¡Ay de aquel que navega, el cielo oscuro, por mar no usado
y peligrosa vía, adonde norte o puerto no se ofrece!
Don Quijote, cap. XXXIV

Powered by Blogger

 Subscribe in a reader

sábado, fevereiro 28, 2009
 
COMISSÁRIO DO POVO E DEMAIS
MINISTROS DESMORALIZAM STF



Tarso Genro, doublé de ministro da Justiça e capitão-de-mato, aquele mesmo ministro que deu acolhida a um terrorista italiano e mandou de volta para a ditadura cubana dois boxeadores que jamais assassinaram alguém e buscavam asilo no Brasil, afirmou ontem que, "do ponto de vista do ministério, temos consciência de que essas violações de propriedade privada são questões de ordem pública, de responsabilidade dos Estados, da polícia estadual e da Justiça estadual". Responsabilidade do ministério, pelo jeito, é dar abrigo a terroristas estrangeiros.

Comentei ontem que era esperada a manifestação urgente do comissário do povo Tarso Genro. Não se fez esperar muito. Como não podia negar que é crime financiar o crime, saiu pela tangente, como costuma fazer. “Não é de competência da União fazer policiamento ostensivo repressivo" – afirmou. Ou seja, há uma guerrilha católico-comunista organizada, treinada e aguerrida, cometendo crimes país afora, e a União não tem nada a ver com isso. Sobre os repasses de recursos financeiros pela União a movimentos sociais, o ministro disse que cabe a análise da CGU (Controladoria Geral da União) e do Tribunal de Contas. Ou seja, caso de polícia agora é de competência da CGU e do TC. Comentando as declarações do presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Gilmar Mendes, que, ao classificar as invasões de terras públicas e privadas de "ilegais", Tarso disse – serenamente, como se o governo nada tivesse a ver com o assunto - que o governo não pode disponibilizar seus recursos para qualquer entidade ligada a invasões, sob pena de ser responsabilizado por esses atos.

"Se tiver alguma irregularidade que envolva órgãos federais, é remetida para a PF realizar o inquérito. Então, nós recebemos com normalidade a manifestação do presidente do Supremo Tribunal Federal, e não temos nenhum comentário de conteúdo a fazer sobre elas", disse o petista.

O que encerra o assunto, pelo menos no âmbito do governo. O ministro afirma que é crime financiar o crime, Tarso admite que o governo deve ser responsabilizado por seus atos caso disponibilize recursos para qualquer entidade ligada a invasões e fim de papo. Até parece que o MST jamais invadiu terras no país.

Na Folha de São Paulo de hoje, demais vestais do Planalto manifestam veladamente seu desagrado com o ministro que disse que o rei está nu. Mas em momento algum entram no mérito da questão. Em Florianópolis, Dilma Rousseff, da Casa Civil, disse que o governo age dentro da lei ao transferir verbas às organizações e que aguarda manifestação "formal" do Judiciário sobre eventuais entidades que recebem recursos públicos e estão envolvidas em invasões. Eventuais entidades – diz a candidata ao governo em 2010 – que recebam recursos públicos e estejam envolvidas em invasões. Como se a ministra desconhecesse quais são tais entidades.

Já para o ministro Guilherme Cassel, do Desenvolvimento Agrário, "não existe ilicitude abstrata. É preciso saber se a ilicitude é referente a qual contrato, a qual convênio, a qual repasse, pra que a gente possa corrigir". Preferiu nem comentar o pronunciamento do ministro do STF, que disse que a ilicitude está em financiar o ilícito. Como se as ilicitudes não fossem absolutamente concretas e de conhecimento geral da nação.

Para o ministro Paulo Vanucchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, o MST não deve ser criminalizado em razão das mortes ocorridas após a invasão de uma fazenda em Pernambuco. Seria interessante saber quem deve ser criminalizado. Certamente os proprietários da fazenda invadida, que resolveram matar seus seguranças. "Movimento social tem que ser equacionado sempre com diálogo". Ou seja, basta um grupo de bandoleiros definir-se como movimento social e está ao abrigo de qualquer sanção penal.

A afirmação de Gilberto Mendes tem duas premissas. A primeira: é crime financiar o crime. Segunda: invadir terras é crime. A primeira, o governo até pode, teoricamente, aceitar. A segunda, jamais.

Neste Brasil incrível, em pleno século XXI, chega a causar escândalo afirmar que invadir terras é crime. O governo Lula sente-se acima da lei, senta-se em cima da lei e desmoraliza o Judiciário ao negar que crime seja crime.

sexta-feira, fevereiro 27, 2009
 
O TUMOR SUMIU


Tenho leitores que adoram ler sobre minhas andanças, leituras, amigas e vinhos. É como se eu vivesse um pouco por eles. A estes, trato com muito carinho e sempre procuro incitá-los a viajar. Mas há também os azedos. Aqueles que, à menor manifestação minha de felicidade, tornam-se ácidos. São ora fanáticos religiosos, ora simples invejosos. Tipo aquele personagem do Pessoa:

Toda a alegria me gela, me faz ódio.
(...)
Sinto em mim que a minha alma não tolera
Que seja alguém do que ela mais feliz;
O riso insulta-me, por existir;
Que eu sinto que não quero que alguém ria
Enquanto eu não puder.


Curiosamente, estes são meus mais fiéis leitores. Eles adoram curtir aqueles “dois minutos de ódio” diários, dos quais falava Orwell, em 1984. Não perdem uma só de minhas crônicas, nem a mínima ocasião de insultar-me. Como pode aquele ateu ter vida tão boa? Como pode aquele reacionário ter degustado tantos vinhos, freqüentado tantos restaurantes mundo afora? Esquecem que boa vida não depende de crenças e viajar implica freqüentar restaurantes. Não ligo. Não vou passar mal só para que eles se sintam bem. Tenho e tive momentos difíceis em minha vida, momentos que este tipo de leitor adoraria ler. Não vou dar-lhe este prazer.

Minhas atribulações não interessam a ninguém. Nestes dias em que escritores exploram a doença dos próprios filhos para ganhar prêmios e páginas na imprensa (a síndrome de Down ainda vai virar gênero literário), em que pacientes terminais expõem suas dores em jornais e vendem suas mortes na televisão, eu até poderia usar mão destes recursos para comover o leitor. Não é de meu feitio. Prefiro cantar a vida. Passado o temporal, posso até falar no assunto. Como falarei agora.

Começou no Natal passado. De início parecia uma simples dor de garganta, que me acometia sempre ao amanhecer. Ora, não vou procurar médico por uma dorzinha de garganta, pensei. De meu passado camponês, herdo um vício que pode ser letal: só busco médico quando a dor incomoda muito. Ou quando sinto que estou morrendo. Assim sendo, fui deixando. Mas a dor, apesar de perfeitamente tolerável, persistia. Meio que por milagre, tomei uma decisão. Afinal, não custava nada procurar um otorrino.

Fui lá. A moça não soube diagnosticar a coisa. Pensou em pênfigo, palavrinha que eu jamais tinha ouvido. Encaminhou-me a uma estomatóloga. Ela deu o mesmo diagnóstico. Fiz então o que não aconselho a ninguém fazer: fui procurar a palavrinha no Google. Passei por várias variantes da doença e acabei caindo numa, o fogo selvagem. Procurei imagens e quase tive um chilique na frente da telinha. Vi corpos consumidos pelas chagas, pessoas mais em carne viva do que em pele. Não pode, pensei. Isto é uma simples dor de garganta. Melhor fosse câncer.

Fiz biópsia. Não deu outra. Carcinoma de palato. Mas no laudo vinham duas palavrinhas mágicas em latim: in situ. Ou seja, localizado. Sem nódulos nem metástases. Mesmo assim minhas médicas não estavam acreditando muito no que viam. Fui enviado a outro profissional do qual também jamais havia ouvido falar: cirurgião de cabeça e pescoço. Ele pediu um segundo exame de laboratório. Conferiu: carcinoma de palato. De novo, in situ.

Pouco me abalei. Aquelas duas palavrinhas mágicas me confortavam. Nunca foi tão bom ouvir uma língua morta. Primeira providência: conclamei a Primeira-Namorada para um almoço comme il faut, para comemorar meu presentinho de Natal. Regado com um excelente carménère da Cordilheira. Carménère, a meu ver, combina com carcinoma. Se não rima, pelo menos alitera.

Só depois fui tratar de tratar-me. Para o cirurgião de cabeça e pescoço, eu teria de parar de beber por um ano. Um ano, Dr? Um ano é muito. Não dá pra negociar? Bom, cerveja pode. Já melhorou. Mas meu fraco é vinho. Bom, vinho também pode. O que não pode é uísque. Maravilha, pensei. Por uísque, entendi destilados. Ficar sem destilados por um ano não é afinal uma tragédia. Fui então encaminhado a um oncologista.

O oncologista foi radical: durante o tratamento, nada de álcool. Como criança pedindo doce, levantei timidamente o dedinho: nem uma cervejinha, Dr? Nem cervejinha. Mas o período de abstinência às boas coisas da vida já era menor: durante o tratamento. Que começaria dali a duas semanas. Bem entendido, isto foi suposição minha. Considerava que, enquanto não começasse a radioterapia, eu não estava em tratamento. Preferi não entrar em detalhes. Certas perguntas, melhor não fazer.

Enquanto médicos e físicos estudavam a estratégia das radiações, convoquei a Primeira, mais amigos e amigas, para festejar com carménères, malbecs, neros d’ávola, regalealis. Com esporádicos acenos ao Ballantines. Os melhores amigos, nunca sabemos quando vamos reencontrar.

Nos primeiros dez dias, foi um passeio no bosque. A partir daí, começaram os pepinos. Dificuldades iniciais para mastigar até total impossibilidade de mastigar. Sensação constante de ter mordido pimenta das bravas. Por vezes, parecia que um incêndio fora deflagrado em minha boca. Almoço, já nem lembro o que seja. Tenho vivido de sopas, sorvetes, iogurtes, ovos mexidos, suplementos, coisas assim. É também uma boa ocasião para visitar um francês e pedir uma île flottante. A sobremesa cai bem, passa pela garganta sem rasgá-la. Ironias da vida. Eu, que estava deplorando a ausência de bebida, agora não suportava nem mesmo a comida.

Fora isso, vida normal. Contei a coisa apenas a meus amigos e amigas mais íntimos. Houve pessoas de vários quadrantes querendo visitar-me. Proibí terminantemente qualquer visita. Só o que faltava visitar-me para me ver tomando sopinhas com Kronenbier. Amigas, de jeito nenhum! Vinho sem mulher passa. Mulher sem vinho não tem graça. Quero todos e todas aqui – afirmei então – para celebrar a cura e a bona-chira.

Estou contando tudo isto não para comover platéias, muito menos para agradar aqueles leitores iracundos tipo o personagem de Pessoa. “Com que alegria minha, cairia um raio entre eles!” – dizia a propósito das pessoas que se sentem felizes. Bom, o raio não caiu e a tempestade passou. No início da semana, o médico que coordena a equipe que me trata olhou-me fixamente, não no fundo dos olhos, mas no fundo da garganta. E disse: “A lesão sumiu”. Sem acreditar muito no que ouvia, perguntei: como é mesmo, Dr? Ele repetiu: “o tumor. O tumor sumiu”.

Enfim, o tratamento ainda continuará por alguns dias, mas agora as radiações se tornaram bem mais suportáveis. Poderia cacarejar como Paulo: “Ó câncer, onde está tua vitória?” Não cacarejo, não! Sei que meu caso é banal e foi constatado a tempo. Há ainda muita água sob a quilha e nunca se sabe o que vem pela frente.

Em suma, escrevo para compartilhar com leitores minha alegria. Há palavras lindas de se ouvir na vida, tipo eu te adoro, te quero bem, me aperta com força, me beija, fica só um pouquinho mais.

Mas ouvir algo como “o tumor sumiu” faz mais bem à alma que muita declaração de amor. Em breve volto aos trabalhos de bar. Tim-tim, leitor!

 
ÓBVIO IRRITA PLANALTO


Comentei ontem a insólita afirmação do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, que afirmou que financiar o ilícito é também uma ilicitude. O ministro classificava ainda como ilegais as invasões do MST. Finalmente uma alta autoridade do Judiciário descobria o óbvio.

O primeiro a se coçar foi – et pour cause – o governo, um dos grandes financiadores da guerrilha católico-comunista. Leio no Estadão de hoje que assessores do Planalto consideraram inadequada a atitude do ministro. Qualificaram como descabido o fato de Mendes opinar fora dos autos.

