sonntag, como Tamino e Pamina
- rever Don Giovanni, regida por Wilhelm Furtwängler, com Cesare Siepi no papel-título e Otto Edelman como Leporello
- ouvir Chavela Vargas, Miguel Aceves Mejía, Jorge Negrete
- subir Toledo a pé
- comer um cordero lechal no Aurélio, em Toledo
- descer Toledo a pé
- beber uma manzanilla no Venencia, em Madri
- degustar outro cochinillo naquela cave medieval do Café de Oriente, também em Madri
- subir de novo Santorini em lombo de mula
- descer Santorini em lombo de mula
- revisitar os vulcões de Lanzarote
- comer um churrasco assado nas lavas dos vulcões de Lanzarote
- rever a árdega peoniana de Skopje, que alegrou meus dias em Paris
- ver de novo um nascer de sol junto ao Tridente, no Assekrem, no Sahara argelino
- ouvir tuaregues contando histórias em torno a uma fogueira no topo da montanha
- beijar mais uma vez uma distante amiga numa meia-noite gélida em Paris, vendo além dos olhos dela a agulha da Notre Dame penetrando a lua em quarto crescente
- rever também aquela sabra baixinha e linda que alegrou meus dias numa travessia do Atlântico
- ver uma aurora boreal
- rever o sol da meia-noite, tomando um vinho naquela noite que não é noite com a Primeira-Namorada, em Tromsø, Noruega
- conhecer Svalbard
- Atacama, que ainda não conheço
- viajar ao México e empinar una copa junto a uma banda mariachi
- cantar canções de corno com os mariachis
- flanar pelas ruas desertas de Veneza, ouvindo o chiado dos sapatos no silêncio da noite
- reencontrar a peoniana na Piazza San Marco, num domingo ensolarado, no Café Florian, com violinos ao fundo
- rever o rancho onde nasci, lá na Linha, hoje tapera
- debruçar-me sobre os pastos e beber água na cacimba frente ao rancho
- abraçar minha professora de francês, dos dias de ginásio, em Dom Pedrito
- uma janta de despedida com o pequeno círculo de amigos que até hoje me acompanham. Discutiríamos a Bíblia, teologia e o apocalipse. Sempre embalados pelo sangue das uvas
- tomar mais um vinho com a Primeira-Namorada no topo do Edifício Itália, enquanto o sol se põe sobre esta São Paulo desvairada
- quando soarem os primeiros sinais do Apocalipse, vou sentar-me nalgum boteco e ler o Qohélet
- não é dado aos que partem voltarem. Se fosse, trocava tudo isto por um dia – um só dia, não mais que um só dia - com minha Baixinha adorada. E mergulharia feliz no buraco negro