Ora, o ministro não estava exatamente opinando fora dos autos. Estava apenas enunciando um princípio geral de Direito. Se financiar o ilícito não é também ilícito, então posso contratar quem quiser para eliminar um desafeto e não estou cometendo crime nenhum. O paralelo pode parecer chocante, mas é isso mesmo. O fato é que, nas esferas do atual poder, há muito deixou-se de considerar crime a invasão de terras ou prédios pelos ditos “movimentos sociais”. Se é movimento social, pode invadir à vontade. O que não pode é invadir por razões individuais. Se você invadir o campo de seu vizinho por achar que precisa de mais espaço para seu gado, é óbvio que estará comentendo um crime. Mas se invadir em nome do MST, está apenas reivindicando o bom direito.

Há muitos crimes no Brasil que há muito deixaram de ser crimes. Entre estes, o aborto ou o uso de drogas. Estima-se em um milhão o número anual de abortos no país. Será que a polícia ignora onde se situam as clínicas que praticam um milhão de abortos? Ou uma rave. Todo mundo sabe, desde à polícia até os pais que financiam seus filhos, que não se concebe rave sem drogas. Mas todo mundo faz que não vê e estamos conversados. Se para o Planalto é descabido afirmar que financiar o crime é crime, mais um pouco e não será crime financiar o tráfico de drogas. Passará a ser algo tão simples, justo e legal como investir na Bolsa.

Para o governo, contra toda a lógica, não há ilegalidade no repasse de recursos para o Movimento dos Sem-Terra (MST). Assessores palacianos lembram que, no passado, quando houve denúncia semelhante, estudos feitos pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário não detectaram repasses irregulares. Ora, não é que os repasses sejam irregulares. Que eles são regulares, disto sabemos. Mas regular não é sinônimo de legal. Tanto o governo como as ONGs internacionais que financiam o MST estão financiando bandoleiros que fazem do crime uma bandeira.

Já a cúpula do Congresso endossou as críticas de Gilberto Mendes ao financiamento público dos sem-terra. Para os presidentes do Senado e da Câmara, José Sarney e Michel Temer , o Poder Judiciário deve coibir ilegalidades quando houver desrespeito à Constituição. Mais duas antas descobrindo a América.

Para o advogado Patrick Mariano, porta-voz da Associação Nacional de Cooperação Agrícola (Anca), Mendes "usa o cargo de magistrado para fazer política. Isso é arriscado para a democracia. Afinal, o que se pode esperar de um magistrado que se manifesta politicamente a respeito de uma questão, que mais tarde será julgada por ele? O que se espera de um juiz é imparcialidade e serenidade".

Ora, Mendes não estava fazendo política. Tampouco estava se manifestando politicamente a respeito de questão alguma. Estava apenas enunciando um postulado elementar do Direito: é crime financiar o crime. Mariano também lembrou que não foi a primeira vez que Mendes investiu contra o MST. "No discurso de posse ele já havia atacado o movimento".

Como afirmei ainda ontem, tudo não passará de um arroubo de retórica, um sonho de uma noite de verão. Ficará o dito pelo não-dito e o governo continuará financiando serenamente a bandidagem. Para poupar o Supremo Apedeuta de um pronunciamento, os áulicos do Planalto já tomaram a iniciativa de desqualificar o ministro. Isto não é coisa que se diga. Ainda mais quando quem a diz é um dos mais altos magistrados da nação. Espera-se a manifestação urgente do comissário do povo Tarso Genro.

Mais um pouco, e ilícito será afirmar que é ilícito financiar o ilícito.

quinta-feira, fevereiro 26, 2009
 
AINDA MOZART NA ÁFRICA (III)


De Francisco José de Queiroz Pinheiro, recebo:

Boa noite, Janer

A associação do subdesenvolvimento geral das nações negras africanas com deficiências da raça é inevitável. O Haiti e o Zimbábue são os exemplos extremos: de colônias razoavelmente produtivas passaram a países caóticos após a independência. Mas não acho que isso demonstre uma inferioridade inata da raça. Stephen Jay Gould dedicou um livro inteiro a esse tema. Nada encontrou. Todas as diferenças podem ser atribuídas inteiramente ao clima. Evolucionariamente, é improvável que os indivíduos mais hábeis da espécie tenham abandonado o continente africano e formado grupos mais evoluídos em outras regiões. O contrário, que os mais fortes e adaptados tenham ficado, é muito mais provável.

O que eu acho que explica o subdesenvolvimento congênito das nações negras, Janer, é o isolamento e inclemência extremos do continente africano, com suas secas, doenças e animais selvagens. Na África, até formiga mata. A economia torna-se incapaz de gerar excedentes. Na amena Europa, o animal mais feroz era o lobo, que logo ficou amigo do homem. Mas o isolamento, a falta de contato com outras civilizações, deve ter sido o fator mais determinante.

Na Europa, houve a transmissão de diversas culturas antigas, como a egípcia, a mesopotâmica, a semita, que vieram através da Grécia e da Roma antiga. Nada porém chegava à África, que permaneceu tribal e iletrada por séculos. Hoje, na era das comunicações, há sinais razoavelmente fortes de nações viáveis. Angola, Nigéria, África do Sul e outras, certamente.

Bom, pelo menos é essa a minha opinião, sem deixar de registrar minha admiração por um articulista que não tem medo de enfrentar o touro só com as unhas.


Salve, Francisco!

A questão é complicada. De fato, há o fator geografia. Mas também se vê que, numa mesma geografia, o negro continua em inferioridade cultural. Creio que as afirmações de James Watson não podem ser deixadas de lado, sem mais nem menos. O problema é: se algum dia se concluir definitivamente que negro de fato é menos inteligente, isso não pode deixar de ser dito, em nome do politicamente correto. Por isso aventei a hipótese de que se Watson tivesse afirmado, contra todas as evidências: AFRICANO É MAIS INTELIGENTE, ninguém o acusaria de racismo, nem universidades e instituições estariam cancelando suas palestras.

 
MINISTRO DESCOBRE AMÉRICA


Alvíssaras! Finalmente uma alta autoridade do Judiciário reconhece que financiar o crime é crime. Leio nos jornais que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Gilmar Mendes, se pronunciou ontem sobre a recente onda de invasões de terras deflagrada por movimentos sociais em São Paulo e Pernambuco. Para o ministro, o financiamento de tais movimentos com dinheiro público é crime com sanções previstas na lei.

Quem diria! Até hoje os sem-terra têm invadido fazendas com a nonchalance de quem faz um piquenique. Em vários Estados e municípios, contam com a cumplicidade dos governos, que se recusam inclusive a fornecer força policial para cumprir ordens judiciais de desocupação da área invadida. É só chegar, com gadanhos, foices e facões – esses curiosos instrumentos de trabalho da agricultura moderna – e mandar o proprietário passear. Se o proprietário reage, é considerado criminoso. Se contrata seguranças, os seguranças não são seguranças, mas jagunços. Há alguns anos, um investidor estrangeiro que resolveu abandonar a pecuária no Brasil, manifestava seu espanto: “Que país é esse onde alguém invade minha casa e eu tenho de recorrer a um juiz para tirá-lo de lá? “

O que era um mero caso de polícia, tornou-se uma affaire do Judiciário. Onde se viu expulsar um invasor de propriedades com polícia? Primeiro é preciso ouvi-lo, considerar suas razões para a invasão e depois, só depois, pensar em retirá-lo da propriedade invadida. Mesmo assim, há prefeitos e governadores que dão a uma ordem judicial menos importância que a um papel higiênico. O fato é que as invasões do MST só existem no Brasil porque têm, no fundo, a complacência do governo federal.

Gilmar Mendes classificou as invasões como "ilegais" e disse que o governo não pode disponibilizar recursos para nenhuma entidade ligada a esse tipo de crime. "Há uma lei que proíbe o governo de subsidiar esse tipo de movimento. Dinheiro público para quem comete ilícito é também uma ilicitude. Aí a responsabilidade é de quem subsidia", afirmou o ministro.

Muito bem! Quem tem subsidiado o movimento dos sem-terra? Fora uma miríade de ONGs estrangeiras, o próprio governo federal, que financia até o pagamento de professores de escolas para os filhos dos sem-terra, destinadas à formação de novos guerrilheiros católico-comunistas. A junção desta duas palavras pode parecer paradoxal. Mas o fenômeno existe.

Para o magistrado, as recentes invasões em São Paulo e Pernambuco extrapolam o limite da legalidade. "Os movimentos sociais devem ter toda a liberdade para agir, manifestar, protestar, mas respeitando sempre o direito de outrem. É fundamental que não haja invasão da propriedade privada ou pública", ressaltou.

Pergunta a quem interessar possa: quem vai denunciar o governo federal? Quem irá acusar os governantes locais que sempre foram lenientes com bandoleiros? Há mais de vinte anos, apoiados pela Igreja Católica e subsidiados pelo governo, os sem-terra têm tomado fazendas, improdutivas ou produtivas, têm invadido e saqueado bancos e delegacias, têm depredado laboratórios de pesquisa e ocupado próprios da União.

Apesar dos contínuos apelos à Justiça, por parte dos proprietários lesados, foram necessárias duas décadas para que um ministro do Supremo viesse a público para afirmar que invadir é crime e financiar invasões também.

O ministro descobriu a América. Só que de nada servirá tê-la descoberto. Foi apenas um arroubo de retórica, um sonho de uma noite de verão, que amanhã mesmo terá sido esquecido.

quarta-feira, fevereiro 25, 2009
 
SAUDADES DAS CARNES TOLLENDAS


Duvido que o fim do carnaval entristeça alguém mais do que eu. Nem o mais entusiasta dos foliões deve sentir tantas saudades da festa. Explico.

Sou obcecado por etimologias. Subscrevo um site espanhol que todos os dias me envia uma palavra. Desta vez foi carnaval. Que já aparece no Diccionario de Nebrija, em 1495, no qual é definido: Carnaval o carnes tollendas: carnis priuium, ou seja, privação da carne. Tollendas, do latim tollere (abandonar). De nada adiantou. Nos carnavais brasileiros, pelo menos o que mais se tem é carne. Não a bovina, por certo, mas uma outra carne também atraente e da qual ninguém se priva.

Até aí, nada de novo. Curiosa é a definição proposta para o evento: “Alguns antropólogos disseram que o Carnaval é uma festa de inversão social, na qual os pobres se sentem ricos e os poderosos trabalham ao serviço dos habitantes dos bairros mais pobres. De acordo com esta tese, a inversão social funciona como uma válvula de escape que alivia tensões sociais e permite a manutenção do status quo. Isto é particularmente verdadeiro no carnaval do Rio de Janeiro, onde não é raro ver um empresário ou diplomata empurrando um carro alegórico, do alto do qual um favelado saúda majestosamente o público, vestido de imperador romano ou de um deus grego”.

A tese, como toda tese de antropólogos, tem um ranço marxista e é tão antiga quanto o marxismo. Nos carnavais de hoje, pobre nem consegue entrar. No Rio, as fantasias repletas de plumas, paetês e esplendores custam, em média, entre R$ 250 e R$ 800. Um abadá, em Salvador, sai de R$ 60 a 360. Bem entendido, não estamos falando das fantasias dos destaques das escolas, de cujos preços não tenho idéia, mas certamente não estão ao alcance de qualquer mortal. Suponho que seja algo a partir dos sete dígitos. Se antes, do alto de um carro alegórico um favelado saudava majestosamente o público, hoje o alto do carro só é freqüentado por estrelas do show business.

O carnaval, como festa popular, há muito tempo morreu. O que existe hoje é uma indústria poderosa, que tem mais em vista o turista endolarado do que o folião nacional. Também nisto não há nada de novo. O curioso é constatar que quem transformou o carnaval em indústria, foi um líder de esquerda, nada mais nada menos que Darcy Ribeiro. Com seu sambódromo no Rio, excluiu do carnaval o povão. O sambódromo carioca fez escola, e hoje cada capital quer ter o seu. Se antes era só seguir o bloco, hoje paga-se para vê-lo passar. O carnaval foi confinado a uma espécie de estádio. Os ingressos podem ser comprados pela Internet. Há blocos com mais suecos e alemães do que com crioulos, afinal eles pagaram seus lugares e fantasias nas escolas. Há navios de cruzeiros atracando na baía. Seus passageiros descem aos magotes, desfilam e voltam ao conforto do barco. Talvez seja o carnaval voltando às suas origens. Porque carnaval não tem suas origens na África negra, como pensa muita gente. Carnaval nasceu em Roma. Originalmente, é festa de brancos.

Ok! Você sempre pode sambar no boteco da esquina ou nos blocos de rua. Sem pagar um vintém. Mas lá onde estão as deusas, os carros alegóricos, os grandes desfiles, lá é lugar de quem pode pagar e pagar bem. Resta-lhe também assistir ao carnaval pela televisão. O que, a meu ver, é bem mais inteligente. Tem-se uma visão de conjunto que não se tem em camarote algum em cima da pista. Mas os desfiles tornaram-se uma monótona sucessão de coisas iguais. Aposto que se a televisão transmitir um carnaval de dois ou três anos atrás como se fosse o de hoje, somente os especialistas da área perceberiam a coisa. Em anos passados, por vezes dediquei uns dez minutos para dar uma olhadela nas escolas. Este ano, não vi sequer uma nesga de carne na telinha. Esqueci de ligar.

Festa popular ou indústria, nunca gostei de carnaval. Em minhas seis décadas de existência, nunca fui a nenhum baile ou desfile. Não que a festa me desagrade. É meu asco às multidões. Talvez asco não seja a palavra adequada. Mas medo. As multidões me amedrontam. Mas adoro o carnaval de São Paulo. A cidade fica vazia e, pelo menos no bairro em que moro, não se houve som nenhum de batucada. É como se o carnaval não existisse. Foi o Vinícius, creio, que disse que São Paulo é o túmulo do samba. De fato, é. Por isso adoro o carnaval paulistano.

Daí porque lamento o fim das carnes tollendas. Hoje, “eles” começam a voltar. Voltam à cidade, que estava tão silenciosa e agradável, 1,7 milhão de carros. O que deve dar, por baixo, uns quatro milhões de pessoas. Acabou a São Paulo aprazível, que emerge a cada feriadão.

Nesta quarta-feira de cinzas, o que mais almejo é carnaval de novo.

 
AINDA MOZART NA ÁFRICA (II)


Do Humberto Quaglio, recebo:

Olá Janer,

Acompanhando em seu blog o tema inteligência, raça e cultura, lembrei-me de um artigo muito interessante publicado na Scientific American de 28 de novembro de 2007: http://www.sciam.com/article.cfm?id=the-secret-to-raising-smart-kids .

A idéia central deste artigo, que se baseia em uma pesquisa, é a de que a ênfase no esforço é mais determinante para o bom desempenho intelectual do que a inteligência inata, ou QI. Se uma criança é estimulada a pensar que deve sempre se esforçar por aprender mais, por se aprimorar, por desenvolcer a própria inteligência, ela pode vir a ter mais sucesso nos estudos, na vida escolar ou acadêmica, do que uma criança cuja inteligência superior inata é apenas elogiada, ou mencionada, mas que não é estimulada a dar importância ao esforço intelectual. Acho que isto é razoável. Se colocarmos uma criança muito inteligente para ser criada em um lar no qual os adultos só dão atenção a novela e futebol, só ouvem "funk" e outros ruídos desagradáveis do mesmo gênero, e onde a única leitura existente é anúncio de oferta de supermercado, não creio que tal criança terá um desenvolvimento mental significativo. Igualmente, se colocarmos uma criança de inteligência mediana em um lar onde a boa cultura é estimulada, onde se dá importância à boa leitura e aos estudos, possivelmente seu desenvolvimento intelectual será bom.

Na minha limitada cosmovisão, a idéia de que o meio não possui nenhuma influência sobre a inteligência é tola. Mais que isso, asinina. Da mesma forma, a idéia de que apenas o meio determina a inteligência ou o desenvolvimento intelectual de uma pessoa é igualmente tola. Para mim, é bastante óbvio que há pessoas que nascem mais inteligentes que outras, há crianças que, recebendo o mesmo estímulo, a mesma criação, possuem inteligências desiguais, capacidades cognitivas diferentes. Há quem aprenda com mais facilidade. Mas pensar que apenas um ou outro fator é absoluto, ou seja, que apenas a inteligência inata, a genética, ou o meio, vão determinar a inteligência de um indivíduo, é tolice. Tomemos como exemplo as crianças orientais desnutridas criadas por pais americanos, mencionadas em seu blog. Se separarmos tais crianças em dois grupos, e sanarmos a desnutrição em um deles, será que as médias de inteligência permanecerão as mesmas? Penso que isso seria pouco provável, e que as mais bem nutridas teriam uma média de inteligência superior. Desnutrição prejudica a inteligência. Isto me parece bastante óbvio e uma boa alimentação é um fator ambiental, não um fator genético.

Quanto à questão das raças, e das pesquisas sobre a inteligência média de cada uma delas, também desprezo essa sandice politicamente correta de que não se deve fazer pesquisa sobre o assunto. Considero o conhecimento da natureza importante, sem estas limitações tolas de caráter político. Assim, se a ciência corroborar a idéia de que é um fato natural a desigualdade de inteligência média entre as raças, mentir sobre isto por causa de ideologias políticas me parece besteira.

Porém penso que uma coisa deve ser levada em conta: o que se mede nestas pesquisas é a média de inteligência entre raças. A média! Ou seja, pode-se concluir que, independentemente da raça, é possível haver indivíduos mais ou menos inteligentes. Suponhamos que constate-se que a inteligência média dos brancos é inferior à dos asiáticos. Isto não significa que todos os indivíduos brancos são menos inteligentes que os asiáticos. Pelo contrário, significa que, mesmo que seja uma minoria, pode haver alguns indivíduos brancos mais inteligentes que alguns indivíduos asiáticos. O mesmo com qualquer outra raça. Assim, pode-se concluir que há negros mais inteligentes que brancos ou asiáticos, mesmo que a inteligência média da população seja diferente.

Para mim, isto basta para fundamentar outro aspecto da minha cosmovisão, ou seja, minha opinião de que não se deve prejulgar a inteligência de uma pessoa com base em sua raça, mas sim em seus méritos individuais, mesmo que a raça à qual ele pertença tenha uma inteligência média inferior.

Outro coisa que percebo quando me deparo com este assuntro é a confusão que muita gente faz quando discute a idéia de igualdade. Na maioria das vezes, percebo que pouca gente compreende a diferença entre os conceitos de igualdade formal e igualdade material, o que leva as pessoas a um equívoco (no sentido estrito da palavra equívoco, ou seja, chamar, ou considerar, igualmente, coisas diferentes). Muita gente acha que, se é óbvio que as pessoas nascem diferentes, que suas capacidades, seus méritos, suas habilidades, suas virtudes e vícios, bem como suas fortunas, são diferentes, então toda idéia de igualdade é tola. De fato, penso que a idéia de igualdade material é ingênua, tola. Aliás, a idéia de igualdade material é festejada entre os esquerdistas de todo tipo, sejam relativistas, pós-modernistas, socialistas, enfim, esta cambada de gente tola ou desonesta. No entanto, ainda considero a igualdade formal entre os indivíduos um dos princípios fundamentais para a boa convivência em sociedade e para a própria justiça. Acho estas cotas universitárias um exemplo perfeito de algo que subverte a igualdade formal e estabelece uma injustiça em nome de uma igualdade material impossível e inexistente. As cotas não levam em conta o mérito do indivíduo, qualquer que seja sua raça, destroem a oportunidade que um indivíduo tem de, com o próprio esforço, obter sucesso, em nome de um privilégio de um grupo.

Gostaria também de fazer uma observação sobre uma afirmação que você fez no artigo anterior: "O que afirmo é que as culturas negras são inferiores às culturas brancas. Atenção: não estou falando de raça, estou falando de cultura." Concordo plenamente. Aliás, isto me parece bastante óbvio. Mas, atualmente, fazer esta afirmação óbvia nos meios acadêmicos brasileiros, dominados pela praga do "politicamente correto", do relativismo pós-modernista, do marxismo cultural (tão bem explicado por Ernest Gellner em sua obra "Pós-modernismo, Razão e Religião"), é anátema, é considerado escandaloso. Por defender um idéia tão óbvia, a da desigualdade cultural entre os povos, eu já fui chamado na faculdade de nazista, racista, preconceituoso, entre outras ofensas. Recentemente, tive um debate acalorado com uma pessoa que ostenta o título de doutor, sobre um assunto que você costuma expor às vezes em seu blog. Esta pessoa insistia em me convencer que a cultura dos índios que matam seus filhos, que vivem como viveram outros povos no neolítico, não pode ser considerada inferior à nossa cultura ocidental.

Eu, um modesto bacharel em Direito e acadêmico de História, tive de ouvir de um Doutor, ao final do debate, um argumento de autoridade ridículo, quando meu interlocutor não tinha mais outros argumentos para sustentar aquela idéia absurda. Disse o doutor ao final de nosso debate que eu estava errado em afirmar que uma cultura pode ser inferior a outra, pois minha afirmação contradizia a idéia de quase todos os antropólogos brasileiros contemporâneos. A isto, respondi que se danem os antropólogos, e que meu ateísmo também contradiz a idéia da maioria dos meus contemporâneos, e que nem por isso eu vou renunciar ao meu ateísmo.

E por falar em ateísmo e QI, lembrei-me ainda de uma outra notícia recente, que é pertinente: http://www1.folha.uol.com.br/folha/bbc/ult272u415923.shtml .

Um grande abraço de seu leitor

Humberto Quaglio

terça-feira, fevereiro 24, 2009
 
AINDA MOZART NA ÁFRICA (I)


Do leitor Luiz Bonow, recebo:

Cristaldo,

com relação ao texto "Mozart não pode nascer na África", acredito que tu não tomaste conhecimento da pesquisa publicada na revista Slate:
http://www.slate.com/id/2178122/entry/2178123/, que poderia acrescentar ao teu texto. Na época, eu havia comentado esse assunto no meu blog: http://bonow.blogspot.com/2007/12/e-agora.html.
A questão é que existem diferenças entre raças que não são meramente culturais, como apregoa o politicamente correto, isso é que faltou ser colocado.
Saudações.


Segue o texto de Bonow:


E AGORA?

Recentemente, citando profundos estudos, a revista Slate publicou um artigo sobre as novas pesquisas científicas que incluem diferenças de QI entre diversas raças humanas.

Depois da descoberta que o sol não anda ao redor da terra e de que o homem não foi feito de barro, talvez essa seja a descoberta científica que maior dano criará ao pensamento cristão e suas conseqüências, o rousseauísmo e o socialismo. E agora? Como afirmar que todos os homens são iguais se a genética interfere na inteligência. A sociedade é que nos corrompe? Esta bobagem foi recentemente coberta com a pá de cal dos avanços do conhecimento científico. Rousseau foi definitivamente superado, hoje em dia ninguém, a não ser alguns de nossos governantes obtusos, pode afirmar e pretender igualdade social, pois as pessoas são intrinsecamente diferentes.

Crianças orientais subnutridas criadas por pais americanos têm em média mais inteligência do que os seus irmãos brancos e bem alimentados. A teoria do ambiente foi posta a terra por estudos como esse.

“Racismo é elitismo menos informação”, diz lá pelas tantas a reportagem da Slate. A grande lição desses novos conhecimentos não é o de fomentar uma corrida pela desinformação, mas o de pretender valorizar o indivíduo. A média de QI de uma raça é maior do que a de outras. As mulheres de ancas largas normalmente são mais inteligentes do que as de ancas estreitas. Os primogênitos são mais inteligentes do que os caçulas. Como será que fica uma judia (povo considerado pelas pesquisas como o mais inteligente) caçula e de ancas estreitas se casar com americano de origem latina e primogênito? Como serão os descendentes? Será que a matemática é tão simples assim?

Por tudo isso, eu vou contra as oposições da dita direita brasileira quando contesta o sistema de cota para negros nas universidades brasileiras. Normalmente se fala que é uma lei que fomenta o racismo, mas o buraco é bem mais embaixo. A questão não é essa, mas a de que é uma proposição racista em si, o fato de a longo prazo fomentar o racismo é o de menos.

A lei pressupõe que em igualdade de condições, os negros não têm a mesma capacidade intelectual dos brancos. Esse é racismo implícito. Por que não estabelecer cotas para brancos em relação a nipo-brasileiros, uma vez que proporcional à população, têm presença maciça nas universidades de São Paulo e Paraná? E de caçulas em relação a primogênitos? Aliás, nessa eu entro, pois sou o caçula da família!

Já passei em vários vestibulares, sendo dois em universidades públicas, com meu próprio esforço e capacidade. Será que uma cota para filhos caçulas não iria me inferiorizar perante os meus colegas? Será que se eu quisesse entrar hoje em uma universidade seria mais importante uma lei que me protegesse ou debruçar-me por sobre os livros e estudar arduamente?

Grupos sociais têm diferenças entre si? E daí? Será que somos indivíduos ou apenas uma colônia de formigas?

segunda-feira, fevereiro 23, 2009
 
O ANTROPOCENTRISMO
DO DEUS DOS CRISTÃOS



Há quem ache que me preocupo demais com religiões e, pior ainda, há quem ache que ando à procura de uma fé. Nada disso. O fato é que o tal de Deus é de fato onipresente. Para onde quer que a gente se vire, lá está ele. É o personagem mais universal da literatura. Um mendigo certamente não sabe quem foram o Quixote ou Pantagruel ou Raskolnikov. Mas Deus, ele o conhece desde sempre. Não por acaso, a todo momento o invocam: “Pelo amor de Deus...” Todo escritor, sem dúvida alguma, deve invejar os hagiógrafos. Nunca alguém, nem mesmo um gênio, criou personagem tão popular como aquele criado por astutos sacerdotes de milênios atrás.

Em outras palavras, é o que afirma Steven Weinberg, físico teórico e prêmio Nobel, em reportagem do El País de hoje: “Há quem tenha conceito tão amplo de Deus que não há forma de evitar que o acabe encontrando em qualquer parte. Se queres dizer que Deus é energia, podes achá-lo em um monte de carvão”.

É o que acontece em nossos dias. Reencontrou-me, outro dia, uma antiga profissional da noite, que eu não via há uns bons trinta anos. A última vez que a vi foi em um de seus aniversários, em Porto Alegre. Terá sido em abril ou maio de 77. Ela estava linda, toda em patchwork. Levei-lhe um ramalhete de flores, ela se desatou em lágrimas. Também estava lá todo o bordel e boa parte de minhas diletas. De repente, surgiu um fotógrafo. Os machos presentes, salvo um ou dois, começaram a perguntar “que horas são?” e foram dando no pé. Eu fiquei. Ela desafiou-me: tiramos uma foto cortando o bolo? Claro, por que não? Mais uma foto abraçadinho comigo? Vamos lá. Me dá um beijo? Dou.

Eu tinha outros compromissos naquela noite, mas não houve como sair de lá. Ela não permitiu. Chorou comigo quase toda a noite, nunca se sentira tão respeitada, o jornalista conhecido aceitando ser fotografado com uma mulher da noite. Ora, aquilo só me honrava. Até hoje guardo com carinho aquelas fotos. Um grupo de clientes lhe financiava um curso de Direito. Formou-se em Direito, advogou, já fez duas viagens à Europa e uma aos Estados Unidos, viagens daquelas tipo conhecer 15 cidades em dez dias, é verdade. Mas, enfim, viagem. Melhor que nada.

Mas não era disto que pretendia falar. A moça, de repente, tornou-se crente. Daquelas fanáticas. Que vê Deus até atrás da porta. Saiu da noite, entrou na universidade e mergulhou naquela outra noite, a do obscurantismo. Depois de nosso reencontro, tenho recebido longas pregações via telefônica. Pergunto a ela: mas como é esse deus do qual falas? Ela não sabe definir, apenas o sente. De cambulhada, acredita também em espiritismo, psicanálise, testemunhas de Jeová, feng shui, florais de Bach, crença que passar por perto ela traça. Vê deus em toda a parte e cerca o jogo por todos os lados, aposta uma fichinha em cada número. Quer dizer, impossível argumentar com a moça.

Por outro lado, Deus só tem qualidades boas. Quando lhe conto sobre os massacres perpetrados ou estimulados por Jeová, ela não acredita. De onde tiraste isso? Da Bíblia, oras. Ah, mas então ele deve ter tido suas razões. Confesso que preferia aquela moça em cujo aniversário estive, há uns bons trinta anos. Até hoje não entendo como um universitário pode acreditar em potocas metafísicas. Isto significa que a universidade, no fundo, não serve para grande coisa. Enfim, se ela se sente bem assim, louvado seja seu Deus, seja lá qual for.

Outro dia, sem saber como definir seu deus, tascou: Deus é energia. Voilà o personagem do qual Steven Weinberg fala. E eles são muito mais encontradiços do que você possa imaginar. Nos espantamos com o fato de que no Oriente existam milhões de deuses. Em verdade, no Ocidente também. Conheço um professor universitário que criou um deus para si e a ele reza todas as noites. Aposto que é deus-cúmplice, camaradão, sempre disposto a avalizar qualquer gesto do professor.

È o deus-à-la-carte, como já comentei em crônicas passadas. Cada um constrói um deus para si próprio, à sua imagem e semelhança. Segundo o repórter, Javier Sampedro, a investigação recente em psicologia cognitiva, neurobiologia e antropologia revelou que a maioria dos crentes, seja qual for seu culto, têm interiorizado um modelo extremadamente antropocêntrico de Deus. Ora, não me parece necessário recorrer a ciências (?) exóticas e contemporâneas para chegarmos a esta brilhante conclusão.

Basta ler a Bíblia, livro velho de dois milênios. Jeová é, sem tirar nem pôr, um retrato das piores qualidades do ser humano. Nutre ódio por quem não é do povo eleito, massacra tribos inteiras, exerce a vingança, protege os seus, perdoa os crimes dos patriarcas que o adoram, é vaidoso e ciumento. “Eu sou um Deus ciumento”, diz no Êxodo. “Eu sou Jeová, teu Deus”, proclama ao final de cada palavra que dirige aos seus. Exige ser adorado. Por que precisaria um deus exigir adoração? Mais ainda: porque precisa de adoração?

O modelito do deus cristão, pelo menos, é extremamente antropocêntrico. Mas este antropocentrismo não se refere ao comum dos mortais, que só desejam viver bem e morrer em paz. Jeová quer mais. O modelo, em verdade, parece ter sido inspirado – ou talvez ter inspirado – homens ilustres como Hitler, Stalin, Mao, Pol Pot, Ceaucescu, Envers Hodja.

 
POPULAR, MAS TODO
CUIDADO É POUCO!



Leio no noticiário online que Lula tomou as devidas precauções para não ser vaiado na Marquês de Sapucaí:

1. Diferentemente do que ocorrera na abertura dos Jogos Panamericanos, em 2007, o locutor oficial do Sambódromo não anunciou a chegada do presidente;
2. Escolheu-se uma hora estratégia para o deslocamento de Lula até o camarote do governador Sérgio Cabral (PMDB);
3. O presidente aguardou até que a Império Serrano, primeira escola a desfilar, já estivesse evoluindo na avenida, sob aplausos das arquibancadas;
4. De resto, o carro que conduzia Lula estacionou ao pé do camarote, em área protegida por grades e tapumes, a salvo dos olhares do público.

Não entendi. Afinal o homem não conta com 84% da preferência nacional?

domingo, fevereiro 22, 2009
 
MOZART NÃO PODE
NASCER NA ÁFRICA



Uma das vantagens de um blog é que seus textos permanecem o tempo todo na Internet. Na imprensa em papel, um texto só tem permanência se recortado ou se o jornal permanecer arquivado. E é claro que leitor algum vai criar um arquivo em sua casa. Cássius Bertoni me interpela sobre crônica que publiquei em outubro de 2007:

Caro Janer, meus cumprimentos:

Venho lendo atentamente teu blog ha uns três meses. Em geral concordo com todas as tuas opiniões que já vi até agora, mas fiquei com algumas dúvidas que me levam a escrever esta mensagem.

Primeiramente, fiquei um tanto chocado com o artigo "E se africano fosse mais inteligente". Por favor, não pense que se isso trata-se de um teórico pudor politicamente correto da minha parte, até porque concordo contigo no que diz respeito ao desenvolvimento europeu em comparação à África e com tua opinião de que fosse a alegação de Watson contrária e ele não teria sofrido represálias; alem disso, concordo que ele tem o direito de dizer o que pensa. O que pergunto aqui é se para você todo indivíduo negro seria deterministicamente menos inteligente do que qualquer indivíduo branco. Pergunto isso pois talvez seja impressão minha, mas foi isso que aquele artigo pareceu sugerir como opinião tua, principalmente com tal frase: "É claro que o branco europeu é mais inteligente que o negro africano" naquele artigo.


Meu caro Cássius:

não serei eu quem vai responder se branco é mais inteligente que negro, ou vice-versa, ou que ambos são igualmente inteligentes. Isso vai depender muito da biologia, antropologia e outra ciências que não domino. Em todo caso, acho que se deve pelo menos levar em consideração a opinião de um prêmio Nobel em Medicina.

O que afirmo é que as culturas negras são inferiores às culturas brancas. Atenção: não estou falando de raça, estou falando de cultura. Não gosto muito de teorias. Prefiro fatos. Qual é o país mais desenvolvido da África negra? É a África do Sul. Quem criou este país desenvolvido? Foram os afrikaners, brancos descendentes de europeus.

A Libéria - Terra Livre, em latim - surge no século XIX, criada pela American Colonization Society, que pretendia levar para a África negros livres ou negros que tinham sido libertos da escravatura. Os primeiros colonos oriundos dos Estados Unidos passaram a se fixar em uma parcela de terra comprada pela American Colonization Society, perto do Cabo Mesurado. Que aconteceu quando os Estados Unidos concederam aos negros libertos um território na África?

Dados atuais: expectativa de vida, 39,65 anos. PIB per capita: 1.003 dólares. Os mesmos dados naquele país racista, os Estados Unidos, onde ficaram os negros que não quiseram embarcar para a Terra Livre: expectativa de vida, 78,14 anos. PIB per capita, 46.000 mil dólares. Ou seja: um negro vive melhor naquele país que há apenas cinqüenta anos não permitia que negros freqüentassem escolas de brancos, do que na uni-racial Libéria, entregue aos negros para seu uso e governança. Façamos uma comparação com este Brasil pobre e bagunçado, mas dirigido majoritariamente por brancos. Expectativa de vida, 72,3 anos. PIB per capita, dados do ano passado: 9.700 dólares.

Deixando de lado os números. Em Salvador, uma amiga minha, gaúcha, tem um restaurante. A maior parte de seus funcionários são negros. "Eles não aprendem" - me dizia a gaúcha. "Eu ensino como dobrar guardanapos e pôr talheres. Ele fazem corretamente na primeira vez, na segunda vez. Na terceira, já nem sabem como se faz”.

Um outro fator a influir na capacidade intelectual dos negros é, a meu ver, o ambiente cultural em que são criados. Em meus dias de Suécia, observei um caso interessante. Já o relatei, ao comentar o caso do prêmio Nobel James Watson, que afirmava serem os africanos menos inteligentes que os ocidentais. Em Lidingö, ilha chique de Estocolmo, conheci dois negrinhos brasileiros, que haviam feito uma ponta em Orfeu Negro, filme de 1959, de Marcel Camus. Eram o que hoje chamaríamos de meninos de rua e o cineasta, sem querer, salvou-os da miséria e da violência. Um casal sueco viu o filme, se comoveu com os meninos e os adotou. Encontrei-os em 71, já com quase 20 anos, cosmopolitas e poliglotas, falando sueco, inglês e português com aisance, jogando tênis e esquiando. Lembro que um deles cursava economia. O outro, vim reencontrar mais tarde, como alto funcionário da SAS no Rio de Janeiro.

Ou seja, tivessem ficado atirados nas ruas, é óbvio que teríamos prováveis trombadinhas, soldados do tráfico, futuros assassinos. Uma vez acolhidos por uma sociedade que lhes deu educação, oportunidades de trabalho e um futuro, diferiam dos suecos apenas na altura e cor da pele. Resgatados do ambiente miserável, demonstravam a mesma inteligência e cultura dos hiperbóreos Sveas.

Pessoalmente, penso que um Mozart até pode ser negro. O que não pode é ser africano.

sábado, fevereiro 21, 2009
 
RATO RENDE DUAS
CAPAS PARA VEJA



A entrevista do senador Jarbas Vasconcelos, do PMBD, concedida à Veja da semana passada, na qual acusa seu próprio partido e demais políticos de corrupção, foi vista como uma atitude extremamente corajosa, que parecia ameaçar as bases do poder. A entrevista foi valorizada a tal ponto, que a edição desta semana retoma o assunto. Assim é introduzida a matéria:

A entrevista do senador Jarbas Vasconcelos, recebida com silêncio pelo PMDB, entrará para a história como um marco na luta contra a corrupção. Ele deu as coordenadas do bom combate.

Mas que marco é esse na história da luta contra a corrupção? Vejamos o que disse, em síntese, o senador.

Ele afirma que “o Senado virou um teatro de mediocridades e que seus colegas de partido, com raríssimas exceções, só pensam em ocupar cargos no governo para fazer negócios e ganhar comissões”. Ora, disso há muito sabemos. Grande novidade. Diz que “a maioria dos peemedebistas se especializou nessas coisas pelas quais os governos são denunciados: manipulação de licitações, contratações dirigidas, corrupção em geral. A corrupção está impregnada em todos os partidos. Boa parte do PMDB quer mesmo é corrupção". Alguém duvida disto?

Considerou que a eleição de Sarney para a presidência do Senado é um completo retrocesso, “foi um processo tortuoso e conservador”. Ora isto é conhecido urbi et orbi. A revista britânica The Economist, em reportagem intitulada “Onde dinossauros ainda vagam", foi bem mais contundente. Classificou a eleição do senador maranhense como "vitória para o semifeudalismo". Nada de novo sob sol.

Afirmou que Renan Calheiros “não tem nenhuma condição moral ou política para ser senador, quanto mais para liderar qualquer partido. Renan é o maior beneficiário desse quadro político de mediocridade em que os escândalos não incomodam mais e acabam se incorporando à paisagem”. Ora, disto até os cisnes do lago do Congresso estão fartos de saber.

De seu partido, afirma: “hoje, o PMDB é um partido sem bandeiras, sem propostas, sem um norte. É uma confederação de líderes regionais, cada um com seu interesse, sendo que mais de 90% deles praticam o clientelismo, de olho principalmente nos cargos”. Ora, ninguém ignora isto. Nem mesmo os eleitores do PMDB, que por isso mesmo nele votam. Em seu Antonio Chimango, de 1915, Amaro Juvenal já dizia:

Quem tem doce pra dar,
Fica logo popular,
Todo mundo aponta a dedo.


Não há político nem eleitor neste Brasil que não saiba disto desde há muito. O eleitor pode parecer ingênuo, pelo menos para quem acredita que nele reside alguma nobreza. Não é ingênuo. É oportunista. Ou não teríamos no poder um demagogo oportunista como o que temos. Quantos políticos, apesar de notórios corruptos, recuperaram o mandato após terem sido denunciados e mesmo condenados por corrupção? São legião.

Por que o senhor continua no PMDB? – pergunta a revista. “Se eu sair daqui irei para onde? É melhor ficar como dissidente, lutando por uma reforma política para fazer um partido novo, ao lado das poucas pessoas sérias que ainda existem hoje na política”. O senador pareceu esquecer que, permanecendo no partido, avaliza todas as corrupções que denuncia.

Vasconcelos, que apoiou Lula, defendia em 2002 que o PMDB apoiasse o governo. Agora tenta se redimir. “Era essencial o apoio a Lula, pois ele havia se comprometido com a sociedade a promover reformas e governar com ética. Com o desenrolar do primeiro mandato, diante dos sucessivos escândalos, percebi que Lula não tinha nenhum compromisso com reformas ou com ética. Também não fez reforma tributária, não completou a reforma da Previdência nem a reforma trabalhista. Então eu acho que já foram seis anos perdidos. O mundo passou por uma fase áurea, de bonança, de desenvolvimento, e Lula não conseguiu tirar proveito disso”.

Ora, o Lula candidato não conseguia sequer explicar convincentemente como conseguira adquirir uma cobertura em São Bernardo. Passou décadas vadiando, sustentado por um compadre empresário. Como pode uma puta velha do Senado imaginar que este senhor governaria com ética?

Segundo Vasconcelos, neste governo, “o país não tem infraestrutura, as estradas são ruins, os aeroportos acanhados, os portos estão estrangulados, o setor elétrico vem se arrastando. A política externa do governo é outra piada de mau gosto. Um governo que deixou a ética de lado, que não fez as reformas nem fez nada pela infraestrutura agora tem como bandeira o PAC, que é um amontoado de projetos velhos reunidos em um pacote eleitoreiro. É um governo medíocre. E o mais grave é que essa mediocridade contamina vários setores do país. Não é à toa que o Senado e a Câmara estão piores. Lula não é o único responsável, mas é óbvio que a mediocridade do governo dele leva a isso”.

O que só demonstra que o senador é um leitor inveterado de jornais. Pois é o que a imprensa denuncia todos os dias. Do programa Bolsa Família, diz ser “o maior programa oficial de compra de votos do mundo". Como se alguém não soubesse. Afirma ainda o que todo analista lúcido da política nacional há muito vem afirmando: “Há um benefício imediato e uma conseqüência futura nefasta, pois o programa não tem compromisso com a educação, com a qualificação, com a formação de quadros para o trabalho. Em algumas regiões de Pernambuco, como a Zona da Mata e o agreste, já há uma grande carência de mão-de-obra. Famílias com dois ou três beneficiados pelo programa deixam o trabalho de lado, preferem viver de assistencialismo. Há um restaurante que eu freqüento há mais de trinta anos no bairro de Brasília Teimosa, no Recife. Na semana passada cheguei lá e não encontrei o garçom que sempre me atendeu. Perguntei ao gerente e descobri que ele conseguiu uma bolsa para ele e outra para o filho e desistiu de trabalhar. Esse é um retrato do Bolsa Família. A situação imediata do nordestino melhorou, mas a miséria social permanece”.

E por aí vai. Não há uma única declaração que nos traga algo novo. Fala o tempo todo sobre o óbvio. Não dá nome aos bois. Fala em corrupção, mas não nomina nenhum corrupto. Porta-se, na verdade, como um adolescente brincando no Orkut. Acusa Deus e todo mundo, mas não denuncia ninguém, nem traz à tona provas da corrupção. É muito fácil acusar um governo ou partido de corrupto. Provar é que são elas. Muitas vezes, nem a máquina policial e judiciária o conseguem.

Evidentemente, não cabe a um senador da República fazer trabalho de policial. Mas se pelo menos nomeasse publicamente os corruptos, obrigaria o Judiciário e a Polícia a tomar iniciativas. Nem isso fez.

O sentido de sua entrevista parece surgir no último parágrafo: “Não tenho mais nenhuma vontade de disputar cargos. Acredito muito em Serra e me empenharei em sua candidatura à Presidência. Se ele ganhar, vou me dedicar a reformas essenciais, principalmente a política, que é a mãe de todas as reformas”.

Ou seja: o senador impoluto, “corajoso” a ponto de denunciar as mazelas de seu próprio partido, aponta seu candidato. Que naturalmente há de ser também impoluto. A reportagem parece ter sido plantada para apoiar a candidatura de Serra em 2010.

A Veja pariu um rato. O rato rendeu duas capas.

sexta-feira, fevereiro 20, 2009
 
RECÓRTER TUCANOPAPISTA
TENTA TIRAR O SEU DA RETA


Escreve hoje o recórter tucanopapista hidrófobo, em seu blog na Veja:


HÁ TROUXA PRA TUDO. OU: OS
MARQUETEIROS DO VITIMISMO


Eu não sei as motivações da tal Paula Oliveira para ter mentido. O que é certo é que foi uma mentira meticulosamente construída, não?, com as fotos exibindo a sua suposta gravidez enviadas a todo mundo. Gravidez que ela exibia por fora, com a barriga estufada, e por dentro, com o falso ultrassom, colhido na Internet. Parece que ela estava plantando indícios, até chegar à falsa agressão, propagandeada no Brasil por certos ramos da imprensa — ou quase isso — chegados no marketing do vitimismo. Os bocós vestiram a camisa verde-amarela e saíram por aí.

Também seu namorado suíço sustentava a gravidez. Quem é ele? Trabalha em quê? Como ganha a vida? Certo, certo, o povo da antiga Helvécia, vocês sabem, é frio como a neve lá fora, mas o será a ponto de não se interessar minimamente em ver os exames médicos que provam uma gravidez? Ou muito me engano, ou este rapaz lamentou a perda das duas “menininhas”, enquanto os vitimistas brasileiros suavam seu nacionalismo ofendido por todos os poros, e Celso Amorim, o Gigante, prometia vingança. E alguns gritavam por aqui: “Sim, é a xenofobia! Agora vão culpar o Terceiro Mundo pela crise! Eles não querem saber de nós!”
(...)
O que realmente me fascina é que, até agora, ninguém admite que errou: nem Celso Amorim nem os que superestimaram o caso. Já escrevi aqui que compreendo o sofrimento da família, mas tal compreensão tem um limite. Paulo, o pai de Paula, precisa mudar o discurso e parar de afirmar que acredita na versão da filha. Ou deixará a imagem até agora cultivada de pai extremoso para se confundir com um pai ou licencioso ou comprometido com as mentiras contadas pela moça. E os motivos ainda são obscuros. QUE ELA TENTOU DAR CONOTAÇÃO POLÍTICA AO CASO, ISSO É EVIDENTE.

“Delírio motivado pelo lúpus”, dizem agora... É, então foi um delírio metódico, continuado, até com sotaque ideológico (dada a realidade política da Suíça). Os mercadores do vitimismo também deveriam estar envergonhados e se desculpar com os leitores. Mas não vai acontecer. Afinal, sabem existir trouxa pra tudo.


É no mínimo curioso ver um trouxa chamar os demais trouxas de trouxa. Santa e tardia indignação para quem já escreveu:


REPÚDIO E CUIDADO

Tendo tudo acontecido segundo o que foi relatado, a brasileira Paula Oliveira foi vítima da mais odienta manifestação de racismo — que não partiu da “sociedade suíça”, é bom deixar claro, mas de um bando de delinqüentes. Nesse caso, não basta uma simples reação de repúdio. O governo brasileiro, de fato, precisará fazer mais, deixando claro que o empenho dos suíços em encontrar os culpados passa a ser fundamental na relação entre os dois países. Se o governo da Suíça não pode, e não pode, ser responsabilizado pelo que aconteceu, o empenho na investigação é, sim, uma obrigação.

O relato que se tem indica que a brasileira foi exposta a extremos de brutalidade, ainda mais chocantes consideradas as conseqüências: o aborto de gêmeos. Tudo, mas tudo mesmo, nesse caso, escandaliza e causa estranheza. E ainda mais chocante é o fato de que os agressores não fizeram nenhuma questão de disfarçar o seu propósito, não é? A sigla de um partido político que a oposição acusa de ser racista — atenção: não se trata de um partido clandestino, neonazista, mas de uma legenda legalmente constituída — foi gravada no corpo de Paula. E se deve notar: mesmo no escuro, num ato apressado, sob o temor óbvio de serem vistos por alguém, ainda não se descuidaram da simetria, procurando distribuir com equilíbrio as marcas da selvageria. As letras obedecem a um traçado cuidadoso, firme, sem aparente variações de profundidade.

Tanta perversidade requer uma apuração rigorosa. Na hipótese de os agressores serem mesmo simpatizantes do Partido do Povo Suíço (SVP, sigla da legenda em alemão), esperam que isso aumente a simpatia da população pela legenda, por mais que os suíços fossem, como se diz aqui e ali, indiferentes a agressões a estrangeiros? Fazem-no para chegar ao poder por meio do terror? Mas o partido já está no poder. E governa o país segundo as regras da democracia. Aqui e ali vejo certa contraposição porque a polícia suíça não teria “confirmado” a agressão e evite falar em “xenofobia e racismo”. Bem, antes da investigação, o que se espera que a polícia faça? Celso Amorim até pode dizer um "tudo indica" que é isso. Quem investiga não pode fazê-lo. Mas que cuidado não seja confundido com descaso.

Que o governo brasileiro, com efeito, fique atento aos desdobramentos desse caso e que se exija o máximo rigor na investigação.

 
BINGO!


No domingo passado, publiquei a tese da Primeira-Namorada sobre a farsa montada em Zurique pela advogada pernambucana Paula Oliveira. Segundo a Primeira, ela anunciou uma gravidez de gêmeos para fisgar um noivo suíço. Como a gravidez não ocorria, de alguma forma tinha de ser "interrompida". A moça então fez alguns cortes na barriga e nas pernas, jogou três neonazis no meio e justificou o "aborto".

Leio na Folha Online:

O jornal suíço Tages Anzeiger publicou uma reportagem hoje afirmando que Paula inventou a gravidez para forçar o noivo Marco Trepp a se casar com ela e, assim, conseguir o visto de permanência na Suíça.
De acordo com a reportagem, o visto de permanência de Paula, que permite a ela trabalhar no escritório em Zurique da multinacional dinamarquesa Maersk, acaba no final deste ano. Sem o visto, ela precisaria deixar o país.


Cherchez l'homme, dizia eu na crônica. A Primeira-Namorada, em seus 25 aninhos, está se revelando mais intuitiva que ilustres e antigos nomes da imprensa nacional. Bem que poderia oferecer seus préstimos para assessorar a polícia suíça.

 
SUPOSTA FARSA?


Para a Folha de São Paulo, pelo jeito ainda não caiu a ficha. Ainda ontem, dias depois de revelada e esmiuçada a armação da advogada Paula Oliveira na Suíça, o jornal ainda mancheteava:

REVISTA QUE CITA SUPOSTA FARSA É LIGADA A PARTIDO

quinta-feira, fevereiro 19, 2009
 
MIRACOLO! GOVERNO CORTA SUBSÍDIOS
PARA A GUERRILHA CATÓLICO-MAOÍSTA



É muito raro, no noticiário nacional, ler-se algum relato de alguma atitude sensata neste país. Hoje, no entanto, o Estadão nos traz uma notícia que sugere um fio de esperança em nossos administradores. Segundo o jornal, a secretária da Educação do Rio Grande do Sul, Mariza Abreu, disse ontem que a rede de ensino pública está pronta para receber os 640 filhos de sem-terra que deixarão de ter aulas de educadores itinerantes neste ano. "Estão asseguradas as matrículas em escolas fixas próximas aos acampamentos, com transporte gratuito", declarou. "Vamos oferecer educação de qualidade e melhor formação para a cidadania para crianças que passarão a estudar com outros brasileiros da mesma idade e não mais separadas (em acampamentos)", enumerou, como vantagens do novo sistema, que passa a vigorar com o novo ano letivo, a partir de 2 de março.

Vá um pai pretender subtrair um filho ao ensino oficial, por achar que esse filho pode ser melhor educado em casa. Escândalo! Mas a guerrilha católica-maoísta adquiriu, desde 1996, o direito de educar os filhos dos guerrilheiros em escolas próprias. Sob a orientação de mestres sublimes como Marx, Lênin, Mao, Fidel Castro. Os bandoleiros que invadem propriedades no país, sob o olhar complacente do governo, estão montando legiões de novos guerrilheiros. E com financiamento do Estado. Ou seja, com financiamento nosso, contribuintes. Uma organização não-governamental – dessas que não existem sem o dinheiro do governo -, o Instituto Preservar, recebia R$ 16 mil mensais para manter 13 educadores entre os sem-terra, num sistema denominado de "escola itinerante".

Segundo o Estadão, no final do ano passado, a Secretaria da Educação assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público Estadual (MPE) se comprometendo a romper o acordo com a ONG e oferecer ensino aos filhos dos sem-terra em suas escolas fixas. A decisão é tardia, ou melhor, nem deveria ter sido tomado. No sentido em que jamais deveria ter sido permitido ao sem-terra criar escolas ideológicas para incutir marxismo na cabeça das crianças. Enfim, antes tarde do que nunca.

Mesmo assim, se subtrai verbas para estas escolas confessionais, o governo continua financiando a guerrilha católico-maoísta. Por outro lado, é preciso esperar para ver quantos dias vigerá a determinação da secretária de Educação. Os bons propósitos, no Brasil, duram o que duram as rosas.

 
PARA ENTENDER A BÍBLIA


A Bíblia é um livro extremamente complexo, dada a quantidade de livros que a compõem, a época em que foram escritos, o número de personagens e as contradições de um livro a outro. A meu ver, sempre foi uma antologia de textos muito mal-costurados. Isso sem falar nas diferentes traduções, nas quais cada seita que se apossa do Livro propõe uma versão diferente. É o livro mais publicado do mundo, mas certamente o menos lido. É também o livro mais deturpado por tradutores. Como não temos hoje nenhum texto original, mas apenas cópias de cópias de cópias, qualquer tentativa de consultar a edição princeps é inviável, porque a princeps não existe. Assim, para quem quer entrar no escasso clube de leitores do livro, sempre é bom ter alguém como guia.

Da Alemanha, uma súbita amiga enviou-me link para um site excelente, construído por um brasileiro que entende de fato do assunto, que situa a Bíblia em sua época e a compara a livros anteriores, http://biblianua.vilabol.uol.com.br/index.htm.

Recomendo vivamente. É site para ler e reler.

quarta-feira, fevereiro 18, 2009
 
PARADOXO DO PÉRIGORD
E OUTROS PARADOXOS



Há cerca de um ano, comentei algo sobre o paradoxo do Périgord. Como ninguém mais deve lembrar do que seja, volto ao assunto. Lá pelos 80, quando viajaria para a França, recomendou-me um médico de Florianópolis: cuidado com o vinho. Seja moderado. E muito cuidado com os queijos e foie gras. Ora, considero que prescrições médicas devem ser levadas a sério. Era no mês de meu aniversário. Amigos me receberam com muito vinho, champanhe, queijos e foie gras. Eu, beliscando como um tico-tico. Bebendo pouco e comendo menos ainda.

Vai daí que, ao tomar o avião de volta, comprei um Nouvel Observateur. A reportagem de capa era sobre o “paradoxe du Périgord”, algo que até hoje perturba a medicina politicamente correta. Por este paradoxo entende-se o estranho fenômeno de o Périgord ser uma região de alto consumo de patês, queijos e vinhos e, no entanto, seus habitantes gozarem de excelente saúde cardíaca e vascular. Um médico declarava, na reportagem, que inclusive um pouco de boudin no leite das crianças era muito saudável. Boudin é a versão francesa da nossa morcilha. Mais suave e um de meus pratos prediletos. Me senti roubado.

Ao voltar a Santa Catarina, busquei meu médico. De Nouvel em punho. Doutor, o senhor ouviu falar disto, o paradoxo do Périgord? Não, não havia ouvido falar. Então leia esta reportagem. Não leio em francês, disse-me. Tudo bem – respondi – eu traduzo. E traduzi.

Ele fez marcha à ré. Bom... meia garrafa de vinho por dia é sempre bom para o coração. Ou duas doses de uísque. Entende-se que o boudin seja saudável às crianças, contém ferro. Mas nós, médicos, não podemos admitir isto. Seria estimular o alcoolismo.

Não acho. Sempre discordei do conceito médico de alcoolismo. Com o tempo, descobri que médicos formados nos Estados Unidos são sempre mais intolerantes em relação ao álcool que os formados na Europa. Coisa de puritanos. Na Espanha, França, Itália ou Portugal, o vinho faz parte de qualquer refeição. Antes do final do século passado, uma médica me proibiu qualquer gota de álcool. Consulente disciplinado, passei dois anos sem beber. Minha vida se tornou um inferno. Meus amigos bebiam e eu só tomava cerveja sem álcool. Em alguns bares, fui apelidado de Kronenbier. Meus amigos entravam em uma outra fase e eu restava sóbrio. Horror. Troquei de médica. De início, já fui claro: Doutora, eu estou trocando de médica porque a anterior me proibiu o álcool. Estou buscando uma que o libere.

Ela topou e eu voltei ao mundo dos vivos. Ainda no ano passado, li que o vinho tinto pode ser muito mais potente do que se imaginava no prolongamento da vida humana, segundo cientistas que pesquisam drogas para a longevidade. O estudo se baseava em doses dadas a camundongos de resveratrol, um ingrediente de alguns vinhos tintos. Alguns cientistas já estariam tomando resveratrol em forma de cápsula, mas outros acreditam que é cedo demais para tomar a droga, especialmente usando vinho como sua fonte, até que haja melhores dados sobre sua segurança e eficácia.

Isso foi no ano passado. Neste ano da graça – ou da desgraça – houve um revertério na opinião dos cientistas. Em despacho da France Press, leio:

ESTUDO FRANCÊS PROÍBE TAÇA DE VINHO DIÁRIA

Segundo um estudo, publicado ontem pelo Instituto Nacional Francês do Câncer (INCA), na relação entre o que comemos e bebemos e as possibilidades de vir a ter um câncer, o álcool é o primeiro a sentar-se nos banco dos réus. Na referência álcool-câncer não existiria "dose protetora". Com seus efeitos invisíveis, "as pequenas e repetidas doses são as mais nocivas", destaca o presidente do INCA, Dominique Maraninchi.

Para Paule Martel, diretora de pesquisa do Instituto de Investigação Agrônoma (INRA), "é desaconselhado todo o consumo diário de vinho". Me soa insólito ouvir isto de um francês. Segundo o estudo, "o consumo de bebidas alcoólicas está associado a um aumento do risco de se sofrer câncer de boca, faringe, laringe, esôfago, cólon e reto, mama e fígado". O risco aumenta 9%, no caso de câncer de cólon e reto, se for consumida uma taça ao dia. E esse risco chega inclusive a 168% para os cânceres de boca, faringe e laringe.

Isso se deveria, sobretudo, à transformação do etanol em acetaldeído; além disso, o etanol aumenta a permeabilidade da mucosa a elementos cancerígenos como o tabaco. O consumo crônico de álcool produz, também, uma deficiência de ácido fólico, algo que favorece o câncer colorretal. O estudo vai mais longe. Na França, o consumo de álcool é, atrás do tabaco, a segunda causa evitável de morte por câncer (10,8% dos falecimentos por patologias cancerígenas entre homens e 4,5% entre mulheres).

Me lembrei de um personagem que conheci há cinco anos. Tinha 93 anos e bebia, religiosamente, uma garrafa de vinho por dia. Chama-se Étilo e fazia jus ao nome. Pena que morreu ano passado. Aos 97 anos. Gostaria de levar “seu” Étilo até o INCA, para ver o que diriam os pesquisadores sobre sua longevidade. Ora, direis, a exceção não justifica a regra. De acordo. Mas proibir uma tacinha diária do sangue das uvas, como diz a Bíblia, me parece um exagero que aos céus clama desmentido.

Se fosse só o vinho... Mas, sempre segundo o famigerado estudo, o consumo de carne vermelha e frios pode produzir câncer de cólon e reto. Mas não há razões, também, para alarmismos: o limiar para que esses produtos comecem a ser perigosos é 500 gramas de carne vermelha por semana. Ora, cá chez nous, o peso médio de um filé é de 250 gramas. Os cientistas nos permitem então apenas dois filés por semana. De preferência sem sal, pois o sal parece estar relacionado ao câncer de estômago. Os alimentos à base de betacaroteno – que até ontem há pouco tempo salvavam de câncer e doenças do coração – agora aumentam significativamente o risco de câncer de pulmão nos fumantes.

Terá o informe dos cientistas força suficiente para coibir, já não digo a taça diária de vinho que os franceses geralmente tomam durante o almoço, mas o pichet, que pode ser de meio litro ou de litro? Isso sem falar no que bebem espanhóis, portugueses e italianos. Anni e bicchieri di vino non si contano mai – diz-se na Itália. Onde fica a sabedoria popular? E o paradoxo do Périgord? Seria uma perversa conspiração de médicos para defender a indústria vinícola francesa? O que antes era saudável, de repente, vira letal?

Isto me lembra um gastroenterologista que consultei em Curitiba. Segundo ele, a dose diária permissível de cerveja é meio copo. Ora, Dr. – objetei – não existe meio copo de cerveja. Outro dia, trabalhava eu aqui em casa com a televisão ligada. Subitamente ouço a expressão “meio copo de cerveja”. Só pode ser aquele cretino de Curitiba, pensei. Fui até a televisão. Era.

Sem ser cientista, observo o mundo que me cerca. Ora, se uma taça de vinho por dia é fator cancerígeno, França, Alemanha e península ibérica já teriam sido devastadas pelo câncer. Em meus dias de Espanha, constava de todo menu – e ainda hoje consta – meia garrafa de vinho. O garçom sempre me trazia garrafa inteira. Eu reclamava: mas não é meia garrafa? Invariavelmente, ouvia como resposta: beba lo que quiera, caballero!

Terá a Europa, durante séculos, mantido em seu passadio um elemento letal, o vinho? Que faziam os cientistas em décadas passadas, que só agora, em 2009, chegam a tal descoberta? Será talvez fruto da islamização da Europa? Para um muçulmano, deve ser reconfortante ouvir que vinho dá câncer. Isto está me parecendo um pouco à trajetória do ovo. Durante décadas, foi visto como um vilão absoluto. Ainda hoje, comentava Ruy Castro na Folha de São Paulo:

“Durante quase toda a segunda metade do século 20, médicos e cientistas dedicaram-se a acusar o ovo dos piores crimes contra o coração e a responsabilizá-lo pela elevação dos níveis de colesterol a placares de basquete americano. Quem fosse cardíaco, não chegasse perto; quem não fosse, idem, para prevenir. Às galinhas só restava submeter-se ao holocausto reservado à sua espécie e ao opróbrio para o seu produto.

“Pois, desde algum tempo, depois de pesquisas mais sérias e profundas, esses mesmos médicos e cientistas começaram a emitir sinais de que talvez tivessem sido injustos com o ovo. E, na semana passada, saiu o relatório definitivo da Universidade de Surrey, na Inglaterra: o ovo não faz o menor mal à saúde - ao contrário, é riquíssimo em nutrientes - e pode ser comido na legalidade e em qualquer quantidade. Só faltam dar-lhe a medalha de alimento do ano”.

Os cientistas do INCA que me desculpem. Vou esperar pelos próximos estudos. Sem vinho, a vida não tem muita graça. Voltando ao estudo, parece só ter graça o que não tem sabor. O informe destaca as excelências das frutas e dos legumes, ricos em antioxidantes e vitamina B9 (ácido fólico), com um consumo diário recomendado de, no mínimo, 400 gramas. Sei lá! Não acredito em teorias conspiratórias, mas isto está me parecendo lobby da indústria hortifrutigranjeira.

Conceber a Espanha sem a media botellita de cada almoço? Sem os cochinillos e lechales? É o mesmo que imaginar uma Espanha sem flamenco nem touradas. Ver a França sem direito a seu demi-pichet rouge? É Paris sem a torre Eiffel. Imaginar a Itália senza il vino? Seria como ir a Roma e não ver o Bento.

Desde há muito não acredito em Deus. Mais uma dessas e deixarei de acreditar na ciência. Decidam-se, senhores cientistas. Ou me tornarei ateu em dose dupla.

terça-feira, fevereiro 17, 2009
 
COMO SE NADA TIVESSE ESCRITO
SOBRE O NEONAZISMO SUÍÇO...



Sábado passado, transcrevi artigo do lúcido jornalista Gilles Lapouge, no Estado de São Paulo. Indignado com a agressão dos neonazis suíços a advogada brasileira em Zurique, Lapouge fechava dramaticamente seu texto: "A única coisa certa é que as marcas do horror, mesmo que desapareçam da carne da moça, dificilmente se apagarão no profundo de suas noites. Como poderá ela esquecer que esteve cara a cara com o mal?"

Hoje, como se jamais tivesse escrito este libelo contra o nazismo suíço, Lapouge escreve:

CASO DA BRASILEIRA NA SUÍÇA
É REPLETO DE CONTRADIÇÕES

Advogada afirma que foi agredida por neonazistas; polícia trabalha com hipótese de autoflagelo


PARIS - Reviravolta dramática no caso da jovem advogada brasileira atacada, na noite de segunda-feira, perto de Zurique, por três jovens em trajes pretos e armados de estiletes. A rádio Suisse Romande divulgou o testemunho do médico que examinou a vítima. E seu veredicto parece não conter ambiguidades: aparentemente, foi uma encenação, montada pela própria jovem.

Segundo este médico, Paula Oliveira não estava grávida, o que anula a tese de que ela teria abortado as filhas gêmeas. Quanto aos cortes sobre os braços e a barriga, reproduzindo a sigla do partido extremista e xenófobo SVP, o médico não os levou a sério. São demasiado regulares para que possam ter sido feitos numa pessoa em pânico, debatendo-se como louca. Além disso, não são profundos, afirma.

Estas dúvidas somam-se às que os policiais suíços haviam manifestado. Eles notaram contradições no testemunho da jovem. Numa primeira declaração, o ataque teria acontecido em um lugar próximo de Zurique chamado Dudendorf; posteriormente, teria ocorrido em um outro bairro perto de Zurique, Stettbach. Neste relato, permanecem partes nebulosas. Na quinta-feira, falava-se do namorado suíço da jovem, que não estaria no local do drama, e sim nas proximidades. Depois, não se falava mais nele.

As rádios suíças e os internautas levantam alguns questionamentos. Foi ressuscitada uma antiga expressão da "clínica psiquiátrica", o termo "histeria", que levaria algumas pessoas a inventar doenças ou perigos para fazer frente à própria angústia ou aos seus terrores. A histeria tinha efeitos absolutamente incompreensíveis, inexplicáveis no corpo de suas vítimas, como mostraram Charcot e Freud. Os histéricos colocavam frequentemente no centro de seu próprio teatro poderes nocivos como Satã, o diabo.

Relatórios médicos recentes sobre casos de histeria mostram que, hoje, o diabo intervém menos frequentemente do que na Idade Média, do que na Renascença ou mesmo do que no início do século XX, na época de Freud. Satã teria sido substituído por outras figuras "do mal", e evidentemente, por cerimoniais nazistas ou neonazistas.

No ano passado, uma jovem alemã portadora de deficiência física contou ter sofrido ataques de nazistas. Em seu corpo foram constatados ferimentos com a forma da cruz gamada. Toda a Alemanha se comoveu com o fato. Os médicos especialistas estabeleceram que a própria jovem infligira a si mesma as feridas. Em Paris, há dois anos, uma condutora de ônibus afirmou ter sido estuprada e espancada por jovens imigrados. Também neste caso, seu corpo apresentou as marcas. Estas também falsas.

É claro que não se pode considerar como totalmente certo o testemunho de um único médico, ainda mais que o reflexo natural dos suíços é minimizar a presença de extremistas em seu território. A Suíça é um Paraíso terrestre. Ela não pode abrigar tais torpezas. Portanto, teremos de aguardar as novas conclusões da polícia e da Justiça antes de podermos nos pronunciar de maneira definitiva.


Pedido algum de desculpas aos leitores, admissão alguma de sua barriga jornalística. Foi como se jamais tivesse escrito algo admitindo o ataque à moça. Encontro cara a cara com o mal? Quem foi mesmo que escreveu isso? – deve estar se perguntando Lapouge. Clóvis Rossi e Eliane Cantanhêde pelo menos deram uma de madalenas arrependidas. Lapouge não se arrepende de nada.

 
ITAMARATY SUGERE À PAULA
SAÍDA SAFADA: FUGIR DA LEI



Alguém ainda lembra daquele intrépido chanceler que via claras evidências de xenofobia no caso da brasileira atacada por neonazis em Zurique e chegou a dizer que levaria o caso à ONU? Falo do Celso Amorim. Pois bem, pelo menos no Itamaraty já caiu a ficha. Segundo o Estadão, o Itamaraty quer que a família de Paula Oliveira decida rapidamente se a brasileira deixará Zurique antes da abertura de um eventual processo penal por fraude, ou se enfrentará as investigações até o fim, mantendo sua versão. Em uma longa conversa com a família de Paula, a consulesa do Brasil em Zurique, Vitória Clever, afirmou que poderia organizar a saída de Paula antes que a investigação fosse concluída e o possível processo penal, instaurado.

Mas se caiu a ficha no Itamaraty, ainda não caiu para o pai da moça, Paulo Oliveira. Embora já tenha dado sinais de que deseja voltar para casa ainda esta semana, continua acreditando na versão da filha, apesar de todas as evidências em contrário. Tanto que Paula ainda não foi informada de que a polícia suíça nega sua alegada gravidez que teria sido interrompida pelo ataque dos neonazis.

A sugestão do Itamaraty já é, em si, safada. Pretende subtrair da justiça suíça uma brasileira que cometeu uma grave fraude, com conseqüências nefastas para o relacionamento entre dois países. Em outros termos, o Brasil quer proteger um criminoso, já que este é brasileiro. O episódio serviu ainda para difamar internacionalmente a Suíça, como país que abriga e protege neonazis. Isso sem falar nos prejuízos causados à imagem do Brasil, cuja imprensa é agora vista como facciosa, caluniadora e patrioteira.

Digamos que a família decida trazer a moça de volta, como recomendam tanto a safadeza como o bom senso. Imaginemos o diálogo de surdos:

- Minha filha, tua mãe e eu decidimos que deves voltar ao Brasil.
- Voltar ao Brasil? Sem punir aqueles nazistas que me fizeram abortar? Não há justiça neste país?
- Não, filha, ocorre que seria mais conveniente esperar o desfecho disto tudo lá em casa...
- Mas eu não quero ir. Pelo menos antes de ver aqueles bandidos na cadeia.

A situação lembra um pouco Adeus Lênin, o belo filme de Wolfgang Becker, raridade nestes dias de salas inundadas por bestsellers para consumo de pobres de espírito. O drama gira em torno de uma cidadã da antiga Berlim Oriental, que caiu em coma um pouco antes da queda do Muro. Só sai do coma alguns meses depois, quando Berlim é uma cidade só. Para evitar que a mãe tenha algum infarto com a nova realidade, seu filho remonta o apartamento com os trastes da era socialista, que nesta altura já haviam sido jogados a um depósito. Toma o cuidado de fechar janelas e eliminar rádio e televisão. Dada a insistência da mãe em ter um aparelho de TV, o rapaz passa a produzir noticiários com um amigo cineasta, no melhor estilo da finada Alemanha Oriental. Ele produz uma RDA que não mais existe, para consumo da mãe em convalescença.

Com a decisão de não comunicar a filha um fato do qual ela precisa ter ciência, os pais de Paula terão de recorrer a recursos semelhantes aos do filme de Becker. Pra começar, a moça não poderá ouvir rádio nem assistir televisão. Muito menos ler jornais. E se sair à rua, talvez tenha surpresas nada agradáveis.

Assim como Paula mentiu às autoridades, os pais de Paula estão alimentando uma mentira piedosa. Que vai ser desta moça quando descobrir que ninguém mais, nem a polícia suíça, nem o jornalismo brasileiro, nem o Itamaraty acreditam em sua farsa? Continuará a sustentá-la? Seus pais continuarão sendo cúmplices da mentira? Ou tomará a atitude mais sensata, a de confessar que tudo foi uma fraude? Doerá, é verdade, mas ainda é a melhor maneira de chegar à saúde mental.

Quanto ao pai de Paula, que em verdade foi o responsável por todo este desastre, ao passar à televisão informações das quais não tinha prova nenhuma, este jamais se sentirá um fraudador. Permanecerá encerrado na condição de pai amoroso, que tudo fez a seu alcance para auxiliar a filha vitimada por bárbaros.

Quanto aos jornais e jornalistas de gatilho fácil, que sem checar fatos logo acusaram a Suíça de proteger neonazistas, com estes nada acontecerá. Algumas desculpas esfarrapadas, mais a sólida confiança na memória curta dos leitores, farão com que em poucos meses readquiram a credibilidade arranhada.

Quanto a Paula, sejam quais forem as razões que a levaram a tal insanidade, admita ou não admita a farsa, tem sua vida já mais ou menos destruída, pelo menos na Suíça. Qual empresário dará emprego a uma maluca que, com uma simples mentira, difamou o país urbe et orbi? Melhor voltar. Aqui no Brasil, sempre terá o apoio de algum patrioteiro que acredita na imprensa nacional e considera que a justiça suíça é uma fortaleza protetora de nazistas.

De última hora, leio que o pai da advogada parece não ter gostado da sugestão malandra do Itamaraty. Declarou ao Jornal Nacional que a filha não pretende fugir da Suíça. "Fugir de quê? Há alguma vítima? Minha filha vitimou alguém?", questionou Paulo Oliveira. "Ela quebrou alguma coisa? Ela deu algum prejuízo? Ela fez alguma perturbação da ordem? Não."

Santo e ingênuo pai. A moça quebrou muitas coisas, a começar pela reputação do país que generosamente a acolheu. E deu muitos prejuízos sim, prejuízos difíceis de serem ressarcidos. Uma mentira, uma vez divulgada pela imprensa, assume ares de verdade, por mais que seja desmentida. E perturbou também a ordem de uma forma quem nem imaginaria perturbar. Caluniou um país inteiro e conseguiu abalar mais um pouco a já frágil reputação do Brasil no Exterior. Um advogado deveria ter suficiente bom senso para avaliar estes estragos.

Estou curioso para assistir ao desfecho. De alguma maneira, esse furúnculo terá de ser purgado.

segunda-feira, fevereiro 16, 2009
 
VENEZUELA E PAPEL HIGIÊNICO


Desde há muito escrevo sobre essa estranha incompatibilidade entre socialismo e papel higiênico. Mesmo antes de viajar para países socialistas, eu ouvia relatos de turistas sobre o assunto. Não era fácil encontrar o artigo nos hotéis. Muitas agências recomendavam que o turista se munisse de um bom estoque de rolos, antes de viajar para a União Soviética.

O pior ocorreu na Romênia, em 1981. Em qualquer hotel que chegasse, a primeira coisa que tinha a fazer era pedir papel higiênico na portaria. Lembro que em Mangália, cidade litorânea do mar Negro, quando fui reclamar a uma moça da portaria com cara de sargento, ela me perguntou: "quantos dias o senhor vai ficar aqui?". Neste hotel, dois dias. Olhou-me então de alto a baixo, avaliou meu metabolismo, rasgou uns dois metros de um rolo e passou-me as tiras.

Em outras viagens a outros países socialistas, o problema não era tão grave, foram feitas perto da Queda do Muro ou depois. Mesmo assim, em 2000, nove anos após o desmoronamento da URSS, em São Petersburgo, tive de voltar a implorar papel higiênico na portaria do hotel.

De Cledson Ramos, amigo e leitor, recebo:

Oi Janer,

Sua tese da incompatibilidade entre Socialismo e papel higiênico continua válida:

"Neste ano, a Venezuela só conseguirá importar metade do que precisa, agravando o racionamento de produtos de primeira necessidade. Na semana passada, a venda de papel higiênico em alguns supermercados estava limitada a quatro rolos por consumidor."

*FONTE: http://veja.abril.com.br/180209/p_074.shtml

Um abraço,
Cledson


Assim, entende-se as altas tiragens do Pravda.

 
IMPRENSA BRASILEIRA
IMPORTA NEONAZIS



Se há neonazistas na Europa, tem de existir também no Brasil. Assim, quando ocorre qualquer incidente nalgum país europeu, preferentemente em países germânicos ou nórdicos, os editores saem a catar nos arquivos grupos equivalentes no Brasil. Basta achar um careca, branco e preferentemente parrudo, vestido com couro e correntes, e lá está a ameaça nazista.

Ocorreu na década dos 90. Locais de reunião de nordestinos em São Paulo foram pichados com frases agressivas, tipo "nordestinos go home", “morte aos nordestinos” e outras que tais. A polícia conseguiu identificar o líder dos pichadores: era um baixinho retaco, por sorte branco, halterofilista. E careca, para alegria dos editores. Estava configurado o neonazista tupiniquim. Nós também temos neonazis. O inimigo está entre nós. Durante alguns dias, foi feita a farra do neonazi. Que durou até sua volta... para o Ceará.

O neonazi era nordestino. Para não atrapalhar o delicado trabalho feito durante décadas no cérebro do leitor, o personagem foi expulso das manchetes. Nordestino não pode ser neonazi. Nordestino é sempre vítima. E não mais se falou naquele paradoxo ambulante, que só servia para confundir as mentes. Mas era preciso criar neonazistas. A tarefa foi assumida por um militante da Anistia Internacional. No dia 06 de setembro de 2000, a Folha de S. Paulo mancheteava:

ANISTIA SOFRE NOVO ATENTADO A BOMBA EM SP

Uma bomba de fabricação caseira foi entregue pelo correio na casa de um funcionário da Anistia Internacional em São Paulo. O alvo era o apartamento do professor de educação física José Eduardo Bernardes da Silva, 40, militante da entidade e que vinha recebendo ameaças pelo telefone. É o segundo atentado em menos de um ano contra a Anistia no Estado, que fechou sua sede na capital, em março passado, em razão de sucessivos incidentes com grupos neonazistas.

Neonazis atentam contra um funcionário da Anistia. Se em países desenvolvidos há neonazistas, o Brasil tem de ter os seus. Se não existe, se fabrica. Ainda segundo a Folha, Bernardes da Silva, professor de educação física com mais de 130 quilos de massa, é o mesmo funcionário que encontrara, em setembro de 99, uma bomba de fabricação caseira no escritório da Anistia em São Paulo. Na época, a entidade recebera uma carta com a foto de um travesti nu com a mensagem: "Vocês defendem homossexuais e negros, nós os matamos. Vocês são nossos inimigos. Morte a vocês".

O jornal registra depoimento do rabino Henry Sobel, aquele das gravatas, lembram? "A covardia demonstrada pelo remetente que se manteve anônimo, e se escondeu indicando um endereço fictício, é tão deplorável quanto o ódio e o preconceito que motivaram o ato".

No dia seguinte, lemos que a Justiça Global Ação e Capacitação em Direitos Humanos irá levar o caso das ameaças à ONU. Em Londres, a Anistia Internacional anuncia que há quase um ano a polícia de São Paulo sabe das ameaças contra Bernardes da Silva, mas não resolveram o problema.

Uma outra carta de ameaça foi entregue no escritório da Anistia em Porto Alegre, onde Silva refugiou-se, depois de ser ameaçado em São Paulo. Poucas pessoas sabiam de sua transferência, uma tentativa de escapar da perseguição dos neonazistas. Vemos então que os neonazistas têm uma organização de âmbito nacional, muito bem informada, que persegue suas vítimas onde quer que elas se escondam. Ainda no dia 07, os neonazis continuam agindo. Diz a Folha:

GRUPO GAY RECEBE PACOTE-BOMBA EM SP

O artefato, similar ao enviado dois dias antes à Anistia, poderia matar; diz o jornal. Bernardes da Silva, que diz ter escapado de três emboscadas nos últimos doze meses, descreve os agressores: bem arianos, pele e olhos claros, andam em carros bons e têm conhecimento de tecnologia.

Fazem as ameaças por telefone e desligam antes de o número de origem ser rastreado. O grupo que faz ameaças por telefone também fala inglês, alemão e francês, além do português. Eles afirmam que têm ligações internacionais muito fortes e que, aqui no Brasil, têm gente muito poderosa que os patrocina, afirmou Silva. Os neonazistas são poliglotas e falam línguas européias. Sob o título "Ameaças Covardes", a Folha faz incisivo editorial contra o perigo neonazista:

Não poderia ser mais trágica a aplicação da tese das idéias fora de lugar a que tem sido levada a termo por autoproclamados grupos neonazistas na cidade de São Paulo. Anteontem, José Eduardo Bernardes da Silva, da Anistia Internacional, recebeu em sua casa uma carta-bomba, que só não lhe causou danos porque, calejado por outras ameaças inclusive de mesmo porte, Silva teve o cuidado de não destampar o pacote e de chamar a polícia.

O professor de educação física manifesta medo: Eu ando nas ruas olhando para os lados, não faço o mesmo caminho para chegar em casa, evito freqüentar os mesmos lugares e sair com minha família. O medo me faz ser mais cauteloso.


Dia 09 de setembro, o atentado assume proporções internacionais:

ANISTIA FAZ CAMPANHA MUNDIAL CONTRA
ATENTADOS DE SKINHEADS EM SÃO PAULO


A Anistia Internacional deu início ontem a uma campanha mundial contra os atentados de grupos que se autodenominam skinheads em São Paulo. Um comunicado do secretariado da entidade, em Londres, foi enviado às sedes nacionais da Anistia, espalhadas pelo mundo, onde as mensagens serão traduzidas e redistribuídas.


Dia 10, a Folha faz uma sinopse sobre

A ESCALADA DO RACISMO

Ainda no mesmo dia:

PARA O MINISTÉRIO PÚBLICO DE SÃO PAULO,CRIMES DE GRUPOS
NEONAZISTAS ERAM TRATADOS DE FORMA BUROCRÁTICA


O cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, da USP, é taxativo: as duas bombas deveriam ser interpretadas como atentados à democracia. A Alemanha só conseguiu desbaratar os grupos neonazistas nos últimos dez anos quando começou a ter uma coordenação nacional. Enquanto cada Estado agia por conta, foi um fracasso.

Dia 15, a aposta aumenta:

ENTIDADES VÃO À ONU CONTRA ATENTADOS

Nove entidades de defesa dos direitos humanos e de minorias encaminharam ontem um documento a Asma Jahangir, relatora especial da ONU (Organização das Nações Unidas), pedindo que a entidade pressione o governo brasileiro a esclarecer os atentados a bomba em São Paulo.


Para fugir aos atentados neonazis, o professor Bernardes da Silva refugiou-se na Espanha. Desde então, os movimentos negros ou gays não receberam mais bombas. Fevereiro de 2001: a caligrafia de Bernardes da Silva bate com a dos bilhetes enviados para entidades de direitos humanos na primeira semana de setembro. O professor, funcionário da Anistia, é indiciado pelos atentados ocorridos no ano passado.

E desaparece, providencialmente, do noticiário.

 
FIÚZA, O PATRIOTÃO EMÉRITO


Só não vou pedir perdão ao leitor por estar-me alongando nesta novela da brasileira na Suíça, porque acredito que o leitor esteja também interessado. O caso é emblemático e além de desvelar uma faceta importante da imprensa contemporânea, mostra a verdadeira personalidade de muitos cronistas e os ressentimentos nutridos seja em relação à Europa, seja em relação à falência da ideologia marxista. A affaire é extremamente didática e mereceria um sólido ensaio sobre as reações suscitadas.

Sem falar, que a história toda me diverte. Um leitor atento enviou-me o artigo infra, escrito pelo jornalista Guilherme Fiúza e publicado no Globo de ontem. Mesmo três dias depois de evidenciado o embuste, mesmo depois da súbita retração de Lula após suas bravatas iniciais, mesmo depois das desculpas esfarrapadas de Clóvis Rossi e Elaine Cantanhêde, ainda há quem pretenda que a imprensa nacional só publica verdades e que Paula Oliveira é uma pobre vítima. O que me lembra aquele polêmico astrólogo, que sempre provou por A + B que existiam armas de destruição massiva no Iraque. Depois que Bush admitiu seu engano e admitiu que tudo não passara de uma grossa mentira, ele deve estar acreditando ainda que Bush é quem se engana ao admitir que se engana. Voilà a pérola:

NÓIS É COLÔNIA

DOM, 15/02/09
POR GMFIUZA

Paula Oliveira não escapará do linchamento. Se for culpada, os anjinhos nazistas da Suíça estão prontos para pendurá-la na cruz da xenofobia. Se for inocente, terá de conviver com o fato de que seu país se envergonhou de lhe dar solidariedade. É por isso que o Brasil é (e para sempre será) uma colônia. Apesar dos ganidos terceiromundistas, continua subalterno. Na alma.

Só uma alma subalterna poderia, ao ouvir a polícia suíça acusar Paula de golpe, passar a desconfiar imediatamente da brasileira. Até prova em contrário, os suíços estão certos. Afinal, eles são… Suíços.

Se não fosse covarde, o Brasil jamais adotaria o silêncio oficial sobre o caso Paula. Ao contrário, reforçaria seu discurso público exigindo investigação rigorosa. Mas o Brasil, a princípio, duvida dos brasileiros.

Paula Oliveira é uma advogada bem formada, mora legalmente na Suíça, trabalha numa empresa conhecida e estável, é noiva de um cidadão suíço que, como ela, não tem delitos no currículo. Paula pode ter pirado. Mas se não merece crédito a priori, quem vai merecer?

A polícia suíça afirmou que a brasileira provavelmente se auto-flagelou, porque as marcas de navalha estão todas ao alcance de suas mãos. Seja qual for a verdade, essa afirmação, tecnicamente ridícula, é um show de leviandade e prepotência. O Brasil, se não fosse uma colônia, deveria repudiá-la.

Mas a vida segue, e você deve torcer para não ter seus olhos furados por vândalos nas ruas de Zurique. Os suíços poderão acusá-lo de tentar ganhar uma pensão para deficientes físicos. Afinal, seus olhos estão ao alcance das suas mãos.
Paula pode não ter sido atacada. Pode ter sido atacada e abortado. Pode ter sido atacada e, transtornada, ter fantasiado o aborto. É o que as investigações vão esclarecer, se forem isentas. E não há nem meio indício de isenção na postura sôfrega das autoridades suíças.

Começa a se formar uma onda contra a imprensa brasileira nos jornais europeus. Como ousam esses periféricos de segunda classe afrontar desta maneira uma nobre cidadela do Primeiro Mundo?

Vamos deixar claro, pelo menos aqui neste espaço: a Suíça, além das inclinações totalitárias, é o paraíso mundial da corrupção. Seus bancos, como se sabe, lavam mais branco. Portanto, devagar com esses arroubos virtuosos.

E eles construirão a verdade que quiserem sobre Paula. Porque o Brasil, para variar, está botando o rabo entre as pernas.